Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01644/15
Data do Acordão:07/04/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
FUNDAMENTOS
DÍVIDA À CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário:I - Uma invocada nulidade do acto de citação não constitui, no regime do CPPT, fundamento de oposição à execução fiscal, podendo ser arguida no processo de execução fiscal, que prosseguirá depois de suprida aquela.
II - A prescrição de dívida proveniente de um contrato de mútuo, objecto de execução fiscal promovida pela CGD, interrompe-se pela citação ou notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente (artº 323º, nº 1 do Código Civil).
III - Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
IV - A interrupção inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, a menos que a interrupção resulte de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, caso em que o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigos 326.º/1 e 327.º/1 do Código Civil).
Nº Convencional:JSTA000P23498
Nº do Documento:SA22018070401644
Data de Entrada:12/11/2015
Recorrente:A.......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A…………, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a oposição à execução fiscal nº 3417198601060011, deduzida contra divida exequenda que resulta de um empréstimo que assumiu na qualidade de fiadora, concedido pela Caixa Geral de Depósitos à sociedade comercial B………., Ld.ª, no montante de 22.000.000$00.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1. Conforme resulta dos autos, designadamente, da certidão de diligência de fls. 31 p.f. (reproduzida no ponto 5 dos factos provados, elencados na sentença) e da Informação da DGI de fls. 70, a Recorrente nunca foi citada para os termos da execução (e tanto assim que deduziu oposição à execução a partir da notificação da existência de penhora do seu vencimento).
2. O certo é que, atendendo à sua qualidade de fiadora e ao valor da causa (€ 318.531,28), deveria a Recorrente ter sido citada pessoalmente, com comunicação dos prazos para dedução de oposição e de que poderia requerer o pagamento em prestações (ou em dação citação essa que deveria ser acompanhada de cópia do título executivo, importância e proveniência da dívida — artigos 66.º e 67.º do Cód. Proc. Contrib. Impostos, artigos 275.º, n.º 3 e 274.º, do Cód. Proc. Tributário e, finalmente, artigos 189.º 190.º e 191.º n.º3, do Cód. Proced. e de Processo Tributário.
3. Disposições legais estas cujo cumprimento foi omitido pela Fazenda Nacional, assim resultando violadas as exigências constantes de tais normativos.
4. Em consequência da falta de citação, a Recorrente foi prejudicada na sua defesa e na dos seus interesses — não pode deduzir oportunamente a sua oposição, não lhe foi conferida a possibilidade de indicar para penhora bens da empresa devedora principal que esta ao tempo detivesse, não pôde optar pelo pagamento da dívida em prestações ou usufruir de benesses fiscais que desde 1986 foram conferidas pelo Estado aos demais contribuintes.
5. A falta de citação constitui uma nulidade insanável, que se invocou — e novamente aqui se invoca, para os devidos efeitos — mas que é do conhecimento oficioso e pode ser conhecida até ao trânsito em julgado da decisão final — artigo 165.º do Cód. Proced. Proc. Tributário (artigos 76.º, alínea f) do Cód. Proc. Contrib. Impostos e 251.º do Cód. Proc. Tributário).
6. Tal nulidade importa, nos termos dos normativos referidos na conclusão anterior, a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente.
7. A falta de citação constitui fundamento para oposição à execução, designadamente, nos termos do artigo 204. n.º 1, alínea i), do Código. Proced. Processo Tributário.
8. Na verdade, no presente caso concreto comprova-se por documento — aquele certidão de diligência e a “Informação” de fls. 70 — que a citação da Recorrente não foi efetuada, estando em causa um vício que acarreta uma nulidade de conhecimento oficioso, a todo o tempo.
9. Para além disso, não existe qualquer norma que determine que, verificando-se a falta de citação, terá a respetiva nulidade de ser arguida necessariamente perante o órgão de execução fiscal e, posteriormente, a respetiva decisão objeto de reclamação para o Tribunal Tributário.
10. E, por outro lado, o meio mais adequado para se reagir numa execução ao vício da falta de citação — aliás de tal modo grave que é cominado com nulidade, apreciável oficiosamente, a todo o tempo — é por via da dedução de oposição à execução, nos termos da alínea i), do art.º 204.º, do Cód. Proced. e Proc. Tributário.
11. Sendo que, sem conceder, mesmo que se perfilhe do entendimento de que a nulidade em causa pode ser invocada perante o órgão da execução, tal não determina que o executado, não o tendo feito, não possa ainda invocar a nulidade da falta de citação por via de oposição à execução, nos termos daquele preceito legal.
De todo o modo,
