Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:027/19.9BALSB
Data do Acordão:05/20/2020
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
REJEIÇÃO DO RECURSO
MÉRITO
Sumário:I – A decisão do Tribunal Constitucional proferida nos autos – de julgar inconstitucional, por violação da proibição de criar impostos com natureza retroactiva, estatuída no art. 103.º, n.º 3, da CRP, a norma do art. 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, no segmento em que, atribuindo carácter meramente interpretativo ao n.º 7 do art. 7.º do CIS, aditado pelo artigo 152.º da mesma Lei, determina a aplicabilidade, em anos anteriores a 2016, da norma do mesmo n.º 7, em conjugação com a alínea e) do n.º 1 do art. 7.º, do referido Código, na redacção dada pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, conducente ao sentido de que a isenção de imposto do selo não abrange as comissões de gestão cobradas pelas sociedades gestoras de fundos de pensões por elas geridos – tem força de caso julgado no processo quanto à questão da inconstitucionalidade (art. 80.º n.º 1 da LOFTC) e obsta a que este Supremo Tribunal possa reapreciar a questão em recurso para uniformização de jurisprudência, o que determina, nesta parte, a rejeição do recurso.
II - O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cfr. o n.º 2 do art. 25.º RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. o n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do art. 25.º do RJAT).
Nº Convencional:JSTA000P25915
Nº do Documento:SAP20200520027/19
Data de Entrada:03/14/2019
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.............. - SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE PENSÕES, S.A.
Votação:MAIORIA COM UM VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 667/2016-T

1. RELATÓRIO

1.1 A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que, julgando procedente o pedido de pronúncia arbitral aí apresentado pela sociedade acima identificada, tendo como objecto a legalidade de liquidações de Imposto de Selo e respectivas liquidações de juros compensatórios, decidiu: «a) Julgar procedente o pedido arbitral principal, anulando os actos de liquidação de Imposto do Selo e de juros compensatórios impugnados;//b) Julgar procedente o pedido de indemnização por garantias indevidamente prestadas».

1.2 A Recorrente apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor:

«a) Constitui objecto do presente recurso a decisão final proferida por Tribunal Arbitral colectivo em matéria tributária constituído, sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), na sequência de pedido apresentado nos termos do RJAT e que correu termos sob o n.º 667/2016-T (Documento n.º 1), e é deduzido na sequência da cessação da interrupção do prazo efectuada pela interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, cf. alegação supra e certidão do processo arbitral.

b) A Recorrida visava no seu pedido de pronúncia arbitral a declaração de ilegalidade das liquidações de Imposto de Selo e respectivas liquidações de juros compensatórios, melhor identificadas na PI, relativas ao período de tributação de 2011 a 2014, solicitando, a final, a anulação das liquidações impugnadas, e, em consequência, ser reembolsada do montante de imposto já pago e ser reconhecido o direito a juros indemnizatórios contados à taxa legal desde a data do pagamento do imposto até à data do seu integral reembolso.

c) Neste recurso para uniformização de jurisprudência, a Recorrente contesta a decisão arbitral em três questões distintas.

d) Assim, contesta, desde logo, a conclusão tirada pelo Tribunal Arbitral sobre o âmbito da isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 7.º do CIS e, em segundo lugar, sobre o carácter inovador da norma ínsita no n.º 7 do art. 7.º do CIS, uma vez que,

e) a decisão arbitral colide frontalmente com a jurisprudência firmada no âmbito do Acórdão do STA de 15-06-2016, transitado em julgado, prolatado no processo n.º 0770/15, primeiro Acórdão fundamento nos presentes autos de recurso e, bem assim, com a jurisprudência firmada no âmbito do Acórdão do STA prolatado em 29-06-2016, transitado em julgado, no âmbito do processo n.º 01630/15, segundo Acórdão fundamento nos presentes autos de recurso.

f) Sempre ressalvado o devido respeito, a Recorrente não pode conformar-se com o acórdão recorrido porquanto entende que esta decisão incorre em erro de julgamento na interpretação das normas ínsitas nos n.ºs 1, alínea e) e n.º 7 do Código do Imposto do Selo, considerando a jurisprudência supra indicada.

g) Face ao disposto no artigo 25.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo, sendo aplicável ao recurso com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

h) O recurso para uniformização de jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do CPTA tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o Supremo Tribunal Administrativo, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição.

i) In casu verifica-se uma patente e inarredável contradição quanto às mesmas questões fundamentais de direito – saber, desde logo, se a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 7.º do CIS tem como elemento catalisador a concessão de crédito, cfr. julgou o Ac. desse Supremo Tribunal no proc. 0770/15,

j) e, assim sendo, saber, em segundo lugar, se tal delimitação do âmbito da isenção (efectuada pelo n.º 7 do mesmo art. 7.º, aditado pela Lei n.º 7-A/2016) tem natureza meramente interpretativa, como qualificou o legislador (cfr. art. 153.º dessa Lei n.º 7-A/2016), e julgou esse Supremo Tribunal no proc. 01630/15.

k) No caso vertente encontram-se reunidos os requisitos para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, desde logo, identidade das situações de facto, versando sobre situações fácticas substancialmente idênticas para efeitos de contradição das soluções dadas, pois que,

l) subjacente à decisão arbitral recorrida está a consideração de que foram cobradas comissões não decorrentes da concessão de crédito (in casu, tratava-se de comissões de gestão cobradas pela sociedade gestora aos fundos de pensões que gere, sobre as quais não liquidou imposto de selo - cf. alíneas a) a h) da matéria de facto dada como provada).

m) Sendo entretanto emitidas pela AT as liquidações impugnadas, no pressuposto de que a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 7.º do CIS apenas se pode aplicar às comissões, como às garantias e aos juros (mormente as referidas alíneas da matéria de facto dada como provada), que estejam directamente ligadas à concessão de crédito, veio a aqui Recorrida, em sede de pedido de pronúncia arbitral pedir a anulação das mesmas, ao que a decisão arbitral recorrida deu procedência.

n) Nos Acórdãos fundamento prolatados nos procs. 770/15 e 1630/15, estava igualmente em causa a alegada aplicabilidade da norma de isenção identificada (em análise estavam comissões também não directamente ligadas à concessão de crédito, in casu, de mediação de seguros), tendo-se aí concluído que não merecia acolhimento a invocada aplicação da isenção a toda e qualquer comissão a se.

