Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:016/18.0BALSB
Data do Acordão:07/03/2019
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:IRS
INDEMNIZAÇÃO
RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
ANTIGUIDADE
INTERPRETAÇÃO DA LEI FISCAL
Sumário:A antiguidade a que se refere o disposto no artigo 2º, n.º 4, al. b) do CIRS respeita unicamente à antiguidade do trabalhador na entidade devedora da compensação/indemnização pela cessação do contrato de trabalho.
Nº Convencional:JSTA000P24766
Nº do Documento:SAP20190703016/18
Data de Entrada:01/17/2018
Recorrente:Z............ E.X............
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Z………… e X…………, melhor identificados nos autos, inconformados com a decisão arbitral proferida em 18/12/2017, no processo nº 357/17-T que julgou improcedente o pedido de pronuncia arbitral, mantendo na ordem jurídica a liquidação adicional de IRS de 2013, vieram ao abrigo do nº 2 do artigo 25º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo por considerarem que tal decisão está em oposição com o acórdão proferido pelo TCA Sul em 21/09/10, no processo nº 03748/10.

2 – Por despacho a fls. 45 dos autos foi admitido o recurso para uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo nos termos dos arts. nº 1, al b) do ETAF, 152º, nº 4 do CPTA e 26º, do nº 1 do RJAT.

3 - Os recorrentes vieram apresentar alegação de recurso a fls. 9 dos autos, tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:
«A- O requerente prestou serviço efectivo, no sector bancário, ao longo de 25,3 anos, não num único banco, mas em dois bancos, como ficou e está provado no citado processo arbitral;
B- O que em 2012, estabelecia a cláusula 22 do ACT do Sector Bancário que:
“O presente Acordo Colectivo de Trabalho é aplicável em todo o território nacional, no âmbito do sector bancário, e obriga os Instituições de Crédito e as Sociedades Financeiras que o subscrevem (adiante genericamente designadas por Instituições de Crédito ou Instituições), bem como todos os trabalhadores ao seu serviço filiados nos Sindicatos dos Bancários do Centro, do Norte e do Sul e lhas, representados pela outorgante FEBASE - Federação do Sector Financeiro e doravante designados por Sindicatos, abrangendo 26 empregadores e estimando-se em 54.300 os trabalhadores abrangidos (...)“, não foi tido em consideração, antes foi rejeitado;
C- A decisão em recurso foi proferida na base de uma interpretação restritiva ao ponto de delimitar a antiguidade implícita na alínea b) do n 4 do artigo 2 CIRS ao número de anos prestados apenas no banco que pagou a indemnização e não ao número de anos prestados no sector bancário;
D- No acórdão fundamento proferido no Tribunal Central Administrativo Sul, de 21/9/2010, processo 3.748/10 e em outros, designadamente o acórdão de 11/05/2004, processo 60002/01, ficou decidido que o conceito de antiguidade para os fins previstos na alínea b) do nº 4 do artigo 2 do CIRS, tinha e tem uma abrangência muito maior, do que aquela que lhe dá a Administração Tributária, tal como previsto no direito laboral e não restritivo, como decidiu a douta decisão arbitral em recurso;
E- A antiguidade, no caso concreto dos autos, abrange todo o tempo de serviço prestado pelo recorrente no sector bancário (25,3 anos) e não apenas o tempo de serviço prestado no banco que lhe pagou a indemnização (9,6 anos), tal como prevê o acórdão fundamento;
F- Fica claro, com o devido respeito e salvo melhor opinião, que reunindo o recorrente todos os requisitos para que a sua «antiguidade» corresponda efectivamente aos anos em que trabalhou, não só no BARCLAYS BANK PLC, como no MILLENNIUM bcp.
Nos melhores termos de direito e face a todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de Vs. Exas. deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta decisão, substituindo-a por outra que determine a anulação da liquidação impugnada e o pagamento dos juros indemnizatórios, desde a data em que ocorreu o pagamento, até à data da emissão do reembolso.»

4 – A recorrida, Autoridade Tributária e Aduaneira não contra alegou.

5 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto proferiu fundamentado parecer no sentido de que se verifica a invocada oposição de julgados, pronunciando-se quanto ao mérito do recurso nos seguintes termos:
«Quanto ao mérito do recurso afigura-se ser de manter a decisão arbitral sindicada.
A questão controvertida traduz-se em saber se a antiguidade que releva para efeitos de delimitação negativa da incidência de IRS é apenas a relativa à antiguidade na empresa/entidade devedora ou todo o tempo de serviço prestado no setor bancário.
Sobre a questão controvertida seguiremos de perto a Anotação ao Acórdão fundamento da autoria do DR. Filipe Fraústo da Silva e DR.a Cláudia Reis Duarte (Revista da Ordem dos Advogados, n.º 1, 2012, páginas 463-465).
Nos termos do disposto no artigo 2.°/4/b) do CIRS as quantias recebidas a qualquer título pela cessação do contrato de trabalho ficam sujeitas a tributação na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com caráter de retribuição sujeitas a impostos, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fração de antiguidade na entidade devedora.
O facto de a antiguidade ser, frequentemente, critério de determinação da compensação no âmbito do acordo celebrado para efeitos laborais não pode levar a que o conceito de antiguidade a ter em conta para efeitos de delimitação do limite de exclusão prevista na norma fiscal atrás referida deva ser coincidente com aquele, como parece sustentar a decisão fundamento
É comum que, para efeitos laborais, no âmbito da cessação do contrato de trabalho, a retribuição-base seja um critério utilizado para a determinação da compensação pecuniária global a atribuir aos trabalhadores, sendo certo que para efeitos fiscais, com relevância para a determinação do montante excluído da tributação o que releva é o valor médio das remunerações regulares com caráter de retribuição sujeitas a impostos, auferidas nos últimos 12 meses, o que, claramente, pode não coincidir com a remuneração-base mensal.
É, pois, evidente que o legislador não quis essa coincidência, tanto assim que o valor das importâncias pagas ao trabalhador pode ser determinado por qualquer critério e só pela prática o fator antiguidade é utilizado.
A própria letra da lei é muito clara ao estatuir que a delimitação negativa de incidência se estabelece usando como fator multiplicador a antiguidade na entidade devedora dos rendimentos, o que, claramente, se afasta da antiguidade usada para efeitos de determinação da compensação por cessação do contrato de trabalho sempre que esta seja diferente, por existência de regulamentação coletiva de trabalho ou no acordo de cessação do contrato de trabalho.
Assim sendo parece que a solução mais consentânea com a letra expressa da lei, assim como a interpretação mais correta, mesmo que não se retirasse já da letra da lei e houvesse que recorrer ao direito laboral, é a que considera como fator multiplicador para efeitos de determinação da delimitação negativa de incidência, a antiguidade na empresa ou na entidade devedora.
Esta é, também, a posição de Manuel Faustino “Sobre o sentido e alcance da nova redação do art. 2.°, n.° 4 do Código do IRS - a tributação das importâncias recebidas por cessação do vínculo contratual com a entidade patronal”, Fiscalidade, n.°s 13-14, Janeiro/Abril 2003, página 10, onde refere que “Não é oponível à administração fiscal a cláusula do ACTV setor bancário que impõe, na transferência de um trabalhador entre instituições de crédito, a contagem do tempo de antiguidade verificada na anterior ou anteriores instituições de crédito de que tenha sido trabalhador. Como, por maioria de razão, também o não são quaisquer acordos que, respeitando à garantia dos benefícios inerentes à antiguidade, hajam sido celebrados entre o trabalhador e a entidade patronal. Sem considerações que hoje poderiam ser propiciadas pela extensão subjetiva do conceito de entidade patronal operada pelo n.º 10 do art. 2.º, uma vez que aquele assenta nas relações de domínio ou de grupo entre sociedades, independentemente da sua localização geográfica reafirmamos aqui a conhecida orientação da Administração Fiscal segundo a qual o tempo de antiguidade relevante é, tão só o tempo de antiguidade “adquirido” na entidade com que se cessa o contrato individual de trabalho, como literalmente decorre da lei não parecendo haver qualquer margem para outro tipo de interpretação”.
A entidade devedora a que se refere o artigo 4.º/2/b) do CIRS é a entidade patronal a que se refere o n.º 10 do mesmo artigo.
Parece, assim certo que o conceito relevante de antiguidade na entidade devedora se refere ao número de anos ou fração de antiguidade na entidade com a qual cessa o contrato de trabalho ou, por força do mencionado no n.º 10, com qualquer outra que com esta esteja numa relação de domínio ou grupo.
Como bem refere a decisão arbitral recorrida este resultado interpretativo a que se chegou ”… é também o mais coerente com os princípios constitucionais da legalidade, da segurança jurídica e da igualdade, na medida em que os critérios para a determinação da medida da tributação resultam da lei (incluindo os critérios para a exclusão da incidência); não dependem dc vicissitudes tais como o facto de os trabalhadores serem ou não sindicalizados e qual o respetivo sindicato, nem o facto de a entidade empregadora ter ou não outorgado Acordo Coletivo de Trabalho, ou a circunstância de o trabalhador ter exercido as suas funções num determinado setor de atividade ou noutro, ou ainda daquilo que possa ter sido acordado entre as partes”.
4.CONCLUSÃO.
Termos em que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a decisão arbitral na ordem jurídica.»

6 – Cumprido o disposto no artº 92º, nº 1 do CPTA - vista dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos - cumpre apreciar em conferência do Pleno da Secção.

7 – Na decisão sob recurso encontram-se fixados os seguintes factos:
a) Os Requerentes são casados e não separados judicialmente de pessoas e bens;
b) O Requerente marido foi trabalhador na referida instituição bancária “BARCLAYS BANK PLC” entre 26-01-2004 e 30-09-2013;
c) No período compreendido entre 14 de Junho do ano de 1988 e 25 de Janeiro do ano de 2004, o Requerente marido trabalhou no Banco “MILLENNIUM BCP”;
d) No ano de 2013, por virtude de uma reestruturação, a entidade “BARCLAYS BANK PLC” procedeu à redução de efetivos e, consequentemente, pagou indemnizações aos funcionários com quem acordou a revogação do contrato de trabalho;
e) O contrato de trabalho celebrado entre o Requerente marido e o “Barclays Bank PLC” contém uma cláusula (Cláusula 7.ª) que tem por objeto a antiguidade, na qual o Banco garante ao trabalhador a antiguidade decorrente da prestação de serviço a outras Instituições de Crédito, desde 14/06/1988, documentalmente provada, mas apenas para efeitos aí tipificados – relativos ao Fundo de Pensões do BARCLAYS –, nada referindo quanto à antiguidade para efeitos de compensação por cessação do contrato de trabalho;
f) O acordo de revogação do contrato de trabalho celebrado entre o Requerente marido e o “Barclays Bank PLC” contém uma cláusula (Cláusula 15.ª) na qual ambos os outorgantes reconhecem o seu acordo na determinação da antiguidade do colaborador (Requerente marido) pela contagem do seu tempo de serviço em entidades bancárias indicadas na Cláusula 17.ª dos ACT do Setor Bancário;
g) O Requerente marido recebeu do “BARCLAYS BANK PLC”, por via dessa revogação, uma indemnização no montante de €158.820,00;
h) A referida indemnização foi apurada com base numa antiguidade de 26 anos no Sector bancário;
i) O Requerente marido esteve filiado no Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, no período compreendido entre 01-09-1978 e 01-11-1999;
j) O Requerente marido esteve filiado no Sindicato Nacional dos Quadros Bancários, no período compreendido entre 09-11-1999 e 30-09-2013;
k) As liquidações de IRS e de juros compensatórios em causa na presente ação arbitral resultam das conclusões alcançadas no procedimento de inspeção tributária, credenciado pela Ordem de Serviço nº OI201601187, dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, no âmbito da qual foram efetuadas correções técnicas à Declaração modelo 3 de IRS, para o ano fiscal de 2013;
l) Na sequência do mencionado procedimento de inspeção, e das conclusões do respetivo relatório, foram emitidas a demonstração de liquidação adicional de IRS/2013 nº 2017 500010141, a demonstração de acerto de contas nº 2017 00001215929 e a respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referentes ao período de tributação de 2013, que resultaram da correção ao rendimento tributável no mesmo período.
m) A correção à matéria tributável em IRS dos Requerentes, respeitante ao ano de 2013, no valor de €99.582,94, em virtude de os SIT terem considerado a antiguidade de 9,68 anos, conforme se constata do seguinte quadro constantes do RIT:



n) Os Requerentes foram notificados da demonstração de liquidação adicional de IRS/2013 nº 2017…, da demonstração de acerto de contas nº 2017 00001215929 e da respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, resultando no montante total de € 54.461,82;
o) Os Requerentes pagaram o imposto ora impugnado em 06-03-2017.

8. No acórdão fundamento do Tribunal Central Administrativo Sul foi considerada a seguinte factualidade:
A) Em 26/5/1988, ................., ora Impugnante celebrou com o B...... - Banco ............., SA, um contrato de trabalho a prazo, com início em 30/5/1988 - cf. fls. 30 dos autos;
B) No ano de 1988 o B....... - Banco ............, SA, procedeu aos descontos no vencimento do Impugnante para o Sindicato e para o SAMS - cf. documento de fls. 47;
C) O B.... - Banco .............., SA, foi incorporado no Banco ............, SA, a que lhe sucedeu o Banco ........, .........., SA - cf. fls. 30 e 35;
D) Em 28/6/2000, o Impugnante apresentou ao banco ....... P........, SA, um pedido de demissão com efeitos a partir de 21/8/2000-cf. fls. 46 e 35;
E) Em 14/6/2000, o ora Impugnante celebrou com o Banco de ............, SA, um contrato de trabalho com efeitos reportados a 22/8/2000 donde constam, entre outras, as cláusulas seguintes: “Cláusula 2ª (Categoria Profissional) O segundo Contratante será admitido ao serviço do ………… com a categoria de Director, Grupo 1, nível 16, nos termos estabelecidos no Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (de ora em diante" ACTV"). (...)
Cláusula 9ª (Situações Omissas) O presente contrato fica sujeito, em todo o omisso, às disposições do ACTV, bem como às disposições dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que o revejam ou substituam, nos precisos termos em que o B.. a eles aderir." - cf. fls. 36;
F) Em 29/5/2001 foi celebrado entre o Impugnante e o Banco de .........., SA, um acordo de rescisão de contrato de trabalho que aqui se dá por integralmente reproduzido, donde se extrai por súmula o seguinte: "1 - O Banco e o Segundo Outorgante estão de acordo em fazer cessar as relações laborais emergentes do Contrato de Trabalho entre si celebrado, o qual produziu efeitos a partir de 31 de Maio de 1988" - cf. fls. 44;
G) Na sequência de acção de fiscalização externa, ao Banco .........., SA, apurou a Inspecção Tributária que o Impugnante recebeu em 2001 uma indemnização no valor de e 215 868,33, considerando não ter declarado e 101922,69 - cf. fls. 141 do PAT e fls.15 dos autos;
H) Na sequência da audiência prévia do Impugnante, em 6/12/2005, pela Divisão de Liquidação de Impostos sobre o Rendimento e sua Defesa, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi prestada informação donde se extrai por súmula o seguinte: "( . . .) 5 - A entidade devedora é o B...., pelo que para o cálculo da parte da indemnização isenta de IRS é o período de tempo que o contribuinte esteve vinculado a esta entidade que conta. Pelo exposto propõe-se que não sejam atendidas as razões do contribuinte, mantendo-se as correcções à declaração de rendimentos do ano de 2001 (.. .)" – cf. documento de fls. 49;
I) Sobre a referida informação, recaiu despacho de concordância datado de 7/12/2005 - cf. fls. 49;
J) Foi efectuada liquidação adicional de que resultou um apuramento de imposto a pagar pelo Impugnante relativo a IRS de 2001, no valor de € 36 568,38 - cf. fls. 58 e 59.

