Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0166/14
Data do Acordão:07/09/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRC
CORRECÇÃO TÉCNICA
CLÁUSULA ANTI-ABUSO
Sumário:A administração tributária não pode operar correcção técnica, sem desencadear o procedimento próprio de aplicação da cláusula anti-abuso, para tributar subsídio atribuído a associação desportiva destinado à construção de estádio de futebol e parque de estacionamento, desconsiderando a realidade dos factos e atento às “intenções” por esta manifestadas de transferência dos activos construídos para uma sociedade sua participada.
Nº Convencional:JSTA00068839
Nº do Documento:SA2201407090166
Data de Entrada:02/10/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Legislação Nacional:LGT98 ART38 N2.
CPPTRIB99 ART62 ART63 ART64.
CIRC01 ART49 N3.
L 64-B/11 DE 2011/12/30.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (Equipa Extraordinária), de 25 de Setembro de 2012, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A…………… contra o despacho de indeferimento de reclamação graciosa e bem assim a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2003, no valor de 1 258 658,70€ e respectivas liquidações de juros compensatórios, apresentando para tal as seguintes conclusões:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida contra a liquidação de IRC do exercício de 2003, na parte respeitante à correcção relativa aos subsídios recebidos para a construção do Estádio …………. e parques de estacionamento, por haver considerado que a AT “considerou haver um erro ou abuso de forma … ou seja que foram usadas formas jurídicas dirigidas à obtenção de vantagens fiscais”, fazendo então aplicação do n.º 2 do artigo 38º da LGT – a denominada cláusula geral anti-abuso, concluindo que: “Não tendo a Administração Fiscal instaurado um procedimento próprio nos termos do art. 62.º a 64.º do CPPT, não pode proceder às correcções efetuadas, através do presente processo.”
B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, padecendo a mesma de erro na análise da matéria de facto e na aplicação do direito.
Pois,
C. E como decorre dos autos, a correcção impugnada não teve por base qualquer disposição anti-abuso, antes resultou de um procedimento de avaliação directo da matéria colectável, perante a constatação objectiva da sujeição a IRC de subsídios recebidos pelo impugnante, uma vez que os mesmos não foram destinados à directa e imediata realização dos fins estatutários do impetrante, como exige o n.º 3 do art. 48.º do CIRC, na sua anterior redacção, então em vigor, e considerado pelo impugnante na qualificação dada a esses subsídios como não tributados em IRC.
D. Não é pelo simples facto de a AT no seu relatório fundamentador afirmar que “a titularidade jurídica do estádio pelo A…………. foi apenas uma questão de mera formalidade legal, e não uma verdadeira materialidade” que se pode entender, porque assim não entendeu a AT, que existiu um erro ou abuso de forma jurídica utilizada, e muito menos que foram usadas formas jurídicas dirigidas à obtenção de vantagens fiscais, como entendeu o Tribunal a quo, aplicando este, singelamente, o n.º 2 do art. 38.º da LGT.
Pois,
E. A aplicação desta norma não se cinge à mera prevalência da substância sobre a forma, como entendeu o Tribunal a quo. Uma coisa é atender-se à substância económica de um determinado facto tributário, desconsiderando apenas a forma jurídica utilizada, algo bem diferente é afirmar-se que essa mesma desconsideração acarreta a utilização de meios artificiosos e fraudulentos.
F. Como refere J.L. Saldanha Sanches, a propósito da clausula geral anti-abuso consagrada no n.º 2 do art. 38.º da LGT: “estamos muito longe da ideia da perspectiva económica, traduzida na mera prevalência da substância sobre a forma: a intencionalidade da norma e os problemas a que procura responder são os mesmos, mas os condicionalismos que rodeiam a sua aplicação são muito mais exigentes, permitindo um balizamento mais cauteloso do exercício de poderes que atribui à Administração. E a primeira e mais importante restrição encontra-se no conceito de negócio jurídico realizado por meios artificiosos e fraudulentos, ou seja, um negócio jurídico que possa ser considerado, ele próprio, por causa dos meios a que recorreu, como sendo artificioso e fraudulento” (in Os limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, 2006, p. 170).
G. Em parte alguma da sua fundamentação entendeu a AT que o impugnante artificiosamente ou anomalamente, utilizou formas jurídicas dirigidas à minimização ou eliminação de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente sem a utilização desses meios, mas tão só uma diferente interpretação dos requisitos exigidos numa norma jurídica – n.º 3 do art. 49.º do CIRC – para que os subsídios em causa nos autos fossem ou não sujeitos a IRC.
H. A AT apenas entendeu que os subsídios foram utilizados em infra-estruturas cujo destino não era a directa e imediata realização dos fins estatutários do impugnante, mas em infra-estruturas cujo destino era quando muito os directos interesses de uma outra entidade – a “B……………”, tanto mais que, já desde 2001, existia a real intenção da transferência daqueles bens (estádio e parques) imediatamente após a realização dos jogos do Euro 2004, concretizada em 2004, com a escritura de reforço de capital da “B…………..”, como entrada em espécie.
