Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01852/07.9BCLSB
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO
FUSÃO DE SOCIEDADES
CONCEITO INDETERMINADO
DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS
Sumário:I - A autorização administrativa de transmissibilidade de prejuízos fiscais está dependente do preenchimento dos requisitos enunciados no artigo 69.º do CIRC (na redacção em vigor à data), o que obriga a que a operação de fusão seja realizada por razões económicas válidas (como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes) e se encontre inserida numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. Para esse efeito, o requerente deve fornecer à entidade administrativa competente todos os elementos necessários para o perfeito conhecimento da operação, já que lhe compete o ónus de prova dos pressupostos constitutivos do direito que invoca (art. 74.º, n.º 1, da LGT).
II - Porém, no caso de indeferimento do pedido, a administração está obrigada a expressar os motivos e critérios objectivos que utilizou para chegar a essa decisão, pela enunciação das razões por que entende que a operação não se encontra devida ou suficientemente documentada para o fim em vista; o que o tribunal tem de poder sindicar, até porque a actividade probatória administrativa constitui uma actividade vinculada e, como tal, sujeita a sindicância jurisdicional.
III - Se a administração não põe em causa a documentação da operação, terá de expor as razões pelas quais refuta o juízo valorativo que o requerente dela extraiu, isto é, os motivos por que considera que a documentação não evidencia os intuitos e as vantagens económicas invocadas. O que tem de ser efeito através de um discurso fundamentador de particular intensidade, que demonstre a lógica, a pertinência e a razoabilidade do juízo valorativo administrativo formulado, revelador da sua forma de concretização conceptual e dos parâmetros avaliativos utilizados, de modo a evidenciar o bem fundado da formação dessa divergente convicção, e que o tribunal tem de poder sindicar.
IV - Apesar de estarem em causa conceitos indeterminados, cujo sentido, alcance e integração passam por um exercício interpretativo e valorativo pelo órgão administrativo decisor, o certo é que eles estão voltados para atingir um entendimento comum que a própria norma há-de fornecer em larga medida, ainda que para tal seja necessário interpretá-la em conformidade com o ordenamento jurídico e com a mens legislatoris. Pelo que, no preenchimento e concretização desses conceitos, a administração está obrigada a desenvolver uma actividade vinculada de interpretação da norma e há-de chegar, em princípio, a uma única solução para o caso concreto, não lhe sendo possível guiar-se por uma liberdade subjectiva ou por critérios de oportunidade. Nessa medida, está em causa um poder vinculado, que o tribunal tem de poder sindicar.
V - Acresce que o próprio processo de concretização do juízo administrativo e os parâmetros de avaliação utilizados não são inteiramente livres, pois têm de se revelar apropriados, coerentes e razoáveis, estando a administração legalmente vinculada a respeitar as regras técnicas para que a lei remete. E o tribunal não pode eximir-se ao controlo judicial desse processo.
VI - Em suma, os tribunais não podem recusar ao interessado a possibilidade de obter um controlo efectivo da aplicação, pela administração, de normas que contém conceitos indeterminados. O que não significa que o controlo judicial dos actos de concretização deste tipo de conceitos seja irrestrito, pois podem existir situações em que distintos actos de concretização do mesmo conceito se adaptam à norma, sendo qualquer um deles possível, viável e lícito; nesses casos, a incidência do controle judicial há-de restringir-se aos limites da razoabilidade da solução escolhida de entre as que se apresentavam como possíveis e legítimas.
VII - Os conceitos indeterminados de cujo preenchimento a norma do CIRC faz depender a autorização de transmissibilidade dos prejuízos destinam-se a evitar que a operação de fusão – com a transmissibilidade de prejuízos que proporciona – tenha sido realizada por razões predominantemente fiscais, pois o legislador não quer que o desagravamento fiscal suceda quando se constate que a operação nunca teria tido lugar caso não fossem as vantagens fiscais que proporciona. Ou seja, a operação tem de ter tido uma motivação eminentemente económica, ainda que tal acarrete, de forma associada, a obtenção de uma vantagem fiscal.
VIII - Esta é a justificação normativa que deve servir para fixar os critérios de interpretação e integração dos conceitos contidos no artigo 69.º do CIRC, o que afasta um tratamento puramente dogmático da operação de fusão e obriga a um exame da situação concreta à luz de todo o contexto jurídico-económico em que ela se desenvolveu, com a análise e ponderação de todas as circunstâncias inerentes apreciadas globalmente, para desse modo averiguar se, do ponto de vista económico, ela faz sentido no seu todo.
IX - A asserção, como única motivação para o indeferimento do pedido, de que o património da entidade incorporada registava um valor negativo no balanço anterior à fusão, constitui um critério redutor sem aptidão e idoneidade suficiente para abalar e desconsiderar integralmente as vantagens económicas da fusão evidenciadas por toda a documentação apresentada e que não foi objecto de contestação. Tal motivação não evidencia, sequer, que tenha sido examinado todo o contexto jurídico-económico em que a operação se desenvolveu e ponderadas as especificidades do caso concreto, ou que a administração tenha atentado na justificação normativa do preceito.
X - Encontrando-se a motivação económica enunciada pelo contribuinte devidamente documentada por forma a evidenciar, de modo convincente, a estratégia empresarial utilizada em termos de racionalidade económica e de melhoria do seu desempenho em função da absorção das áreas de negócio da entidade bancária incorporada, o interesse económico da operação e a sua inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo com efeitos positivos na estrutura produtiva, competia à administração fiscal um especial dever de fundamentação, pela evidenciação do carácter artificioso da fusão, por forma a convencer que ela visou unicamente, ou de forma predominante, propósitos de obtenção de vantagens fiscais.
XI - O n.º 4 do artigo 69.º do CIRC, ao estabelecer que «no despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a estabelecer o escalonamento da dedução», visa apenas escalonar o benefício se a administração fiscal o entender necessário após deferir o pedido, não constituindo um requisito ou condição de acesso ao regime contido no artigo 69.º do CIRC.».
Nº Convencional:JSTA000P26503
Nº do Documento:SA22020101401852/07
Data de Entrada:07/22/2019
Recorrente:SECRETÁRIO DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS
Recorrido 1:A....... COMUNICAÇÕES INTERACTIVAS, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão


1. RELATÓRIO

1.1.A……… — COMUNICAÇÕES INTERACTIVAS, S.A.”, intentou a presente acção administrativa especial contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, pedindo a anulação do Despacho n.º 98/2007 – XVII, de 2 de Fevereiro, proferido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ao abrigo de delegação de competências, que indeferiu o pedido que havia formulado ao abrigo do disposto no artigo 69.º, n. 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC - na redacção em vigor até à republicação do Código operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho) e a sua condenação a admitir B………. II — Comunicações Interactivas, S.A.” (doravante "B………"), “C……… — Informática e Comunicação, S.A.” (doravante "C………."), “D……….— Música Interactiva, S.A.” (doravante "D……….”),E……….. — Serviços de Telecomunicações e Transferência de Informações, S.A.” (doravante "E………") e F……..— Plataforma de Comércio Electrónico, S.A. (doravante "F……”.).

1.2. Julgada integralmente procedente a acção, com a consequente anulação do despacho impugnado e condenação da Ré a praticar acto que defira a pretensão, sem prejuízo de um plano específico para essa dedução, nos termos do n.º 4 do artigo 69.º do citado diploma legal, veio o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais interpor o presente recurso jurisdicional, cuja motivação rematou com as seguintes conclusões:

«A) Ao ter deliberado anular o despacho nº 98/2007-XVII, de 02.02.2007, do SEAF e condenado o mesmo à prática do acto decisório de deferimento do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, por verificação dos pressupostos legais contidos no art. 69º do CIRC, sem prejuízo da fixação de um plano específico de dedução desses prejuízos, o, aliás, douto Acórdão recorrido fez uma incorrecta interpretação e aplicação do art. 69º do CIRC, na redacção à data aplicável aos factos, bem como, dos art.s 71º nº 2 e 95º nº 5 do CPTA, motivo pelo qual não se pode manter.

Quanto ao segmento decisório de saber se é sindicável pelo Tribunal o juízo da Administração Fiscal quanto à existência de razões económicas válidas:

B) O Acórdão ora recorrido considerou, contrariamente ao que a entidade demandada havia invocado, que a questão de saber se a operação de fusão foi efectuada por razões económicas válidas podia ser sindicada pelo Tribunal remetendo nesta questão para o já deliberado no Acórdão do STA de 27.11.2013, proferido no processo nº 01159/09.

C) Ora, embora o Acórdão ora recorrido tenha remetido para a jurisprudência constante do Acórdão de 27.11.13, também é certo que o mesmo STA também já entendeu, cfr., entre outros, Acórdão da 2ª Sec., do STA, de 12/07/06, proc. nº 1003/05, que “ saber se houve “razões económicas válidas” ou se a fusão “ se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie” e que, “este seu juízo não pode ser fiscalizado pelos tribunais. A menos que ocorresse erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal

D) Assim, contrariamente ao entendido pelo Acórdão recorrido, também parte da jurisprudência vem entendendo que, o saber se a operação de fusão realizada foi efectuada por razões económicas válidas envolve juízos de valor inseridos numa grande margem de liberdade de apreciação da AT, uma vez que estamos no campo da chamada discricionariedade técnica.

E) Deste modo, não só o juízo emitido pela AT, de considerar que a operação não foi efectuada por razões económicas válidas, não é, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, sindicável pelo Tribunal, como também, porque o acto que a A. pretende que o Tribunal condene a AT a emitir envolve valorações próprias do exercício da actividade administrativa, não sendo identificável uma única solução como legalmente possível, não pode, salvo o devido respeito, o Tribunal substituir-se à AT e determinar o conteúdo do acto a praticar pela mesma, cfr. art. 71º nº 2 e 95º nº 5 do CPTA.

