Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02143/17.2BEBRG
Data do Acordão:07/01/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO
NULIDADE INSUPRÍVEL
RGIT
Sumário:I - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “descrição sumária dos factos” [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do RGIT] tem de ser interpretado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê e pune a infracção imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão de aplicação da coima não são senão os factos essenciais que integram o tipo de ilícito em causa.
II - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “indicação dos elementos que contribuíram para a […] fixação” da coima [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea c), do RGIT] deve ter-se por cumprido se, embora de forma sintética e padronizada, refere os elementos que contribuíram para a fixação da coima e se a coima única aplicada às várias infracções praticadas foi fixada no seu limite mínimo.
III - Do mesmo modo, não há que relevar como nulidade insuprível da decisão administrativa de aplicação da coima [cfr. arts. 63.º, n.º 1, alínea d) e 79.º, n.º 1, alínea c), do RGIT], por insusceptibilidade de contender com o direito de defesa do arguido, atenta a fixação da coima única no mínimo legal, o facto de se não ter indicado as coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções e as circunstâncias ponderadas na respectiva fixação.
Nº Convencional:JSTA000P26157
Nº do Documento:SA22020070102143/17
Data de Entrada:01/31/2020
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de recurso judicial da decisão de aplicação da coima com o n.º 2143/17.2BEBRG

1 RELATÓRIO

1.1 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que aquele Tribunal, julgando procedente o recurso judicial interposto pela sociedade acima identificada, anulou a decisão administrativa que lhe aplicou uma coima por considerar que a mesma enferma de nulidade insuprível nos termos do art. 63.º, n.ºs 1, alínea d) e 3, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), por violação do disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 79.º do mesmo Regime.

1.2 Apresentou para o efeito alegações, com o seguinte quadro conclusivo:

«I- O presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida no processo supra referenciado, que julgou verificada uma nulidade insuprível dos processos de contra-ordenação tributária em crise, por força do disposto no artigo 63.º, n.º 1, alínea d), do Regime Geral das Infracções Tributárias [RGIT], determinando a anulação dos termos subsequentes do processo, de acordo com o n.º 3 do mencionado artigo, bem como que, após trânsito, os autos baixem à Autoridade Tributária que aplicou as coimas para eventual sanação daquela nulidade e renovação dos actos sancionatórios.

II- Douta sentença que, a nosso ver, e salvo o devido e muito respeito que nos merece, padece de erro de julgamento em matéria de direito.

III- A questão que se coloca em sede do presente recurso prende-se, tão só, em matéria de direito, com a interpretação do disposto no artigo 63.º, n.º 1, alínea d), do RGIT, conjugado com o artigo 79.º, n.º 1, alínea b) do referido diploma legal – que prevê que a decisão que aplica a coima deve conter a “descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas”.

IV- Tomaremos como exemplo da descrição sumária dos factos que figura nas decisões de aplicação de coima proferidas pelo Chefe do Serviço de Finanças de Viana do Castelo, nos processos de contra-ordenação em causa, a que consta da decisão proferida no processo de contra-ordenação fiscal n.º 23482017060000049834, que consubstancia a primeira infracção e que consiste na identificação do imposto/tributo em causa, da data/hora da infracção, do local da infracção, da entrada e saída [da infra-estrutura rodoviária em causa], da identificação da viatura e do montante da taxa de portagem, nos termos que, de seguida, se transcrevem [cfr. ponto 2) do probatório]:
Ao(À) arguido(a) foi levantado Auto de Notícia pelos seguintes factos: 1. Imposto/Tributo: Taxa de portagem; 2. Data/hora da infracção: 2012-06-01 06.28; 3. Local da infracção: A28 – AENL – Auto - Estradas Norte Litoral – Soc. Concessionária AENL, S.A; 4. Entrada: Esposende N-S Saída: Angeiras N-S 5. Identificação da viatura: ………./SCANIA/4; 6. Montante da taxa de portagem: 8,80;
[…]
os quais se dão como provados”.

V- A referida factualidade preenche o requisito legal previsto no artigo 79.º, n.º 1, alínea b), do RGIT, pois contém uma explicitação clara e suficiente dos factos que se imputam à arguida, sendo facilmente por esta perceptíveis.