o) Demonstra-se, assim, que entre a decisão arbitral e estes acórdãos fundamento existe identidade de situações de facto, pois, subjacentes às decisões em confronto, estão dois casos de entidades que cobraram comissões não advindas da concessão de crédito, sendo que, em ambos os casos, pugnavam pela aplicabilidade da norma de isenção e pela existência de norma meramente interpretativa.

p) Quanto ao pressuposto da identidade da questão de direito, importa que as soluções opostas tenham sido perfilhadas relativamente ao mesmo fundamento de direito, verificando-se que, no caso, é idêntica a questão fundamental de direito apreciada quer na decisão arbitral recorrida, quer nos Acórdãos fundamento.

q) Considerou-se no acórdão fundamento prolatado no proc. 770/15, em confirmação de jurisprudência anterior, nomeadamente o seguinte:
«não se nos afigura fazer qualquer sentido estabelecer uma autonomia entre os juros, as comissões cobradas e as garantias prestadas, de um lado e a utilização do crédito concedido, por outro, sendo que, apenas relativamente a este, se poderia conexioná-lo dependentemente, das instituições de crédito e sociedades ou instituições financeiras concedentes e das sociedades ou entidades observadoras, na forma e no objecto, dos tipos de instituições de crédito e sociedades e instituições financeiras beneficiárias.
- Na realidade, afigura-se-nos incompreensível que, desde logo, o legislador se reportasse aos juros, comissões cobradas e garantias prestadas, pretendendo referir-se a realidades com existência «a se», para efeitos de isenção de imposto, o que redundaria, a ter o alcance pretendido pela recorrente, que todas e quaisquer que elas fossem, desde que reportadas a operações entre sociedade com localização observadora do, ali determinado, estariam isentas.
- Mas mais relevantemente do que isto é que se tornaria ainda mais incompreensível que assim se passassem as coisas no que concerne aos referidos juros, comissões e garantias e já no que toca à utilização do crédito se restringisse, apenas aqui, a isenção às operações financeiras celebradas entre aquelas aludidas instituições. (…).
Assim sendo, também nós consideramos que o preceito em questão se reporta, aos juros, às comissões cobradas, às garantias prestadas ou à mera utilização, em todos os casos, por reporte ao crédito concedido nos termos do estipulado no normativo em análise, tal como o considerou a sentença recorrida». (todos os destaques nossos).

r) Porém, a decisão arbitral recorrida concluiu o oposto, designadamente que:
«Assim, e conforme é referido nos acórdãos proferidos nos processos arbitrais n.º 348/2016-T, de 2 de Maio de 2017, e n.º 633/2016-T, de 19 de Maio de 2017, "a razão de ser da fusão das alíneas não tem a ver com a incorporação na nova alínea e) do n.º 1 do expressamente revogado n.º 2 do artigo 6.º mas com a uniformização dos pressupostos da isenção de imposto do selo do crédito concedido e dos juros cobrados com o das comissões cobradas em operações em que fossem exclusivamente intervenientes instituições de crédito e sociedades financeiras”.
Subscrevemos ainda os referidos acórdãos quando neles se afirma que "[a] evolução histórica do preceito aponta de forma clara que apenas na versão originária e, posteriormente, entre o período em que vigorou a redacção dada pelo artigo 37.º da Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro (que acrescentou um n.º 2 ao artigo 6.º), a isenção tinha claramente como elemento catalisador o crédito concedido nos termos mencionados em tal normativo. No que se refere em particular às comissões cobradas a isenção apenas se podia aplicar àquelas que tivessem subjacentes operações destinadas à concessão de crédito. por força da restrição introduzida no mencionado n.º 2 do artigo 6.º". […]
Face ao exposto, conclui-se que a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS não se cingia, antes da entrada em vigor da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, às operações directamente destinadas à concessão de crédito no âmbito da actividade.».

s) Para concluir que:
«Considera-se, portanto, que a Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março (LOE 2016) veio, através da interpretação conjugada dos seus artigos 152.º e 154.º, delimitar o âmbito material da isenção prevista alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, de forma inovadora e retroactiva, e, como tal, inconstitucional, por violação do princípio da proibição da retroactividade das normas fiscais, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, ínsito no princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos».

t) Ora, tal apreciação teve por base uma interpretação incorrecta das normas constantes, à data dos factos, da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, como acima se referiu, atento o acórdão fundamento citado, bem como do n.º 7 daquele artigo aditado pela Lei n.º 7-A/2016, sendo precisamente esta mesma questão apreciada pelo acórdão fundamento do STA proferido no processo n.º 01630/15, de 29.06.2016.

u) De facto, como bem se fundamenta no segundo acórdão fundamento:
«Com o Orçamento de Estado para o corrente ano de 2016, Lei n.º 7-A/2016, de 30.03, cfr. artigo 152.º, o Legislador introduziu um n.º 7 naquele artigo 7.º, esclarecendo que o disposto na alínea e) do n.º 1 apenas se aplica às garantias e operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da actividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea, atribuindo natureza interpretativa ao disposto neste novo n.º 7, cfr. artigo 153.º.
Face à dúvida interpretativa existente em torno do disposto naquele artigo 7.º, n.º 7, veio o legislador restringir a sua aplicação às garantias e operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito, excluindo, assim, expressamente, as comissões recebidas pelos Bancos a título de actividade de mediação de seguros.
E esta norma interpretativa é aplicável imediatamente às situações anteriores uma vez que não aporta um conteúdo inovador, nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil.
Na verdade, “…a razão pela qual a lei interpretativa se aplica a factos e situações anteriores reside fundamentalmente em que ela, vindo consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da LA com que os interessados podiam e deviam contar, não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas. Poderemos consequentemente dizer que são de sua natureza interpretativas aquelas leis que, sobre pontos ou questões em que as regras jurídicas aplicáveis são incertas ou o seu sentido controvertido, vem consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter adoptado [e efectivamente adoptaram no caso concreto]…”cfr. J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, pág. 246.
Não há qualquer dúvida, assim, que a concreta situação dos autos se enquadra precisamente no regime legal da Lei Interpretativa previsto no artigo 13º do Código Civil, uma vez que à Lei interpretativa não se lhe reconhece desvio no tocante à dualidade de interpretações que se fazia de tal norma, o legislador optou por uma delas, e não introduziu qualquer “novidade” no próprio texto da norma» (destaques nossos).