I. Se a AT ao conhecer de toda a matéria de facto, entender que a deve requalificar juridicamente, ou seja, no caso concreto, qualifica-la como sujeita a imposto por não reunião dos pressupostos de não sujeição, sem ter de desconsiderar actos ou negócios jurídicos, então não haverá nunca lugar à aplicação da cláusula geral anti-abuso ou anti-elisão, como aliás não houve no caso em concreto por parte da AT.
J. A cláusula geral anti-abuso pressupõe a utilização de estruturas jurídicas, actos ou negócios “anómalos” como instrumentos elisivos, não decorrendo tal circunstância da factualidade apurada pela AT e descrita no relatório, daí que, não se retira da interpretação do aí fundamentado, a interpretação que o tribunal a quo, erroneamente extraiu.
K. Ademais, refira-se, não decorre dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo o preenchimento dos pressupostos exigidos no n.º 2 do art. 38.º da LGT, para que a cláusula anti-abuso fosse aplicada, ou seja,
L. não pode o Tribunal decidir pela anulação da liquidação por não instauração de um procedimento próprio nos termos do art. 62.º a 64.º do CPPT, quando ao interpretar os fundamentos invocados pela AT determinantes da sujeição a IRC dos subsídios recebidos, entende que esta considerou haver erro ou abuso na forma jurídica utilizada dirigida à obtenção de vantagens fiscais,
M. mas não demonstra, como deveria, para assim decidir, quais os factos dados como provados que preenchem todos os pressupostos exigidos no art. 38.º, n.º 2 da LGT.
N. Considera a Fazenda Pública que tais factos inexistem, daí que a AT não tenha procedido à aplicação da norma que o Tribunal entende que a AT implicitamente aplicou.
O. Isto porque a aplicação do n.º 2 do art. 38.º da LGT – a denominada cláusula geral anti-abuso – não é de tão singela aplicação, como, com o devido respeito, fez transparecer o Tribunal a quo na sua decisão aqui recorrida.
P. Assim, sendo certo que não poderá vislumbrar-se no caso concreto a figura do antiabuso até porque não foi essa a fundamentação que suportou a correcção aqui controvertida, dúvidas não podem subsistir de que a conduta da AT ao não ter instaurado o procedimento específico previsto no art. 63.º do CPPT na correcção efectuada, mostra-se legitimada, pelo que, não pode proceder a presente impugnação, como entendeu o Tribunal, por a não ocorrência do mesmo.
Q. Deste modo, tendo o Tribunal a quo feito errada interpretação da factualidade e fundamentação explanada pela AT, aplicando um pressuposto exigido numa norma legal não aplicada pela AT nem de aplicar ao caso concreto, incorreu em erro de julgamento de facto e do direito aplicável, devendo em consequência ser a sentença revogada
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, com as legais consequências.
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – Por Acórdão de 29 de Novembro de 2013 (a fls. 313 a 332 dos autos), o Tribunal Central Administrativo Norte julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecimento do objecto do recurso e competente para o efeito este Supremo Tribunal, para o qual os autos foram remetidos precedendo requerimento da recorrente nesse sentido (cfr. requerimento de fls. 311 dos autos).

4 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
«(…)
A nosso ver o recurso merece claro provimento.
Vejamos.
Nos termos do estatuído no artigo 38.º/2 da LGT, “São ineficazes os actos ou negócios jurídicos quando se demonstre que foram realizados com o único ou principal objectivo de redução ou eliminação dos impostos que seriam devidos em virtude de actos ou negócios jurídicos de resultado económico equivalente, caso em que a tributação recaia sobre estes últimos.”
Ora, como resulta do probatório e sustenta a recorrente, nunca esta sustentou que os negócios jurídicos feitos pelo recorrente e conexionados com a questão em discussão nos autos foram realizados com o único ou principal objectivo de redução ou eliminação dos impostos que seriam devidos em virtude de actos ou negócios jurídicos de resultado económico equivalente”.
Pelo contrário, resulta do probatório que o próprio recorrente deu a conhecer ao membro competente do Governo, aquando da atribuição do subsídio em causa, a intenção de proceder aos negócios em causa nomeadamente à transmissão do Estádio ……….. para a B……….., SA.
Aliás, se bem analisamos a PI, nunca a recorrente A……….. sustentou que a AT utilizou o regime das cláusulas anti-abuso para proceder à correcção atinente ao subsídio obtido para a construção do Estádio ………...
Na verdade, é a própria recorrida que no artigo 128.º da PI diz, textualmente, que “Ora, independentemente de tudo o mais, não se podem tributar intenções, antes haveria, se a AF efectivamente considerasse que foi utilizada uma forma jurídica dirigida à obtenção de vantagens fiscais indevidas, que acionar o procedimento regulado no art. 63.º do CPPT, por decorrência do enquadramento no art. 38.º da LGT, - o que não foi feito antes nem agora se sugere dever ter sido feito … (manifestação de razoabilidade que se aplaude, malgrado, naturalmente, o decurso, há muito tempo, do prazo de três anos consignado para o efeito no n.º 3 da norma citada no CPPT”.
