Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0378/10.8BECTB 0821/17
Data do Acordão:01/08/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
EXCESSO DE PRONÚNCIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
DESPACHO DE REVERSÃO
Sumário:I - No nosso sistema, vigora o princípio do dispositivo ou da disponibilidade das partes que é um dos princípios basilares e estruturante relativo à prossecução processual, assegurando a autonomia das partes na definição dos fins que elas procuram obter através da acção, fazendo recair sobre elas o dever de formularem o pedido e de alegarem os factos que lhe servem de fundamento e os factos em que estruturam as excepções – artigo 264.º, nº 1, do CPC, hoje artº 5º do NCPC.
II - A essa luz, a Juíza do tribunal a quo interpretou os fundamentos da oposição como integrando o vício formal de falta de fundamentação o qual está corporizado na alegação em que o oponente invocou o vício na fundamentação do despacho de reversão, por não se indicar outras normas que não sejam os artigos 23.º e 24.º da LGT, não merecendo censura a decisão tomada, pois que a matéria alegada e a nominação categorial dos vícios pelo oponente deu azo a que o tribunal a quo interpretasse o apontado fundamento como corporizador não só de um vício de falta ou insuficiente fundamentação na indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal.
III - Sendo que a causa de pedir consiste na indicação dos factos concretos que integram os vícios invocados como fundamento do pedido de declaração de invalidade do acto (entendida aqui a invalidade em sentido lato, nela se incluindo a anulação), resulta da leitura e interpretação da petição inicial, que o oponente entende que o acto de reversão que pretende ver anulado, enferma do vício de falta/insuficiente fundamentação pelo que, no caso concreto, deveria a Mmª Juíza a quo, conhecer e pronunciar-se (como o fez) sobre tal vício, independentemente da qualificação jurídica feita pelas partes, pois esse mesmo vício foi claramente invocado na petição de recurso e o seu conhecimento não constituiria qualquer alteração da causa de pedir.
IV - O tribunal goza de total liberdade na qualificação ou seja, o princípio da limitação do juiz pela causa de pedir, que só permite que o tribunal baseie a sua decisão em factos invocados pelas partes no processo como fundamentos concretos do efeito jurídico pretendido ("factos principais"), não implica que o tribunal fique vinculado à qualificação jurídica avançada pelo recorrente nem que fique, de qualquer forma tolhido na averiguação do direito aplicável ao caso.
V - Sendo certo que a invocação do vício não depende da qualificação jurídica efectuada pelo recorrente, mas dos factos ou circunstâncias que são apontados como motivos da invalidade, não deveria o oponente ser prejudicado e ver precludido o direito invocado por ter especificado juridicamente ainda que de forma menos perceptível os vícios alegados.
VI - Mesmo a própria arguição de um vício concreto não implica que o juiz não possa qualificar diversamente os factos, entendendo que os mesmos integram vício diferente do arguido. Vale aqui o princípio da "jura novit curia".
VII - Assim, ao conhecer da falta de fundamentação do despacho de reversão, como o fez, por considerar ter sido invocado tal fundamento, tendo em conta que este decorre, inequivocamente, dos factos claramente expostos na petição inicial, não proferiu o Mm°. Juiz a quo uma sentença nula nos termos da al. d) do n.°1 do art.° 668° do C.P.Civil (actual 615º).
VIII - Deve considerar-se fundamentado de direito um acto de reversão da execução fiscal quando ele se insere num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
IX - A responsabilidade do gerente que se manteve na gerência da sociedade executada, conforme decorre do documento do registo comercial que instruiu o procedimento para reversão da execução fiscal e no qual se apoia o despacho de reversão, não pode deixar de ser aquela a que se refere a al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT, e que encontra expressão na afirmação feita de que não tendo sido provada a não imputabilidade da falta de pagamento pelo(s) contribuinte(s) acima referenciados em sede de audição prévia, e suficientemente provada nos autos quer a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis da executada, quer a qualidade de administradores conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial e informações juntas, concluiu-se que são subsidiariamente responsáveis pelas dívidas a que se referem os Autos, cujo prazo se venceu no período em que era(m) Gerente(s),pelo que, não podendo ser diverso o quadro jurídico configurável, o despacho de reversão se encontra fundamentado de direito, apesar de o seu texto não indicar expressamente a alínea do art. 24º da LGT em que se apoia.
Nº Convencional:JSTA000P25382
Nº do Documento:SA2202001080378/10
Data de Entrada:07/05/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pela Autoridade Tributária e Aduaneira, visando a revogação da sentença de 31-03-2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou totalmente procedente a oposição à execução fiscal n.º 1724200601007610 e apensos, deduzida por A…….., devidamente identificado nos autos e citado na qualidade de revertido da sociedade B…….., Lda.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Autoridade Tributária e Aduaneira as seguintes conclusões:

“1. A sentença, ora posta em crise, julgou procedente a presente oposição, tendo-se decidido pela anulação do despacho de reversão, por falta de fundamentação do dito e em consequência absolveu o oponente da instância executiva e determinou a extinção do PEF, quanto ao oponente e quanto às dívidas de coimas.
2. Como adiante procuraremos demonstrar que a sentença decidiu mal, tendo violado os art.ºs 153º do CPPT, o n.º 2 do art. 23º e al b) do n.º 1 do art.º 24º, da LGT, por isso devendo ser revogada e ser substituída por outra que julgue a oposição improcedente e isto se não for mesmo inválida a determinar a sua nulidade por se afigurar que terá ido mesmo além do pedido.
3. Em face da matéria dada como provada, que aqui damos por integralmente reproduzida, não podemos concordar com o decidido, pois a nosso ver o despacho de reversão está suficientemente fundamentado, quer de facto quer de direito.
4. Na verdade a sentença depois de afirmar que em sede de fundamentação de direito não poder acompanhar o oponente no que invoca ser falta de fundamentação, sem que fosse expectável ela retoma o tema da fundamentação e levanta ela própria e só ela a questão “em que nos termos de deter é na falta de indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcrevemos parcialmente”.
5. Com efeito, do despacho de reversão, reproduzido na sentença e neste recurso, não consta de forma expressa o período em que o ora recorrido exerceu o cargo de gerente.
6. Porém, no sexto parágrafo do despacho de reversão se refere expressamente e passamos a transcrever que “Deste modo, não tendo sido provada a não imputabilidade da falta de pagamento pelo(s) contribuinte(s) acima referenciados em sede de audição prévia, e suficientemente provada nos autos quer a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis da executada, quer a qualidade de administradores conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial e informações juntas, concluiu-se que são subsidiariamente responsáveis pelas dívidas a que se referem os Autos, cujo prazo se venceu no período em que era(m) Gerente(s)” (...).
7. Ora, na aludida certidão lá encontramos o período(s) em que o recorrido exerceu a gerência na executada originária, nomeadamente que a primeira nomeação para o cargo foi registada em 06/02/2004 a que renunciou em 19-11-2004, tendo sido registada uma nova nomeação para o mesmo cargo datando a deliberação de 12-08-2006, conforme resulta através das AP. 04/20040220, AP. 05/20041124 e AP. 01/20060830, respetivamente, aliás, factos que a sentença dá como provados (cfr. b), c) e d) do probatório).
8. Tal como consta da informação junta aos autos que o despacho refere como informação que antecede, lá encontramos em 2 al. e) que “ A………., NIF……., com responsabilidade na gerência a partir de 12-08-2006”.
9. Note-se que a sentença em sede de fundamentação de facto refere que “os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório, incluindo a citação/reversão (cfr. al. h) do probatório).
10. Ora em face do ora alegado consideramos, que o despacho de reversão está, salvo melhor opinião, suficientemente fundamentado de facto e de direito não merecendo qualquer censura.
11. E isto porque nada obriga na lei que a fundamentação de facto e de direito do despacho de reversão tenha de tudo de nele constar de forma expressa e até à exaustão, podendo tal fundamentação apoiar-se em informações e documentos juntos aos autos, no que somos acompanhados por muitos arestos superiores, que com as devias adaptações cobram aqui total aplicação.
12. Entre, muitos outros, vejam-se Acs. TCAS de 13-02-2014, Proc. 06961/13, 10-07-2014, Proc. 06242/12 e sobretudo os Acs. STA de 12-02-2015, Proc. 01860/13, de 08-04-2015, Proc. 0345/14, que pela sua pertinência nos presentes autos aqui reproduzimos os seus sumários:
I — Deve considerar-se fundamentado de direito um acto de reversão da execução fiscal quando ele se insere num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
II — A responsabilidade do gerente que se manteve na gerência da sociedade executada, conforme decorre do documento do registo comercial que instruiu o procedimento para reversão da execução fiscal e no qual se apoia o despacho de reversão, não pode deixar de ser aquela a que se refere a al. b) do n.º 1 do art.º 24º da LGT, e que encontra expressão na afirmação feita nesse despacho de que «o sócio-gerente acima identificado exerceu de facto e de direito, a gerência da executada, no período a que respeitam as dívidas aqui em cobrança, relativas a IRC e IVA dos anos 2001 a 2004 conforme certidão narrativa da Conservatória do Registo Comercial (...)», pelo que não podendo ser diverso o quadro jurídico configurável, o despacho de reversão se encontra fundamentado de direito, apesar de o seu texto não indicar expressamente a alínea do art.º 24º da LGT em que se apoia.
13. In casu a decisão de reversão fundamentou-se na al. b) do n.º 1 do art.º 24º da LGT, sendo que em matéria de direito a própria sentença declara que “Termos em que se verificam os pressupostos para a reversão do aqui oponente mas apenas quanto às dívidas cujo prazo de pagamento terminou no exercício do seu cargo, isto é, entre 06/02/2004 e 19/11/2004, e depois de 12-08-2006”. Acrescentado, ainda: “Voltemos ao caso dos autos e analisemos o despacho de reversão. Aí verificamos que o mesmo encontra justificação legal para a citação do oponente com revertido, quer nos artigos 23º e 24º, n.º 1, alínea b) da LGT, assim como no artigo 153º do CPPT (...). Sendo justamente as normas que resultam violadas pela sentença, porque cumpridas estas está o despacho de reversão fundamentado.
14. Sendo que tal matéria de facto foi dada toda como provada (cfr. b), c), d), e), f), g) h) do probatório).
15. Pelo que reputamos o despacho de reversão de suficientemente fundamentado quer facto quer de direito e que a sentença ao decidir como decidiu errou de direito violando justamente o art.º 23º, a al. b) do n.º 1 do Art.º 24º da LGT, e o art.º 153º do CPPT ao anular o despacho de reversão por falta de fundamentação, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que o considere fundamentado em todas as suas dimensões e em consequência julgar a oposição improcedente, assim, dando provimento ao presente recurso.
16. Acresce que o recorrido, então revertido, exerceu plenamente a sua defesa, desde logo, o direito de audição prévia conforme f) do probatório, e que na sua petição identifica os impostos e períodos de tributação (2007, 2008, 2009) bem como, o período temporal a partir do qual se lhe pode ser assacada a responsabilidade do seu pagamento, que refere como a partir dos meados do ano 2006 (cfr. PI. Art.s 95° e 96°) o que revela que percebeu tudo o que estava em causa na reversão, pelo que ainda que se revela-se insuficiente, tal não significaria falta de fundamentação (Neste sentido Ac. TCAS de 10-01-2012).
17. SEM PREJUÍZO DO EXPENDIDO, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA O QUE POR MERA HIPÓTESE ADMITIMOS SEMPRE DIREMOS QUE A SENTENÇA PADECE DE NULIDADE POIS AFIGURA-SE-NOS QUE HOUVE EXCESSO DE PRONUNCIA.
SENÃO VEJAMOS:
18. Na sentença em sede “De direito”, refere-se que “através da presente oposição, o revertido por dívidas da B……., Lda, veio insurgir-se contra o PEF n.° 1724200601007610 e apensos, invocando:
Como fundamentos da presente oposição:
- Invoca a falta de excussão do património da executada originária e a sua de culpa na insuficiência dos bens daquela sociedade para fazer face às dívidas tributárias.
- Alega ainda que não foi gerente, de facto, da sociedade devedora originária, invocando que nunca praticou actos de disposição ou administração em nome e interesse da sociedade.
- Opõe-se ainda, e em concreto, quanto às dívidas provenientes de decisões de aplicação de coimas, aplicada à B………., Lda..
- Mais invoca que o PEF é nulo, pois no ano a que se referem as dívidas não teve qualquer actividade.
- Falta de fundamentação do despacho de reversão e nulidade;
- Violação dos artigos 45°, 46°, e 59º do CPPT, e dos art.°s 8°, 55°, 56, 58,59° e 60° da LGT.
19. Mais referindo que “Antes de mais, importa referir que as alegações do oponente são genéricas e não são devidamente circunstanciadas, mais não fazendo o oponente do que invocar vícios do despacho de reversão, ou fundamentos de oposição, desconexos entre si e muitas vezes contraditórios (como sublinha o Digníssimo Magistrado do MP).
20. Mais referindo, ainda, que “Assim sendo e tendo estas considerações em mente, desde já, se diga que o oponente não concretiza em que medida foram violados os artigos 45°, 46°, e 59° do CPPT, e dos artigos 8°, 55º, 56º, 59º e 60° da LGT, pelo que sem necessidade de maiores considerações, não se conhecerá deste fundamento.
21. O fundamento com base no qual foi julgada procedente a oposição e em consequência anulou o despacho de reversão foi como refere e passamos a citar: «A questão em que nos termos de deter é na falta de indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcrevemos parcialmente”.
22. Ora, como facilmente se alcança dos fundamentos elencados não figura o fundamento acabado de referir e foi como resulta claramente da sentença o que determinou a procedência total da oposição.
23. Em tais termos a sentença padece de excesso de pronúncia porquanto se pronunciou sobre questão que não devia conhecer, porque não expressamente suscitada, articulada ou invocada pelo oponente na sua PI e que não resultando da lei o seu conhecimento oficioso, excedeu os seus poderes de cognição, violando a regra de identidade de causa de pedir e causa de julgar, sendo a sentença nula por clara violação do art.° 125° do CPPT e art. 615° n.° 1 al. d) do CPC, “ex vi” da al. e) do art.° 2° do CPPT. (cfr. entre outros, Acs. STA de 10-09-2014, Proc. 084/09; de 20-05-2015, Proc. 0116/14; de 05-02-2015, Proc. 0875/13; de 24-05-2016, Proc. 036/16; de 28-05-2014, Proc. 0458/12).
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, deve o presente recurso merecer provimento e ser revogada a sentença recorrida, substituída por outra que julgue fundamentado o despacho de reversão ou caso assim não se entenda a declare nula por excesso de pronúncia com o que farão Vossas Excelências, Excelentíssimos Juízes Conselheiros, JUSTIÇA.”