v) Resulta, assim, e quanto às duas primeiras questões, que na decisão recorrida e nos acórdãos fundamento, perfilharam-se soluções opostas de forma expressa sobre as mesmas questões fundamentais de direito, desde logo, saber se deve ser atribuída à norma de isenção da alínea e) do n.º 1 do art. 7.º o sentido de ser aplicável apenas às comissões, garantias e juros ligadas à concessão de crédito, conforme se julgou no acórdão fundamento tirado no proc. 770/15, e, em segundo lugar, saber se a explicitação do respectivo n.º 7 tem carácter meramente interpretativo, como julgou o acórdão fundamento prolatado no proc. 1630/15;

w) Ou se, ao contrário, a isenção deveria ser estendida a todas e quaisquer comissões e garantias com as características da norma, conforme determinou a decisão arbitral recorrida, assim isentando as comissões ali em causa, pagas pelos fundos de pensões à respectiva sociedade gestora, julgando, a final, pela procedência do pedido de anulação das liquidações.

x) A norma em causa tem carácter interpretativo, integrando-se na lei interpretada (cf. art. 13.º do Código Civil), sendo aprovada perante divergências interpretativas, indesmentíveis - sempre salvo melhor opinião - face à jurisprudência do STA ante mencionada e, bem assim, do Tribunal Central Administrativo Sul (Proc. n.º 02754/08, de 21-09-2010).

y) Pois que, considera-se que tem carácter interpretativo «a lei que sobre um ponto em que a regra de direito é incerta ou controvertida vem consagrar uma solução a que a jurisprudência, por si só, poderia ter adoptado» (Baptista Machado, in Aplicação das Leis no Tempo no Novo Código Civil, pág. 286 e segs.). Isto é, a lei nova limita-se a resolver uma incerteza ou controvérsia jurídicas, dando-lhe um entendimento que a jurisprudência, se o tivesse querido, já poderia ter adoptado. E, neste caso, adoptou, efectivamente.

z) Pois que, o raciocínio subjacente às liquidações fora avalizado já no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 02754/08, de 21-09-2010, e foi avalizado o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 0770/15, de 15/06/2016, vindo a ser acolhido expressamente pelo legislador no Orçamento de Estado para 2016.

aa) Pelo que «o Legislador introduziu um n.º 7 naquele artigo 7.º, esclarecendo que o disposto na alínea e) do n.º 1 apenas se aplica às garantias e operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da actividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea, atribuindo natureza interpretativa ao disposto neste novo n.º 7, cfr. artigo 153.º. […] E esta norma interpretativa é aplicável imediatamente às situações anteriores uma vez que não aporta um conteúdo inovador, nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil. […] Não há qualquer dúvida, assim, que a concreta situação dos autos se enquadra precisamente no regime legal da Lei Interpretativa previsto no artigo 13.º do Código Civil, uma vez que à Lei interpretativa não se lhe reconhece desvio no tocante à dualidade de interpretações que se fazia de tal norma, o legislador optou por uma delas, e não introduziu qualquer “novidade” no próprio texto da norma» (destaques nossos) - cfr. segundo acórdão fundamento.

bb) Em suma, e quanto às duas primeiras questões aqui em causa, entre a decisão recorrida e os Acórdãos fundamento existe uma patente e inarredável contradição que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida.

cc) No estrito cumprimento do n.º 2 do artigo 152.º do CPTA, as infracções imputadas à decisão recorrida consistem em manifestos erros de julgamento, expressos na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral adoptou uma interpretação das normas em questão que não respeita, nomeadamente, as directrizes dos arts. 8.º e 9.º do Código Civil.

dd) Tendo em consideração os factos considerados relevantes quanto às duas questões já apresentadas, devidamente expostos supra, é inequívoca a conclusão de que as normas aqui em análise, porque tratam do regime de um benefício fiscal (isenção) impõem particular atenção à coerência interna do sistema, nomeadamente à justificação subjacente à consagração do benefício, conforme foi decidido nos acórdãos ora invocados como fundamento.

ee) De outro modo, a isenção beneficiaria comissões e garantias como realidades a se, sem se exigir a ligação à actividade beneficiária (a concessão de crédito) que, historicamente, justificou a consagração da isenção, ademais quando, como já se expendeu em sede arbitral, o fio condutor na evolução da norma de isenção é definido: i) num primeiro momento, os juros (que pressupõem sempre a existência do crédito); ii) depois, juros e crédito de que aqueles resultem; e iii), por último, o crédito, e os juros e comissões decorrentes daquele.

ff) Na verdade, não se considera fundada a conclusão de que a alteração efectuada aquando da agregação das alíneas correspondeu a uma intenção legislativa de alargamento do âmbito da isenção, não devendo qualificar-se a eliminação do n.º 2 e renumeração dos n.ºs 3 e 4 do artigo 6.º como um acto revogatório, por não resultar manifesto que o legislador tenha querido dispor num sentido diverso do anterior.

gg) Apenas se deve considerar que a vontade do legislador não necessitava (ou, o que resulta no mesmo, assim se pressupôs) de qualquer norma que esclarecesse o seu sentido, devendo concluir-se pela inexistência de acto revogatório com um resultado muito alargador do âmbito da isenção.

hh) Ademais, deve notar-se que a decisão arbitral recorrida não logra identificar, em abono da invocada vontade legislativa de alargamento da isenção, qualquer trabalho preparatório em que tal (alegada) vontade haja sido minimamente evidenciada. Ora, a inexistência de uma qualquer externação da (alegada) intenção legislativa de alargamento da isenção, em elementos coevos à alteração, é bastante significativa.

ii) Mais cabendo destacar, face à qualificação (pacífica) dos benefícios fiscais como despesa fiscal, que havia de ter sido feita a estimativa da despesa fiscal associada a tal alargamento, cf. dispõe o n.º 3 do art. 2.º do EBF; no entanto, o acórdão recorrido falha também em indicar a evidência da estimativa da despesa fiscal inerente, comprometendo a sua conclusão sobre a (alegada) vontade legislativa de alargar o âmbito da isenção.

jj) Ora, como já se referiu, no primeiro acórdão fundamento concluiu-se doutamente que «o preceito em questão se reporta, aos juros, às comissões cobradas, às garantias prestadas ou à mera utilização, em todos os casos, por reporte ao crédito concedido nos termos do estipulado no normativo em análise» (destaque nosso).

kk) De facto, o primeiro acórdão fundamento salienta a importância de estabelecer uma interpretação fundada – nomeadamente em virtude dos elementos lógico e sistemático – do âmbito de aplicação da norma de isenção.

ll) Por outro lado, no segundo acórdão fundamento, tirado no proc. 01630/15, julgou-se fundadamente que a delimitação do âmbito da isenção efectuada pelo nº 7 do mesmo art. 7.º, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, tem natureza meramente interpretativa, visando resolver divergências interpretativas, pela eleição de um sentido que a jurisprudência tinha já acolhido antes da aprovação da norma interpretativa.