F) Donde, devendo os conceitos de “razões económicas válidas” e o de “ se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, definir-se como indeterminados e cujo preenchimento cabe à Administração, a valoração que foi feita no despacho impugnado no que concerne à ausência de “razões económicas válidas” necessárias ao deferimento do pedido de dedução de prejuízos, releva de considerações de interesse público, pelo que, o juízo a esse respeito formulado escapa à fiscalização dos tribunais, só podendo os mesmos controlar o acto administrativo por existência de erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal.

G) Ora, lido o Acórdão ora recorrido, constata-se que o mesmo entendeu apreciar da bondade do acto impugnado, da validade substancial tecendo considerações sobre o contexto jurídico-económico em que a operação decorreu, mais, dando apenas relevo a um Estudo Demonstrativo das Vantagens Económicas da Fusão, considerações estas que foram muito para além da indagação sobre a existência do erro grosseiro ou da desadequação ao fim legal.

H) Termos pelos quais, quanto ao 1º segmento decisório do Acórdão ora recorrido há que concluir que o mesmo não só fez uma errada interpretação do nº 2 do então art. 69º do CIRC, como também, extravasou dos poderes que a lei processual lhe confere nos artigos 71º nº 2 e 95º nº 5 do CPTA, tendo-se substituído, sem que para tanto detivesse competências, à AT, na apreciação e valoração do que são razões económicas válidas.

I) Pelo que, o Acórdão recorrido, neste segmento, não se pode manter devendo ser, desde logo, revogado e ser mantido o acto impugnado.

Quanto ao segmento decisório de saber se, no caso em concreto, a fusão foi realizada por razões económicas válidas:

J) O acto de fusão tem de envolver não só o interesse económico das entidades envolvidas na fusão, mas também deve revestir-se de interesse público e não pode ter como objectivo a diminuição da carga tributária, por parte da sociedade incorporante.

K) Ora, na análise da operação de fusão por incorporação em que a então A., ora recorrida, é parte e, na apreciação do interesse económico da mesma, a AT considerou que o contributo fornecido pelas sociedades incorporadas, que tinham um passivo superior ao activo e que apenas tinham prejuízos fiscais para transmitir, não podia deixar de sobrecarregar a incorporante no seu objectivo de reorganização e de viragem de resultados futuros.

L) Donde, tendo a AT eleito como critério para avaliação de uma empresa, o do património líquido, para estabelecimento de um limite de dedução de prejuízos fiscais nas situações de fusão de empresas, não podia, salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” ficar alheado da realidade espelhada no balanço, à qual deveria ter dado o devido relevo, devendo concluir que a fusão não era realizada por razões económicas válidas, mas por simples razões fiscais.

M) Pelo que, face ao invocado, ainda que a ora recorrida pretenda que a eliminação de estruturas é razão económica válida, assume toda a legitimidade e adequação ao fim legal a posição da AT que concluiu, com base nos motivos atrás referidos, que não ficou demonstrado que a operação em causa tivesse efeitos positivos na estrutura da ora recorrida, pelo contrário, os resultados positivos ao longo do período projectado decorrem exclusivamente, ou quase exclusivamente, da contribuição da incorporante. Ou seja não existe, nas palavras do Ac. do STA, de 5/07/06, interesse sacrificado - perda da receita fiscal -, proporcional ao interesse salvaguardado - ganhos macro-económicos obtidos com a fusão.

N) O acórdão recorrido analisou menos bem os factos e aplicou e interpretou também deficientemente o artigo 69º do CIRC, tendo apenas considerado anular o acto com base num juízo que até nem se verifica, que a AT não infirmou a motivação produzida pela A. De facto, pergunta-se, tinha a AT que contestar, ponto por ponto, o estudo apresentado pela A.? Tinha que pedir documentos ou esclarecimentos? É evidente que não.

O) Se a AT entende que a motivação apresentada pela então A. é insuficiente, por ser inerente a todas as operações de fusão, para demonstrar a existência de razões económicas válidas, bastava-lhe, como o fez, salientar o que também é evidente, que o facto de as incorporadas só legarem um património negativo para a incorporante não vai ter efeitos positivos futuros na estrutura produtiva da mesma.

P) Contrariamente ao que se afirma no Acórdão recorrido, esta consideração não representa uma “regra geral de exclusão automática da possibilidade de transmissibilidade de prejuízos fiscais quer tenha ou não havido propósito de evasão ou fraude fiscais”. Na verdade do que se trata é de determinar, tendo em conta a existência de um evidente benefício fiscal com a transmissão dos prejuízos fiscais, se se justifica a perda de receita fiscal inerente à concessão de tal benefício.

Q) Há, pois, que ponderar os interesses em confronto e o benefício só será de atribuir caso os interesses sacrificados forem proporcionais aos salvaguardados.

R) Salvo o devido respeito também não deveria o Acórdão recorrido ter anulado o acto sem cuidar de ponderar se, pese embora o facto de haver só património negativo, as incorporadas iriam contribuir para a melhoria da estrutura produtiva da incorporante. Se a AT considerou que não existia e que, pelo contrário, a incorporante ficava sobrecarregada no seu objectivo de reorganização e de viragem de resultados futuros, então, salvo o devido respeito, não poderia o Tribunal “a quo” abdicar de analisar devidamente o Estudo Demonstrativo das Vantagens Económicas da Operação e, com base nele, afastar a conclusão da AT .

S) Como já se disse, para a AT é evidente que tendo analisado tal Estudo apresentado pela A. e tendo considerado que não havia nele quaisquer outras razões válidas, para além das vantagens inerentes a uma operação de fusão, então, ponderados os interesses em causa, o que tinha maior peso eram as vantagens fiscais que a A. obteria com a operação em causa.

T) O que também legitima a conclusão de que o fim que determinou a realização da operação foi a finalidade fiscal, o aproveitamento dos prejuízos fiscais das incorporadas para diminuir o lucro tributável da incorporante, o que comprova o carácter abusivo da operação.

U) Face a esta conclusão, também é certo que à AT era legítimo concluir, como o fez, que o facto de a incorporada ter legado à incorporante um património negativo, inviabilizaria qualquer plano de deduções, nos termos do Despacho nº 79/2005-XVII, de 15/04, do SEAF.

V) Contudo, não foi a aplicação de tal despacho que motivou o indeferimento do pedido de transmissão de prejuízos fiscais. A referência a esta orientação administrativa constituiu, ao invés, mais um acréscimo para alertar para as consequências decorrentes da transmissão de um património líquido negativo.

W) Assim esta invocação não pode ser vista, como um fundamento autónomo para o indeferimento do pedido da então A.

X) De facto, o que motivou o indeferimento foi o facto de a entidade demandada ter considerado, no âmbito da sua discricionariedade técnica, que a fusão não se revestia de razões económicas válidas face à transmissão, por parte das incorporadas, de um património líquido negativo.

Y) Termos pelos quais, quanto ao 2º segmento decisório do Acórdão ora recorrido há que concluir que o mesmo fez uma errada interpretação e aplicação do dos nºs 2 e 4 do então art. 69º do CIRC, aos factos, motivo pelo qual não deve ser mantido».

1.3. A Recorrida, notificada da admissão do recurso, contra-alegou, elegendo, a final, como razões determinantes para o não provimento do recurso, as seguintes:

«A. O ato de indeferimento em causa nos autos fundamentou-se unicamente no argumento de que a Fusão não teria sido realizada por razões económicas válidas por os patrimónios das sociedades incorporadas serem negativos à data em que aquela operação ocorreu.

B. Este é um erro mais que grosseiro (dir-se-á mesmo, aberrante) cometido pelo Recorrente.

C. Ademais, a decisão de indeferimento da autoria do Recorrente contraria a posição que vem sendo postulada pela doutrina e jurisprudência (do STA e do TCAS) relevantes.

D. O Réu contrapõe que a AT tinha discricionariedade técnica e que o TCAS “extravasou dos poderes que a lei processual lhe confere nos artigos 71º nº 2 e 95º nº 5 do CPTA, tendo-se substituído, sem que para tal detivesse competências, à AT, na apreciação e valoração do que são razões económicas válidas”.

E. No entanto, o Recorrente parece esquecer que, perante todos os factos e todos os elementos apresentados pela Autora demonstrando as “razões económicas válidas” da fusão, o Recorrente considerou que as mesmas não se verificavam única e exclusivamente porque as entidades incorporadas por fusão apresentavam património líquido negativo.

F. Ora, se este foi o único fundamento do Recorrente para considerar que não existiam “razões económicas válidas”, sendo tal fundamento grosseiramente ilegal, e se a existência destas “razões” constitui o único critério legal para exercer o direito previsto no n.º 2 do artigo 69.º do CIRC, então o “ato devido” em relação ao qual deve ser condenada a administração só pode ser o deferimento do pedido.

G. O argumento do Recorrente demonstra também um certo arreigamento ao antigo contencioso de anulação, rejeitando a condenação à prática de ato devido.

H. A prova disso mesmo é que o Recorrente, em outro processo muito semelhante ao presente, foi condenado a deferir o pedido e fê-lo… mas considerando que os prejuízos a deduzir são no montante de zero (palavra de honra) pois a sociedade incorporada tinha um património líquido negativo.

I. Na verdade, o Recorrente recusa-se a reconhecer que o motivo que apresentou para considerar que a fusão não foi efetuada por “razões económicas válidas” está grosseiramente errado, motivo pelo qual, nas suas alegações de recurso, volta a insistir (ainda e sempre) que é este o motivo pelo qual o pedido de dedução de prejuízos deverá ser negado e a decisão recorrida revogada.

J. O Recorrente chega a admitir que a AT analisou o estudo das vantagens económicas apresentado pelo Autor, “tendo considerado que não havia nele quaisquer razões válidas, para além das vantagens inerentes a uma operação de fusão”.

K. Ou seja, admite que a fusão em causa apresenta as vantagens económicas inerentes.

L. O Recorrente parece ignorar a interpretação do conceito de “razões económicas válidas” efetuada pelo TJUE e pela própria AT, pela mão do SEF, no parecer n.º 70/03, exigindo vantagens “para além das inerentes à fusão” (sejam elas quais forem, já que esta passagem permanece enigmática).