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se o decidido e julgando-se o despacho de reversão insuficientemente fundamentado quanto aos períodos de exercício do cargo de gerente.
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

a) Através da AP. 03/980724 foi registada o contrato de sociedade “B………, Lda.” (cfr. cópia de certidão, de fls. 47 dos autos);
b) Através da AP. 04/20040220 foi registada a nomeação do oponente como gerente da sociedade a que se refere a alínea anterior, com efeitos a partir de 06/02/2004 (cfr. cópia de certidão, de fls. 48 dos autos);
c) Através da AP. 05/20041124 – Foi registada a cessação de funções do oponente, como gerente, por renúncia em 19/11/2004. (cfr. 47 cópia de certidão, fls. 54 dos autos);
d) Através da AP. 01/20060830, foi registado a nomeação do oponente para a gerência, datando a deliberação de 12/08/2006 (cfr. 54 cópia de certidão, fls. 54 dos autos);
e) A 28/04/2009 foi proferido projecto despacho de reversão contra o oponente, e outros (cfr. despacho de fls, 62 dos autos);
f) O oponente exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. requerimento de fls. 64 dos autos);
g) A 17/03/2010 foi proferido despacho de reversão (cfr. despacho de fls. 75 dos autos):




h) A 18/03/2010 foi emitido o ofício de citação, no PEF n.º1724200601007610, dirigido ao aqui oponente, para cobrança de dívida no valor de 101.657,30euros (cfr. 80 dos autos);
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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença a qual julgou totalmente procedente a oposição:
(i) padece de nulidade por excesso de pronúncia;
(ii) padece de erro de julgamento no que respeita à questão da falta de fundamentação do despacho de reversão.
Vejamos.
Quanto à invocada nulidade, a recorrente estrutura-a nos seguintes termos:
A sentença considerou que os fundamentos da presente oposição eram a falta de excussão do património da executada originária e a sua de culpa na insuficiência dos bens daquela sociedade para fazer face às dívidas tributárias; a não gerência, de facto, da sociedade devedora originária, por o oponente ter invocando que nunca praticou actos de disposição ou administração em nome e interesse da sociedade; oposição às dívidas provenientes de decisões de aplicação de coimas, aplicada à B………., Lda.; a nulidade do PEF, por no ano a que se referem as dívidas não haver qualquer actividade; a falta de fundamentação do despacho de reversão e nulidade e a violação dos artigos 45°, 46°, e 59º do CPPT, e dos art.°s 8°, 55°, 56, 58,59° e 60° da LGT.
Sustenta a recorrente, que o fundamento com base no qual foi julgada procedente a oposição e em consequência anulou o despacho de reversão foi, como consta da sentença, “A questão em que nos termos de deter é na falta de indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcrevemos parcialmente”.
Por assim ser, ampara a recorrente que dos fundamentos elencados não figura o fundamento acabado de referir e foi como resulta claramente da sentença o que determinou a procedência total da oposição.
Por esse prisma, conclui a recorrente que padecendo a sentença de excesso de pronúncia porquanto se pronunciou sobre questão que não devia conhecer, porque não expressamente suscitada, articulada ou invocada pelo oponente na sua PI e que não resultando da lei o seu conhecimento oficioso, excedeu os seus poderes de cognição, violando a regra de identidade de causa de pedir e causa de julgar, sendo a sentença nula por clara violação do art.° 125° do CPPT e art. 615° n.° 1 al. d) do CPC, “ex vi” da al. e) do art.° 2° do CPPT.
Assim a ora Recorrente, coloca à apreciação deste a questão de saber se a sentença recorrida é nula por excesso de pronúncia, por ter tomado conhecimento de uma questão que não fora invocada.