mm) Por outro lado, igualmente quanto ao segmento decisório de condenação ao pagamento de indemnização por garantia indevida se verifica a contradição sobre a mesma questão fundamental de direito na decisão recorrida e no acórdão fundamento, incorrendo em manifesto erro de julgamento, na medida em que o Tribunal Arbitral adoptou uma interpretação das normas em questão (in casu, os arts. 43.º e 53.º da LGT) que não respeita, nomeadamente, as directrizes dos arts. 8.º e 9.º do Código Civil, em contradição com a jurisprudência firmada no terceiro acórdão fundamento, no âmbito do proc. 0471/14.

nn) De facto, tanto a condenação ao pagamento de indemnização por garantia prestada para suspender a cobrança coerciva da dívida tributária que vem a ser anulada, por ilegalidade, como a atribuição do direito a juros indemnizatórios têm como pressuposto a ocorrência de erro imputável aos serviços, o que decorre do cotejo entre os arts. 43.º e 53.º da LGT, constituindo doutrina pacífica que comungam da mesma natureza ressarcitória dos danos sofridos pelo sujeito passivo em virtude da emissão de uma liquidação que vem a ser julgada ilegal por motivo imputável à Administração Fiscal – neste sentido, veja-se, v. g., o Acórdão do Pleno desse STA tirado no proc. n.º 0632/14, em 21.01.2015.

oo) Ora, o tribunal arbitral a quo simplesmente considerou que a norma, na interpretação (autêntica) dada pela LOE 2016, ofendia a proibição da retroactividade fiscal e, neste pressuposto, anulou as liquidações.

pp) Porém, concomitantemente, condenou a aqui Recorrente a pagar indemnização por garantia indevidamente prestada, desconsiderando que o erro nas liquidações, invocado pelo contribuinte, deriva exclusivamente da aplicação de uma norma que veio a ser considerada inconstitucional pelo tribunal aqui recorrido, dessa forma não fundamentando a condenação na indemnização prevista no artigo 53.º da LGT.

qq) Pois que, as liquidações anuladas na decisão recorrida foram emitidas em estrita obediência à lei, não ocorrendo qualquer erro imputável aos serviços, pelo que incorreu o douto tribunal recorrido em erro de julgamento e em contradição com a jurisprudência firmada no terceiro acórdão fundamento, no âmbito do proc. 0471/14.

rr) Neste aresto considerou-se, designadamente, o seguinte:
«Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por diversas vezes sobre questão semelhante à ora suscitada e sempre no sentido de que o para efeitos de pagamento de juros indemnizatórios ao contribuinte, não pode ser imputado aos serviços da AT erro que, por si, tenha determinado o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, quando não estava na sua disponibilidade decidir de modo diferente daquele que decidiu - cfr., para além do Acórdão 1529/14, citado pelo Exm.º Procurador-Geral Adjunto, os acórdãos de 26/2/2014, rec. n.º 0481/13; de 12/3/2014, rec. nº 01916/13; de 21/1/2015, rec. nº 0843/14; de 21/1/2015, rec. nº 0703/14, de 11.05.2016, recurso 704/14 e de 01.06.2016, recurso 1352/14, todos in www.dgsi.pt.
Com efeito, como se deixou exarado no supra citado Acórdão 481/13, em que o presente relator teve intervenção como adjunto, «…a menos que esteja em causa o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art. 18.º, n.º 1, da CRP, a AT não pode recusar-se a aplicar a norma com fundamento em inconstitucionalidade (Com interesse sobre a questão, vejam-se os pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República referidos na Colectânea dos Pareceres da Procuradoria-Geral da República, volume V, pontos 10, 3, 3.2 – respectivamente, com as epígrafes «Fiscalização da constitucionalidade», «Fiscalização sucessiva» e «(In)aplicação de norma inconstitucional (poderes e deveres da Administração Pública)» –, cuja doutrina seguimos.).
É que a Administração em geral está sujeita ao princípio da legalidade, consagrado constitucionalmente e a AT está-lo também por força do disposto no art. 55.º da LGT.
A nosso ver, a AT deverá aguardar a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, a emitir pelo Tribunal Constitucional (TC), nos termos do art. 281.º da CRP.
É que, como diz VIEIRA DE ANDRADE, «Este conflito [entre a constitucionalidade e o princípio da legalidade] não pode resolver-se através da prevalência automática do direito constitucional sobre o direito legal. Não é disso que se trata, porque o que está em causa é não a constitucionalidade da lei, mas o juízo que sobre essa constitucionalidade possam fazer os órgãos administrativos. Por um lado, a Administração não é um órgão de fiscalização da constitucionalidade; por outro lado, a submissão da Administração à lei não visa apenas a protecção dos direitos dos particulares, mas também a defesa e prossecução de interesses públicos […]. A concessão ao poder administrativo de ilimitados poderes para controlo da inconstitucionalidade das leis a aplicar levaria a uma anarquia administrativa, inverteria a relação Lei-Administração e atentaria frontalmente contra o princípio da divisão dos poderes, tal como está consagrado na nossa Constituição» (Direito Constitucional, Almedina, 1977, pág. 270.)

ss) Resulta, assim, demonstrado que na decisão recorrida e neste acórdão fundamento foi decidida a mesma questão fundamental de direito, em sentido oposto, pois que o acórdão recorrido julgou que «No caso dos autos ocorre a prática pela AT dos actos controvertidos em resultado de erro na interpretação das normas jurídicas em causa, erro esse que apenas é imputável aos respectivos serviços […]», concluindo que «assiste razão à Requerente no presente processo, esta deverá ser ressarcida dos prejuízos resultantes da prestação indevida de tal garantia», obliterando que a Administração não pode desaplicar uma norma legal, com fundamento em inconstitucionalidade, o que impede a conclusão de existir erro imputável aos serviços, pressuposto da atribuição do direito a indemnização por garantia indevida.

tt) Desta forma contradizendo a jurisprudência firmada no terceiro acórdão fundamento quanto à questão do erro imputável aos serviços:
«a Administração Tributária não poderia ter decidido de modo diferente […] quer porque não lhe assiste o direito a recusar a aplicação de norma que no seu entender poderia ser inconstitucional, porque não lhe é permitido formular um juízo sobre essa constitucionalidade.
Assim, se o contribuinte no cumprimento duma norma legal procede a uma liquidação que a lei lhe impõe e essa norma vem posteriormente a ser declarada inconstitucional todos os efeitos decorrentes de uma aplicação viciada apesar de serem obrigatoriamente anulados, o certo é que tal anulação não decorre de qualquer conduta da Administração Tributária nem de erro por si praticado que se reflectiria na esfera da Administração Tributária.
E não podendo a errada consideração (no apuramento do imposto a pagar) de uma norma posteriormente julgada inconstitucional, ser atribuída a ilegal conduta da Administração Tributária, também não pode legitimar a condenação nos juros indemnizatórios pedidos ao abrigo do artº. 43.º da LGT por se não verificar um pressuposto de facto constitutivo de tal direito – o erro imputável aos serviços» (destaques nossos).

uu) Revogando a decisão arbitral recorrida e substituindo-a por decisão que respeite a jurisprudência invocada, se garantirá a unidade do sistema jurídico e a sua coerência, sendo que, conforme dispõe o artigo 8.º do Código Civil, o julgador deve ter em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito, o que decorre da própria ideia de Justiça e está, também, subjacente à consagração do meio processual aqui em uso.

vv) Cabendo, na perspectiva da ora Recorrente, sempre ressalvado o devido respeito, corrigir os indesmentíveis erros de julgamento em que incorreu a, aliás douta, decisão aqui em análise.

ww) Mais se peticionando, nos termos legais e constitucionais supra expostos, dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça».

1.3 A Recorrida apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A. A título de questão prévia, deve o presente recurso para uniformização de jurisprudência ser rejeitado por a Recorrente sustentar o presente recurso para uniformização de jurisprudência na alegada contradição entre a decisão recorrida, por um lado, e três acórdãos fundamento, por outro.

B. Sucede que, como resulta de jurisprudência firme e unânime, a invocação de mais de dois acórdãos, um acórdão fundamento e um acórdão recorrido, é causa de rejeição imediata do recurso para uniformização de jurisprudência, o que desde já se peticiona.

C. Ainda que assim não se entenda, não deverá o presente recurso ser admitido, por inexistência dos pressupostos de identidade quanto à situação de facto e quanto à questão fundamental de direito.

D. Entende a Recorrente que a decisão recorrida se encontra em contradição com os acórdãos fundamento na medida em que considera que a isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do IS tem como elemento catalisador a concessão de crédito, tendo tal delimitação do âmbito da isenção (efectuada pelo n.º 7 do mesmo artigo 7.º, aditado pela Lei n.º 7-A/2016) natureza meramente interpretativa.

E. Salvo o devido respeito, não se verificam, in casu, os pressupostos de identidade quanto à situação de facto e quanto à questão fundamental de direito, dos quais depende a admissibilidade do recurso para uniformização jurisprudência.

F. Quanto à identidade de situações de facto, basta referir que nos dois acórdãos fundamento estavam em causa comissões por actividade de mediação de seguros (actividade não financeira), enquanto que na decisão recorrida estão em causa comissões decorrentes da gestão de comercialização de unidades de participação em fundos de pensões (actividade financeira).

G. Ora, ao passo que na decisão recorrida decidiu-se pela isenção do pagamento de IS nas comissões de gestão do Fundo de Pensões (que são operações financeiras), no acórdão fundamento tirado no processo n.º 0770/15 decidiu-se pela não aplicação da isenção nas comissões pela actividade de mediação de seguros, tendo sido demonstrado que esta actividade não recebe o enquadramento de operações financeiras (nem sequer sendo acessória a operações financeiras!).

H. Assim, existem duas realidades fácticas totalmente diferentes – consequentemente com distintos regimes normativo-fiscais aplicáveis, inclusivamente no que diz respeito à norma de incidência do imposto e da isenção prevista na alínea e) do artigo 7.º – uma respeitante à actividade das sociedades gestoras dos fundos de pensões e outra respeitante à actividade de mediação/angariação de seguros.

I. A questão identificada pela Recorrente (contradição na medida em que a isenção aqui em causa tem como elemento catalisador a concessão de crédito, tendo tal delimitação do âmbito da isenção, efectuada pelo n.º 7 do mesmo artigo 7.º, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, natureza meramente interpretativa) não constitui a questão decidenda em qualquer dos acórdãos fundamento, visto que a Recorrente pretende comparar o incomparável, ou seja, pretende comparar a actividade de mediação de seguros com a actividade desenvolvida pelas sociedades gestoras de fundos de pensões.

J. De acordo com o entendimento da Recorrente, todas as “comissões”, independentemente da sua natureza, se tornariam, afinal, idênticas, para o efeito da admissão de recursos de uniformização de jurisprudência, pelo facto de a questão jurídica ser a do âmbito de aplicação da norma de isenção.

K. Isto é, a identidade de factos deixaria de ser aferida no confronto entre as duas situações concretas, objecto dos dois acórdãos em confronto, passando a decorrer do mero facto de em ambos não estar em causa a concessão directa de crédito por instituições de crédito.

L. Sucede, porém, que o legislador não definiu a identidade das situações de facto, por exclusão das mesmas face uma terceira situação de referência, antes tendo exigido que essa identidade se verificasse, pela positiva, relativamente aos elementos de facto concretos que compõem cada uma daquelas situações e que devem ser idênticos entre si.

M. Já no que tange à suposta identidade na questão fundamental de direito, que constitui um outro pressuposto de admissibilidade do presente recurso, é manifesto que, no caso em apreço, estamos perante soluções distintas para dois litígios diferentes, enquadrados em regimes normativos diferenciados.

N. Não ocorre verdadeiramente uma interpretação divergente de um mesmo regime normativo, pelo simples facto dos acórdãos fundamento rejeitarem liminarmente a aplicação da isenção prevista na alínea e) do artigo 7.º, com base no facto de não estar aí em causa uma actividade financeira (daí que a incidência de Imposto do Selo seja efectuada pela Verba 22.2) e as entidades intervenientes não se enquadrarem sequer na incidência subjectiva dessa isenção.

O. Muito pelo contrário, a decisão arbitral recorrida versa sobre uma actividade financeira (daí que a incidência de Imposto do Selo seja efectuada pela Verba 17.3) e é logicamente necessário que as entidades intervenientes sejam forçosamente enquadradas na incidência subjectiva dessa isenção (caso contrário, também não estariam abrangidas pela norma de incidência do imposto previsto na Verba 17.3, não incidindo qualquer imposto sobre as operações em causa).