12. E atendendo às razões invocadas nas anteriores conclusões, sempre deverá ser considerado inconstitucional o preceituado no art.º 204º nº 1, alínea i) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quando interpretado no sentido de que não contempla tal normativo, dentre os fundamentos nele previstos de oposição à execução, a falta de citação.
13. Com efeito, tal interpretação, do nosso humilde ponto de vista, é manifestamente violadora de direitos e deveres fundamentais constitucionalmente consagrados, tais como, entre outros, o do princípio da igualdade, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva e de garantia dos contribuintes, contemplados, respetivamente, nos artigos 13.º, 20.º, n.º 1 e 103.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, que assim resultam violados.
Em qualquer hipótese,
14. A presente execução foi instaurada em 5 de Março de 1986 contra a empresa devedora e fiadores, com base em ofício da Caixa Geral de Depósitos datado de 7 de Fevereiro de 1986 dirigido ao Agente do Ministério Público, em que se dava conta que a origem da dívida em o incumprimento de um contrato de abertura de crédito — sendo a Recorrente uma das fiadoras relativamente a uma parte do crédito.
15. Daqui resulta que o incumprimento do referido contrato de crédito, que originou o ofício e a instauração da execução, ocorreu necessariamente em data anterior à do ofício, isto é, data anterior a 07-02-1986.
16. Conforme se evidenciou nas conclusões supra, a Recorrente nunca foi citada para os termos da execução e apenas teve conhecimento da existência da execução a partir da carta que recebeu em 07-04-2006 endereçada pelo Serviço de Finanças de Ovar-1, que aliás nem sequer identifica a execução, tendo sido necessária a deslocação a dois Serviços de Finanças para tomar conhecimento da mesma — cfr. DOC. 1 junto com a nossa oposição, a fls. dos autos.
17. Assim se podendo concluir que decorreram mais de 20 anos desde o incumprimento do contrato e/ou a instauração da execução e a data em a Recorrente tomou conhecimento da existência da execução.
18. Pelo que, tendo decorrido o prazo ordinário de prescrição desde o incumprimento do contrato de abertura de crédito e/ou a instauração da execução até aquela data de 07.04.2006 tem a Recorrente ora Recorrente a faculdade de recusar o cumprimento da prestação e de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito — art.º 304.º, do Código Civil
19. Prescrição que aqui novamente se invoca mas que também é do conhecimento oficioso do Tribunal, nos termos do art.º 175.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e que acarreta a extinção da execução, nos termos do artº 1 76.º, n.º 1, alínea c), do mesmo Código.
20. Acresce referir que, contrariamente ao mencionado na sentença, não se verifica qualquer causa de interrupção da prescrição, nomeadamente, por virtude da emissão do mandado de citação e auto de diligência.
21. O mandado nunca constituirá causa de interrupção do prazo de prescrição e, por outro lado, o que o auto de diligência atesta é, tão só, que não foi possível a citação da Recorrente na data nele referida.
22. Acresce que, não se deverá considerada interrompida a prescrição com efeitos a 26-04-1986, por aplicação do disposto no n.º2, do art.º323.ºdo Código Civil.
23. É que, pelo facto da Recorrente ter mudado de residência não poderá concluir-se que a sua citação não teve lugar apenas por motivos que lhe são imputáveis, assim beneficiando a Caixa Geral de Depósitos da presunção estabelecida naquele n.º 2, do art.º323. do Código Civil.
24. Com efeito, não era legalmente exigível à Recorrente que comunicasse à exequente a sua alteração de morada, pois não prestou qualquer termo de identidade e residência e, sendo professora do ensino oficial, titular, obrigatoriamente (ao tempo) de conta na Caixa Geral de Depósitos, facilmente poderia a exequente promover a sua citação,
25. De todo o modo, sempre competiria à Caixa Geral de Depósitos encetar as diligências necessárias para efetivar a citação da Recorrente, em obediência ao disposto no art.º 242.º e seguintes do Código de Processo Civil (redação ao tempo em vigor).
26. Acresce que, eventuais interrupções ou suspensões da prescrição que se tenham porventura verificado relativamente à empresa devedora, não produzem qualquer efeito relativamente à ora Recorrente fiadora — artigos 636.º e 637.º, do Código Civil
27. De referir, por último, que o Tribunal a quo violou os preceitos legais e constitucionais constantes das disposições enumeradas nas anteriores conclusões, que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido de ser admissível a oposição à execução com fundamento na falta de citação, sob pena de uma interpretação inconstitucional do art.º 204.º n.º 1, alínea i) do Cód. Proc. e de Processo Tributário e, bem assim, no sentido de que se encontra prescrita a dívida exequenda,
28. O que determina deva ser revogada a decisão constante da douta sentença, devendo ser substituída por decisão que, nos termos daqueles preceitos legais, determine a extinção da execução, nos termos, designadamente, do art.º 176. n.º 1, alínea c), do mesmo Código, assim se fazendo