Cumpre desde logo determinar se e em que termos o oponente suscitou na p.i. o vício de falta de fundamentação do acto de reversão.
É que, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC (aplicável no momento do seu proferimento), a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, nulidade que está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660.º nº 2 do CPC, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
O excesso de pronúncia ocorre, assim, quando o tribunal aprecia e decide uma questão que não havia sido chamado a resolver. Todavia, se o tribunal, consciente e fundamentadamente, toma conhecimento de uma questão por julgar que ela foi, expressa ou implicitamente, invocada, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse julgamento, mas não nulidade por excesso de pronúncia. Desde que o tribunal afirme ou invoque razões para justificar o conhecimento de uma determinada questão, como acontece no caso em que julga que ela resulta da matéria alegada ou que aí se encontra corporizada, não se verifica a nulidade da decisão por excesso de pronúncia, mesmo que se conclua ter existido erro nesse julgamento.
No caso dos autos, a Meritíssima Juíza do tribunal a quo interpretou os fundamentos da oposição como integrando o vício formal de falta de fundamentação nos seguintes termos:
“Da falta de fundamentação do despacho de reversão e da falta da identificação concreta do valor da dívida a reverter.
Invoca o oponente vício na fundamentação do despacho de reversão, por não se indicar outras normas que não sejam os artigos 23.° e 24.° da LGT.
Concordam as partes que o despacho de reversão tem de ser fundamentado, em cumprimento com o artigo 268.° da CRP, assim como do artigo 77.° da LGT.
Resulta do acórdão do STA de 0925/13 de 29/10/2014:
“(...), não sofre dúvida que a responsabilidade subsidiária se efectiva por reversão do processo de execução fiscal (n.° 1 do art. 23.° da LGT) e que este despacho de reversão, sendo um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (art. 268.° n.°3 da CRP; arts. 23.° n.°4 e 77.°n° 1, da LGT).
E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23.° n.° 4 e 24.° n.° 1, da LGT) a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 21° n.° 2 da LGT; art. 153.° n.° 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (art. 24.° n.° 1 da LGT), então o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (n° 1 do art. 77.° da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23° n° 4 LGT). Daí que, em consonância com este normativo, se tenha afirmado, no acórdão do Pleno desta Secção do STA, proferido em 16/10/13, 0458/13, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» (cfr., igualmente, os acórdãos desta Secção do STA, de 31/10/2012, proc. n° 580/12 e de 23/1/2013, proc. n° 953/12).
Sendo que, em caso de discordância, o revertido exercerá o direito de defesa mediante dedução de oposição onde, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações das previsões legais:
(i) - incumbe à AT comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do n.° 1 do art. 24° da LGT);
(ii) - incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do n° 1 do art. 24° da LGT;”
Voltemos ao caso dos autos e analisemos o despacho de reversão. Aí verificamos que o mesmo encontra justificação legal para a citação do oponente como revertido, quer nos artigos 23.° e 24.°, n.°1, alínea b) da LGT, assim como no artigo 153.° do CPPT, mais se fundando no artigo 8.° do RGIT.
Assim, e em sede de fundamentação de direito não podemos acompanhar o oponente no que invoca ser falta de fundamentação.
A questão em que nos termos de deter é na falta de indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcrevemos parcialmente.
Assim e por falta de fundamentação do despacho de reversão, tem de proceder a presente oposição.”
No caso dos autos, a Meritíssima Juíza do tribunal a quo interpretou os fundamentos da oposição como integrando o vício formal de falta de fundamentação.
E na verdade, o referido vício está corporizado na alegação, vertida nos artigos 62º e ss dos quais resulta, como sintetizou a Mª Juíza, que o oponente invocou o vício na fundamentação do despacho de reversão, por não se indicar outras normas que não sejam os artigos 23.° e 24.° da LGT.
No nosso sistema, vigora o princípio do dispositivo ou da disponibilidade das partes que é um dos princípios basilares e estruturante relativo à prossecução processual, assegurando a autonomia das partes na definição dos fins que elas procuram obter através da acção, fazendo recair sobre elas o dever de formularem o pedido e de alegarem os factos que lhe servem de fundamento e os factos em que estruturam as excepções – artigo 264.º, nº 1, do CPC, hoje artº 5º do NCPC.
No caso vertente, a Meritíssima Juíza do tribunal “a quo” interpretou a materialidade alegada e os fundamentos gizados pelo oponente na respectiva petição inicial como integrando não só o vício de violação de lei, como, também, o vício de falta de fundamentação, nos sobreditos termos.
Ora, interpretada do modo que foi a petição inicial de oposição, a decisão tomada não merece censura, pois que a matéria alegada e a nominação categorial dos vícios pelo oponente deu azo a que o tribunal a quo interpretasse o apontado fundamento como corporizador não só de um vício de falta ou insuficiente fundamentação na indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcreveu parcialmente.
Neste contexto, considerando como plenamente viável essa leitura e interpretação da petição, não terá ocorrido violação do princípio do dispositivo, em termos de a Mª Juíza ter a obrigação de conhecer do vício nesse vector.
Como vimos do relato supra, sustenta a Recorrente AT que a sentença em causa padece de nulidade, por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 668.°, n° 1, alínea d), do CPC, dado o Tribunal ter excedido os seus poderes de cognição pois há matéria que aquela afirma que foi indevidamente conhecida.
Ora, os vícios determinantes de nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença, como é o caso de uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia). Esses são vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.
Se, porventura, a sentença incorreu num desvio do ritualismo processual prescrito na lei, sempre haverá que aquilatar se o mesmo teve relevância na discussão da causa, sendo assim nulo e devendo essa nulidade ser arguida – como foi.
E só existe a nulidade prevista no artº 668º nº 1, al. d), 2ª parte, do CPC então em vigor [correspondente ao artº 615º do NCPC) - excesso de pronúncia – quando o tribunal conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Assim, tal nulidade apenas é verificável relativamente a «questões» e não a «factos» - Cfr. Ac. do STJ de 10.1.2002, Ver. Nº 4351/01-1ª: Sumários, 2/2002).
Ora, como vimos, um dos princípios estruturantes do direito processual civil é o princípio do dispositivo, a que alude o artigo 264º do CPC e o artº 5º, n.º 1, do NCPC, segundo o qual “às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”.
E a que também se refere o art. 660º, n.º 2, do mesmo CPC – ou 608º, nº2 do NCPC -, que diz que “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Conforme este princípio, cabe às partes alegar os factos que integram o direito que pretendem ver salvaguardado, impondo-se ao juiz o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões por aquelas suscitadas, não podendo, por regra, ocupar-se de outras questões.
A sentença ficará afectada de nulidade, quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (art. 668.º, n.º 1, alínea d), do CPC).
Mas importa precisar o que deve entender-se por «questões» cujo conhecimento ou não conhecimento integra nulidade por excesso ou falta de pronúncia.
Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras «questões» de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista no art. 668º/1/d) do CPC.
Há, assim, que distinguir as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes e de que o tribunal não tenha conhecido ou que o tribunal tenha aduzido sem invocação das partes [Ver Abílio Neto In “Código do Processo Civil”, Anotado, 14.ª ed., pág. 702 e Acórdão da Relação de Lisboa, de 2.07.1969, publicado JR, 15.].
Num caso como no outro não está em causa omissão ou excesso de pronúncia.
Obviamente sempre salvaguardadas as situações onde seja admissível o conhecimento oficioso do tribunal.
Por último importa não confundir a nulidade por falta ou excesso de conhecimento com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz não decide acertadamente, por decidir «contra legem» ou contra os factos apurados [vd A. dos Reis, In “Código de Processo Civil”, Anotado, Volume V, pg. 130].
Quer isto dizer que só a parte dispositiva da sentença e não a sua fundamentação pode padecer do vício de excesso de pronúncia previsto na 2ª parte da alínea d) do nº 1 do artº 668º do CPC.
Ora, no caso em apreciação, o tribunal recorrido não conheceu de questão de que não devesse conhecer.
E isso ficou claramente demonstrado supra e não subsiste qualquer dúvida de que o recurso da sentença proferida em primeira instância versou sobre a falta de fundamentação formal do despacho de reversão.
Lapidar, nesse sentido, é a própria fundamentação jurídica da sentença supra transcrita.
Sendo que a causa de pedir consiste na indicação dos factos concretos que integram os vícios invocados como fundamento do pedido de declaração de invalidade do acto (entendida aqui a invalidade em sentido lato, nela se incluindo a anulação), resulta da leitura e interpretação da petição inicial, que o oponente entende que o acto de reversão que pretende ver anulado, enferma do vício de falta/insuficiente fundamentação pelo que, no caso concreto, deveria a Mmª Juíza a quo, conhecer e pronunciar-se (como o fez) sobre tal vício, independentemente da qualificação jurídica feita pelas partes, pois esse mesmo vício foi claramente invocado na petição de recurso e o seu conhecimento não constituiria qualquer alteração da causa de pedir.
Ademais, "O tribunal goza de total liberdade na qualificação” ou seja, "O princípio da limitação do juiz pela causa de pedir, que só permite que o tribunal baseie a sua decisão em factos invocados pelas partes no processo como fundamentos concretos do efeito jurídico pretendido ("factos principais"), não implica que o tribunal fique vinculado à qualificação jurídica avançada pelo recorrente nem que fique, de qualquer forma tolhido na averiguação do direito aplicável ao caso.
Sendo certo que a invocação do vício não depende da qualificação jurídica efectuada pelo recorrente, mas dos factos ou circunstâncias que são apontados como motivos da invalidade, não deveria o oponente ser prejudicado e ver precludido o direito invocado por ter especificado juridicamente ainda que de forma menos perceptível os vícios alegados.
Mesmo a própria arguição de um vício concreto não implica que o juiz não possa qualificar diversamente os factos, entendendo que os mesmos integram vício diferente do arguido. Vale aqui o princípio da "jura novit cúria".
Assim, ao conhecer da falta de fundamentação do despacho de reversão, como o fez, por considerar ter sido tal fundamento, tendo em conta que este decorre, inequivocamente, dos factos claramente expostos na petição inicial, não proferiu o Mm°. Juiz a quo uma sentença nula nos termos da al.d) do n.°1 do art.° 668° do C.P.Civil.
Mas como o presente recurso não se cinge ao cometimento da irregularidade ritualística em análise e nele se desferem críticas à decisão sobre o julgamento do mérito da causa de pedir em apreço, importa desta conhecer.
*