P. A discussão que é efectuada, nos acórdãos fundamento, sobre o âmbito de aplicação objectiva da isenção prevista na alínea e), no que respeita à necessidade de concessão de crédito, é meramente lateral, acessória e subsidiária, pois este Venerando Tribunal havia já concluído que, em ambos os casos, as entidades em causa não preenchiam a incidência subjectiva dessa isenção (por se tratar de uma actividade seguradora de mediação, não financeira).

Q. Adicionalmente refira-se que o TC já decidiu a questão de saber se a norma interpretativa do n.º 7 do artigo 7.º do Código do IS (introduzida pela Lei n.º 7-A/2016 de 30 de Março), quando aplicável às comissões de gestão cobradas pelas sociedades gestoras aos fundos de pensões por elas geridos, é ou não conforme com a CRP, tendo concluído pela inconstitucionalidade, por violação da proibição de criação de impostos com natureza retroactiva, da norma que determina a aplicabilidade nos anos fiscais anteriores a 2016, da norma do n.º 7, em conjugação com o artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do IS, segundo a qual a isenção objecto de tais preceitos não abrange as comissões de gestão cobradas pelas sociedades gestoras aos fundos de pensões por elas geridos.

R. Ao insistir na natureza interpretativa do disposto no n.º 7 do artigo 7.º do Código do IS, a Recorrente parece esquecer que o TC já declarou, nestes próprios autos, a inconstitucionalidade dessa interpretação, sendo tal decisão de aplicação obrigatória pelos demais tribunais judiciais, sob pena de nova inconstitucionalidade (ex vi do disposto no artigo 80º n.º 3 da LTC e dos artigos 204º e 280.º n.º 1 da CRP).

S. Acresce que a Recorrente invoca três acórdãos fundamento, mas depois não indica em que sentido deve a jurisprudência ser fixada, devendo também por esse motivo o recurso ser rejeitado.

T. Mesmo equacionando a hipótese de o recurso ser aceite (por cautela de patrocínio), o mesmo deverá improceder, pois a isenção do artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do IS não se restringia, anteriormente à entrada em vigor da Lei n.º 7-A/2016, às operações directamente destinadas à concessão de crédito no âmbito da actividade desenvolvida pelas instituições de crédito, sociedades financeiras e outras instituições financeiras, como se defende no relatório de inspecção em que a liquidação se baseou.

U. Aquela restrição – inicialmente instituída pela Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, e expressamente revogada pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro – apenas voltou a ser expressamente instituída pela Lei n.º 7-A/2016.

V. Não assiste, assim, razão à Recorrente quanto à matéria de fundo que constitui objecto do presente recurso.

W. Aplica-se a isenção do imposto às comissões cobradas pelas instituições de crédito na comercialização de unidades de participação em fundos de pensões abertos.

X. O entendimento pugnado pela Recorrida encontra suporte na mais elevada e considerada Doutrina, nomeadamente a que vem sendo pugnada por JOAQUIM SILVÉRIO MATEUS, VASCO BRANCO GUIMARÃES e VASCO VALDEZ MATIAS, e que encontra conforto, de um ponto de vista linguístico, no Parecer do Professor Doutor ANTÓNIO MANUEL DOS SANTOS AVELAR, professor auxiliar da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Y. Note-se, de resto, por ser verdade, que mesmo as posições conhecidas do STA e que constam dos Acórdãos Fundamento resultam de uma errada interpretação das palavras de J. SILVÉRIO MATEUS e L. CORVELO DE FREITAS, porquanto é claro que as citações feitas em tais acórdãos da obra destes Ilustres Autores apontam em sentido diametralmente oposto àquele que consta das conclusões alcançadas por aquele Supremo Tribunal, quando aplicado ao caso nos autos, sendo no entanto favorável ao sentido daqueles Acórdãos quando aplicado à actividade de mediação de seguros.

Z. Razão pela qual a conclusão – errónea, salvo melhor opinião – que o STA retirou nesses acórdãos fundamento, na parte aplicável aos presentes autos, é contrária aos argumentos doutrinais que o mesmo enunciou para justificar a sua posição.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve ser rejeitado o presente recurso ou negado o seu provimento».

1.4 Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que «[…] é de tomar conhecimento do recurso interposto, fixando-se jurisprudência no sentido decidido pelo C.A.A.D., e mantendo-se a atribuição de juros indemnizatórios, por ter existido no entendimento tido a respeito do art. 7.º n.º 1 al. e) do C.I.S. erro imputável aos serviços, julgando-se o recurso interposto improcedente».

1.5 Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir em conferência no Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.


* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

2.1.1 A decisão arbitral recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«a) A Requerente é uma sociedade gestora de fundos de pensões;

b) Entre os anos 2011 e 2014 (e no que releva para efeitos deste pedido de pronúncia), a Requerente cobrou, mensalmente, comissões aos fundos de pensões, como contrapartida pela prestação dos seus serviços de gestão, conforme infra discriminado:

c) Aquando da cobrança destas comissões, a Requerente não liquidou Imposto do Selo;

d) Ao abrigo das ordens de serviço n.ºs OI201500700, OI201500701, OI201500702 e OI201500703, relativas aos exercícios 2011, 2012, 2013 e 2014, respectivamente, todas de 30.03.2015, os Serviços de Inspecção Tributária efectuaram uma acção inspectiva para analisar o enquadramento fiscal das comissões de gestão cobradas pela Requerente aos fundos de pensões, nos períodos de tributação de 2011 a 2014, à luz do disposto no CIS e do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 20/86, de 13 de Fevereiro;

e) Através do Ofício n.º 045207, de 09.09.2015, foi a Requerente notificada para se pronunciar sobre o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária, no qual se propunha efectuar correcções em sede de Imposto do Selo;

f) De acordo com esse Projecto, a fundamentação das correcções advinha do exposto na Informação n.º I2014002788, da Direcção de Serviços de IMT (Informação DS IMT), e no Parecer n.º 25/2013 do Centro de Estudos Fiscais e Aduaneiros (CEF);

g) As correcções propostas pela AT em sede de Imposto do Selo ascendiam ao montante de € 1.256.034,33, assim discriminado (conforme consta do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária):

h) Após exercer o seu direito de audição prévia, a Requerente foi notificada, em 02.10.2015, do Relatório de Inspecção Tributária (Relatório), que manteve as correcções acima enunciadas;

i) Em face das correcções pugnadas pela AT no Relatório, foi a Requerente notificada das liquidações de Imposto do Selo e de juros compensatórios melhor identificadas infra:

j) Para efeitos de suspensão dos processos de execução instaurados pela Autoridade Tributária, a Requerente prestou garantias nos valores fixados pelo Chefe de Finanças Adjunto do Serviço de Finanças de Oeiras 2;

k) A Requerente, não se conformando com aquelas liquidações, apresentou a competente reclamação graciosa, no dia 24.03.2016, junto da AT;

l) Após ter sido notificada para se pronunciar acerca do projecto de decisão da reclamação graciosa, veio a Requerente a ser notificada, através do ofício n.º 037018, de 29.08.2016, do despacho, de 23.08.2016, proferido pelo Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, do qual resultou o indeferimento de tal reclamação graciosa;

m) Em tal despacho, aqueles serviços da AT mantiveram em pleno as liquidações então reclamadas;

n) Não se conformando com essa decisão nem com as liquidações subjacentes, veio a Requerente apresentar este pedido de pronúncia arbitral».