Portanto, ressalvado, melhor juízo, o presente recurso jurisdicional não pode deixar de ser provido.
Uma vez que foi fixada a pertinente factualidade, nos termos do estatuído nos artigos 726.º e 715.º/2 do CPC, deve o STA conhecer das questões que ficaram prejudicadas pela solução dada à causa, na parte recorrida, em substituição do tribunal recorrido e que são:
1. Da não retroactividade da lei (artigos 91.º a 109.º da PI);
2. Do desvio dos fins estatutários (artigos 110.º a 123.º da PI)
Para o efeito, antes de mais, impõe-se que as partes sejam ouvidas sobre tais questões, pelo prazo de 10 dias, o que se promove (artigo 715º/3 CPC).
Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, revogar-se a sentença recorrida, conhecendo-se das questões prejudicadas pela solução dada à causa, em substituição do tribunal recorrido, devendo, previamente, as partes ser notificadas para se pronunciarem pelo prazo de 10 dias.»

Notificadas as partes do parecer do Ministério Público, veio a recorrida responder nos termos de fls. 347 a 351 dos autos, advogando o não provimento do recurso e a confirmação da sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
5 – Questão a decidir
É a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao anular a liquidação de IRC sindicada – na parte respeitante às correcções relativas aos subsídios recebidos para a construção do Estádio ………. e parque de estacionamento – por a AT não ter desencadeado o procedimento próprio de aplicação da cláusula anti-abuso prevista no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, procedimento este regulado nos artigos 62.º a 64.º do CPPT.

6 – Matéria de facto
Na sentença objecto do presente recurso encontram-se fixados os seguintes factos:
1. O Serviço de Inspeção Tributária efetuou uma ação fiscalizadora à Impugnante a fim de informar a ordem de serviço n.º OI200704065, tendo sido iniciada em 03.09.2007 e concluída em 12.05.2008, cfr. documento de fls. 50 a 74 dos PA apenso aos autos, que se dá por integralmente reproduzida.
2. Na sequência da inspeção foi efetuada a liquidação n.º 2008 8310033218, no valor de 1 218 271,32€, com data limite de pagamento em 25.06.2008 (fls. 33 a 35 do PA apenso aos autos);
3. O A………….. (A………) é uma pessoa coletiva de direito privado constituída como associação desportiva de utilidade pública.
4. Do relatório da ação inspetiva, consta, nomeadamente, o seguinte:
“OBJECTIVO, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA
(…)
II.2 – MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL: Parcial IRC, exercício de 2003, que abrange o período compreendido entre 01/07/2003 e 30/06/2004 por opção do período fiscal diverso do ano civil (cfr. n.ºs 2 e 3 do art. 8.º do CIRC).
II.3 – Outras situações
II.3.1 – Natureza jurídica do sujeito passivo e regime de tributação de IRC
O sujeito passivo A…………. (A……….) é uma pessoa colectiva de direito privado, constituída como associação desportiva de utilidade pública.
Por se tratar de uma entidade que não exerce a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, a tributação em sede de IRC incide sobre o rendimento global, formada sobre a soma algébrica dos rendimentos líquidos das diversas categorias, determinados nos termos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e, bem assim, dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, cfr. al. b), n.º 1 do artigo 3.º e n.º 1 do art. 48.º, ambos do CIRC.
De acordo com o n.º 3 do artigo 11.º do CIRC, o clube é tributado pelos rendimentos que não sejam directamente derivados do exercício das actividades desportivas e recreativas, com as condições previstas nos números 1 e 2 do referido artigo. Especifica o n.º 3 do art. 11.º, que os rendimentos, provenientes de qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola exercida ainda que a título acessório, em ligação com essas actividades desportivas e recreativas, não estão abrangidas pela isenção de IRC. Por outro lado, o n.º 4 do artigo 3.º do CIRC define como actividades comerciais, aquelas que consistam na realização de operações económicas de carácter empresarial.
Actividade
(…)
III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL
1. DESVALORIZAÇÃO EXCEPCIONAL – ART. 10.º do DR N.º 2/90 DE 12/01
1.1 Teor do requerimento apresentado pelo contribuinte
Em 15/03/2004, mediante requerimento dirigido ao Ex.mo Sr. Director-Geral dos Impostos, elaborado nos termos do n.º 3 do art. 10.º do Decreto Regulamentar (DR) n.º 2/90 de 12 de Janeiro e da al. b) do n.º 5 do art. 29.º do CIRC, o A………. solicitou que: “lhe fosse reconhecida a perda em sede de IRC, para efeitos de apuramento do lucro tributável do exercício de 2003, no valor de €3.293.471,55 referente às amortizações extraordinárias em elemento do activo imobilizado corpóreo com a descrição de “Estádio e respectivas instalações adjacentes”, em consequência desvalorização excepcional”. (sublinhado nosso)
(…)
1.3 Verificação contabilística
Procedemos à análise dos elementos contabilísticos, tendo-se constatado o seguinte:
a) foi contabilizado como perda extraordinária do exercício o valor de €3.295.738,99, correspondente ao abate do Estádio ………. (que corresponde ao somatório do valor indicado no requerimento, mais um valor de €2.267,44);
b) existe conformidade entre os valores líquidos contabilísticos e as fichas previstas no art. 51.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) e mapas de amortização;
c) do valor total do abate (€3.295.738,99), o contribuinte considerou a verba de €3.007.725,98, como custo específico da categoria B – rendimentos da actividade comercial (cfr. anexo n.º 1). De referir que, parte das amortizações relativas ao Estádio ……….., no valor de €342.289,15, praticadas nesse exercício, foram, também consideradas como rendimentos da categoria B.