JUSTIÇA!»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer que, na parte relevante se transcreve:
«(….) Creio que não assiste razão à Recorrente.
Com efeito, como é jurisprudência pacífica, a nulidade da citação não se comporta no elenco dos fundamentos de oposição taxativamente enumerados no art. 204º, nº 1 do CPPT. Sendo a citação uma formalidade do processo de execução, é na execução que deverá ser arguida a nulidade da citação, com eventual reclamação do despacho que vier a ser proferido, nos termos do art. 276.º do CPPT. E conferindo a lei a possibilidade de, por essa via, poder ser suscitada e resolvida a questão da falta de citação, manifestamente inexistirá violação dos direitos constitucionais enunciados no art. 13 da Alegação de Recurso.
Não procederá, por outro lado, salvo melhor entendimento, a invocada prescrição da dívida exequenda.
Como bem se refere na sentença recorrida, o prazo da prescrição da dívida exequenda é de 20 anos, nos termos do art. 309.º do CC.
De acordo com factualidade que resultou provada e que não é posta em causa pela ora Recorrente o contrato cujo incumprimento determinou a instauração da execução em causa foi celebrado em 20.12.1980 e, instaurada a execução, foi, em 21.04.1986, emitido mandado de citação, diligência que não se concretizou pelo facto da ora Recorrente não ter sido encontrada na respectiva residência (cfr. pontos 1 a 5 do probatório).
Neste contexto, iniciando-se o prazo prescricional a partir do momento em que a obrigação se tomou exigível e possibilitou o exercício do direito, nos termos do art. 306º, n.º 1 do CC, ou seja, em data anterior a 07.02.1986 (ponto 2 do probatório), o mesmo interrompeu-se passados que foram 5 dias sobre a diligência de citação que não foi realizada nesse lapso de tempo, por causa não imputável ao exequente, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 323.º do CC.
A ocorrência do facto interruptivo inutiliza para a prescrição todo o tempo anteriormente decorrido, começando a correr novo prazo a partir do facto interruptivo, nos termos do disposto no art. 326º, n.º 1 do C.Civil. Só assim não será quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, nos termos do n.º 1. do art. 327º, n.º 1 do C. Civil, caso em que não terá início novo prazo de prescrição enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo. É o que ocorre no caso vertente, não obstante a não concretização da citação nos 5 dias subsequentes à diligência a que aludem os pontos 4 e 5 do probatório, nos termos do mencionado art. 323º, n.º 2 do CC.
Não operou, portanto, a prescrição da dívida exequenda.
Concluo, em face do exposto, pela improcedência do presente recurso e, em consequência, pela manutenção do julgado.»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – A decisão sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade:
1. Em 20/12/1980, a sociedade B.............., Lda, na qualidade de segundo outorgante representada por C……. e mulher A……….; …………….; Dr. ……………. e ……………. e mulher …………. celebrou com o primeiro outorgante Caixa Geral de Depósitos, escrito particular denominado “Abertura de crédito com hipoteca e fiança”, cfr. fls. 17/25 do p.f, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e donde consta designadamente o seguinte: «(...) Primeiro- Um- Para fins industriais a Caixa concede à Sociedade um empréstimo, sob a forma de abertura de crédito até ao montante de VINTE E DOIS MILHÕES de ESCUDOS, pelo prazo de sete anos. (...) Quatro — Um- O capital emprestado vence o juro de vinte e três quartos por cento ao ano, que a Caixa se reserva o direito de alterar dentro dos limites legais em vigor na data da mesma alteração; (...) Para garantia do presente contrato e condições estipuladas a Sociedade constitui hipoteca sobre o direito de superfície do prédio rústico, sito na freguesia de Santo André, concelho de Santiago do Cacém, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santiago de Cacém sob o número dezoito mil seiscentos e trinta e quatro do livro E- cinquenta e seis, inscrito na matriz sob parte dos artigos cinco, vinte e seis, vinte e sete e cinquenta, todos da secção I (...) Décimo quinto- Os segundos outorgantes responsabilizam-se solidariamente para com a Caixa como fiadores e principais pagadores da Sociedade, pelo pagamento de uma parte do capital do empréstimo igual a doze mil e quatrocentos contos e dos correspondentes juros e despesas, dando desde já o seu acordo às modificações de prazo ou moratórias que vierem ser convencionadas entre a Caixa e a Sociedade (...)»
2. Em 07/02/1986, em consequência do incumprimento do contrato referido em 1., a Caixa Geral de Depósitos, requereu ao Agente do Ministério Público no 1.º Juízo do Tribunal de 1.ª Instância das Contribuições e Impostos de Lisboa, a instauração de execução, cfr. fls. 14/29 do p.f., que aqui se dá por integralmente reproduzido:


3. Em consequência do referido em 2., foi instaurado o processo de execução n.º 3417-02/100708.4 (processo de execução fiscal n.º 3417198601060011) contra a Oponente, cfr. fls. 4 do p. f.;
4. Em 2110411986, foi emitido mandado de citação, cfr. fls. 30 do p.f., que aqui se dá por integralmente reproduzido:




5. Em consequência do mandado de citação referido em 4. foi lavrada certidão de diligencia, cfr. fls. 31 do p.f., que aqui se da por reproduzida e com o seguinte teor:
«(…)


6. Em 12/06/2003, a Caixa Geral de Depósitos, apresentou requerimento junto da 2. Repartição de finanças de Aveiro, cfr. fls. 52/53 do p.f.., com o seguinte teor:
«(…)
A Caixa Geral de Depósitos, S.A. Pessoa Colectiva nº 500960046, com sede na Av. João XXI, 63, 1000-300 Lisboa, exequente nos autos à margem identificados, que move contra B……….., Lda notificada através do oficio nº 2207, de 30/05/2003,
vem expor e requerer a V.Exª o seguinte:
1. Face à notificação, ora recebida, fomos informados de que das diligências efectuadas pelo Serviço de Finanças de Albergaria-a-Velha, não foi possível proceder à penhora dos prédios indicados no nosso requerimento, de 10/11/97, em virtude de dois dos prédios já não pertencerem aos executados e o terceiro já se encontrar penhorado noutro processo por dívida à CGD.
2. Contudo, no âmbito da presente execução, a Caixa Geral de Depósitos, em 11/09/92, requereu a penhora de 1/3 da retribuição auferida pela fiadora A……….., como professora na Escola Secundária ………, cuja cópia se anexa.
3. Decorridos mais de onze anos, a exequente desconhece qual o despacho que recaiu sobre o referido requerimento e se a penhora da retribuição auferida pela fiadora A…………., se chegou a efectivar, e em caso afirmativo qual a data do seu início e qual o montante que se encontra depositado.
Termos em que requer a V.Exa se digne informar qual o despacho que recaiu sobre o requerimento que solicitou a penhora de 1/3 da retribuição auferida pela fiadora A…………. e subsequente tramitação processual referente aquele pedido.
E.D.
CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS

7. Em 25/07/2003, o chefe de serviço de finanças de aveiro 2, remeteu oficio 3126, cfr. fls. 56 do p.f. com o seguinte teor:

Assunto:Proc. exec. Fiscal – Empréstimo nº 101.659C de 22/12/1980
Executado: B………., Ldª
NIPC ………….
Processo de execução Fiscal nº 3417-02/100708.9
Em conformidade com o solicitado no oficio em referencia, informo V. Exª que após apresentação do requerimento a solicitar a penhora de vencimento, o processo foi mandado suspender através do requerimento que se junta cópia, sem posteriormente e até esta data, tenha sido ordenada a referida penhora.
Venho ainda por este meio solicitar a V.ª Exª, e com a finalidade de determinar o montante em divida da responsabilidade da fiadora, nota de débito actualizada da responsabilidade dos fiadores, tendo em vista o teor oficio que também se junta cópia.

8. Em resposta ao oficio referido em 7., a exequente Caixa Geral de Depósitos, remeteu ao Serviço de Finanças supracitado a seguinte nota de débito, cfr. fls. 57/61 do p.f.:




9. Em 28103/2006, o Serviço de Finanças de Ovar-1, notificou a Oponente da Penhora de bens no âmbito da execução fiscal n.º 3417198601060011, cfr. fls. 11 p.f.;
10. Em 08/05/2006, deu entrada na 2. Repartição de Finanças de Aveiro, a presente Oposição à execução fiscal [ 5 do p.f].

6. Do objecto do recurso

As questões a decidir reconduzem-se a saber:

- se ocorreu nulidade por falta de citação da recorrente no processo de execução fiscal e se a referida falta de citação constitui fundamento de oposição à execução, nos termos previstos na alinea i) nº1 do art.º 204º do CPPT;
- se ocorreu a prescrição da dívida exequenda à Caixa Geral de Depósitos.

6.1 Da invocada nulidade por falta de citação no processo de execução fiscal .
Perante a suscitada questão da nulidade por falta de citação pessoal da executada, e ora recorrente, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro entendeu, sufragando jurisprudência desta Secção, que quer a falta de citação quer a nulidade da citação, por inobservância das formalidades prescritas na lei, não constituem fundamento de oposição à execução fiscal, devendo ser arguidas perante o órgão da execução fiscal no prazo da contestação, sendo a eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o Tribunal Tributário.