VI- A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sobre esta matéria tem sido no sentido de que “I - A «descrição sumária dos factos» prevista no art. 79.º, n.º 1, alínea b), do RGIT, como requisito da decisão administrativa de aplicação de coima não consiste na «[a] enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal», referida no art. 374.º, n.º 2, do C.P.P. para as sentenças proferidas em processo criminal. II - O que exige aquela alínea b) do n.º 1 do art. 79.º, interpretada à luz das garantias do direito de defesa, constitucionalmente assegurado (art. 32.º, n.º 10, da CRP) é que a descrição factual que consta da decisão de aplicação de coima seja suficiente para permitir ao arguido aperceber-se dos factos que lhe são imputados e poder, com base nessa percepção, defender-se adequadamente. (…)”. [cfr. acórdão do STA, de 2006-03-29, proferido no processo n.º 143/2006; cfr. ainda o acórdão do STA de 2007-06-27, proferido no processo n.º 0353/07, cfr. ainda acórdão do STA de 2018-10-17, proferido no processo n.º 01004/17.0BEPRT, disponíveis em www.dgsi.pt].

VII- No caso em apreço existe uma descrição sumária dos factos que permite à arguida perceber claramente que não pagou as taxas de portagem devidas pela transposição de um local de detecção de veículos numa concreta infra-estrutura rodoviária, a qual se encontra devidamente identificada na decisão, com a indicação do local e da entrada e saída da referida infra-estrutura, além da matrícula do veículo, assim como o valor da taxa e o período a que respeita, com menção do dia e hora da sua ocorrência.

VIII- A descrição sumária dos factos é complementada, nas decisões de aplicação da coima em causa, pela indicação da norma infringida – artigo 5.º, n.º 2, da Lei n.º 25/06, de 30/06 – e da norma punitiva – artigo 7.º da Lei n.º 25/06, de 30/06 – e menção de que se trata de “Falta de pagamento de taxa de portagem” com referência a cada facto em concreto, mencionando não só a coima fixada, como também a matrícula do veículo, data da infracção e o período de tributação.

IX- De referir, que não foi posta em causa pela arguida, em sede de recurso das decisões de aplicação de coimas, a propriedade do veículo utilizado na prática das infracções ou a sua responsabilidade pelo pagamento das taxas.

X- Tratando-se a arguida de uma empresa cuja actividade consiste exclusivamente no transporte rodoviário de mercadorias, com sede no concelho que é atravessado pela infra-estrutura rodoviária designada de A28 – Auto-Estradas Norte Litoral, onde se verificaram as infracções em questão, parece-nos inegável o seu conhecimento quanto às obrigações de pagamento das taxas de portagem devidas pela transposição do local de detecção de veículos, na referida infra-estrutura rodoviária que apenas dispunha de sistema de cobrança electrónica de portagens, e que, assim não procedendo, incorria em infracção tributária punida por lei.

XI- Concludentemente, deverá a douta sentença recorrida ser revogada, e substituída por outra decisão que mantenha a condenação da arguida nos termos constantes das decisões de aplicação da coima em causa, com as respectivas consequências legais».

1.2 O recurso foi admitido e não foram apresentadas contra-alegações.

1.3 O Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, não porque se verifique a nulidade da decisão administrativa de aplicação da coima por falta de descrição sumária dos factos, mas porque as decisões administrativas enfermam de nulidade por falta de especificação e discriminação das coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções imputadas à Arguida, omissão que considerou integrar a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 63.º, com referência à alínea c) do n.º 1 do art. 79.º, ambos do RGIT. Isto, com a seguinte fundamentação:

«A questão que vem suscitada no recurso é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao dar como verificada a nulidade insuprível da decisão de aplicação de coima, por falta de descrição sumária dos factos imputados à arguida e de enunciação dos elementos considerados na fixação das coimas, nos termos do artigo 79.º, n.º1, alíneas b) e c) do RGIT, em conjugação com o disposto no artigo 63.º, n.º 1, alínea d), do RGIT.
A questão que agora vem suscitada pela Fazenda Pública tem-se repetido amiúde e contende com uma deficiente padronização das decisões de aplicação de coima proferidas pela Administração Tributária e uma ligeireza (ou mesmo inexistência) na apreciação jurídica dos factos1. E a questão jurídica que se coloca não é tanto de ordem geral e abstracta (tanto o tribunal “a quo” como a Recorrente invocam os mesmos princípios doutrinais para fundamentar entendimentos diversos), mas antes contende com a aplicação desses princípios às especificidades de cada caso concreto.
Ora, neste aspecto a jurisprudência do STA tem adoptado um entendimento suficientemente elástico que permite compatibilizar a necessária resposta ao fenómeno de massificação deste tipo de infracção e o direito de defesa dos arguidos, ou seja, e parafraseando Jorge Lopes de Sousa 2 [2 RGIT Anotado, em anotação ao art. 79.º do RGIT], que “a descrição factual que consta da decisão de aplicação de coima seja suficiente para permitir ao arguido aperceber-se dos factos que lhe são imputados e poder, com base nessa percepção, defender-se adequadamente”.
No caso concreto está em causa a imputação à arguida de infracções, p. e p., pelos artigos 5.º, n.º 2, e 7.º da Lei nº 25/2006, de 30 de Junho. Nos termos dos citados normativos configura infracção o não pagamento de taxas de portagem resultante da transposição, numa infra-estrutura rodoviária que apenas disponha de um sistema de cobrança electrónica de portagens, de um local de detecção de veículos sem que o agente proceda ao pagamento da taxa devida nos termos legalmente estabelecidos, a qual é punível com coima de valor mínimo correspondente a 7,5 vezes o valor da respectiva taxa de portagem.
Dispõe por sua vez o artigo 10.º do mesmo diploma legal que nos casos em que não é identificado o condutor da viatura (seja presencialmente ou na sequência da notificação do titular do documento de identificação do veículo) é responsável pelo pagamento das coimas a aplicar o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário, o locatário ou o detentor do veículo.
Ora, atento o teor das decisões de aplicação de coima constata-se que na parte relativa à descrição sumária dos factos a entidade administrativa indicou os elementos da identificação da infra-estrutura rodoviária e da viatura, período e percurso da passagem e respectiva taxa de portagem devida.
E na parte das normas sancionadoras fez-se referência aos artigos 5.º, n.º 2, e 7.º da Lei n.º 25/02, de 30 de Junho, concluindo-se pela responsabilidade da arguida à luz do disposto no artigo 10.º da mesma lei.
Quanto aos elementos considerados na fixação das coimas atendeu-se à frequência da conduta, à situação económica “baixa” e à negligência simples, aplicando-se, em cúmulo material, as coimas no valor de € 7.703,41 de € 11.070,77 euros, respectivamente, em cada um dos processos.
A questão que se coloca consiste em saber se esses elementos são bastantes para preencher os requisitos da “descrição sumária dos factos” e da fixação da coima.
Ora, embora todas as considerações feitas pelo Mmo. Juiz [do Tribunal] “a quo” na decisão recorrida mereçam a nossa adesão, em termos do que deveria constituir um bom exemplo de decisão de aplicação de coima, afigura-se-nos contudo que a decisão sindicada mesmo assim satisfaz os requisitos mínimos e possibilita à arguida o exercício cabal do seu direito à defesa.