1.4 Custos específicos da categoria F
Até Janeiro de 2004, o Estádio ………. esteve cedido à sociedade A………….. SAD. Os rendimentos daí provenientes foram classificados, em 2003, como rendimentos da categoria B, contudo, configuram rendimentos da categoria F, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do art. 8.º do Código do IRS, como, aliás, é ressalvado no próprio Dossier Fiscal do A…………. desse exercício, (em relatório relativo ao apuramento da estimativa de imposto, pg. 4). Por outro lado, o contribuinte não atendeu princípio da consistência, já que nos exercícios anteriores, os proveitos foram tipificados como rendimentos da categoria F e as amortizações do estádio ……….. consideradas como custos específicos da referida categoria (cfr. evidenciado nos mapas de “aumento da matéria colectável, que se anexam. (anexo n.º 2).
Face ao exposto, as amortizações do Estádio ………… (€342.289,15) e o respectivo abate extraordinário (€3.007.725,98), num total de €3.350.015,13€, devem ser considerados encargos específicos da categoria F, contudo não elegíveis como custos fiscais, para efeitos do apuramento do rendimento líquido desta categoria, porque não são dedutíveis nos termos do art. 4.º CIRS. Relembra-se que, de acordo com o art. 48.º do CIRC, no apuramento do rendimento líquido da categoria F, devem seguir-se as regras estabelecidas no CIRS. No que respeita aos rendimentos decorrentes da cedência do Estádio ………. à sociedade A…………. SAD, no valor global de €565.500,00 (cfr. Anexo n.º 1), procedemos à sua reclassificação como rendimentos da categoria F.
1.5. Correcção ao rendimento global
De acordo com os quadros de apuramento da matéria colectável de IRC (cfr. art. 15.º, n.º 1 al. b) e arts. 48.º e 49.º todos do CIRC), elaborados para efeitos dos arts. 115.º e 116.º, do CIRC, o contribuinte apurou os seguintes rendimentos e custos:
Notas (a) os custos comuns elegíveis apurados pelo contribuinte foram de €9.571.960,22

Após reclassificação dos custos do abate extraordinário do Estádio ………….. e respectivas amortizações, assim como dos rendimentos de cedência, conforme descrito nos pontos anteriores, será de acrescer ao rendimento global tributável do exercício fiscal de 2003, o valor de €3.350.015,13 (€7.563.190,76 - €4.213.175,63):




Notas (a) os custos comuns elegíveis apurados pelo contribuinte foram de €9.571.960,22

2. SUBSÍDIOS OBTIDOS PARA A CONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO ……… E PARQUE DE ESTACIONAMENTO
(…)
2.2 Natureza dos subsídios obtidos
(…)
Porém, da leitura dos contratos celebrados, verificamos que não foram especificamente regulados os pontos, a que se referem as alíneas c) e g) do n.º 2 do art. 12.º do referido DL 432/91, ou seja:
- Não foram identificadas outras entidades eventualmente associadas à gestão do programa, seus poderes e suas responsabilidades.
- Não ficou estabelecido qual o destino a dar aos bens construídos ao abrigo do programa e responsabilidade pela sua gestão e manutenção, bem como as garantias de afectação futura dos mesmos bens aos fins do contrato.
2.6 Enquadramento tributário dos subsídios atribuídos pelo IND
O A………. qualificou os subsídios atribuídos para a construção da obra (Estádio …….. e Parque), num total de €18.076.408,98, como rendimentos não sujeitos a IRC, ou seja subsídios não tributáveis, nos termos do n.º 3 do art. 49.º do CIRC (com a redacção dada pelo DL n.º 287/03 de 12/11, com entrada em vigor em 01/01/2004), por considera-los “destinados à directa e imediata realização dos seus fins estatutários”.
Contudo, vejamos:
I) Conforme consta nos Estatutos do Clube os seus fins são (cfr. Art. 4.º):
“1) visando o engrandecimento do desporto nacional:
a) Promover a educação física dos seus associados;
b) Desenvolver a prática dos desportos e proporcionar meios de recreio e cultura, em especial aos seus associados;
c) fomentar a acção social que, pelos presentes estatutos, lhe foi cometida;
d) levar a cabo nas suas instalações, quaisquer jogos permitidos por lei, nomeadamente o Bingo, mediante prévio licenciamento, conforme referido no DL n.º 277/82, decretos regulamentares n.ºs 41/82 e 70/82 e mais legislação aplicável.