É, de confirmar a sentença que neste sentido se pronunciou.
Constitui jurisprudência pacífica que a nulidade por falta de citação não se comporta no elenco dos fundamentos de oposição taxativamente enumerados no artº 204º, nº 1 do CPPT, podendo ser arguida no processo executivo que, prosseguirá, depois de suprida a eventual nulidade, sendo a decisão que venha a ser proferida pelo órgão de execução fiscal passível de reclamação judicial, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 276.º e seguintes do CPPT. (v., entre muitos outros, os Acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 30.05.2018, recurso 1410/17, de 08/07/2015, recurso nº 0512/14, de 28/02/2007, no Processo n.º 0803/04, de 01/07/2009, no Processo n.º 01050/08 e de 24/02/2011, no Processo n.º 0105/11).
Mais, ao invés do que alega a recorrente, o fundamento invocado - sua falta de citação para a execução – não cabe na previsão do artº 204º nº 1, al. i) do CPPT.
Com efeito na alínea i) daquele normativo admite-se como fundamento de oposição à execução fiscal qualquer outro fundamento a provar apenas por documento e que não envolva apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda nem represente interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.
Trata-se de uma disposição com carácter residual em que serão enquadráveis todas as situações não abrangidas pelas outras alíneas do mesmo número, em que existir um facto extintivo ou modificativo da dívida exequenda ou que afecta a sua exigibilidade, hipótese em que não se integra o fundamento invocado pela recorrente.
Os fundamentos susbsumíveis à previsão desta al. i) devem consubstanciar-se em factos modificativos ou extintivos da dívida, ou que afectam a sua exigibilidade, importando a sua verificação, consequentemente, a impossibilidade de prosseguimento da instância executiva, ao menos, nos precisos termos em que foi instaurada - neste sentido, cfr. os acórdãos deste STA, de 12/2/2003, rec. nº 1529/02 e de 22.03.2011, recurso 749/10, in www.dgsi.pt.
Na verdade, esta disposição, como todas as outras do referido artigo 204º reporta-se apenas a fundamentos que possam conduzir à extinção da execução, que é o fim a que se destina a oposição à execução.
Em suma a nulidade por falta de citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
É certo que, invocada a nulidade por falta da citação em processo de oposição à execução fiscal, há que ponderar a possibilidade de convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal (cf. art. 97.º, n.º 3, da LGT e art. 98.º, n.º 4, do CPPT).
Porém essa possibilidade, não existe quando a nulidade da citação não é o único fundamento de oposição invocado e entre os invocados se inclua algum que esteja previsto como tal no art. 204.º - no caso subjudice a prescrição da dívida exequenda.
Em situações deste tipo, como sublinha Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume III, pags. 146/147, havendo uma cumulação de pedidos e ocorrendo erro na forma de processo quanto a um deles, a solução que se extrai do regime do processo civil é considerar sem efeito o pedido para o qual o processo não é adequado, como se infere da solução dada a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do C.P.C.

É, por isso, de concluir que em função do pedido e das causas de pedir o meio processual de oposição à execução é o adequado, pelo que inexiste erro na forma do processo.
Por fim importa referir, como bem nota o Ministério Público, que, conferindo a lei a possibilidade de poder ser suscitada e resolvida a questão da falta de citação mediante arguição no processo executivo, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável, inexiste a invocada violação dos direitos constitucionais enunciados no artº. 13 das conclusões da alegação de recurso.

6.2 Da prescrição da dívida exequenda

Como resulta do ponto 1 do probatório, está em causa dívida à CGD relativa a empréstimo concedido à Sociedade B……….., Ldª, mediante contrato de mútuo celebrado em 20 de Dezembro de 1980, de que foi fiadora a executada, e ora recorrente, A……….