9. O presente recurso vem interposto, ao abrigo do art.º 25.º, nº 2, do Decreto Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime da Arbitragem Tributária), da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no âmbito do processo nº 357/2017-T, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral mantendo na ordem jurídica liquidação adicional de IRS de 2013.

Invocam os recorrentes que tal decisão arbitral está em oposição com a doutrina do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido no âmbito do processo 03748/10, datado de 21/09/2010, quanto à questão da determinação do conceito de «antiguidade» para efeitos de delimitação negativa de incidência de IRS na compensação por cessação do contrato de trabalho, nos termos do estatuído no artigo 2.º/4 do CIRS.

Cumpre apreciar, antes de mais, se se verificam os requisitos do recurso por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito previsto pelo artº 25º, nº 2 do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, DL nº 10/2011, de 20/1)

9.1 De harmonia com o disposto no nº 2 do art. 25º do RJAT (DL nº 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
A este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral. (cfr. o nº 3 do mesmo art. 25º)
O único requisito explicitamente referido para a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência (152º do CPTA) é a existência de contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Na ausência de qualquer expresso tratamento legislativo neste âmbito serão de assim de manter os critérios jurisprudenciais já firmados no domínio da LPTA e do ETAF quer relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deverá existir contradição, quer quanto à verificação da oposição de julgados.

Os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação sempre que, durante o intervalo da sua publicação, não tenha sido introduzida qualquer alteração legislativa substancial que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.

No que concerne à existência da oposição, exige-se que a mesma norma jurídica tenha sido interpretada e aplicada diversamente numa idêntica situação de facto, não podendo ser considerada quando relativamente a um dos acórdãos em oposição vier a ser detectada uma divergência sobre a factualidade apurada que puder ser determinante para a aplicação de um diferente regime jurídico.
A oposição deverá decorrer de expressa resolução da questão de direito suscitada, não sendo atendível a oposição implícita dos julgados, o que implica que tenha havido julgamento contraditório sobre questões que tenham sido colocadas à apreciação do tribunal e sobre as quais este carecia de emitir pronúncia – cf., neste sentido, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Dicionário de Contencioso Administrativo, Ed. Almedina, pags. 608/609, e, entre muitos outros, acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 05.05.1992, in AP.DR de 29.11.1994, pag. 426, de 18.02.1998, recurso 28637, de 26.09.2007, recurso 452/07, de 21.05.2008, recurso 460/07, de 13.11.2013, recurso 594/12, de 26.03.2014, recurso 865/13, de 07.05.2014, recurso 60/14, de 25.02.2015, recurso 964/14, de 18.03.2015, recurso 525/14, e de 16.09.2015, recurso 8/15, todos in www.dgsi.pt.

Note-se, em todo o caso, que, conforme determina o n.º 3 do artigo 152.º, "o recurso não é admitido se a orientação perfilhada na decisão impugnada estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