M. A verdade é que a AT nunca obstou às vantagens económicas apresentadas pela Autora e, presumindo-se que a fundamentação do ato de indeferimento está completa, então é de concluir que, no entendimento da AT, estas vantagens ocorrem, pelo que o conceito de “razões económicas válidas” encontra-se preenchido.

N. Caem assim por terra todos os argumentos do Recorrente, devendo este recurso ser considerado totalmente improcedente.

O. Caso este Venerando Tribunal venha a dar provimento ao recurso – o que apenas por cautela de patrocínio se equaciona, sem conceder –, requer-se a ampliação do âmbito do recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 636.º do CPC, aplicável por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.

P. A Autora procedeu ao saneamento financeiro logo após a fusão, sendo certo que poderia tê-lo feito, caso tivesse conhecimento do esdrúxulo entendimento da AT, antes da mesma, situação em que as participadas teriam apresentado uma situação patrimonial positiva à data da fusão.

Q. Uma vez que a AT havia deferido um mesmo pedido de dedução de prejuízos a propósito de uma fusão anterior de uma participada na Autora, em que foram apresentadas as mesmas vantagens económicas mas em que a participada apresentava uma situação patrimonial positiva, então é lícito concluir que o presente pedido seria também deferido.

R. Caso subsistam dúvidas a este Venerando Tribunal sobre o conceito de “razões económicas válidas” e a sua relação com a situação patrimonial negativa das participadas, então deverá ser efetuado o reenvio prejudicial nos termos solicitados».

1.4. Colhidos os “vistos” dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos, vem agora, por a tal nada mais obstar, os autos à conferência para decisão.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1. Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, na sua vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou, se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), situação em que não podem ser reapreciadas pelo Tribunal ad quem. Na sua vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso que são duas as questões que se colocam para decidirmos.

A primeira prende-se com a questão de saber se é admissível que o Tribunal sindique o juízo da Administração Tributária quanto à existência de razões economicamente válidas para efeitos de deferimento do pedido de dedução de prejuízos fiscais ao abrigo do preceituado no artigo 69.º do CIRC, designadamente fora de um quadro referencial de existência de erro grosseiro, sendo que para a Entidade Recorrente a resposta a esta questão só pode ser negativa, pelas razões vertidas nas conclusões A) a I) das suas alegações de recurso.

A segunda, sendo dada resposta negativa àquela primeira, está directamente conexionada com a questão de mérito, isto é, com a questão de saber se no caso em análise está ou não verificado o interesse económico válido das entidades envolvidas na fusão - que o artigo 69.º do CIRC tem como pressuposto para que seja deferida a pretensão de dedução dos prejuízos fiscais -, o que a Recorrente não aceita pelas razões aduzidas nas conclusões J) a Y), da já referida peça processual de recurso.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

3.1.1. O julgamento de facto mostra-se exarado na sentença recorrida nos termos que infra se transcrevem:

«Tendo em atenção a prova documental junto aos autos, o constante do processo administrativo (cujas folhas não se mostram numeradas) e as posições assumidas pelas partes, dá-se com assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão:

A) A Autora foi constituída em 2000, com a firma social "A………… Mutimédia.Com — Serviços de Acesso à Internet, SGPS, S.A." e com o objecto social de "gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indirecta de exercício de actividades económicas" – cfr. documento n.º 9 junto à petição inicial.

B) Em 31 de Maio 2004, a Autora perdeu o estatuto de SGPS, alterando a sua firma para a actual (“A……… — Comunicações Interactivas, S.A.”) e o seu objecto social para a "prestação de serviços e desenvolvimento e comercialização de produtos e serviços nas áreas de telecomunicações, sistemas de informação e multimédia, bem como a gestão de informação, elaboração de produtos informáticos, formação e comunicação" - cfr. documento n.º 9 junto com a petição inicial.

C) Em 31 de Dezembro de 2003 (último balanço efectuado antes da Fusão, cujo efeito retroagiu a 01.01.2004), a Autora apresentava uma situação líquido-contabilística negativa no montante de € 297.594.523,00, conforme rúbrica do capital próprio constante do balanço a 31 de Dezembro de 2003 - cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial.

D) Por escritura pública celebrada em 14 de Dezembro de 2004, ficou concluída a fusão por incorporação das sociedades “B………. — Comunicações Interactivas, S.A.” (doravante "B……….), “C……….. — Informática e Comunicação, S.A.” (doravante "C………."), “D………— Música Interactiva, S.A.” (doravante "D…….."), “E………— Serviços de Telecomunicações e Transferência de Informações, S.A.” (doravante "E……..) e F……… — Plataforma de Comércio Electrónico, S.A. (doravante "F……..") na Autora - cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial.

E) As cinco sociedades incorporadas pela Fusão apresentavam, nos balanços efectuados em 31 de Dezembro de 2003 (rúbrica do capital próprio), uma situação líquido-contabilística negativa nos seguintes montantes:

Sociedade Situação líquida

B……….. (7.704.828)

C…………. (2.139.034)

D………… (530.004)

E………… (12.652)

F………. (5.581.044)

Total (15.967.562) - cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial.

F) Em 28 de Janeiro de 2005, a Autora apresentou, ao abrigo do n.º 1, do artigo 69.º do Código do IRC, um requerimento solicitando a dedução dos prejuízos fiscais das sociedades fundidas que instruiu com os seguintes documentos: escritura pública de fusão, Declarações de rendimentos Modelo 22 de IRC; fotocópia do projecto de fusão, Estudo demonstrativo das vantagens económicas da operação de fusão, fotocópia do parecer do ROC independente, que consta do projecto de fusão, fotocópia da certidão do registo comercial da sociedade incorporante, informação sobre os lucros previsíveis da sociedade incorporante para os seis exercícios seguintes ao da operação, fotocópia dos balanços e das demonstrações de resultados de todas as sociedades envolvidas na operação referentes aos três exercícios anteriores ao da operação e fotocópia dos balanços e das demonstrações de resultados provisionais para os três exercícios seguintes ao da operação da sociedade incorporante - cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial.

G) No documento intitulado por "Estudo demonstrativo das vantagens económicas da fusão» que acompanhou o pedido identificado na alínea antecedente, consta, além do mais, o seguinte:

«II. Descrição da operação de reestruturação e seus objectivos

Conforme referido no requerimento apresentado de que o presente estudo é parte integrante, por razões que se prendem com a racionalização da respectiva actividade, com o aumento da eficácia na gestão global do Grupo A………. , e com o reforço da sua imagem e presença comercial na área das telecomunicações em Portugal, o Grupo em apreço pretende proceder à fusão por incorporação das sociedades B…….. C…….. … D……… e E………. que operam em negócios complementares da internet, serviços de e-commerce e multimédia, gestão de redes e de portais em Portugal.

O processo de fusão por incorporação acima enunciado traduziu-se na transferência global dos activos e passivos das sociedades supra referidas para a esfera da A………..., nos termos do artigo 98° do Código das Sociedades Comerciais.

O acto de concentração projectado insere-se, portanto, no plano estratégico que visa reorganizar a estrutura societária do Grupo, simplificando, por um lado, a respectiva estrutura administrativa, contabilística, legal e comercial e aumentando, por outro, a eficiência económica e a capacidade competitiva das unidades comerciais actualmente existentes nas diversas empresas incorporadas, concentrando deste modo na esfera da A………. as várias vertentes de negócio desenvolvidas até ao presente momento por entidades jurídicas distintas.

Com efeito, o enquadramento económico e regulamentar do sector das telecomunicações tem sofrido nos últimos anos uma profunda alteração que tornou imperativa a reestruturação do Grupo nas múltiplas vertentes de negócio, nomeadamente no que concerne à necessidade de apresentar uma oferta integrada ao nível da prestação de serviços, desenvolvimento e comercialização de produtos e serviços nos domínios da Internet, comércio electrónico e multimédia. Adicionalmente, e perante um ambiente de negócio cada vez mais competitivo quer em termos nacionais, quer em termos internacionais, torna-se crítico para a A………. a realização de um conjunto de medidas de reestruturação - onde se inclui a operação de concentração vertente - tendo em vista assegurar a competitividade através da racionalização e integração de recursos que, actualmente, se encontram dispersos por entidades distintas.

Concretamente e sendo a A………. detentora da totalidade do capital social das sociedades a incorporar, a operação de concentração em apreço pretende satisfazer os seguintes objectivos:

1. Na perspectiva dos sócios

Com a implementação do processo de reestruturação delineado através da unificação das sociedades supra referidas, espera-se rentabilizar de uma forma significativa os capitais próprios, em virtude de a concentração societária possibilitar a obtenção de melhores níveis de remuneração para estes mesmos capitais.

Importa ainda referir que a concentração das sociedades a incorporar permitirá à A……... a concentração do volume de negócios e do património das sociedades resultantes do processo de reestruturação, situação que se reflectirá, nomeadamente, ao nível dos capitais próprios.

2. Na perspectiva dos recursos humanos

Uma organização de dimensão nacional valorizará os seus recursos humanos e irá criar funções com maior conteúdo técnico, decorrendo ainda de tal facto uma maior atenção à gestão de carreiras.

3. Na perspectiva das sociedades

O processo de fusão em apreço que tem como sociedade incorporante a A………. , visa a implementação de uma estratégia global que se pretende apta a responder a inúmeros desafios que se colocam presentemente; assim como a consolidação das actividades existentes com a criação de novos e mais eficazes mecanismos de controlo interno. Em termos futuros a A………. pretende continuar a apostar na liderança do mercado de serviços de internet e dos conteúdos, em todos os segmentos de mercado relevantes, subordinada aos imperativos de rentabilidade global do negócio, condição necessária para garantir o desenvolvimento e crescimento do Grupo neste negócio.