De facto da decisão de aplicação da coima resulta com mediana clareza que as infracções imputadas à arguida têm subjacente o facto de não terem sido pagas as taxas de portagem de utilização de infra-estruturas rodoviárias e em que foram utilizadas determinadas viaturas nas mesmas identificadas, factualidade esta que preenche os elementos típicos da contra-ordenação prevista no n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 25/2006.
É certo que não consta expressamente das decisões administrativas a que título a arguida é responsabilizada pelas infracções, mas também é certo que nada sendo dito em contrário tal responsabilidade é do titular do documento de identificação das viaturas envolvidas e que a lei presume circularem sob a sua direcção efectiva. Ou seja, uma vez que constitui condição de punibilidade das infracções em causa a falta de pagamento das taxas de portagem no prazo assinalado na lei, e sendo notificado o dono do veículo para efectuar esse pagamento ou identificar outro responsável pelo seu pagamento (artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 25/2006), caso nada diga assume ele essa responsabilidade, sendo o auto de notícia levantado contra o mesmo. Atento o referido procedimento e presunção legal sobre a direcção efectiva do veículo, e não tendo tal condição sido questionada pela arguida aquando da sua notificação para o exercício do direito de defesa, a falta de especificação na decisão de aplicação da coima de outros elementos caracterizadores da autoria da infracção não inquina de nulidade essa mesma decisão (pois não cria qualquer grau de incerteza sobre a imputação da autoria à pessoa da arguida).
Já quanto à fixação da medida parcelar de cada coima compreendida no cúmulo material, pese embora conste no processo uma demonstração do seu apuramento, não consta da decisão de aplicação de coima quaisquer elementos atinentes a essa demonstração, mas apenas o valor fixado, nem se alcança dos autos que esses elementos tenham sido comunicados à arguida (uma vez que não é perceptível que os mesmos tenham acompanhado a notificação efectuada ao abrigo do artigo 70.º do RGIT). Por outro lado e aparentemente (com base no cálculo dos valores mínimos) no seu cálculo foi considerado o disposto no n.º 4 do artigo 26.º do RGIT, o que não resulta de qualquer elemento das decisões de aplicação da coima, que se referem apenas a este preceito para concluir que foram respeitados os limites máximos ali previstos 3 [3 Sendo certo que é duvidoso que se aplique o disposto no n.º 4 do artigo 26.º do RGIT, motivo pelo qual o arguido precisa de saber, para efeitos de exercício do seu direito de defesa, que essa disposição legal de agravamento da coima, no caso das pessoas colectivas, foi aplicada], no cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 25/2006.
Assim e sem prejuízo da aplicação, em concurso e cúmulo material, de uma coima única, impõe-se a especificação e discriminação das coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções imputadas à arguida, com a menção da moldura mínima e máxima, uma vez que esta é de montante variável e calculada em razão do valor das taxas de portagem correspondentes às utilizações das infra-estruturas rodoviárias feitas em períodos diários por cada veículo interveniente (n.º 4 e 5 do artigo 7.º da Lei n.º 25/2006), e não ser por esse motivo de fácil apreensão.
Em face do exposto afigura-se-nos que se mostra essencial que na fixação de cada coima parcelar a decisão administrativa contenha elementos suficientes que permitam à arguida perceber como foi determinada a coima, uma vez que no caso concreto, ainda que a mesma corresponda ao limite mínimo, há necessidade de ter em consideração diversas variáveis no seu cálculo. E no caso das decisões de aplicação de coima objecto de recurso para o tribunal tributária tal não ocorre, o que conflitua com o exercício efectivo do direito de defesa da arguida.
Afigura-se-nos, assim, que essa omissão configura a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º, com referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 79.º, ambos do RGIT, motivo pelo qual se impõe a confirmação da decisão recorrida, ainda que com outra fundamentação».

1.4 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade:

«1. Contra a arguida foi levantado auto de notícia por 69 infracções de falta de pagamento de taxas de portagem, que determinou a instauração do processo de contra-ordenação n.º 23482017060000049834 – cfr. documento de fls. 78-156 do SITAF, cujo teor de dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

2. Em 28/06/2017 foi proferida, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Viana do Castelo, a decisão no processo de contra-ordenação n.º 23482017060000049834, da qual consta, entre o mais, o seguinte – cfr. documento de fls. 78-156 do SITAF:
“(…)
[omissis]

3. Contra a arguida foi levantado auto de notícia por 95 infracções de falta de pagamento de taxas de portagem, que determinou a instauração do processo de contra-ordenação n.º 23482017060000053319 – cfr. documento de fls. 78-156 do SITAF, cujo teor de dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

4. Em 28/06/2017 foi proferida, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Viana do Castelo, a decisão no processo de contra-ordenação n.º 23482017060000053319, da qual consta, entre o mais, o seguinte – cfr. documento de fls. 78-156 do SITAF:
[omissis]».


*

2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

O Chefe do Serviço de Finanças de Viana do Castelo aplicou à Arguida e ora Recorrida duas coimas únicas de € 7.703,41 e de € 11.070,77 pela prática de sessenta e nove mais noventa e cinco infracções, respectivamente, todas previstas no art. 5.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, e punidas pelo art. 7.º da mesma Lei.
A Arguida impugnou judicialmente essas decisões administrativas de aplicação da coima, ao abrigo do disposto no art. 80.º do RGIT, com diversos fundamentos, dando origem aos processos n.ºs 2143/17.2BEBRG e 2146/17.2BEBRG, que se encontram apensados.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, apreciando a invocada nulidade da decisão de aplicação da coima, prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 63.º do RGIT, deu-a por verificada, por entender que esta não respeita a exigência da descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas, imposta pela alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do mesmo RGIT.
Em síntese, ficou dito na sentença recorrida que «a norma punitiva – artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/2006, exige como elementos constitutivos do tipo, que a omissão de pagamento seja resultante:
§ a transposição de um local de detecção de veículos;
§ numa infra-estrutura rodoviária que apenas disponha de sistema de cobrança electrónica de portagens;
§ o não pagamento da respectiva taxa de portagem, sem que o infractor proceda ao pagamento da taxa devida nos termos legalmente estabelecidos, factualidade que é omitida em absoluto nas decisões condenatórias».
Mais ficou aí dito que, «considerando os referidos elementos constitutivos do tipo e comparando-os com os factos descritos nas decisões recorridas verificamos, em primeiro lugar, que não é claro que a transposição ocorrida tenha sucedido numa via reservada a um sistema electrónico de cobrança de portagens e que, em segundo lugar, nada é dito de factualmente relevante quanto à circunstância de a arguida não ter pago a taxa devida nos termos da lei.
Ora, para se concluir que a arguida não pagou as taxas que eram devidas, teria que se considerar na factualidade que havia sido ultrapassado o prazo para pagamento voluntário previsto no artigo 17.º da Portaria nº 314-B/2010 (aqui designado por «pós-pagamento») e que haviam sido previamente seguidos os trâmites e notificações previstas no artigo 10.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho. Só assim, se cumpriria o requisito da necessária descrição dos factos subsumíveis às infracções apontadas à arguida.
E, em parte alguma das decisões impugnadas consta a referência à realização da notificação levada a cabo, nos termos e para os efeitos do artigo 10.º, n.º 1 e 2, da Lei n.º 25/2006.
Assim, sendo este facto essencial para a responsabilização da arguida, tem o mesmo que constar da decisão, ficando a arguida com a possibilidade de o escrutinar, querendo, o que não se verificou nas decisões em crise.
[…]
Ora, no caso dos autos, as decisões não contêm todos os factos que integrem e sustentem as contra-ordenações imputadas à arguida, ou seja, todos os elementos constitutivos do tipo contra-ordenacional em causa, sendo, por isso, insuficiente para sustentar a imputação do mesmo à arguida.
Por outro lado, a mera remissão para aqueles factos por via da invocação da norma “infringida” e da norma “punitiva” não é apta a garantir a verificação do elemento essencial consubstanciado na “descrição sumária dos factos”, seja porque tal não se traduz numa efectiva descrição factual, seja porque, onerando o destinatário da decisão, lhe impõe o acesso aos diplomas legais invocados para, por via indirecta, se aperceber da factualidade que lhe é imputada, o que é, em abstracto, passível de constituir uma limitação à respectiva defesa.
Concluímos, assim, que a decisão de fixação de coima viola o disposto no artigo 79.º, n.º 1, alínea b) do RGIT, na parte em que impõe que a decisão contenha “a descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas”, consubstanciando a nulidade insuprível consagrada no mencionado artigo 63.º, n.º 1 alínea d) do RGIT».
Ou seja, a sentença anulou as decisões administrativas de aplicação de coima por considerar que as mesmas enfermam da nulidade prevista no art. 63.º, n.º 1, alínea d), do RGIT, na medida em que não cumprem o requisito legal previsto na alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT, motivo por que deixou por conhecer os demais fundamentos invocados pela Recorrente na petição inicial.
O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga recorreu da sentença. Considerou, em síntese e louvando-se em jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (A Recorrente invoca os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 29 de Março de 2006, proferido no processo n.º 143/2006;
- de 27 de Junho de 2007, proferido no processo n.º 353/07;
- de 17 de Outubro de 2018, proferido no processo n.º 1004/17.0BEPRT.), que não se verifica a nulidade da decisão de aplicação de coima, que cumpre suficientemente com os requisitos legais previstos no art. 79.º do RGIT, designadamente os que se referem à descrição sumária dos factos que integram a infracção – que a Arguida deu mostras de ter compreendido perfeitamente, como resulta da leitura da petição de recurso judicial daquela decisão, não havendo dúvida quanto à conduta que foi sancionada – e, por isso, que não ficou comprometido, em medida alguma, o direito de defesa que a observância daqueles requisitos visa assegurar.
Assim, a questão a dirimir é a de saber se a sentença fez correcto julgamento ao anular a decisão administrativa de aplicação da coima pela nulidade insuprível prevista no art. 63.º, n.ºs 1, alínea d) e 3, do RGIT («falta dos requisitos legais da decisão de aplicação das coimas», a determinar «a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente»), por violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do mesmo Regime por desrespeito da exigência da «descrição sumária dos factos».
O Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal suscita também a questão da nulidade da decisão administrativa por falta de especificação e discriminação das coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções imputadas à Arguida, tudo nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 63.º, com referência à alínea c) do n.º 1 do art. 79.º, ambos do RGIT, sendo, aliás, com base nessa nulidade que considera dever manter-se a sentença recorrida, ainda que por fundamentação diversa.

2.2.2 DA NULIDADE DA DECISÃO DE APLICAÇÃO DA COIMA

2.2.2.1 DA DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS

A «descrição sumária dos factos» imposta pela alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT e, bem assim, os demais requisitos da decisão de aplicação da coima enumerados nesse número «devem ser entendidos como visando assegurar ao arguido a possibilidade de exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão» (JORGE LOPES DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2010, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 79.º, pág. 517. ). Por isso, essas exigências «deverão considerar-se satisfeitas quando as indicações contidas na decisão sejam suficientes para permitir ao arguido o exercício desses direitos» (Ibidem.), assim assegurando o direito de defesa ao arguido [cfr. art. 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa].
Quanto à descrição sumária dos factos na decisão administrativa, disse GERMANO MARQUES DA SILVA, em intervenção no Centro de Estudos Judiciários: «em resposta à questão de «qual o limite para a descrição sumária dos factos enquanto garantia de defesa» a minha resposta é também sumária: deve descrever o facto nos seus elementos essenciais para que o destinatário possa saber o que lhe é imputado e de que é que tem de se defender sem necessidade de consultar outros elementos em posse da administração» (Cfr. Contra-ordenações Tributárias 2016 [Em linha], Centro de Estudos Judiciários, 2016, pág. 20, disponível em http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/Administrativo_fiscal/eb_contraordenacoes_t_2016.pdf.).
A sentença considerou que as decisões administrativas que aplicaram as referidas coimas únicas não respeitaram a exigência quanto à descrição sumária dos factos, uma vez que nesta o Chefe do Serviço de Finanças Viana do Castelo se teria limitado a afirmar a «falta de pagamento da taxa de portagem», quando a norma que nela se considerou infringida – a alínea b) do n.º 1 do art. 5.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Julho – não se basta com essa falta de pagamento, uma vez que constitui ainda elemento integrante do tipo de ilícito contra-ordenacional aí previsto a «a transposição de um local de detecção de veículos», ocorrida «numa infra-estrutura rodoviária que apenas disponha de sistema de cobrança electrónica de portagens», bem assim como «o não pagamento da respectiva taxa de portagem, sem que o infractor proceda ao pagamento da taxa devida nos termos legalmente estabelecidos».
Salvo o devido respeito, bastando-se a lei como uma descrição sumária dos factos, afigura-se-nos que esta exigência se há-de considerar satisfeita quando, como no caso sub judice, o elemento essencial do tipo – a falta de pagamento da taxa de portagem pela circulação de veículo automóvel em infra-estruturas rodoviárias, designadamente auto-estradas e pontes – está descrito na decisão administrativa; e está, não apenas por referência à norma que prevê a contra-ordenação, o que não seria suficiente, mas mediante a descrição detalhada do comportamento: falta de pagamento de taxas de portagem referente ao veículo identificado pela respectiva matrícula e com referência aos trajectos expressamente indicados, com indicação dos locais, datas e horas a que se verificaram as infracções e aos montantes das respectivas taxas.
É certo que a “Falta de pagamento da taxa de portagem” não está referida na parte da decisão administrativa que tem como epígrafe “Descrição Sumária dos Factos”, mas na parte intitulada “Normas Infringidas e Punitivas”, sob a indicação das dessas normas. Mas essa menção, apesar de fora do lugar adequado na decisão administrativa condenatória, constitui uma efectiva descrição da factualidade que integra o tipo contra-ordenacional (Vide o comentário de JORGE LOPES DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS, ob. cit, na nota de rodapé com o n.º 153, pág. 425, a propósito de uma situação paralela, objecto do acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Junho de 2007, proferido no processo n.º 353/07, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0633394c326a59e6802573150037201b.) e, conjugada com a demais, aduzida no lugar próprio, não deixa à Arguida qualquer dúvida sobre a factualidade que lhe foi imputada. Essa factualidade, conjugada com a indicação das normas que prevêem e punem a infracção, permite à Arguida exercer plenamente o seu direito de defesa relativamente à decisão de aplicação da coima.
Como, lapidarmente, ficou dito no acórdão de 7 de Outubro de 2015 desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 218/15, «O requisito da decisão administrativa de aplicação da coima “descrição sumária dos factos”, constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º, do RGIT, há-de interpretar-se em correlação necessária com o tipo legal de infracção no qual se prevê e pune a contra-ordenação imputada à arguida, pois que os factos que importa descrever, embora sumariamente, na decisão de aplicação da coima não são outros senão os factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal punitiva aplicada» (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/307ae8d6f83e653780257ed9003d5b80.).
O ilícito em causa é a falta de pagamento da taxa de portagem e os comportamentos imputados à Arguida, descritos com o pormenor acima referido (designadamente, referindo expressamente a falta de pagamento de taxas de portagem, o veículo a que se reportam essas taxas e os trajectos em causa, com indicação dos locais, datas e horas a que se verificaram as infracções e os montantes das respectivas taxas), preenchem o tipo legal, permitindo à Arguida entender claramente os factos que lhe são imputados.
A norma em apreço – art. 5.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho – tutela o pagamento da taxa de portagem, sendo indiferente o modo como o não pagamento se concretizou, que também não releva quanto à coima aplicável ou à respectiva medida (cfr. art. 7.º da mesma Lei). É certo que no referido art. 5.º se descrevem, nos seus n.ºs 1, alíneas a) e b), e 2, os diversos modos como pode concretizar-se essa falta de pagamento, uma vez que esta, em razão da diversidade de modos de pagamento, pode resultar de uma multiplicidade de circunstâncias. Mas essas circunstâncias não constituem elementos essenciais do tipo, pois se destinam apenas a concretizar um e o mesmo ilícito, qual seja a falta de pagamento da portagem. Por isso, não se exige a menção às mesmas na “descrição sumária dos factos” requerida pela primeira parte da alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT.
De igual modo, entendemos que não se exige na “descrição sumária dos factos” referência à notificação a que alude o art. 10.º da Lei n.º 25/2016, que, manifestamente, não integra a factualidade requerida para a verificação do tipo contra-ordenacional em causa.
Se, porventura, essa notificação não foi efectuada ou se não foi respeitada a indicação efectuada pelo titular do documento de identificação do veículo, a Arguida, que é a destinatária dessa notificação, não teria mais do que invocar essa omissão ou desrespeito para questionar a responsabilidade pela contra-ordenação, possibilidade que não depende de essa notificação ser mencionada na decisão administrativa condenatória.
Note-se, para além disso, que a Arguida não questionou essa notificação, designadamente a omissão da mesma, o que poderia ter feito na defesa a apresentar ao abrigo do art. 70.º do RGIT, motivo por que não vemos que a decisão administrativa que aplicou a coima houvesse de se lhe referir.
Em suma, a descrição sumária da factualidade constante da decisão administrativa que aplicou a coima permite à Arguida o exercício cabal do seu direito de defesa, não subsistindo dúvida alguma quanto aos factos que lhe são imputados e ao motivo por que lhe é imputada a responsabilidade contra-ordenacional, motivo por que não concordamos com a sentença quando considera que essa decisão enferma de nulidade por inobservância do requisito constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do art. 79.º, do RGIT.

2.2.2.2 DA FALTA DE ESPECIFICAÇÃO E DISCRIMINAÇÃO DAS COIMAS PARCELARES APLICADAS A CADA UMA DAS INFRACÇÕES IMPUTADAS À ARGUIDA

O Procurador-Geral-Adjunto junto deste Supremo Tribunal arguiu também a nulidade das decisões administrativas por nelas não se terem discriminado as coimas parcelares, ou seja, a coima que caberia a cada uma das infracções se não houvesse de proceder-se ao cúmulo, bem assim como por não se ter indicado a moldura mínima e máxima que caberia a cada uma delas e a ponderação dos elementos utilizados na fixação de cada uma das coimas parcelares.
Considera que essas omissões configuram a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 63.º, com referência à alínea c) do n.º 1 do art. 79.º, ambos do RGIT, motivo por que propôs a confirmação da decisão recorrida, ainda que com outra fundamentação. Vejamos:
Como este Supremo Tribunal tem vindo a dizer, o requisito que a segunda parte da alínea b) do art. 79.º do RGIT estabelece é a «indicação das normas violadas e punitivas». Nem aí nem em qualquer outra das alíneas que elencam os requisitos legais da decisão que aplica a coima descortinamos a exigência de que seja mencionada a moldura abstracta da coima.
Admitimos que essa indicação poderia ajudar na tarefa da fixação da medida da coima e na compreensão dos fundamentos que presidiram à respectiva fixação, mas a verdade é que o art. 79.º do RGIT não a erigiu em requisito da decisão que aplicar uma coima.
Por outro lado, convém recordar o disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT: «1. A decisão que aplica a coima contém: […] c) A coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação».
Ora, essa exigência deve ter-se por satisfeita no caso sub judice, pois quanto à fundamentação da concreta coima aplicada foram ponderados os factores a que manda atender o art. 27.º do RGIT; assim, como consta da decisão, foram ponderados: a inexistência de actos de ocultação e de benefício económico para o agente, o carácter frequente da prática, o ter sido cometida por negligência simples, a situação económica e financeira do agente baixa e terem decorrido mais de seis meses desde a prática da infracção.
Assim, entendemos não ser nula a decisão de aplicação da coima, pois que dela constam os requisitos mínimos que a lei manda observar quanto ao dever de fundamentação da decisão e que visam permitir ao visado contra ela reagir no exercício do seu direito de defesa; direito que, como ficou dito no acórdão desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 25 de Junho de 2015, proferido no processo n.º 382/15 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/96227826215066e080257e770035334c.
No mesmo sentido, o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 14 de Dezembro de 2016, proferido no processo n.º 1270/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a75dc76a097b3c3d8025808e00440621.), ditado pelo Recorrente, «não se vê tenha sido postergado pela forma estandardizada como foi cumprido o dever de fundamentação da decisão».
Por outro lado, sendo certo que na decisão não foram indicadas as coimas parcelares, respeitantes a cada uma das infracções praticadas, a verdade é que a coima única foi fixada no mínimo legal, motivo por que, como este Supremo Tribunal tem vindo a dizer desde há muito (Vide os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 12 de Dezembro de 2006, proferido no processo n.º 1045/06, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/645a53890508e81b80257261004e2de0;
- de 6 de Novembro de 2008, proferido no processo n.º 619/08, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8ec037fb7e9bf2478025750100384141;
e, mais recentemente,
- de 14 de Dezembro de 2016, proferido no processo n.º 1270/15, disponível em
http://www.gde.mj.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/a75dc76a097b3c3d8025808e00440621.), perde relevância jurídica autónoma a falta de indicação dos elementos considerados na fixação da coima, que não é sancionada com nulidade, constituindo mera irregularidade nos termos dos artigos 118.º n.º 1 e 123.º do Código de Processo Penal, porquanto essa omissão não é susceptível de causar prejuízo ao arguido, pois que ele não pode ver diminuído o montante da coima aplicada.
Ou seja, a decisão de aplicação da coima respeitou o requisito da alínea c) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT.

2.2.3 CONCLUSÕES

Por tudo quanto ficou dito, o recurso será provido e, em consequência, os autos regressarão ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, a fim de aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar. Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “descrição sumária dos factos” [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do RGIT] tem de ser interpretado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê e pune a infracção imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão de aplicação da coima não são senão os factos essenciais que integram o tipo de ilícito em causa.

II - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “indicação dos elementos que contribuíram para a […] fixação” da coima [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea c), do RGIT] deve ter-se por cumprido se, embora de forma sintética e padronizada, refere os elementos que contribuíram para a fixação da coima e se a coima única aplicada às várias infracções praticadas foi fixada no seu limite mínimo.

III - Do mesmo modo, não há que relevar como nulidade insuprível da decisão administrativa de aplicação da coima [cfr. arts. 63.º, n.º 1, alínea d) e 79.º, n.º 1, alínea c), do RGIT], por insusceptibilidade de contender com o direito de defesa do arguido, atenta a fixação da coima única no mínimo legal, o facto de se não ter indicado as coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções e as circunstâncias ponderadas na respectiva fixação.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar que os autos regressem ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, a fim de aí prosseguirem com o conhecimento do recurso judicial, se a tal nada mais obstar.

Sem custas.

*
Lisboa, 1 de Julho de 2020. – Francisco Rothes (relator) – Joaquim Condesso – Paulo Antunes.