Vejamos, então, se o despacho de reversão está, ou não, devidamente fundamentado e se a sentença recorrida incorreu, ou não, no erro de julgamento sobre tal questão.
Sob a epígrafe «Responsabilidade dos membros de corpos sociais e responsáveis Técnicos» o n° 1 do art. 24° da LGT dispõe o seguinte:
«1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.»
Da literalidade do inciso legal acabado de transcrever, preceito emerge, que, enquanto na al. a) não se prevê qualquer presunção de culpa do gerente da sociedade, ficando, por isso, a cargo da Fazenda Pública, o ónus de provar que tenha sido por culpa daquele que o património social se tornou insuficiente para satisfação das dívidas tributárias, já na al. b) se onera o responsável subsidiário com a prova de que não lhe foi imputável a falta de pagamento.
No caso, a sentença recorrida considerou que, “…nos te(r)(mos de deter é na falta de indicação, em relação ao oponente, do período em que este exerceu o cargo, não podendo ter-se por suficiente a decisão que não concretiza esse período temporal, como expressamente o refere o acórdão do STA que transcrevemos parcialmente”.
Mas, como defende a recorrida, não se afigura que a matéria de facto julgada provada conduza ao entendimento de que no despacho de reversão não se contém um juízo de subsunção da factualidade apurada na previsão legal da norma constante da al. a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT.
É que, em relação à fundamentação de direito, a jurisprudência do STA (cfr., entre outros, o ac. de 27/5/2003, proc. nº 1835/02) tem vindo a considerar que tal fundamentação se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível, impondo-se a verificação de duas condições: que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto e que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra.
Ora, no caso vertente, os elementos constantes dos autos e a materialidade vertida no probatório da sentença permitem concluir que estas condições se encontram reunidas.
É certo que do despacho de reversão, não consta de forma expressa o período em que o ora recorrido exerceu o cargo de gerente.
Todavia, como bem aponta a recorrida, no sexto parágrafo do despacho de reversão alude-se expressamente que “Deste modo, não tendo sido provada a não imputabilidade da falta de pagamento pelo(s) contribuinte(s) acima referenciados em sede de audição prévia, e suficientemente provada nos autos quer a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis da executada, quer a qualidade de administradores conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial e informações juntas, concluiu-se que são subsidiariamente responsáveis pelas dívidas a que se referem os Autos, cujo prazo se venceu no período em que era(m) Gerente(s)” (...).
Da análise da dita certidão constata-se que lá constam os período(s) em que o oponente exerceu a gerência na executada originária, designadamente que a primeira nomeação para o cargo foi registada em 06/02/2004 a que renunciou em 19-11-2004, tendo sido registada uma nova nomeação para o mesmo cargo datando a deliberação de 12-08-2006, conforme resulta através das AP. 04/20040220, AP. 05/20041124 e AP. 01/20060830, respectivamente, aliás, factos que a sentença dá como provados (cfr. b), c) e d) do probatório).
Acresce que também consta da informação junta aos autos que o despacho refere como informação que antecede, no seu ponto 2 al. e) que “A…………, NIF……….., com responsabilidade na gerência a partir de 12-08-2006”.
Certo ainda que a sentença em sede de fundamentação de facto refere que “os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório, incluindo a citação/reversão (cfr. al. h) do probatório).
Somos, pois, levados a concordar com a recorrida no sentido de que o despacho de reversão está suficientemente fundamentado de facto e de direito tanto mais que nada obriga na lei que a fundamentação de facto e de direito do despacho de reversão tenha de tudo de nele constar de forma expressa e até à exaustão, podendo tal fundamentação apoiar-se em informações e documentos juntos aos autos, no que somos acompanhados por muitos arestos superiores, que com as devias adaptações cobram aqui total aplicação.
Nesse sentido se pronunciaram muitos arestos dos tribunais superiores em que pontifica o do STA de 12-02-2015, Proc. 01860/13, de 08-04-2015, Proc. 0345/14, de cujo sumário brota a seguinte doutrina:
I — Deve considerar-se fundamentado de direito um acto de reversão da execução fiscal quando ele se insere num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
II — A responsabilidade do gerente que se manteve na gerência da sociedade executada, conforme decorre do documento do registo comercial que instruiu o procedimento para reversão da execução fiscal e no qual se apoia o despacho de reversão, não pode deixar de ser aquela a que se refere a al. b) do n.° 1 do art.° 24° da LGT, e que encontra expressão na afirmação feita nesse despacho de que «o sócio-gerente acima identificado exerceu de facto e de direito, a gerência da executada, no período a que respeitam as dívidas aqui em cobrança, relativas a IRC e IVA dos anos 2001 a 2004 conforme certidão narrativa da Conservatória do Registo Comercial (...)», pelo que não podendo ser diverso o quadro jurídico configurável, o despacho de reversão se encontra fundamentado de direito, apesar de o seu texto não indicar expressamente a alínea do art.° 24° da LGT em que se apoia.
No caso vertente a decisão de reversão ancorou-se na al. b) do n.° 1 do art.° 24° da LGT, sendo que em matéria de direito a própria sentença proclama que “Termos em que se verificam os pressupostos para a reversão do aqui oponente mas apenas quanto às dívidas cujo prazo de pagamento terminou no exercício do seu cargo, isto é, entre 06/02/2004 e 19/11/2004, e depois de 12-08-2006”. (…): “Voltemos ao caso dos autos e analisemos o despacho de reversão. Aí verificamos que o mesmo encontra justificação legal para a citação do oponente com revertido, quer nos artigos 23° e 24°, n.° 1, alínea b) da LGT, assim como no artigo 153° do CPPT (...).
Sendo assim, como é, essas mesmas normas que se apresentam violadas pela sentença, porque cumpridas estas está o despacho de reversão fundamentado e isso resulta cristalino do probatório, ou seja, tal matéria de facto foi dada toda como provada (cfr. b), c), d), e), f), g) h) do probatório).
Concorda-se, pois, com a recorrente quando considera que (conclusão 15ª) o despacho de reversão suficientemente fundamentado quer facto quer de direito e que a sentença ao decidir como decidiu errou de direito violando justamente o art.° 23°, a al. b) do n.° 1 do Art.° 24° da LGT, e o art.° 153° do CPPT ao anular o despacho de reversão por falta de fundamentação, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que o considere fundamentado em todas as suas dimensões e em consequência julgar a oposição improcedente, assim, dando provimento ao presente recurso.
Procedem, portanto, as Conclusões do recurso, não podendo manter-se a sentença no que respeita à procedência deste vício do acto de reversão.