II) Por outro lado, refere o art. 73.º dos referidos Estatutos, que:
&1.º Os subsídios atribuídos para valorização ou conservação do património do clube são obrigatoriamente, consignados à sua reintegração.” (sublinhado nosso).
III) Os subsídios atribuídos pelo IND foram integrados no património do clube (Estádio ……….). Para a não sujeição a IRC destes rendimentos, o clube deveria afectar o estádio subvencionado para a realização directa e imediata dos fins estatutários. Contudo, nunca houve a intenção de o afectar, na medida em que o património subvencionado foi transmitido para outra entidade, cujo objecto social é diverso, i.é, corresponde ao exercício de uma actividade comercial.
IV) Não obstante o capital social da B……………, SA ser detido em 99,99% pelo A…………., é aquela empresa que detém o património (Estádio ………….).
Face ao exposto, os subsídios em dinheiro atribuídos pelo IND, não foram tributados porque esta, associação desportiva (A…………) os considerou aplicados em investimentos destinados a prosseguir fins estatutários. Contudo, transfere a propriedade deste para o património de outra empresa a participada, a qual é tributada pelo regime geral de IRC. Sabe-se de antemão, que isto viria a acontecer como o comprova o requerimento endereçado pelo A………… (associação desportiva) ao Ministro das Finanças, o qual tem carimbo de entrada no Gabinete do Ministro datado de 06 de Abril de 2001, no qual na pág. 9, pode ler-se o seguinte:
(…) O A…………. tem, por isso, interesse que, no futuro (logo que estiver construído), o novo estádio seja “propriedade da B…………... Todavia, por imposição legal decorrente do contrato-programa que o A…………. celebrou com o Estado português, a construção do estádio deve ser promovida directamente pelo A………….
Em face desta limitação, optou-se por manter o A………….. como superficiário do terreno de construção onde será implantado o novo estádio transferindo, neste momento, e por aumento de capital, apenas a nua propriedade daquele terreno em favor da B…………... Concluída a construção do novo estádio, será então transferida a respectiva propriedade em favor da B……………, concluindo-se, assim, por um lado, a transferência do “ramo de actividade” afecto à construção do novo estádio do A…………… e extinguindo-se, por outro lado, o referido direito de superfície.
A transmissão, também por aumento de capital, deste imóvel, envolverá, naturalmente, a transmissão do passivo porventura associado à respectiva construção”…
Assim, afigura-se-nos que os subsídios atribuídos pelo IND ao A………… devem ser tributados, porque “Estádio, depois da realização do “Euro 2004” deixou de ser propriedade do A…………… (associação desportiva).
Embora, o n.º 3 do art. 49.º do CIRC, na sua anterior redacção (então em vigor), referisse “consideram-se rendimentos não sujeitos a IRC, designadamente as quotas pagas pelos associados em conformidade com os estatutos, bem como os subsídios e os incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, uns e outros destinados à directa e imediata realização dos seus fins estatutários “(sublinhado nosso), e os jogos do Euro 2004 tenham sido de facto disputados no estádio a que nos referimos, o certo é que:
1) A intenção do A…………… era, desde logo (2001), a transferência daqueles bens (Estádio e Parque de Estacionamento) imediatamente após a realização dos jogos para a B……………., SA, como entrada em espécie, para a realização do aumento de capital, naquela sua participada;
2) Com efeito, a confirmar que a titularidade jurídica do estádio pelo A…………… foi apenas uma questão de formalidade legal, e não uma verdadeira materialidade, está a seguinte passagem no seu requerimento de 2001 (anexo n.º 6):
3) O A………….., ficou, de facto, a partir de 30 de Dezembro de 2004, desprovido daquela estrutura adequada para a realização dos fins estatutários. Actualmente, os fins estatutários da associação prosseguem, agora sem a estrutura necessária para o efeito.
4) Os subsídios recebidos pelo IND foram na realidade utilizados em infra-estruturas, cujo destino não era a directa e imediata realização dos fins estatutários do A…………, tal como exige o n.º 3 do art. 49.º do CIRC para a sua não sujeição, pelo que devem ser tributados no exercício do seu recebimento, cuja parcela foi de €11.426.597,20 no exercício fiscal de 2003 (ver ponto 2.3)
5) Pelo exercício de 2004, é concretizada a citada intenção, pois em 30 de Dezembro, é lavrada a escritura de reforço de capital da B…………….., SA, aspecto jurídico que, apenas levou à concretização da real intenção já existente em 2001, da transferência supra explanada.
Face ao exposto, propomos o acréscimo ao rendimento global tributável do exercício fiscal de 2003 a parte do subsídio recebido nesse ano, num total de €11.426.597,20 de acordo com o n.º 1 do art. 48.º e da al. b) do n.º 1 do art. 3.º e do CIRC (redacções dadas pelo decreto-Lei n.º 287/2003 de 12/11). (…)” (conforme consta de relatório de Inspecção constante de fls. 50 a 74 do PA apenso aos dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido;

5. Em 06/06/2000, foi celebrado contrato-programa de Desenvolvimento Desportivo (Estádio) entre o A………………. com o Instituto Nacional de Desporto (IND) e a Sociedade ……………, SA, com a finalidade de execução da obra de construção do estádio de propriedade do A……………. (ponto 1, da cláusula primeira do referido contrato programa), sendo concedido ao A……………… “na qualidade de dono da obra, uma comparticipação financeira até ao valor de 3,25 milhões de contos” (cláusula quinta).