A concentração racional dos recursos até agora dispersos levará ao fortalecimento da presença do Grupo no negócio da internet e serviços multimédia nomeadamente através do redimensionamento das actuais unidades económicas, da eliminação de funções redundantes e aumento da quota de mercado resultante de uma melhoria da capacidade competitiva.

Saliente-se, aliás, que algumas das sociedades envolvidas na operação vertente não se encontravam com actividade já no exercício de 2003. Tal foi o caso da E………., D……….e F………….

Os objectivos a atingir nas diversas áreas funcionais são como se segue:

a) Área Comercial

Com a concentração das várias unidades de negócio na A……... pretende-se definir uma política de marketing e de distribuição mais efectiva em sintonia com os desafios que actualmente se suscitam neste sector, tratar e analisar de forma centralizada a informação comercial, responder de modo integrado às exigências dos clientes e introduzir novos métodos de abordagem ao mercado.

Entende-se que com a presente operação de concentração será possível a integração das operações na área da internet em todas as componentes de negócio em que se encontra presente (conteúdos, serviços, publicidade, e-commerce).

b) Área de Logística

Existirá uma reorganização na área de logística, o que permitirá introduzir novos métodos de gestão dos serviços, stocks - quando aplicável - e a melhoria do produto final a entregar ao cliente, originando uma alocação mais eficiente dos recursos e a consequente redução de custos.

c) Área Administrativa, Financeira e de Recursos Humanos

A reestruturação possibilitará a implementação de técnicas de gestão e controlo interno que não seriam passíveis de aplicação a nível individual pelos elevados custos que acarretariam, simplificando os fluxos internos e reduzindo as operações intra-grupo.

Por outro lado, os sistemas de informação serão uniformizados, tornando mais económica a sua actualização.

A dimensão da nova empresa racionalizará e reduzirá os custos relacionados com os processos administrativos (v. g.. preparação de demonstrações financeiras, entrega de declarações periódicas de IVA, elaboração do Dossier Fiscal, etc.) e potenciará novas oportunidades em termos de carreira profissional.

III. Vantagens decorrentes da reestruturação projectada e seus objectivos

Em face do anteriormente exposto, no presente estudo procurar-se-á demonstrar de uma forma detalhada, as vantagens económicas associadas à presente reestruturação a qual, conforme acima mencionado, E…………

1. Área Administrativa e Financeira

1.1 Economias

a) Ao nível de actos do Conselho de Administração e das Assembleias Gerais:

• Eliminação de reuniões do Conselho de Administração das sociedades B………., C…………., ……, D………. e E………..;

• Eliminação dos custos associados à manutenção de órgãos sociais das sociedades B………., C………., F………, D…….. e E………..;

• Eliminação das Assembleias Gerais das sociedades B………., C………., F…….., D………. e E……….:

•Eliminação de custos decorrentes da publicação de convocatórias e do cumprimento de prazos estatutários para a realização das referidas assembleias:

b) Ao nível de apoio jurídico e fiscal

Eliminação dos custos relativos à consultoria prestada por advogados e consultores em virtude da semelhança das actividades e das questões suscitadas na esfera das sociedades intervenientes.

1.2. Melhorias qualitativas face a terceiras entidades

a) Perante clientes

Relativamente a este primeiro ponto, é entendimento da sociedade ora Requerente que, por via da concretização da operação de reestruturação delineada, será possível alcançar uma maior racionalização do tipo de operações de natureza comercial praticadas junto dos respectivos clientes.

Por outro lado, ao criar-se um único departamento de marketing responsável pela promoção da sociedade resultante da fusão, será igualmente possível passar a desenvolver um planeamento integrado na promoção/venda dos produtos e unidades de negócio, nomeadamente através do lançamento de campanhas de publicidade junto do público em geral.

A operação vertente permitirá, também, fortalecer uma oferta competitiva e segmentada através das marcas de maior notoriedade (……… e B……….), tendo em consideração os segmentos residenciais e empresariais que se pretende atingir, facilitando a continuação da revisão dos processos de apoio ao cliente de modo a assegurar um nível de serviço em linha com a imagem de excelência que se pretende obter.

b) Perante fornecedores

Considerando que as sociedades envolvidas na fusão necessitam do fornecimento do mesmo tipo de produtos e serviços, por desenvolverem actividades similares/complementares o agrupamento em duas únicas entidades permitirá aumentar o volume dos fornecimentos e serviços contratados, contribuindo para uma melhoria significativa da capacidade negocial da A………. evidentes ganhos, não só ao nível da obtenção de preços mais reduzidos, como também das condições de pagamento acordadas, permitindo assim contribuir para uma redução dos custos operacionais e melhorar o rácio preço de venda/qualidade oferecida.

Como vantagem adicional refira-se ainda que, à semelhança das melhorias a obter junto de clientes, também ao nível de fornecedores a centralização numa entidade permitirá reduzir drasticamente o volume contabilístico associado ao tratamento dos custos incorridos por cada empresa, em virtude de as operações de aquisição de bens e/ou serviços fornecidos passarem a estar condensadas.

2. Área da Informática

Dependendo cada vez mais a gestão de uma sociedade da utilização de sofisticados equipamentos informáticos, a fusão em apreço permitirá rentabilizar os respectivos equipamentos e, bem assim, evitar a multiplicação dos custos de aquisição e manutenção dos mesmos ao nível do Grupo, libertando desta forma as disponibilidades financeiras obtidas com esta economia para outros sectores estratégicos e, naturalmente, para investimentos na esfera do Grupo A………..

Por outro lado, e do ponto de vista estritamente organizacional a centralização dos sistemas de apoio à contabilidade, à logística, à gestão de activos, à gestão do pessoal, permitirá ainda a criação de um sistema informático central, mais funcional, o que possibilitará por um lado a redução do volume e da complexidade do trabalho contabilístico, bem como o processamento de todo o tipo de operações informáticas e, por outro, a racionalização dos custos a nível interno pela afectação do pessoal a outras funções.

Por fim, e ainda como resultado das melhorias decorrentes do acto de concentração projectado, a criação de um único sistema informático permitirá melhorar, de forma significativa, os canais de comunicação interna, potenciando a capacidade de utilização da informação contida em ficheiros informáticos a qual conduzirá não só à redução dos custos de comunicação (utilização de serviço de estafetas, telefone, envio de faxes ou utilização de papel, entre outros), como também dos encargos suportados com terceiras entidades (por exemplo, consultores externos).

3. Área Comercial e Operacional

Na prestação de serviços de internet, a "customização" do produto final aos gostos e necessidades do cliente final apresenta-se como um dos factores críticos de sucesso do negócio do Grupo A…………

Neste sentido, e em face da dimensão que poderá ser atingida pelas novas empresas após a concretização das operações de fusão, será muito mais eficiente, do ponto de vista comercial e da racionalização dos recursos existentes aproveitar a sua capacidade para comercializar os referidos produtos do que continuar a insistir num modelo com cinco sociedades, o qual não só não é eficiente, pela multiplicação de custos exigida, como também não dá a resposta mais adequada às potencialidades de comercialização dos produtos e serviços em causa e, bem assim, ao desenvolvimento do próprio negócio.

Neste âmbito, assume especial relevância, no entender da sociedade ora Requerente, a redução de um sem número de operações e procedimentos diários que são efectuados presentemente pelas sociedades envolvidas no processo em curso e que passarão no futuro a ser concretizados apenas por si, como sociedade incorporante.

Esses procedimentos passam desde logo pelas operações resultantes da gestão da tesouraria, pelo controlo do crédito, pelo controlo de stocks, pela manutenção e supervisão de cinco contabilidades distintas e a consequente obrigatoriedade de prestação de contas.

Em face do exposto, é entendimento das sociedades intervenientes na reestruturação em apreço que a mesma permitirá, pela centralização da força de vendas, obter sinergias significativas que se traduzirão na utilização mais eficiente dos recursos disponíveis e na obtenção de vantagens competitivas mediante a redução dos custos operacionais.

Pela harmonização e interacção que se pretende desta forma obter, a ora Requerente entende ser possível melhorar significativamente a curto e a médio prazo, os resultados de exploração do Grupo em Portugal e, consequentemente consolidar a respectiva quota de mercado.

4. Cultura da Empresa

Por fim, a concentração dos recursos actualmente dispersos por cinco sociedades facilitará o desenvolvimento de uma cultura empresarial mais forte, através da implementação de uma visão estratégica e procedimentos uniformes» cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial.

H) Em 27 de Julho de 2005, a Autora foi notificada pelos Serviços da Administração Tributária através do Ofício n.º 20882 para apresentar as certidões de inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades envolvidas na Fusão (A…….., B…….., C…….., F………., E……… e D………) e, bem assim, prestar informações relativas aos processos de execução fiscal que, de acordo com o sistema informático da DGCI, se encontravam em nome da B………. - cfr. documento n.º 4 junto com a petição inicial.

I) Em 29 de Setembro de 2005, a Autora apresentou resposta ao Ofício n.º 20882, na qual se encontravam os elementos acima referidos e, bem assim, os pedidos apresentados junto da Segurança Social, relativamente às certidões que não foram obtidas em tempo útil, tendo obtido as referidas certidões posteriormente - cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial.

J) Em 28 de Dezembro de 2005, foi emitida a Informação n.º 1620/2005, pela Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, sob o assunto: «Dedução de Prejuízos Fiscais» da qual se extraíram as seguintes conclusões: « (...) Resumindo, face ao que se expôs anteriormente propõe-se o indeferimento do presente pedido de autorização para a transmissibilidade dos prejuízos fiscais, das extintas B………. - Comunicações lnteractivas, SA, C……….. — Informação e Comunicação, SA, D………. — Música Interactiva, SA, E…….. - Serviços de Telecomunicações e Transferência de Informações, SA e F……….— Plataforma de Comércio Electrónico, SA, para a ora requerente A…….. - Comunicações Interactivas, SA, nos termos do disposto no artigo 69° do CIRC, porquanto não se encontram cumpridos os requisitos exigidos para a sua concessão pelas razões que se indicam:

• A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, facto que não se verifica na situação em apreço. Com efeito as incorporadas legaram para a incorporante um património negativo, dotando-a de um passivo ainda mais elevado.

• Na verdade, não se antevê qualquer efeito positivo na incorporação do património das incorporadas para a ora requerente, que após a fusão diminuiu o seu património face ao seu último Balanço.

Parece que os resultados positivos futuros, a existirem, dever-se-ão exclusivamente ao contributo da ora incorporante.

• Deste modo, afigura-se que a fusão em análise não é susceptível de produzir efeitos positivos na estrutura produtiva do grupo, ficando assim por cumprir o pressuposto legal de "reconhecido interesse económico" imposto pelo n°2 do artigo 69° CIRC.

• Esta realidade torna-se ainda mais evidente, quando se procura proceder à fixação de um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, na hipótese de se considerar cumprido o n.º 2 do artigo 69° do CIRC.

• A aplicação do plano específico de dedução de prejuízos determinado pelo Despacho n° 79/2005-XVlI, de 2005/04/15, de S.Exa o SEAF e posteriormente pela Circular 7/2005 de 16 de Maio, torna inaplicável, na situação sob análise, o cumprimento da alínea c) do n°1 da supra citada Circular.

• Com efeito, a alínea c) do n°1 da Circular 7/2005, impõe como restrição à dedutibilidade dos prejuízos o contributo das sociedades incorporadas, na promoção dos resultados futuros da sociedade incorporante. Esse parâmetro é encontrado através do peso relativo que o património da sociedade incorporada possui, no conjunto dos patrimónios de todas as entidades envolvidas na operação.

Se, com um peso relativo próximo de zero (património quase nulo), a dedução fica limitada a uma reduzida percentagem do acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante, quando um património é negativo (o nosso exemplo), não será possível efectuar qualquer dedução dos prejuízos da incorporada, na incorporante, pois aquela não influi positivamente nos lucros futuros da sociedade incorporante.

De acordo com o disposto no art. 60° da LGT, deverá ser concedido ao contribuinte o direito de audição.» (documento junto ao processo administrativo).

K) Em 28 de Junho de 2006, a Autora foi notificada através do Ofício n.º 16712 do projecto de decisão de indeferimento do Pedido de Dedução apresentado - cfr. documento n.º 6 junto com a petição inicial.

L) Em 6 de Julho de 2006, a Autora exerceu o direito de audição prévia, acompanhado com onze documentos - cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial.

M) Em 20 de Julho de 2006, foi emitida a Adenda à Informação n°1620/2005, pela Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, sob o assunto: «DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS» da qual consta designadamente o seguinte:

«11. Quanto aos argumentos invocados, para contestar a decisão de indeferimento do processo, os mesmos não merecem acolhimento, na medida em que esta matéria da transmissibilidade de prejuízos fiscais de entidades incorporadas com capitais próprios negativos, já foi submetido à consideração do CEF (Centro de Estudos Fiscais), tendo sido apresentada opinião concordante com esta Direcção de Serviços.

12. Somos de parecer de que não se encontra devidamente comprovado nem demonstrado o interesse económico produtivo em incorporar, numa operação de fusão, um conjunto de sociedades que apresentam todas elas capitais próprios negativos.

13. Reafirma-se que, mesmo que se reconhecesse a possibilidade das incorporadas transmitirem os prejuízos fiscais para a incorporante, considerando-se que a operação de fusão apenas foi perpetrada para a obtenção de sinergias em negócios complementares, com vista à obtenção de lucros em exercícios futuros, isto é que existiriam razões económicas válidas nos termos do n°2 do artigo 69° do CIRC, a aplicação dos critérios objectivos, sancionados pelo Despacho n°79/2005-XVII, de 15/04/2005, de S. Exa o Secretário de Estado de Assuntos Fiscais (divulgados pela Circular da DGCI n°7/2005), para efeitos do exercício do poder conferido pelo n°4 do mesmo artigo, na fixação do plano de dedução dos prejuízos transmitidos, sempre conduziria a um limite de dedução anual nulo, em resultado das entidades incorporadas apresentarem capitais próprios negativos.

14. Dado o exposto e tendo em atenção os factos e fundamentos invocados nas informações 1620/2005, respectiva adenda e informação n°600/2006 que se encontram no processo, propõe-se que se convole em definitivo o projecto de despacho de indeferimento do pedido. De notar que, na ausência de parte dos elementos comprovativos da inexistência de dívidas, nos termos do art.° 11-A do EBF, necessários ao perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos, o prazo para a formação do acto tácito não começou a correr, pelo que este nunca se formou» - cfr. documento junto ao processo administrativo).

M) Sob a informação qua antecede o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais exarou o Despacho n.º 98/2007-XVII, de 2 de Fevereiro, que é do seguinte teor: «Concordo. Indefiro nos termos propostos» - cfr. documento junto ao processo administrativo.

N) Pelo ofício n.º 3739 de 14 de Fevereiro de 2007, a Autora foi notificada do Despacho n.º 98/2007 — XVII de 2 de Fevereiro, proferido pelo Exmo. Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, do qual consta:

«Serve o presente ofício, para informar que o pedido acima identificado foi indeferido, por Despacho n°98/2007 - XVII de 2 de Fevereiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por delegação de competências (Despacho 17829/2005 (2ª Série), publicado no D.R. n°159, II Série, de 2005/08/19) com os seguintes fundamentos:

• A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, facto que não se verifica na situação em apreço. Com efeito as incorporadas legaram para a incorporante um património negativo.

• Na verdade, não se antevê qualquer efeito positivo na incorporação do património das sociedades B………………. - Comunicações Interactivas, SA, C………. - informática e Comunicação, SA, D……….. - Música Interactiva, SA, E………. - Serviços de Telecomunicações e Transferência de informações, SA e F…….. - Plataforma de Comércio Electrónico, SA, para a ora requerente A… - Comunicações Interactivas, SA, não contribuindo esse património para os eventuais resultados positivos futuros da ora Incorporante.

• Deste modo, afigura-se que a fusão em análise não é susceptível de produzir efeitos positivos na estrutura produtiva do grupo, ficando assim por cumprir o pressuposto legal de "reconhecido interesse económico" imposto pelo n°2 do artigo 69° do CIRC. • Esta realidade torna-se ainda mais evidente, quando se procura proceder à fixação de um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, na hipótese de se considerar cumprido o n°2 do artigo 69° do CIRC.

• A aplicação do plano específico de dedução de prejuízos determinado pelo Despacho n°79/2005-X VII, de 2005/04/15, de S. Exa o SEAF e posteriormente pela Circular 7/2005 de 16 de Maio, torna inaplicável, na situação sob análise, qualquer dedução, tendo em conta a necessidade de cumprimento da alínea c) do n°1 da supra citada Circular.

• Com efeito, a alínea c) do n°1 da Circular 7/2005, impõe como limite à dedutibilidade dos prejuízos a proporção do contributo da sociedade incorporada para a promoção dos resultados, futuros da sociedade incorporante. Esse parâmetro é encontrado através do peso relativo que o património da sociedade incorporada possui no conjunto dos patrimónios de todas as entidades envolvidas na operação. Se, com um peso relativo próximo de zero (património quase nulo), a dedução fica limitada a uma reduzida percentagem do acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante, quando um património é negativo (o nosso exemplo), não será possível efectuar qualquer dedução dos prejuízos da incorporada na incorporante, pois aquela não influi positivamente nos lucros futuros dá sociedade incorporante. É, ainda, de salientar, que a requerente foi chamada a pronunciar-se sobre o pedido em análise em dois direitos de audição. O primeiro através do ofício n°4522, de 2006/02/22, não se tendo a requerente pronunciado sobre o conteúdo do referido despacho.

Em 2006/06/14, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais emitiu o Despacho n°789/2006-XVII, no sentido da requerente ser novamente notificada para exercer o direito de audição, nos termos da alínea b) do n°1 do artigo 60° da LGT aprovada pelo DL 398/98, de 17 de Dezembro, sobre o entendimento da Administração Fiscal que considera que, no presente processo, a contagem do prazo de seis meses fixado para o deferimento tácito nunca se iniciou, em virtude da requerente não ter apresentado todos os elementos exigidos na Circular 7/2005, de 16 de Maio da DSIRC. A notificação foi efectuada em 2006/05/28, pelo ofício n°16712, não tendo a requerente referido nada sobre o objecto da notificação - contagem do, prazo para o deferimento tácito, limitando-se apenas a juntar documentos comprovativos da suspensão de parte das dívidas e protestando juntar os documentos comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social e de garantia prestada relativamente aos processos de execução fiscal ainda em falta. Contestou, no entanto, os fundamentos da decisão do indeferimento.

Quanto aos argumentos invocados, para contestar a decisão de indeferimento do processo, os mesmos não merecem acolhimento, pelos motivos atrás expostos. Aliás, esta matéria da transmissibilidade de prejuízos fiscais de entidades incorporadas com capitais próprios negativos, já foi submetida à consideração do Centro de Estudos Fiscais, tendo sido apresentada opinião concordante com esta Direcção de Serviços.

Entendemos que não se encontra devidamente comprovado nem demonstrado o interesse económico produtivo em incorporar numa operação de fusão, um conjunto de sociedades que apresentam todas elas capitais próprios negativos. Reafirma-se que, mesmo que se reconhecesse a possibilidade das incorporadas transmitirem os prejuízos fiscais para a incorporante, considerando-se que a operação de fusão apenas foi perpetrada para a obtenção de sinergias em negócios complementares, com vista à obtenção de lucros em exercícios futuros, isto é que existiriam razões económicas válidas nos termos do n°2 do artigo 69° do CIRC, a aplicação de critérios objectivos, sancionados pelo Despacho n°79/2005- XVII, de 2005/04/15, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (divulgados pela Circular da DGCI n°7/2005), para efeitos do exercício do poder conferido pelo n°4 do mesmo artigo, na fixação do plano de dedução dos prejuízos transmitidos, sempre conduziria a um limite dedução anual nulo, em resultado das entidades incorporadas apresentarem capitais próprios negativos.