*


3. Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, na parte em que julgou procedente a oposição com base em insuficiente fundamentação do despacho de reversão, mais julgando a oposição improcedente mas ordenando que a execução prossiga seus termos contra o oponente só nessa parte já que se mostra extinto o PEF, quanto às dívidas de coimas.

Custas pelo recorrente.
*

Lisboa, 08 de Janeiro de 2020. – José Gomes Correia (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo Antunes.

Segue acórdão de 18 de Novembro de 2020:

Descritores: ALEGAÇÕES – NOTIFICAÇÃO – IRREGULARIDADE -PRAZO PARA ALEGAÇÕES – REFORMA DE ACÓRDÃO QUANTO A CUSTAS – CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 282º, nº 3 do CPPT

I - A falta de notificação das alegações de recurso, que deveria ter sido efectuada pela recorrente AT apresenta-se como mera irregularidade processual insusceptível de determinar a anulação dos termos processuais subsequentes, face ao disposto no art.º 195.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário por não estar em causa a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, que possa influir no exame ou na decisão da causa.
II - Os reclamantes foram notificados do despacho que admitiu o recurso e, nesta fase processual, apenas a omissão dessa notificação levaria à verificação de uma nulidade insanável com a consequente anulação dos termos processuais subsequentes.
III - A omissão da notificação das alegações de recurso é irrelevante para iniciar o prazo para o recorrente apresentar alegações por este prazo se contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso, quinze dias, a contar do termo do prazo para as alegações do recorrente, sendo que o prazo de apresentação destas é de quinze dias, a contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso.
IV – Assentando o recorrente o objecto da arguição no acto de processo que deveria ter sido observado tal é, de todo, irrelevante na medida em que o juízo de apreciação sobre a validade dos actos praticados repousa na conformidade entre o que foi feito e o que é estatuído como formalidade na norma que rege o caso concreto, aferindo-se a relação de adequação tendo em conta os actos que concretamente foram praticados e se mostram documentados no processo.
V – O princípio do contraditório é a trave mestra do sistema processual civil e é a garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.
VI - O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo.
VII - Na acepção dada, não foi prejudicada a defesa do recorrido, volvendo espúrias as asserções por ele vertidas quanto aos efeitos da preterição da formalidade que sinaliza pois se defendeu, em devido tempo, apresentando as suas contra-alegações assim se sanando a irregularidade cometida.
VIII - Destarte, o disposto no artigo 282º, nº 3 do CPPT não é inconstitucional por violação ao disposto no artigo 3º, nº 3 do CPC e 20º, nºs 1 e 4 da CRP e por não assegurar às partes um processo justo e equitativo.