No contrato ficou estabelecida a utilização do estádio para a realização das atividades integradas nas fases finais do Campeonato Europeu de Futebol em 2004 e uma cláusula de servidão desportiva, (cláusula décima segunda) a que se refere o artigo 13.º do DL n.º 432/91 de 6/11, que determina o regime jurídico dos contratos-programa celebrados com vista à atribuição de comparticipações financeiras no âmbito do Sistema de Apoio ao Associativismo Desportivo, ou seja cláusulas de constituição de um direito real público de uso de bens privados, destinados a assegurar a utilização pelo público das infraestruturas e equipamentos, conforme consta do documento de fls. 124 a 133 e 113 e 114 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
6. Em 17/02/2003, o A…………… com a Câmara Municipal do Porto (CMP), celebram um contrato-programa, com a finalidade de (cfr. cláusula 1.ª) “regular a atribuição pelo Município do Porto ao A…………….. de uma comparticipação financeira, sob a forma de subsídio em espécie, para a construção no novo Estádio ……………. O A……………. assume, como beneficiário do citado subsídio, a obrigação efetiva da construção do seu novo Estádio de Futebol.
O contrato-programa estabelece o regime e destino da comparticipação financeira, cfr. cláusula 5.ª, consubstanciando-se em espécie em: entrega das parcelas n.º 4.2, 3.1 e 4.1 e ainda a cedência das parcelas E1 e E4”.
as parcelas E1 e E4, propriedade da CMP são entregues para a localização das novas instalações desportivas do Segundo outorgante, não lhes podendo ser dado outro uso ou destino”.
Por outro lado, a cláusula 6.ª estabelece que o A…………… “é a entidade responsável pela gestão manutenção e conservação das novas instalações desportivas” cf. 134 a 139 dos autos.
7. Em 29/11/2004, através de escritura pública, a CMP cede gratuitamente, em conformidade com o contrato-programa de 17702/2003, ao A………….. as parcelas de terreno E1 e E4, que correspondem a comparticipação sob a forma de subsídio em espécie para a construção do novo Estádio (fls. 140/146 dos autos),
8. Em 30/12/2004, através de escritura pública o A…………… procedeu ao aumento do capital social da sua participada B……………., S.A., nos seguintes termos:
“Aumenta o capital para oitenta e seis milhões trezentos e oitenta e seis mil euros mediante a emissão de dezasseis milhões duzentas e setenta e sete mil duzentas e quarenta acções ordinárias, no valor nominal de 5 euros cada, integralmente preenchida pelo acionista “A…………….”, por entrada em espécie na sociedade de bens e direitos que constituem uma unidade económica autónoma/complexo multifuncional denominado estádio do ……….. … conforme consta de documento constante de fls. 147 a 151 dos autos que aqui se dá por integralmente por reproduzido;
9. Dos Estatutos do A……………… consta no seu art. 4.º, o seguinte: “O A………………. tem por objectivo:
1) Visando o engrandecimento do desporto nacional:
a) promover a educação física dos seus associados;
b) Desenvolver a prática dos desportos e proporcionar meios de recreio e cultura, em especial aos seus associados;
c) fomentar a acção social que, pelos presentes estatutos, lhe foi cometida;
d) levar a cabo nas suas instalações, quaisquer jogos permitidos por lei, nomeadamente o Bingo, mediante prévio licenciamento, conforme referido no DL n.º 277/82, decretos regulamentares n.ºs 41/82 e 70/82 e mais legislação aplicável.
2) Com vista à obtenção de meios económicos para o conseguimento dos fins fixados no número anterior, o A……………. pode praticar quaisquer actos de natureza lucrativa, assim como pode prossegui-los através da participação em outras pessoas colectivas, nos termos permitidos por lei. O A…………… pode designadamente:
a) Promover a constituição de sociedades desportivas através da personalização jurídica das suas equipas que participem, ou pretendam participar em competições desportivas profissionais, e subscrever parte do respectivo capital social;
b) Exercer directamente actividades económicas de todo o tipo, bem como tomar participações de qualquer montante em sociedades comerciais de responsabilidade limitada, seja qual for o seu objecto;
c) Associar-se com outras pessoas jurídicas em quaisquer associações com fins económicos, nomeadamente consórcios;
d) Apoiar e participar em quaisquer outras iniciativas e empreendimentos de carácter financeiro.