2.1.2 Dá-se aqui por reproduzida a matéria de facto constante dos acórdãos fundamento, nos termos do disposto no artigo 663.º, n.º 6, do Código de Processo Civil.


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do RJAT, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão arbitral proferido pelo CAAD em 20 de Junho de 2017, no processo n.º 667/2016-T (() Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=27&id=2790.), por alegada oposição com o decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo em três diferentes acórdãos, todos transitados em julgado, a saber, o acórdão de 29 de Junho de 2016, proferido no processo com o n.º 1630/15 (() Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b374a4e6efb2565480257fe600466138.), o acórdão 15 de Junho de 2016, proferido no processo com o n.º 770/15 (() Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/296d3c448abc891b80257fe2003b3899.) e o acórdão de 22 de Março de 2017, proferido no processo com o n.º 471/14 (() Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7bc7472dc9b233d9802580ed003eee94.), se bem interpretamos as alegações respeitantes às três seguintes questões, respectivamente (() Apesar de a Recorrente não ser inequívoca a esse propósito, sendo três as questões que alega terem sido decididas em sentido oposto à jurisprudência deste Supremo Tribunal e três os acórdãos invocados como fundamento, tendo sempre presente que constitui jurisprudência uniforme e pacífica que apenas pode ser indicado um único acórdão fundamento relativamente a cada questão em alegada oposição, assumir-se-á que cada um destes respeita a uma das questões, assumindo-se igualmente que a recorrente pretende que a jurisprudência seja uniformizada, relativamente a cada uma das questões, no sentido constante de cada um dos acórdãos fundamento que indica.): i) carácter inovador ou interpretativo da norma ínsita no n.º 7 do art. 7.º do CIS, ii) âmbito da isenção prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 7.º do Código do Imposto de Selo (CIS) e iii) obrigação do pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida.
Ou seja, a Recorrente entende que as referidas questões foram decididas pelo acórdão arbitral recorrido em sentido divergente das decisões proferidas nos referidos acórdãos fundamento.
Nos termos do n.º 2 do referido art. 25.º do RJAT, na redacção aplicável, «[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é […] susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»; dispõe o n.º 3 do mesmo artigo que a esse recurso «é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral».
Assim, o regime de interposição do recurso da decisão arbitral para o Supremo Tribunal Administrativo difere do regime do recurso previsto no art. 152.º do CPTA, na medida em que aquele tem de ser apresentado no prazo de 30 dias contado da notificação da decisão arbitral, enquanto neste o prazo se conta do trânsito em julgado do acórdão recorrido, como decorre da alínea a) do n.º 2 do referido art. 152.º (() Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág. 230.).
Já quanto ao acórdão fundamento, o recurso para uniformização de jurisprudência pressupõe o seu trânsito em julgado, como tem vindo a afirmar este Supremo Tribunal Administrativo, condição verificada no caso sub judice.
Assim, quanto à primeira questão, antes do mais, haverá que averiguar da repercussão da pronúncia do Tribunal Constitucional sobre o recurso para esse tribunal interposto pela ora Recorrente.
Quanto às demais questões, não havendo dúvidas quanto aos demais requisitos formais (legitimidade da Recorrente e tempestividade do recurso), há que averiguar se estão verificados os requisitos substanciais da admissibilidade do recurso, a saber, i) que exista contradição entre essa decisão e um acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo, relativamente à mesma questão fundamental de direito, e ii) que a orientação perfilhada pelo acórdão impugnado não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Só depois, se for caso disso, passaremos a conhecer do mérito do recurso.
Porque as questões suscitadas no presente recurso não são trazidas à apreciação do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo pela primeira vez, tendo sido já objecto de decisão em anteriores acórdãos (() Vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 5 de Junho de 2019, proferido no processo com o n.º 2014/18.5BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d8ce52a68fce6d9a80258419004d3c51;
- de 3 de Julho de 2019, proferido no processo com o n.º 1315/17.4BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3c0ea91c8021da42802584350045b107;
- de 3 de Julho de 2019, proferido no processo com o n.º 426/18.3BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b37b77e6d723eb4b8025843500309ebd;
- de 11 de Dezembro de 2019, proferido no processo com o n.º 26/19.0BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a178fb184ec4a14f802584d4004463d1.), vamos seguir de perto, quando não transcrevermos, essa jurisprudência, designadamente o texto do acórdão proferido em 11 de Dezembro de 2019, no processo n.º 26/19.0BALSB, por as conclusões de recurso serem em tudo idênticas às aí formuladas.