Salienta-se também que, na ausência de parte dos elementos comprovativos da inexistência de dívidas, nos termos do art.° 11-A do EBF, necessários ao perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos, o prazo para a formação do acto tácito não começou a correr, pelo que este nunca se formou. Desta decisão poderá interpor acção administrativa especial, no prazo de três meses a contar da presente notificação, nos termos do art°66° e seguintes do Código do Processo dos Tribunais Administrativos (...)» - cfr. documento n.º 8 junto com a petição inicial.

3.2. Fundamentação de direito

A ora Recorrente, enquanto entidade incorporante numa operação de fusão por incorporação, pediu ao Ministro das Finanças, ao abrigo do disposto no artigo 69.º do CIRC (na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 221/2001, de 7 de Agosto, que dispunha que «Os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante até ao fim do período referido no n.º 1 do artigo 47.º, contado do exercício a que os mesmos se reportam, desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados entregue na Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do mês seguinte ao do registo da fusão na conservatória do registo comercial»), autorização para deduzir os prejuízos fiscais das entidades incorporadas (as sociedades “B………. — Comunicações Interactivas, S.A., C……… — Informática e Comunicação, S.A., D………. — Música Interactiva, S.A., E………. — Serviços de Telecomunicações e Transferência de Informações, S.A. e F………. — Plataforma de Comércio Electrónico, S.A.”) no âmbito da operação de reestruturação do grupo denominado “A…., SGPS”.

Porque viu recusada a sua pretensão, apresentou acção administrativa especial, pedindo judicialmente a anulação da decisão do Secretário dos Assuntos Fiscais (SEAF), e a condenação da Administração à prática de acto de deferimento daquela pretensão.

Invocou a Autora na petição inicial, em síntese nossa, que o despacho impugnado enferma de vício de violação de lei por erro grosseiro na aplicação do critério contido no artigo 69.º, n.º 2, do CIRC, já que o seu fundamento se esgota na afirmação de que não há razões economicamente válidas subjacentes à operação de fusão por o património das sociedades incorporadas ser, à data da fusão, negativo.

O Réu, reconhecendo que o apontado fundamento foi efectivamente o único que sustentou a sua decisão de indeferimento, contrapõe que nem o Tribunal pode sindicar o juízo da Administração Tributária que suporta a decisão, por ser evidente a inexistência de erro grosseiro, única situação em que esse controlo judicial seria legítimo, nem a operação em causa (fusão) evidencia razões economicamente válidas, isto é, capazes de sustentar um juízo de verificação do pressuposto consagrado no n.º 2 do artigo 69.º do CIRC.

O Tribunal Central Administrativo Sul, como deixámos dito no ponto 1.1. deste acórdão, julgou integralmente procedente a acção, lançando mão, em especial, como fundamento do seu julgamento, do acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 14-11-2018, emitido no processo n.º 3297/06.9BELSB90/09, também proferido em recurso de acórdão do mesmo Tribunal Central Administrativo Sul e subscrito pela mesma relatora, no qual, com excepção da questão relativa à alegada formação de acto tácito de deferimento, que nestes autos se não coloca, apreciou e decidiu questões idênticas por referência a alegações e contra-alegações muito semelhantes às ora apresentadas no presente recurso jurisdicional.

Neste contexto, na ausência de razões de facto ou de direito particulares que determinem que adoptemos posição distinta, quer ao nível da fundamentação, quer ao nível do sentido da decisão, justifica-se e exige a uniformidade de julgamentos e o respeito pelos princípios da justiça, celeridade e igualdade, que nos limitemos a transcrever o citado aresto deste Supremo Tribunal que assumimos como fundamentação da nossa decisão:

“(…)

Finalmente, quanto ao vício de violação de lei por ofensa do art. 69.º do CIRC, o acórdão recorrido começou por apreciar a questão de saber se a operação de fusão em causa assenta em razões económicas válidas, preenchendo, assim, os requisitos do n.º 2 daquele preceito legal, que dispunha: «A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos».

Desde logo, o acórdão começou por afastar a argumentação da Entidade demandada, de que o juízo sobre as razões económicas válidas, envolvendo uma grande margem de apreciação pela AT, se situaria dentro do âmbito da denominada discricionariedade técnica, arredada do âmbito da sindicância judicial, a menos que em casos de erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal. Para tanto, chamou à colação o acórdão deste Supremo Tribunal de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 1159/09 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d3fa5d25ce444b4c80257c3600544933.), para concluir, de acordo com a doutrina aí firmada, que o tribunal não pode recusar ao interessado o controlo judicial do processo por que a AT chegou à decisão, apesar de estarem em causa conceitos indeterminados, uma vez que nesse processo os parâmetros de avaliação não são inteiramente livres, antes têm de se revelar apropriados, coerentes e razoáveis, uma vez que a AT está legalmente vinculada a respeitar as regras técnicas para que a lei remete.

Depois, passou a tecer diversos considerandos em torno do regime legal do n.º 1 do art. 69.º do CIRC e, por remissão para o referido acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, definiu o âmbito e o alcance dos conceitos vertidos no n.º 2 do mesmo artigo.

De seguida, salientou que no despacho impugnado (incluindo as informações por ele apropriadas) a AT não infirmou a motivação produzida pela Autora, nem a documentação por esta apresentada foi objecto de qualquer pedido de esclarecimento ou contestação e, ao invés, o indeferimento do pedido por ela formulado fundamentou-se nas seguintes ordens de razões: 1) a sociedade incorporada contribuir com um património líquido negativo, o que implica a inexistência de efeito positivo para a incorporante e os seus resultados futuros, uma vez que fica com o seu património diminuído e não aumentado; 2) ainda que se permitisse a transmissibilidade dos prejuízos fiscais, a aplicação do plano específico de dedução desses prejuízos a que se refere o n.º 4 do art. 69.º do CIRC, e concretizado no n.º 7 do Despacho n.º 79/2005-XVII, de 15 de Abril, do SEAF, impõe determinados limites que inviabilizam estas deduções.

Concluiu o acórdão, sempre baseando-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal máxime no já referido aresto, que o indeferimento do pedido da Autora, tal como foi fundamentado, «representaria não só uma solução excessivamente redutora, como traduziria, no fundo, a instituição de uma regra de alcance geral de exclusão automática da possibilidade de transmissibilidade de prejuízos fiscais quer tenha ou não havido propósito de evasão ou fraude fiscais, retirando o sentido e a razão de ser à norma».

Já quanto à segunda ordem de razões acima enunciada, entendeu que a questão também foi resolvida pelo mesmo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, que continuou a seguir. Após salientar que o Despacho n.º 79/2005-XVII, desenvolvido pela Circular 7/2005, de 16 de Maio, não constitui, nem podia constituir, motivo para o indeferimento do pedido formulado pela Autora, mas um «mero acréscimo para alertar para as consequências decorrentes da transmissão do património negativo da incorporada», sendo que o único motivo daquele indeferimento foi a afirmação de que a fusão não se realizou por razões económicas válidas em face do património negativo da entidade incorporada, deixou expresso que o critério adoptado naquelas instruções administrativas é restritivo e «só consente operações quando estas sejam favoráveis na perspectiva interessada da tributação efectiva por parte da administração fiscal. No entanto, com base na legislação aplicável, o interesse económico relevante para efeitos de apreciação da operação de fusão, ex vi do n.º 4 do artigo 69.º do CIRC, é predominantemente o do contribuinte e não o da administração Fiscal», como refere CARLOS BAPTISTA LOBO (Neutralidade fiscal das fusões: benefício fiscal ou desagravamento estrutural? Corolários ao nível do regime da transmissibilidade dos prejuízos, Revista Fiscalidade n.º 26/27, págs. 29 a 62.).

Assim, aplicando a doutrina definida por aquele aresto à situação sub judice, concluiu que o acto sindicado não pode manter-se na ordem jurídica, «o que leva à procedência desta acção e à condenação deste [SEAF] a praticar novo acto que reconheça à Autora o direito pretendido».

Em consequência, o acórdão recorrido decidiu: «a) anular o despacho n.º 917/2006-XVII, de 20.07.2006, do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais; // b) condenar a Entidade Demandada a praticar o acto decisório de deferimento do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais formulado pela Autora, por verificação dos pressupostos legais contidos no artigo 69.º do CIRC, sem prejuízo da fixação de um plano específico da dedução desses prejuízos em conformidade com o n.º 4 desse preceito legal».

2.2.3 DA POSSIBILIDADE DE SINDICÂNCIA JUDICIAL DO JUÍZO SOBRE A EXISTÊNCIA DE RAZÕES ECONOMICAMENTE VÁLIDAS

A esse propósito, o Recorrente sustenta que está vedado ao tribunal sindicar o juízo da AT quanto à existência de razões economicamente válidas para a realização da operação de fusão.

Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, o Recorrente limita-se a afirmar que, sendo certo que o acórdão segue um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, também é certo que o mesmo Supremo Tribunal também já entendeu, designadamente no acórdão de 12 de Julho de 2006, proferido no processo n.º 1003/05 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/c90b52860c83d4ea802571e1003eab1e.), que saber se houve razões económicas válidas, ou se a fusão «se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, é matéria de discricionariedade técnica, com uma larga margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie» e que, «este seu juízo não pode ser fiscalizado pelos tribunais. A menos que ocorresse erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal».

O Recorrente, aderindo à fundamentação desse acórdão que cita, sustenta que, «quanto ao 1.º segmento decisório do Acórdão ora recorrido há que concluir que o mesmo não só fez uma errada interpretação do n.º 2 do então art. 69.º do CIRC, como também, extravasou dos poderes que a lei processual lhe confere nos artigos 71.º n.º 2 e 95.º n.º 5 do CPTA, tendo-se substituído, sem que para tanto detivesse competências, à AT, na apreciação e valoração do que são razões económicas válidas».