10. Por despacho do Chefe de Divisão, de 18.01.2008, foi autorizada a prorrogação da inspecção pelo período de 3 meses (fl. 47/48 dos autos);
11. Em 12.02.2008, a impugnante foi notificada, na pessoa de C……………….., da prorrogação da ação de inspeção, por período de 3 meses em conformidade com o despacho de 18.01.2008 (fls. 46 dos autos);
12. Em 17.01.2008, foi elaborada informação pelo Inspetor tributário, na qual consta “(…) 2. No decurso da acção foram detectados factos tributários cujo enquadramento fiscal suscitaram dúvidas, tendo sido solicitada, em 10/12/2007, à DS IRC, a apreciação desses factos com carácter de urgência; 3. A matéria em apreciação refere-se ao enquadramento de rendimentos obtidos pelo contribuinte, no exercício fiscal de 2003, e sua qualificação, para efeitos dos art.s 21.º, 22.º e 49.º, n.º 3 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e ainda sobre o carácter da dedutibilidade nos termos do n.º 2 do art. 52.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF). 4. Perante a existência de matéria susceptível de produzir eventuais alterações às declarações fiscais, no âmbito da acção Inspectiva em curso (0/200704065), cujo enquadramento tributário se encontra em apreciação pela DSIRC, atendendo ao prazo normal do procedimento tributário de seis meses, previsto no art. 57.º da LGT, propõe-se ao abrigo do estipulado na alínea a) do n.º 3 do art. 36.º do RCPIT, por se estar perante uma situação tributária de especial complexidade, a ampliação do prazo da acção inspectiva por um período de três meses. (…)” Cfr. fls. 48/49 dos autos;
13. A B……………………, S.A., é uma sociedade anónima, tem por objecto a promoção e gestão de empreendimentos imobiliários, (fls. 100 a 112 dos autos que se dá por integralmente reproduzido.)
14. O capital social é de 99,999% da A………………, 0,0001% do A…………… (fls. 112 dos autos)
15. A Administração Tributária procedeu à liquidação adicional de IRC referente ao ano de 2004 e juros compensatórios no valor total de € 1.258.658,70, cuja data limite de pagamento era 2009.06.25, cfr. documento de fls. 58 do PA, “Processo de Reclamação Graciosa”, que se dá por integralmente reproduzido.
16. Em 29 de julho de 2009, foi o impugnante notificado da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que apresentou, cfr. documentos de fls. 124 a 126 do PA “Processo de Reclamação Graciosa”, que se dá por integralmente reproduzido.
17. Em 12.09.2008, o impugnante prestou caução através de garantia bancária emitida pelo D……………, no valor total de € 1 652 260,23 para suspender a execução fiscal. (fls. 42 do PA “Processo de Reclamação Graciosa”)
18. Em 14 de agosto de 2009, o impugnante intentou a presente ação judicial de impugnação, cfr. documento de fls. 1 que se dá por integralmente reproduzido.

7 – Apreciando
7.1 - Do alegado erro de julgamento da sentença recorrida
A sentença recorrida, a fls. 265 a 276 dos autos, julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pelo ora recorrido contra o indeferimento de reclamação graciosa e liquidação adicional de IRC relativa a 2003 bem como respectivos juros compensatórios, no entendimento de que a correcção operada pela Administração Tributária ao IRC de 2003 da impugnante relativa ao subsídio atribuído para a construção do Estádio ………… não podia ter lugar sem que para tal a Administração tivesse instaurado um procedimento próprio nos termos do art. 62.º a 64.º do CPPT, anulando na parte respectiva a liquidação sindicada.
Para assim decidir considerou a sentença recorrida que resulta da interpretação do Relatório da Inspecção tributária que a AF considerou haver um erro ou abuso na forma afirmando que a (…) titularidade jurídica do estádio pelo A……………. foi apenas uma questão de formalidade legal, e não uma verdadeira materialidade (…)” ou seja que foram usadas formas jurídicas dirigidas à obtenção de vantagens fiscais (cfr. sentença recorrida, a fls. 275, frente, dos autos), impondo-se, por isso, para legalmente operar a correcção, que tivesse desencadeado o procedimento próprio de aplicação de cláusula anti-abuso, sendo ilegal proceder à correcção, com aqueles fundamentos, sem ter desencadeado tal procedimento.
Insurge-se contra o decidido a Fazenda Pública, alegando, além do mais, que a correcção impugnada não teve por base qualquer disposição anti-abuso, antes resultou de um procedimento de avaliação directo da matéria colectável, perante a constatação objectiva da sujeição a IRC de subsídios recebidos pelo impugnante, uma vez que os mesmos não foram destinados à directa e imediata realização dos fins estatutários do impetrante, e que não é pelo simples facto de a AT no seu relatório fundamentador afirmar que “a titularidade jurídica do estádio pelo A……………… foi apenas uma questão de mera formalidade legal, e não uma verdadeira materialidade” que se pode entender, porque assim não entendeu a AT, que existiu um erro ou abuso de forma jurídica utilizada, e muito menos que foram usadas formas jurídicas dirigidas à obtenção de vantagens fiscais, como entendeu o Tribunal a quo, aplicando este, singelamente, o n.º 2 do art. 38.º da LGT. Que em parte alguma da sua fundamentação entendeu a AT que o impugnante artificiosamente ou anomalamente, utilizou formas jurídicas dirigidas à minimização ou eliminação de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente sem a utilização desses meios, mas tão só uma diferente interpretação dos requisitos exigidos numa norma jurídica – n.º 3 do art. 49.º do CIRC – para que os subsídios em causa nos autos fossem ou não sujeitos a IRC, antes apenas entendeu que os subsídios foram utilizados em infra-estruturas cujo destino não era a directa e imediata realização dos fins estatutários do impugnante, mas em infra-estruturas cujo destino era quando muito os directos interesses de uma outra entidade – a “B……………”, tanto mais que, já desde 2001, existia a real intenção da transferência daqueles bens (estádio e parques) imediatamente após a realização dos jogos do Euro 2004, concretizada em 2004, com a escritura de reforço de capital da “B…………….”, como entrada em espécie. Conclui que tendo o Tribunal a quo feito errada interpretação da factualidade e fundamentação explanada pela AT, aplicando um pressuposto exigido numa norma legal não aplicada pela AT nem de aplicar ao caso concreto, incorreu em erro de julgamento de facto e do direito aplicável, devendo em consequência ser a sentença revogada.