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1– Relatório

Notificado do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, exarado em 08/01/2020, A…………, melhor identificado nos autos, vem apresentar Requerimento de arguição de nulidades, ao abrigo dos artigos 98º, do CPPT, nos termos e com os seguintes fundamentos:
“1º
O Requerente Recorrido citada da reversão, deduziu Oposição, nos termos do disposto nos artigos 203º e seguintes, do CPPT, conforme o alegado nos autos.

A Fazenda Pública citada para o efeito apresentou contestação, alegando o que consta de fls.

O aqui Requerente/ Recorrido respondeu às excepções invocadas pela fazenda Pública alegando o que consta de fls. 2

Realizou-se a Audiência de Julgamento.

As partes notificadas para o efeito apresentaram as alegações escritas, alegando o que consta de fls.

Foi proferida Sentença, em que foi julgada procedente a oposição à reversão.

Por Despacho proferido a 04/05/2017 e notificado ao Requerente/Recorrido pela notificação de 05/05/2017, foi admitido o recurso apresentado pela Fazenda Pública.

Sucede que a partir de tal Despacho, não houve a notificação ao Requerente/Recorrido ou seu mandatário de mais nenhum ato processual praticado nos presentes autos, com excepção da notificação do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, datada de 10/01/2019.

Na verdade, o aqui Requerente/Recorrido não foi notificado das alegações de recurso apresentadas pela Fazenda Pública, nem por esta, nem pelo douto Tribunal de 1ª Instância.
10º
Pois, o Requerente/Recorrido só tomou conhecimento de que foram apresentadas alegações de recurso, com a notificação do douto Acórdão proferido por este Venerando Tribunal.
11º
Sendo certo que o Requerente/Recorrido não foi notificado, nem dos Pareceres do Ministério Público, nem da remessa do recurso ao Supremo Tribunal Administrativo.
12º
Ora, o Requerente/Recorrido desconhecendo o teor das alegações de recurso apresentadas pela Fazenda Pública, fica impossibilitado de saber, desde logo se foram ou não foram apresentadas as alegações, ou se teria ocorrido a deserção do recurso.
13º
Bem como ficou impedido de contra-alegar, em virtude de desconhecer as alegações da Recorrente.
14º
A lei processual Administrativa no seu artigo 145º do CPTA, impõe à Secretaria do Tribunal a notificação do recorrido para alegarem, aguardando o tribunal o decurso do prazo para a subida do processo.
15º
Atento os princípios que enformam o direito processual tributário e, particularmente, o disposto no nº 2, als. c), d) e) do CPPT, com o devido respeito por entendimento contrário, deveria o recorrido ter tido conhecimento da apresentação das alegações de recurso, do seu teor e da data da sua apresentação, para poder, cabalmente, contra-alegar o que tivesse por conveniente e exercer o contraditório sobre o alegado pela Recorrente, até quanto à tempestividade da sua apresentação, etc.
16º
Não tendo sido notificado das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, ficou o Requerente/Recorrido impossibilitado de contra-alegar.
17º
Por outro lado, dispõe o Código de Processo Civil aplicável por remissão do CPPT, no seu artigo 2º, que todas as peças processuais são notificadas entre mandatários, quando constituídos, a partir da contestação, nomeadamente os artigos 220 e 255º do CPC, inclusivamente as alegações e contra-alegações.
17º
Mais, dispõe a lei de processo civil que a Secretaria notifica oficiosamente as partes quando possam responder para exercer algum direito processual, como é o caso.
18º
Por outro lado, dispõe o artigo 3º, nºº 3 do CPC, que o Juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, quer sejam questões de direito ou de facto, sem que tenham dado à parte a possibilidade sobre tal questão se pronunciar.
19º
Assim, não tendo sido notificado o Requerente/Recorrido das alegações de recurso pela Fazenda Pública, nem pela Secretaria do Tribunal foi cometida uma nulidade processual.
20º
Nulidade que aqui se invoca e se requer a sua apreciação, com todas as consequências legais daí resultantes.
21º
Assim, deve ser revogado o Acórdão de fls e consequentemente ser anulado todos os actos posteriores à notificação do Despacho de admissão do recurso e serem notificadas as alegações de recurso ao Requerente/Recorrido a fim de o mesmo poder apresentar as suas contra-alegações, seguindo o processo os ulteriores termos processuais.
22º
O que, desde já e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes.
Caso assim não se entenda, o que por mera hipótese académica se equaciona, mas que não se admite, alegamos a inconstitucionalidade do artigo 282º, nº 3 do CPPT, por violação dos artigos 3º, nº 3 do CPC, 20º, nº 1 e 4 da CRP, por não assegurarem às partes um processo justo e equitativo.
23º
Isto porque só com a notificação, pelo Tribunal ou da parte que apresenta a peça processual, neste caso as alegações de recurso, é que a outra parte tem o conhecimento da peça e do seu teor, podendo alegar de forma cabal e precisa sobre as questões suscitadas pela parte no recurso, bem como da tempestividade do mesmo.
24º
Sendo certo que nos presentes autos, o Requerente/Recorrido não foi notificado quer das alegações de recurso, quer do despacho que apreciou as alegadas nulidades invocadas no recurso, nem do Despacho que mandou subir o recurso ao STA.
25º
Ora a nossa Constituição impõe que as partes tenham um tratamento igual e que possam fazer valer as suas razões de forma justa, equitativa e em condições de igualdade, respeitando o princípio do contraditório.
26º
Ora, tal não aconteceu nos presentes autos.
27º
Isto porque à alegante foi-lhe notificado uma sentença, e depois um despacho a admitir o recurso apresentado, e a ordenar a notificação nos termos do artigo 282º do CPPT.
28º
Ora, a Alegante sabe quando é que começou o seu prazo e apresenta as suas razões de direito que entende que estão contra a decisão proferida.
29º
Pelo contrário, o Contra-alegante, não sendo notificado das alegações pela Recorrente ou Tribunal, não sabe quais as razões invocadas pela parte nas suas alegações, nem sabe quando as mesmas as apresentou, nem sequer se as apresentou, não podendo de forma clara, precisa e concisa rebater os argumentos apresentados pela Recorrente, nem tão pouco alegar a intempestividade, ou outra nulidade cometida pela recorrente.
30º
Isto porque nem sequer teve conhecimento da sua apresentação, nem teor, quer pela alegante, nem pelo douto Tribunal que tem de fazer cumprir a equidade e o princípio do contraditório entre as partes.
31º
Assim, caso seja considerado que não existe nenhuma nulidade processual, deve ser declarado nulo o artigo 282º, 3 do CPTT, por violação do artigo 20º, nº 1 da CRP e artigo 3º, nº 3 do CPC e artigo 2º, als, c), d) e e) do CPPT e 145º do CPTA.
32º
O que, desde já e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes.
Conclusões:
Termos em que, e nos melhores de direito, e com sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve:
a) O presente Requerimento de arguição de nulidades ser conhecido e, consequentemente, deferido, por todos os motivos acima expostos, devendo o Acórdão sub judice ser revogado e consequentemente ser declarados nulos todos os atos praticados após a notificação do Despacho de Admissão do recurso, devendo ser notificado ao Requerente/Recorrido as Alegações de recurso por forma a poder apresentar as contra-alegações, seguindo o processo os ulteriores termos processuais, com todas as consequências legais daí resultantes;