Salvo o devido respeito, porque o Recorrente se limita a remeter para esse acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 2006 (E poderia até ter citado um aresto menos vetusto, pois encontramos um outro acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no mesmo sentido de que o juízo da AT quanto à existência de razões económicas válidas é discricionário e não pode ser fiscalizado pelos tribunais, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal:

- de 3 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 844/09, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/565b5b2489f67ab3802576c50051b5f2.), entendemos que nada mais há a acrescentar àquilo que ficou dito no acórdão deste Supremo Tribunal de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 1159/09 (Vide nota 5 supra.), que foi seguido pela decisão do Tribunal Central Administrativo Sul ora recorrida e que subscreve aquela que se nos afigura ser a melhor resposta à questão (A qual, aliás, já tinha sido aflorada no mesmo sentido nos seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- de 18 de Janeiro de 2012, proferido no processo n.º 574/10, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/200010d5291e441c802579910042f7cb;
- de 16 de Janeiro de 2013, proferido no processo n.º 232/12, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3f949d29d1a132a280257b0b00430005. ), em conformidade com a mais recente doutrina. Assim, dispensando a repetição dos argumentos aí aduzidos, vamos limitar-nos a reproduzir o que ficou consignado no respectivo sumário:

«A autorização administrativa de transmissibilidade de prejuízos fiscais está dependente do preenchimento dos requisitos enunciados no art. 69.º do CIRC, o que obriga a que a operação de fusão seja realizada por razões económicas válidas (como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes) e se encontre inserida numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. Para esse efeito, o requerente deve fornecer à entidade administrativa competente todos os elementos necessários para o perfeito conhecimento da operação, já que lhe compete o ónus de prova dos pressupostos constitutivos do direito que invoca (art. 74.º, n.º 1, da LGT)».

«Porém, no caso de indeferimento do pedido, a administração está obrigada a expressar os motivos e critérios objectivos que utilizou para chegar a essa decisão, pela enunciação das razões por que entende que a operação não se encontra devida ou suficientemente documentada para o fim em vista; o que o tribunal tem de poder sindicar, até porque a actividade probatória administrativa constitui uma actividade vinculada e, como tal, sujeita a sindicância jurisdicional».

«E se a administração não põe em causa a documentação da operação, terá de expor as razões pelas quais refuta o juízo valorativo que o requerente dela extraiu, isto é, os motivos por que considera que a documentação não evidencia os intuitos e as vantagens económicas invocadas. O que tem de ser efeito através de um discurso fundamentador de particular intensidade, que demonstre a lógica, a pertinência e a razoabilidade do juízo valorativo administrativo formulado, revelador da sua forma de concretização conceptual e dos parâmetros avaliativos utilizados, de modo a evidenciar o bem fundado da formação dessa divergente convicção, e que o tribunal tem de poder sindicar».

«Apesar de estarem em causa conceitos indeterminados, cujo sentido, alcance e integração passam por um exercício interpretativo e valorativo pelo órgão administrativo decisor, o certo é que eles estão voltados para atingir um entendimento comum que a própria norma há-de fornecer em larga medida, ainda que para tal seja necessário interpretá-la em conformidade com o ordenamento jurídico e com a mens legislatoris. Pelo que, no preenchimento e concretização desses conceitos, a administração está obrigada a desenvolver uma actividade vinculada de interpretação da norma e há-de chegar, em princípio, a uma única solução para o caso concreto, não lhe sendo possível guiar-se por uma liberdade subjectiva ou por critérios de oportunidade. Nessa medida, está em causa um poder vinculado, que o tribunal tem de poder sindicar».

«Acresce que o próprio processo de concretização do juízo administrativo e os parâmetros de avaliação utilizados não são inteiramente livres, pois têm de se revelar apropriados, coerentes e razoáveis, estando a administração legalmente vinculada a respeitar as regras técnicas para que a lei remete. E o tribunal não pode eximir-se ao controlo judicial desse processo».

«Em suma, os tribunais não podem recusar ao interessado a possibilidade de obter um controlo efectivo da aplicação, pela administração, de normas que contém conceitos indeterminados. O que não significa que o controlo judicial dos actos de concretização deste tipo de conceitos seja irrestrito, pois podem existir situações em que distintos actos de concretização do mesmo conceito se adaptam à norma, sendo qualquer um deles possível, viável e lícito; nesses casos, a incidência do controle judicial há-de restringir-se aos limites da razoabilidade da solução escolhida de entre as que se apresentavam como possíveis e legítimas».

Porque concordamos integralmente com o referido acórdão – que nos dispensamos de reproduzir na íntegra, pois não só o Tribunal Central Administrativo Sul já o reproduziu, como também indicamos onde está publicado –, que representa a mais recente posição deste Supremo Tribunal sobre a questão (Seguida também no acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 10 de Janeiro de 2018, proferido no processo n.º 1486/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4933e7b02fb03a0580258216005c003b.), o recurso não merece provimento neste segmento.

2.2.4 DA EXISTÊNCIA DE RAZÕES ECONOMICAMENTE VÁLIDAS

O Recorrente discorda também do julgamento efectuado pelo Tribunal Central Administrativo Sul na parte em que neste se considerou estarem verificados os requisitos previstos no n.º 2 do art. 69.º do CIRC para a transmissibilidade dos prejuízos fiscais, designadamente as razões economicamente válidas.

Também neste segmento, o aresto recorrido apelou ao referido acórdão deste Supremo Tribunal, de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 1159/09. A nosso ver, também neste segmento, não merece censura. Senão vejamos:

Sendo certo que o n.º 1 do art. 69.º do CIRC prevê a possibilidade dos prejuízos fiscais das sociedades fundidas serem deduzidos aos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante – no reconhecimento do interesse nacional da reorganização e redimensionamento das empresas –, mediante autorização do Ministro das Finanças, o n.º 2 do mesmo artigo, em ordem a prevenir abusos, logo impõe: «A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos».

Como ficou dito no acórdão deste Supremo Tribunal de 27 de Novembro de 2013, que, tal como a decisão recorrida, vimos citando (mas aqui apenas com base no sumário, uma vez que o Tribunal Central Administrativo Sul já deixou reproduzido o teto integral): «Os conceitos indeterminados de cujo preenchimento a norma do CIRC faz depender a autorização de transmissibilidade dos prejuízos destinam-se a evitar que a operação de fusão – com a transmissibilidade de prejuízos que proporciona – tenha sido realizada por razões predominantemente fiscais, pois o legislador não quer que o desagravamento fiscal suceda quando se constate que a operação nunca teria tido lugar caso não fossem as vantagens fiscais que proporciona. Ou seja, a operação tem de ter tido uma motivação eminentemente económica, ainda que tal acarrete, de forma associada, a obtenção de uma vantagem fiscal».

Esta é a justificação normativa que deve servir para fixar os critérios de interpretação e integração dos conceitos contidos no art. 69.º do CIRC, o que afasta um tratamento puramente dogmático da operação de fusão e obriga a um exame da situação concreta à luz de todo o contexto jurídico-económico em que ela se desenvolveu, com a análise e ponderação de todas as circunstâncias inerentes apreciadas globalmente, para desse modo averiguar se, do ponto de vista económico, ela faz sentido no seu todo».

No caso sub judice, a ora Recorrida instruiu o pedido de transmissibilidade de prejuízos com um «Estudo Demonstrativo do Impacto Positivo do Acto Projectado na Estrutura Produtiva», em que, em ordem a demonstrar a verificação dos pressupostos constitutivos do direito que invoca (cfr. art. 74.º, n.º 1, da LGT), detalhou aqueles que, a seu ver, serão os ganhos de eficiência e de competitividade resultantes da fusão, com factualidade e argumentação que a AT, não só não rebateu, como aceitou expressamente.

No entanto, a AT erigiu como fundamentos para indeferir o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais i) a inexistência de qualquer efeito positivo para a sociedade incorporante, a ora Recorrida, e os seus resultados futuros, com o argumento de que o património líquido da sociedade fundida é negativo, o que significa que aquela ficaria com o seu património diminuído, ao invés de aumentado e ii) o facto de o eventual deferimento do pedido não ter resultados práticos, «uma vez que a aplicação do plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a que se refere o n.º 4 do art. 69.º do CIRC, e concretizado no n.º 7 do Despacho n.º 79/2005 do SEAF, impõe determinados limites que inviabilizam estas deduções».

Afastando desde já este segundo fundamento, diremos, em sintonia com os acórdãos recorrido e com aquele para o qual este remeteu, que «a invocação do Despacho nº 79/2005-XVII, de 15 de Abril, desenvolvido pela Circular 7/2005, de 16 de Maio, não constituiu (nem podia constituir) o motivo que determinou o indeferimento do pedido. A referência a essa orientação administrativa constituiu um mero acréscimo para alertar para as consequências decorrentes da transmissão do património negativo da incorporada, pois o que levou ao indeferimento do pedido foi, tão só, a afirmação de que a fusão não se realizara por razões económicas válidas face ao património negativo da entidade incorporada.// Pelo que a administração não terá criado aqui um qualquer critério decisório».

Podemos, pois, concluir, com o citado acórdão de 27 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 1159/09, para cuja exaustiva fundamentação remetemos, que «[o] n.º 4 do art. 69.º do CIRC, ao estabelecer que «no despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a estabelecer o escalonamento da dedução», visa apenas escalonar o benefício se a administração fiscal o entender necessário após deferir o pedido, não constituindo um requisito ou condição de acesso ao regime contido no art. 69º do CIRC».