9.2 No caso vertente os recorrentes suscitam a oposição de julgados relativamente à questão da determinação do conceito de «antiguidade» para efeitos de delimitação negativa de incidência de IRS na compensação por cessação do contrato de trabalho, nos termos do estatuído no artigo 2.º/4 do CIRS.
A liquidação de IRS em causa nos autos está fundamentada no artigo 2.º/4/ b) do CIRS tributando a indemnização recebida, na parte em que excedeu o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fração de antiguidade na entidade empregadora ou seja, o BARCLAYS, correspondente a 10 anos (entrada em 26/01/2004 e saída em 30/09/2013).
O recorrente Z………… foi filiado no Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (de 01/09/1978 a 01/11/1999) e no Sindicato Nacional dos Quadros Bancários (de 09/11/1999 a 30/09/2013), sendo certo que o BARCLAYS pagou a indemnização de € 158.820,00, a título de indemnização pela rescisão do contrato de trabalho, considerando 26 anos de serviço no sector bancário ao abrigo da cláusula 17ª do ACT para o Sector Bancário, de acordo com cláusula constante do acordo de revogação do contrato de trabalho celebrado entre o recorrente e o BARCLAYS.
No acórdão fundamento (acórdão do TCAS, de 21/09/2010-P. 03748/10, acessível em www.dgsi.pt) a factualidade apurada é, substancialmente, similar.
De facto, o contrato de trabalho ali em causa continha uma norma que remetia para o ACTV do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, subscrito pela entidade empregadora, que prevê a extensão da antiguidade a todo o tempo de prestação de serviço no sector bancário.
Ou seja, no acórdão fundamento estava reconhecido ao respectivo trabalhador, no caso de cessação do contrato, o direito a uma antiguidade reportada a uma data anterior à da celebração do contrato, como sucede na decisão recorrida, em que, de facto, a entidade patronal pagou a indemnização por cessação de antiguidade equivalente a todo o tempo de serviço prestado no sector bancário.
Todavia, a decisão recorrida, para efeitos de delimitação negativa de incidência de IRS apenas relevou a antiguidade na entidade devedora/BARCLAYS, enquanto a o acórdão fundamento relevou toda a antiguidade no sector bancário.

Concluiu-se assim, que, se verifica, quanto a esta questão, para além de identidade de situações fácticas, a invocada oposição de soluções jurídicas.

10. Orientação perfilhada na decisão impugnada de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo

Entendemos porém que no caso em apreço falece o segundo dos apontados requisitos para que o recurso seja admitido, ou seja a exigência legal de que não exista, no sentido da decisão recorrida, jurisprudência recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como vem afirmando a jurisprudência desta Secção o conceito legal jurisprudência consolidada consubstancia-se numa estabilidade de julgamento demonstrativa de uma constância decisória, que pode transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o art. 17º, nº 2, do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.

Ora a decisão arbitral recorrida está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo uma vez que sobre a questão foi proferido no dia 8 do passado mês de Maio o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário no recurso 0407/18.7BALSB, que decidiu uniformizar jurisprudência no seguinte sentido: «A antiguidade a que se refere o disposto no artigo 2º, n.º 4, al. b) do CIRS respeita unicamente à antiguidade do trabalhador na entidade devedora da compensação/indemnização pela cessação do contrato de trabalho».
A existência desse acórdão, tirado pelo Pleno recentemente, com um único voto de vencido, na ausência de alterações na composição da Secção de Contencioso Tributário e não havendo outras circunstâncias que permitam antever a alteração do aí decidido, significa que ele corporiza a existência de jurisprudência recentemente consolidada.
Em suma resulta do exposto que não está, desde logo, preenchido um dos pressupostos da uniformização de jurisprudência invocada pela recorrente, já que, sobre a questão de direito sobre a qual se invocava existir oposição de julgados, a decisão arbitral recorrida não diverge, antes converge, com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

Conclui-se, assim, que não se verificam os requisitos do recurso para uniformização de jurisprudência previsto nos arts. 25º, nº 2 do RJAT e no 152º do CPTA, pelo que o presente recurso não deve ser admitido.

11. Termos em que acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelos recorrentes.
Comunique-se ao CAAD.
Lisboa, 3 de Julho de 2019. - Pedro Manuel Dias Delgado (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva – António José Pimpão - Joaquim Casimiro Gonçalves - Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.