2.2.2 DA REPERCUSSÃO DA DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

A Recorrente, antes de recorrer da decisão arbitral para este Supremo Tribunal, dela recorreu para o Tribunal Constitucional.
Esse recurso, aliás como o que foi interposto pelo Ministério Público, foi julgado por decisão sumária, com o n.º 53/2019, proferida em 23 de Janeiro de 2019, no processo n.º 735/17 (() Disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/decsumarias/20190053.html.), no seguinte sentido: «a) Julgar inconstitucional, por violação da proibição de criar impostos com natureza retroactiva, inscrita no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, no segmento em que, atribuindo carácter meramente interpretativo ao n.º 7 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, aditado pelo artigo 152.º da mesma Lei, determina a aplicabilidade, em anos fiscais anteriores a 2016, da norma do mesmo n.º 7, em conjugação com a alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º, do referido Código, na redacção dada pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, com o sentido de que a isenção de imposto do selo não abrange as comissões de gestão cobradas pelas sociedades gestoras aos fundos de pensões por elas geridos; e, em consequência, b) Julgar improcedentes os recursos interpostos pelos recorrentes MINISTÉRIO PÚBLICO e AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA».
No entanto, a Recorrente não só não deu conta no presente recurso do sentido da decisão do Tribunal Constitucional, como também dela não retirou as consequências devidas.
A decisão do Tribunal Constitucional quanto à questão da inconstitucionalidade suscitada nos presentes autos tem força de caso julgado – cfr. os n.ºs 1 e 4 do art. 80.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LOFTC), aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro – e é obrigatória para todas as entidades públicas e privadas, incluindo, obviamente, a AT e este Supremo Tribunal.
«Por isso, interpor recurso para este STA para uniformização de jurisprudência de questão que o Tribunal Constitucional já decidiu e que adquiriu força de caso julgado nos presentes autos é uma actuação censurável (que de resto é chamada à colação nas conclusões Q. e R. das contra-alegações e conclusão da a) das alegações) o que releva o seu conhecimento pelas partes. Como pretender que este STA, conhecendo de novo a questão (que a recorrente lhe apresenta omitindo a referência à questão da inconstitucionalidade, mas que em torno desta gira necessariamente), uniformize jurisprudência em sentido contrário ao julgado pelo Tribunal Constitucional – ou seja, que diga que a norma do n.º 7 do artigo 7.º do CIS tem carácter interpretativo, como consignado no Acórdão fundamento indicado pela recorrente, quando o Tribunal Constitucional disse já, neste processo e para o caso concreto, que a atribuição de carácter interpretativo a tal norma é inconstitucional, por violação do n.º 3 do artigo 103.º n.º 3 da Constituição – é uma pretensão ilegítima, que este STA rejeita, rejeitando por isso o recurso no que à questão identificada pela recorrente como sendo “a do carácter inovador da norma do n.º 7 do artigo 7.º do CIS”».
Com essa fundamentação, que acolhemos, também aqui rejeitamos o recurso quanto à primeira questão acima identificada.

2.2.3 DOS REQUISITOS SUBSTANCIAIS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Quanto às demais questões suscitadas, passando a apreciar os requisitos substanciais da admissibilidade do recurso, vamos limitar-nos a transcrever os trechos relevantes do acórdão que vimos citando:

2.2.3.1 «Por Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA do passado dia 5 de Junho, proferido no processo n.º 2014/18.5 BALSB, foi decidido, por unanimidade, não haver contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre uma decisão arbitral que julgou que as comissões de gestão cobradas pela gestora de fundos de pensões aos fundos que administra estavam, em 2013, isentas de imposto do selo, ex vi da alínea e) do artigo 7.º do CIS, e o Acórdão deste STA proferido no processo n.º 770/15 – o mesmo Acórdão indicado como fundamento nos presentes autos quanto à primeira questão – que decidiu que não estavam isentas de Imposto do Selo ao abrigo da referida norma legal as “comissões cobradas pela impugnante Banco por serviços de mediação de seguros a Seguradoras”.
Nos presentes autos estão também em causa comissões cobradas por uma Sociedade Gestora de Fundos de Pensões aos fundos que administra nos anos de 2011 a 2014, sobre os quais não liquidou Imposto do Selo no entendimento de que tal imposto não era devido em razão da isenção prevista na alínea e) do artigo 7.º do CIS, entendimento este que a inspecção tributária rejeitou e está na origem das liquidações adicionais sindicadas – cfr. o probatório fixado do acórdão arbitral recorrido, pelo que o que naquele Acórdão do Pleno se decidiu quanto à inexistência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito é inteiramente transponível para os presentes autos, remetendo-se para o ali decidido no que à motivação da decisão respeita.
Na verdade, esta posição assumida pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal é uma posição uniforme que se vem repetindo ao longo do tempo nos seguintes acórdãos, entre outros, recurso n.º 01315/17.4BALSB, de 03-07-2019, recurso n.º 0426/18.3BALSB, de 03-07-2019. Assim, não haverá que admitir este recurso ao abrigo do disposto no artigo 152.º, n.º 3 do CPTA».

2.2.3.2 «Por outro lado, e no que toca à questão respeitante à indemnização por prestação de garantia indevida, também não há qualquer contradição com o acórdão invocado para fundar essa contradição uma vez que ali se tratava de condenação em juros indemnizatórios. De resto, face à argumentação usada pela recorrente, em confronto com o disposto no artigo 43.º, n.º 3, al. d) da LGT (na redacção de 2019), sempre seria devida a referida indemnização, pelo que, não ocorre a necessária contradição entre a decisão arbitral e o acórdão fundamento.
Não haverá, pois, que conhecer do mérito do recurso».

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões, decalcadas do sumário doutrinal do acórdão de 3 de Julho de 2019, proferido no processo com o n.º 426/18.3BALSB:

I - A decisão do Tribunal Constitucional proferida nos autos – de julgar inconstitucional, por violação da proibição de criar impostos com natureza retroactiva, estatuída no art. 103.º, n.º 3, da CRP, a norma do art. 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, no segmento em que, atribuindo carácter meramente interpretativo ao n.º 7 do art. 7.º do CIS, aditado pelo artigo 152.º da mesma Lei, determina a aplicabilidade, em anos anteriores a 2016, da norma do mesmo n.º 7, em conjugação com a alínea e) do n.º 1 do art. 7.º, do referido Código, na redacção dada pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, conducente ao sentido de que a isenção de imposto do selo não abrange as comissões de gestão cobradas pelas sociedades gestoras de fundos de pensões por elas geridos – tem força de caso julgado no processo quanto à questão da inconstitucionalidade (art. 80.º n.º 1 da LOFTC) e obsta a que este Supremo Tribunal possa reapreciar a questão em recurso para uniformização de jurisprudência, o que determina, nesta parte, a rejeição do recurso.

II - O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cfr. o n.º 2 do art. 25.º RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. o n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do art. 25.º do RJAT).


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3. DECISÃO

Pelo exposto, os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em:

- rejeitar o recurso, quanto à primeira questão, atento o decidido pelo Tribunal Constitucional na sua decisão sumária com o n.º 53/2019, proferida em 23 de Janeiro de 2019, no processo n.º 735/17; e

- não tomar conhecimento do mérito do recurso, quanto à segunda e terceira questões, pela não verificação dos respectivos pressupostos substantivos.

Custas pela Recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, como peticionado e ex vi do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, atenta a rejeição parcial do recurso e o seu carácter remissivo.

Comunique-se ao CAAD.

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Lisboa, 20 de Maio de 2020. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – José Gomes Correia – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (Vencido, quanto à decisão de dispensa total do remanescente da taxa de justiça, em coerência com o sucedido no acórdão de 11.12.2019 (processo n.º 26/19.0BALSB), remetido neste] – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Isabel Cristina Mota Marques da Silva.