O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Supremo Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito defende o provimento do recurso, porquanto como resulta do probatório e sustenta a recorrente, nunca esta sustentou que os negócios jurídicos feitos pelo recorrente e conexionados com a questão em discussão nos autos foram realizados com o único ou principal objectivo de redução ou eliminação dos impostos que seriam devidos em virtude de actos ou negócios jurídicos de resultado económico equivalente”. Pelo contrário, resulta do probatório que o próprio recorrente deu a conhecer ao membro competente do Governo, aquando da atribuição do subsídio em causa, a intenção de proceder aos negócios em causa nomeadamente à transmissão do Estádio ………….. para a B………………, SA.
Vejamos.
Resulta do Relatório de Inspeção que serviu de base à “correcção técnica” controvertida nos presentes autos (transcrito, no segmento relevante, no n.º 4 do probatório fixado – cfr. o ponto 2 do referido Relatório) que a Administração Tributária entendeu ser de sujeitar a IRC o montante dos subsídios atribuídos ao A……………. pelo IND para a construção do Estádio ………….. e parque de estacionamento, não porque tais subsídios não tenham sido efectivamente utilizados para os fins para que foram atribuídos ou porque tais fins não sejam de considerar fins estatutários do beneficiário, antes porque a intenção do A…………… era, desde logo (2001), a transferência daqueles bens (Estádio e Parque de Estacionamento) imediatamente após a realização dos jogos para a B…………….., SA, como entrada em espécie, para a realização do aumento de capital, naquela sua participada, razão pela qual se entendeu que os subsídios recebidos pelo IND foram na realidade utilizados em infra-estruturas, cujo destino não era a directa e imediata realização dos fins estatutários do A……………, tal como exige o n.º 3 do art. 49.º do CIRC para a sua não sujeição.
Ou seja, através de mera “correcção técnica” – fundada no não preenchimento do pressuposto legal de que dependia, nos termos da lei, a não tributação dos subsídios (destinação do subsídio à directa e imediata realização dos seus fins estatutários) -, a Administração tributária procurou conformar a realidade tributária de acordo com a intenção final do A………….. de transferência dos activos construídos para uma sociedade sua participada (a B…………..), não relevando que, no exercício fiscal em causa (2003), os equipamentos co-financiados pelos subsídios eram propriedade do A…………… e estavam afectos à realização dos seus fins estatutários.
Procurou, pois, fazer “prevalecer a substância sob a forma”, mas sem que tivesse desencadeado o procedimento próprio para o poder fazer, procedimento este que se lhe impunha observar para desconsiderar a realidade dos factos e tributar os subsídios em causa atendendo à intenção manifestada de transferir os activos construídos para uma sociedade comercial sua participada.
É certo que no Relatório não se faz menção dos pressupostos, designadamente subjectivos, de que depende a aplicação da cláusula anti-abuso prevista no artigo 38.º n.º 2 da Lei Geral Tributária, a não ser por referência às “intenções”, porquanto se pretendeu alcançar por via de mera correcção técnica fim equivalente ao decorrente de tal cláusula, mas sem os respectivos “constrangimentos” procedimentais. Sucede, contudo, que a lei processual tributária vigente ao tempo - cfr. os n.ºs 1 e 2 do artigo 63.º do CPPT, na redacção anterior à que lhe foi conferida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – determinava que: 1 - A liquidação dos tributos com base em quaisquer disposições antiabuso nos termos dos códigos e outras leis tributárias depende da abertura para o efeito de procedimento próprio. 2 - Consideram-se disposições antiabuso, para os efeitos do presente Código, quaisquer normas legais que consagrem a ineficácia perante a administração tributária de negócios ou actos jurídicos celebrados ou praticados com manifesto abuso das formas jurídicas de que resulte a eliminação ou redução dos tributos que de outro modo seriam devidos.
Impunha-se, pois, como bem decidido, desencadear procedimento tributário próprio para que a correcção pudesse ter lugar com a fundamentação que a sustenta, o que, não tendo sido observado, inquina de ilegalidade o acto de liquidação na parte afectada.
A sentença que assim decidiu não merece, pois, censura.
- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 9 de Julho de 2014. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Pedro DelgadoFonseca Carvalho.