Sendo inquestionável que a dívida em causa não tem natureza tributária, mas civil, pese embora possa ser cobrada coercivamente através do processo de execução fiscal, esse facto não implica que fique sujeita ao prazo ou ao regime de prescrição da dívida tributária.
Com efeito, como se exarou no acórdão desta Secção de Contencioso Tributário, de 1/3/2000, proc. nº 024545, «Com a possibilidade de cobrança dos créditos através do processo de execução fiscal, pretendeu-se dar à CGD um meio mais expedito de cobrança dos seus créditos, em atenção às suas funções de interesse público, e não alterar a natureza dos seus créditos nem o regime substantivo que os regula.
Por outro lado, a atribuição deste regime especial de cobrança, (…), visou privilegiar a CGD em relação às outras entidades com intervenção no comércio bancário, atento o interesse público subjacente a essa cobrança.
Sendo essa a finalidade dessa atribuição, seria incongruente que, concomitante e contraditoriamente, se fosse atribuir-lhe um estatuto diminuído a nível do direito substantivo (…)».
Este regime especial de cobrança coerciva derivava do disposto no art.º 61º do DL. n.º 48 953, de 5 de Abril de 1969 e no art.º 159º do Regulamento da Caixa Geral de Depósitos, aprovado pelo Decreto n.º 694/70, de 31 de Dezembro, sendo que tais preceitos continuaram a ser aplicáveis, não obstante a conversão da CGD em sociedade anónima de capitais exclusivamente público (DL. n.º 287/93, de 20/08), e de, por essa razão, a competência para conhecer destas questões ter passado para o foro comum, em virtude do disposto no seu art.º 9º n.º 5 em que se ressalvou que «as execuções pendentes à entrada em vigor do presente diploma continuam a reger-se, até final, pelas regras de competência e de processo vigentes nessa data».
Assim sendo há que atentar no regime substantivo de prescrição que regula a dívida em causa que é disposto nos arts. 309º/310º e 323º e segs. do Código Civil
Ora, de harmonia com o n.º 1 do artigo 323.º CC, a prescrição, cujo prazo é de vinte anos (artigo 309.º CC), interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
O acto interruptivo aqui previsto é a citação e o seu efeito é a interrupção da prescrição, a qual inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir da sua verificação (artigo 326.º CC).
No caso em apreço, como se evidencia na decisão recorrida e resulta do probatório (pontos 2, 4 e 5) exequente CGD procedeu à instauração da competente acção em 07/02/1986, nos termos do disposto no Decreto n.º 16899, de 27/05/29 e dos artigos 59.º e 61.º do Decreto-Lei n.º 48953, de 05/04/69, contra a Oponente e restantes fiadores, tendo sido simultaneamente requerida a citação dos mesmos para procederem ao pagamento da dívida exequenda.
E em 21/04/1986 foi emitido o mandado de citação, com vista à citação da Oponente, tendo-se frustrado a diligência de citação por a mesma não se encontrar na sua última residência conhecida.
Como a citação não se fez dentro de cinco dias depois de ter sido requerida por causa não imputável à exequente, a prescrição interrompeu-se logo que decorridos esses cinco dias (artigo 323.º, n.ºs 1 e 3 CC).
Com efeito o que interrompe a prescrição é a citação e mesmo que esta não tenha sido feita cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, a verdade é que a prescrição se interrompe logo que decorridos esses cinco dias.
Ou seja, ainda que a citação se faça para além desses cinco dias, o seu efeito de interrupção da prescrição faz-se repercutir ao decurso daqueles cinco dias - neste sentido vide Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 07.03.2007, recurso 554/06 e de 14.12.2016, recurso 193/14.
Mesmo a anulação da citação não impede o efeito interruptivo desta (n.º 3 do artigo 323.º Código Civil).
No caso vertente não existe nexo de causalidade adequada entre a conduta da exequente e a não realização do acto interruptivo (citação) no prazo de cinco dias após ter sido requerido.
Como bem se assinala na sentença recorrida não resulta provado qualquer facto passível de imputar à exequente CGD um comportamento que tenha obstado ou provocado o retardamento da citação da Oponente, diligência que se frustrou por não se encontrar a mesma na sua última residência conhecida.
Interrompido o prazo de prescrição, inutiliza-se o tempo decorrido anteriormente e inicia-se nova contagem do prazo prescricional a partir do acto interruptivo (artigo 326.º CC), sem prejuízo, porém, de, tendo a interrupção resultado de citação, o novo prazo de prescrição não começar a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (n.º 1 do artigo 327.º CC).

Assim sendo, no caso subjudice o prazo de prescrição, de 20 anos, foi interrompido desde o quinto dia posterior àquele em que a execução foi instaurada, ou seja, pelo menos desde 12.02.1986, e não voltará a correr enquanto não passar em julgado a decisão que venha a pôr termo ao presente processo (artigos 326.º/1 e 327.º/1 do CC).
Não se mostra, pois, verificada a prescrição da dívida exequenda.
A sentença recorrida, que decidiu neste pendor, não merece censura.

7. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente

Lisboa, 4 de Julho de 2018. - Pedro Delgado (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva.