Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0129/18
Data do Acordão:02/22/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:REVISTA
RESPONSABILIDADE CIVIL
ATRASO NA JUSTIÇA
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
Sumário:Não é admitir a revista quando o Recorrente viu ser-lhe reconhecido o direito a uma indemnização e esta foi fixada no montante que o mesmo esperava obter com a sua queixa-crime. Tanto mais quanto é certo que o processo foi arquivado por insuficiência de indícios e o Acórdão recorrido fez uma ponderada valorização das circunstâncias do caso e atribuiu uma indemnização de valor razoável e equilibrado.
Nº Convencional:JSTA000P22958
Nº do Documento:SA1201802220129
Data de Entrada:02/06/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I. RELATÓRIO

A…….., intentou no TAF de Viseu, contra o Estado Português, acção administrativa comum pedindo:
a) uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros)
b) despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pelo autor, despesas de certidões, despesas de tradução de documentos e honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos conforme artigos 39º a 42º;
c) juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento sobre as verbas em a), b), d) e e);
d) a todas as verbas atrás referidas devem acrescer quaisquer quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado;
e) deve ainda ser condenado em custas e demais encargos legais, como o reembolso de taxas de justiça inicial e subsequente e preparos para despesas e quaisquer outras pagas pelo autor.”
Aquele Tribunal, por sentença de 31/01/2016, julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência, condenou o Estado Português a pagar ao Autor a importância de € 2.000,00 (dois mil euros) a título de danos patrimoniais e morais e, ainda, nos juros de mora que se vencerem, à taxa legal de 4%, decorridos que sejam 30 dias desde a data da prolação da sentença, até ao seu integral pagamento.

O Autor, recorreu para o TCA Norte e este, por Acórdão de 04/10/2017, concedeu parcial provimento ao recurso condenando o Réu no pagamento de € 3.000,00, com juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da sentença e no pagamento de honorários que sejam fixados em subsequente liquidação e nas quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as anteriores quantias.
O Autor não se conformou com essa decisão e daí interposição desta revista.

II.MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III.O DIREITO

1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. Resulta dos autos que o Autor, ora Recorrente, apresentou queixa crime nos serviços do M.P., contra terceiro, com vista a recuperar os 600.000$00 que, alegadamente, haviam sido ilicitamente subtraídos do seu património.
O processamento desses autos durou cerca de 9 anos, tempo que o Recorrente considerou excessivo, o que o levou a intentar esta acção, contra o Estado, pedindo que lhe fosse arbitrada uma indemnização pelo atraso na administração da justiça em valor nunca inferior a 7.500 euros.

O TAF de Viseu, onde a acção foi proposta, julgou a acção parcialmente pela seguinte ordem de razões:
“No fundo o objecto do processo visava a tutela do autor em obter uma determinada importância que alegadamente lhe havia sido ilicitamente retirada do seu património, no caso a importância de Esc. 600.000$00 (cfr. participação/crime feita pelo autor), e relativamente à qual nada ou nenhum elemento existe nos autos que demonstre que essa mesma importância tenha deixado o autor numa situação aflitiva ou com consequências ofensivas para o mesmo de forma irreparável. E também releva, in casu, que o processo-crime em causa (processo de inquérito) veio a ser arquivado por insuficiência de indícios para a sua prática pelo suspeito ou arguido nele constituído.
Assim, em face das circunstâncias do caso em apreço, julga-se justo e equitativo fixar o quantum indemnizatório, a pagar pelo réu ao autor, na importância de € 2.000,00 (dois mil euros), importância esta que o tribunal fixa como actualizada à data da prolação da sentença.
Porém, sobre a referida quantia vencer-se-ão os juros de mora sobre a mesma, à taxa legal em vigor de 4%, decorridos que sejam 30 dias desde a data da sentença até ao seu efectivo e integral pagamento ao autor.”

O Autor apelou para o TCA e este, à semelhança do TAF, considerou que as consequências do atraso no processamento dos autos crime não se podiamconsiderar graves na medida em que, com grande probabilidade o procedimento criminal em causa estaria prescrito, facto este de que o autor se presume ter conhecimento, por ser advogado, e, aliás, para tal fora alertado, no decurso do procedimento/processo de inquérito para esse facto extintivo do procedimento, maxime se se tivesse de realizar a inquirição por carta rogatória requerida pelo autor/participante em face da demora de cumprimento da mesma, previsível de entre um a dois anos e, assim, de resto consumar-se-ia essa prescrição do procedimento criminal e que seria causa extintiva do mesmo.” O que o levou a concluir:
“Pelo exposto, acordam em conferência os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em, na parcial procedência do recurso, revogar a sentença recorrida, na parte em que condenou o réu a pagar ao autor a importância de € 2.000,00 (dois mil euros) e estabeleceu a contagem de juros “decorridos que sejam trinta (30) dias desde a data da prolação”, antes condenando ao pagamento de € 3.000,00 (três mil euros), com juros de mora à taxa legal de 4% contados desde a data da sentença (31/06/2016), mais condenando ao pagamento de honorários que sejam fixados em subsequente liquidação e nas quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as anteriores quantias.”

3. O Autor sustenta nesta revista que o TCA “violou a jurisprudência do STA quanto a indemnizações por processos lentos e quanto a acções indemnizatórias contra o Estado em processos novamente lentos”, que a indemnização fixada foi “irrisória por 9 anos de atraso e paragens longas do processo-crime” e que, sendo assim, o “Estado deve ser condenado a pagar, pelo menos, o que foi peticionado, acrescido dos juros legais.”

4. Como se acaba de ver a pretensão do Recorrente ao fazer a mencionada queixa crime foi a de, para além de uma eventual condenação do denunciado, obter a restituição da quantia que, alegadamente, lhe tinha sido ilegalmente subtraída. Pretensão que não teve êxito uma vez que o processo crime foi arquivado, cerca de nove após a denúncia, por insuficiência de indícios condenatórios.
Ora, o Recorrente considera que tem direito a ser indemnizado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais provocados por aquele atraso, pedindo para o efeito a condenação do Estado no pagamento de uma quantia não inferior a 7.500 euros.
E as instâncias reconhecerem-lhe esse direito, o que levou o TAF a atribuir-lhe uma indemnização de 2.000 euros, valor que o TCA considerou insuficiente e, por isso, elevou para 3.000 euros. Todavia, e apesar disso, esse montante não satisfaz o Recorrente que não só a considera injusta como defende que a mesma não respeita os valores que a jurisprudência deste STA e do TEDH vêm atribuindo.
Daí a interposição desta revista.

É sabido que tanto um como o outro dos identificados Tribunais vem fixando as indemnizações que, com este fundamento, tem atribuído em função das circunstâncias concretas de cada caso.
Sendo assim, e sendo que o Recorrente viu ser-lhe reconhecido o direito a uma indemnização, que esta foi fixada no montante que o mesmo esperava obter com a sua participação crime, que esta veio a ser arquivada por insuficiência de indícios e que o Acórdão recorrido fez uma ponderada valorização das circunstâncias do caso e que atribuiu uma indemnização de valor razoável e equilibrado não é necessária a admissão desta revista para uma melhor aplicação do direito.
Por outro lado, a questão aqui suscitada não se reveste de especial relevo jurídico e social nem a sua resolução passa pela realização de operações exegéticas de alguma dificuldade.
Não estão, assim, preenchidos os requisitos de admissão do recurso.

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam não admitir a revista.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2018. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.