Quanto ao primeiro (e, verdadeiramente, único) fundamento invocado pela AT para indeferir o pedido – qual seja a inexistência de qualquer efeito positivo para a sociedade incorporante, a ora Recorrida, e os seus resultados futuros, com o argumento de que o património líquido da sociedade fundida é negativo, o que significa que aquela ficaria com o seu património diminuído, ao invés de aumentado – diremos, sempre com o citado acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, que, «admitir-se que a circunstância de a entidade incorporada registar um património negativo é, por si só, e sistematicamente, inviabilizador do preenchimento daqueles conceitos indeterminados, representaria não só uma solução excessivamente redutora, como traduziria, no fundo, a instituição de uma regra de alcance geral de exclusão automática da possibilidade de transmissibilidade de prejuízos fiscais quer tenha ou não havido propósito de evasão ou fraude fiscais, retirando o sentido e a razão de ser à norma.// Compartilhamos, por isso, inteiramente do entendimento expresso por CARLOS BAPTISTA LOBO (Obra citada, pág. 56) quando refere que a análise da motivação económica não pode limitar-se à análise da vertente patrimonial líquida e que esse critério é indevidamente condicionador do princípio da liberdade económica e distorce o que se deve entender por “vantagem económica”. Por isso, «apreciações administrativas de motivações económicas das fusões que assentem unicamente na verificação dos seus efeitos na óptica do critério do património líquido põem em causa o princípio da legalidade fiscal e pecarão por um défice de fundamentação (à luz das exigências que devem suportar os juízos de avaliação em sede de aplicação do artigo 69.º do Código do IRC).

Em primeiro lugar, o que consta nos despachos e nas circulares em questão não se encontra qua tale suportado na lei, o que corporizará uma violação do princípio da legalidade fiscal constante do artigo 103.º da CRP.

O património líquido não é critério de fundamentação económica (ou, pelo menos, não pode ser erigido em parâmetro exclusivo de avaliação económica das repercussões de fusões para efeitos de aplicação do artigo 69.º do Código do IRC). O que releva é a continuidade e manutenção da fonte produtora e o desenvolvimento da actividade das absorvidas. De facto, quando a Administração Fiscal realiza a análise de acordo com este critério está, na prática, a ficcionar uma liquidação definitiva da actividade da sociedade incorporada, só admitindo um interesse económico na fusão se os seus capitais próprios forem positivos. Ora, em termos económicos, o interesse da fusão acentua-se precisamente no caso inverso, ou seja, quando a empresa se encontra numa situação de dificuldade económica mas, ainda assim, detenha uma posição de mercado que interessa salvaguardar e desenvolver».// Perante todo o exposto, não podemos deixar de concluir que se mostravam preenchidos os requisitos previstos no art. 69.º do CIRC para o deferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais».

Assim, tendo presentes as razões e objectivos da reestruturação empresarial em causa, tal como relatados no referido «Estudo Demonstrativo do Impacto Positivo do Acto Projectado na Estrutura Produtiva» apresentado pela ora Recorrida (que o acórdão recorrido reproduziu nas suas fls. 27 a 30), designadamente, a “optimização de recursos”, “reforço da competitividade”, “optimização da actividade”, “concentração numa única sociedade das actividades actualmente desenvolvidas, em Portugal, pelas três sociedades participantes”, “união dos recursos, tecnologias e know-how numa única estrutura” e que a AT não infirmou – nem sequer solicitou qualquer esclarecimento ou comprovação e, pelo contrário, resulta da informação referida em E) dos factos provados ter aceitado –, somos levados a concluir que bem andou o acórdão recorrido quando anulou o acto de indeferimento sindicado e, bem assim, quando condenou a Entidade demandada à prática de novo acto em que reconheça à ora Recorrida o direito pretendido, autorizando-a a deduzir os prejuízos fiscais acumulados pela entidade incorporada, por verificação dos pressupostos legais contidos no art. 69.º do CIRC, sem prejuízo da fixação de um plano específico de dedução desses prejuízos em conformidade com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo.

Em conformidade, há que dizer que também nesta parte o recurso não é merecedor de provimento.».

Em suma, revisitando o sumário elaborado no acórdão de 27 de Novembro de 2013 deste Supremo Tribunal, proferido no processo n.º 1159/09, conclui-se que:

I- A autorização administrativa de transmissibilidade de prejuízos fiscais está dependente do preenchimento dos requisitos enunciados no art. 69.º do CIRC (na redacção em vigor à data), o que obriga a que a operação de fusão seja realizada por razões económicas válidas (como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes) e se encontre inserida numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. Para esse efeito, o requerente deve fornecer à entidade administrativa competente todos os elementos necessários para o perfeito conhecimento da operação, já que lhe compete o ónus de prova dos pressupostos constitutivos do direito que invoca (art. 74.º, n.º 1, da LGT).

II - Porém, no caso de indeferimento do pedido, a administração está obrigada a expressar os motivos e critérios objectivos que utilizou para chegar a essa decisão, pela enunciação das razões por que entende que a operação não se encontra devida ou suficientemente documentada para o fim em vista; o que o tribunal tem de poder sindicar, até porque a actividade probatória administrativa constitui uma actividade vinculada e, como tal, sujeita a sindicância jurisdicional.

III - Se a administração não põe em causa a documentação da operação, terá de expor as razões pelas quais refuta o juízo valorativo que o requerente dela extraiu, isto é, os motivos por que considera que a documentação não evidencia os intuitos e as vantagens económicas invocadas. O que tem de ser efeito através de um discurso fundamentador de particular intensidade, que demonstre a lógica, a pertinência e a razoabilidade do juízo valorativo administrativo formulado, revelador da sua forma de concretização conceptual e dos parâmetros avaliativos utilizados, de modo a evidenciar o bem fundado da formação dessa divergente convicção, e que o tribunal tem de poder sindicar.

IV - Apesar de estarem em causa conceitos indeterminados, cujo sentido, alcance e integração passam por um exercício interpretativo e valorativo pelo órgão administrativo decisor, o certo é que eles estão voltados para atingir um entendimento comum que a própria norma há-de fornecer em larga medida, ainda que para tal seja necessário interpretá-la em conformidade com o ordenamento jurídico e com a mens legislatoris. Pelo que, no preenchimento e concretização desses conceitos, a administração está obrigada a desenvolver uma actividade vinculada de interpretação da norma e há-de chegar, em princípio, a uma única solução para o caso concreto, não lhe sendo possível guiar-se por uma liberdade subjectiva ou por critérios de oportunidade. Nessa medida, está em causa um poder vinculado, que o tribunal tem de poder sindicar.

V - Acresce que o próprio processo de concretização do juízo administrativo e os parâmetros de avaliação utilizados não são inteiramente livres, pois têm de se revelar apropriados, coerentes e razoáveis, estando a administração legalmente vinculada a respeitar as regras técnicas para que a lei remete. E o tribunal não pode eximir-se ao controlo judicial desse processo.

VI - Em suma, os tribunais não podem recusar ao interessado a possibilidade de obter um controlo efectivo da aplicação, pela administração, de normas que contém conceitos indeterminados. O que não significa que o controlo judicial dos actos de concretização deste tipo de conceitos seja irrestrito, pois podem existir situações em que distintos actos de concretização do mesmo conceito se adaptam à norma, sendo qualquer um deles possível, viável e lícito; nesses casos, a incidência do controle judicial há-de restringir-se aos limites da razoabilidade da solução escolhida de entre as que se apresentavam como possíveis e legítimas.

VII - Os conceitos indeterminados de cujo preenchimento a norma do CIRC faz depender a autorização de transmissibilidade dos prejuízos destinam-se a evitar que a operação de fusão – com a transmissibilidade de prejuízos que proporciona – tenha sido realizada por razões predominantemente fiscais, pois o legislador não quer que o desagravamento fiscal suceda quando se constate que a operação nunca teria tido lugar caso não fossem as vantagens fiscais que proporciona. Ou seja, a operação tem de ter tido uma motivação eminentemente económica, ainda que tal acarrete, de forma associada, a obtenção de uma vantagem fiscal.

VIII - Esta é a justificação normativa que deve servir para fixar os critérios de interpretação e integração dos conceitos contidos no art. 69.º do CIRC, o que afasta um tratamento puramente dogmático da operação de fusão e obriga a um exame da situação concreta à luz de todo o contexto jurídico-económico em que ela se desenvolveu, com a análise e ponderação de todas as circunstâncias inerentes apreciadas globalmente, para desse modo averiguar se, do ponto de vista económico, ela faz sentido no seu todo.

IX - A asserção, como única motivação para o indeferimento do pedido, de que o património da entidade incorporada registava um valor negativo no balanço anterior à fusão, constitui um critério redutor sem aptidão e idoneidade suficiente para abalar e desconsiderar integralmente as vantagens económicas da fusão evidenciadas por toda a documentação apresentada e que não foi objecto de contestação. Tal motivação não evidencia, sequer, que tenha sido examinado todo o contexto jurídico-económico em que a operação se desenvolveu e ponderadas as especificidades do caso concreto, ou que a administração tenha atentado na justificação normativa do preceito.

X - Encontrando-se a motivação económica enunciada pelo contribuinte devidamente documentada por forma a evidenciar, de modo convincente, a estratégia empresarial utilizada em termos de racionalidade económica e de melhoria do seu desempenho em função da absorção das áreas de negócio da entidade bancária incorporada, o interesse económico da operação e a sua inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo com efeitos positivos na estrutura produtiva, competia à administração fiscal um especial dever de fundamentação, pela evidenciação do carácter artificioso da fusão, por forma a convencer que ela visou unicamente, ou de forma predominante, propósitos de obtenção de vantagens fiscais.

XI - O n.º 4 do art. 69.º do CIRC, ao estabelecer que «no despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a estabelecer o escalonamento da dedução», visa apenas escalonar o benefício se a administração fiscal o entender necessário após deferir o pedido, não constituindo um requisito ou condição de acesso ao regime contido no art. 69.º do CIRC.».

Improcedem, pois, pelos motivos expostos, todas as conclusões do recurso apresentado pela Entidade Ré, confirmando-se assim, integralmente, o douto acórdão recorrido.

5. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, negando provimento ao recurso, em confirmar integralmente o douto acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 14 de Outubro de 2020 – Anabela Russo (relatora) – Francisco Rothes – Aníbal Ferraz.