b) Caso assim não se entende, deve ser declarado inconstitucional o artigo 282º, nº 3 do CPPT, por violação do disposto no artigo 20º, nº 1 da CRP, 3º, nº 3 do CPC, artigo 2º, als, c), d) e e) do CPTT e 145º do CPTA, com todas as consequências legais daí resultantes.
Pede Deferimento.

Por seu turno, a Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 616.º e n.º 1 do art.º 666.º, ambos, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi da al. e) do art.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, requerer a sua reforma quanto a custas, com os seguintes fundamentos:

1.
O processo de impugnação foi objeto de sentença, proferida pelo Tribunal Tributário de Administrativo e Fiscal de Castelo Branco em 31 de Março de 2017, que julgou a oposição procedente e em consequência:
- Anulou o despacho de reversão, por falta de fundamentação do despacho de reversão, indo assim absolvido o oponente da instância executiva.
- Determinou a extinção do PEF, quanto ao oponente, e quanto às dívidas de coimas.
2.
A FP, inconformada com a decisão, apresentou recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, sem, contudo, ter posto em causa em sede de recurso “a extinção do PEF, quanto ao oponente, e quanto às dívidas de coimas.”
3.
Refira-se que no total da dívida exequenda revertida de € 101.657,30, se constata que é referente a dívidas de coimas o valor de € 7.700,81 (i.e. 7,58% do total), certidões de dívida n.ºs: 2007/5000027, 2007/5000119, 2007/5000124, 2007/5000133, 2007/5000134, 2007/5000288 2007/5000347, 2007/5000348, 2007/5000370, 2007/5000472, 2007/5000567, 2007/5000660, 2007/5000661, 2007/5000685, 2007/5000810, 2008/5000028, 2008/5000951, 2008/5000952, 2008/5000953, 2008/5000954, 2008/5000955, 2008/5000956, 2008/5000957, 2008/5000958, 2008/5000959, 2008/5000960, 2008/5000961, 2008/5000962, 2008/5000963, 2008/5000964, 2008/5000965, 2008/5000966, 2008/5001451, 2008/5001631, 2009/5000054, e a dívidas tributárias o valor de € 93.956,48 (i.e. 92,42% do total), certidões de dívida n.ºs : 2006/1020941, 2007/539138, 2007/539142, 2007/539146, 2007/539149, 2007/539172, 2007/539179, 2007/539183, 2007/539186, 2007/539190, 2007/539214, 2007/539216, 2007/539217, 2007/725185, 2007/725186, 2007/725187, 2007/725188, 2007/725189, 2008/130604, 2008/130741, 2008/130742, 2008/130743, 2008/133876, 2008/146030, 2008/146031, 2008/146032, 2008/146033, 2008/146034, 2008/146035, 2008/146036, 2008/160506, 2008/160507, 2008/160508, 2008/160509, 2008/160510, 2008/160511, 2008/160512, 2008/160513, 2008/163889, 2008/163890, 2008/163891, 2008/163892, 2008/163893, 2008/163894, 2008/163895, 2008/163896.
4.
A Recorrida não contra-alegou no recurso interposto pela FP.
5.
Os Juízes da Secção de Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 08 de janeiro de 2019, acordaram em conceder provimento ao recurso, mais julgando a oposição improcedente, mas ordenando que a execução prossiga os seus termos contra o oponente só nessa parte já que se mostra extinto o PEF, quanto às dívidas de coimas.
6.
Já no segmento decisório relativo às custas entendeu-se, no douto acórdão:
Custas pelo recorrente.”
7.
Ora, tendo em conta que a Recorrente (FP) obteve ganho de causa, sendo o recurso procedente, as custas terão de ser suportadas, nesta instância, pela Oponente/Recorrida, e bem assim em 1ª instância, ao menos na proporção do seu decaimento (de 92,42%) - e não pela recorrente conforme decorre da condenação do STA.
8.
Até porque, a ser assim (a manter-se condenação em custas pela Recorrente), a FP ficava impedida de solicitar, à parte vencida a título de custas de parte, a taxa de justiça a pagar (pela FP) pela interposição do recurso.
9.
Sendo que, o facto da Recorrida não ter contra-alegado no recurso e, consequentemente, não dever pagar qualquer taxa de justiça quanto ao recurso, não deve determinar a sua não condenação em custas, até porque, aquela incumbência de saber se a Recorrida tem, ou não, que pagar taxa de justiça caberia desde logo à secretaria do tribunal que, caso haja contra-alegações sempre teria que notificar a parte que contra-alegou para pagar a taxa de justiça correspondente.
10.
O segmento decisório relativo às custas, também tem por função decidir qual o responsável pelo pagamento das custas de parte no processo.
11.
Os Juízes da Secção Tributário do STA têm que condenar em custas a parte vencida, até porque, é em função dessa condenação que a parte vencedora vai solicitar o pagamento das custas de parte (à parte vencida) em todo o processo.
12.
Nos termos do n.º 1 do art.º 533.º do Código de Processo Civil (CPC):
“..., as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento e nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais.”.
13.
Sendo que, por força da alínea a) do n.º 3, do art.º 26.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP):
3 - A parte vencida é condenada, nos termos previstos no código do processo civil, ao pagamento dos seguintes valores, a título de custas de parte:
a) Os valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora, na proporção do vencimento;
c) 50 % do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário judicial, sempre que seja apresentada a nota referida na alínea d) do n.º 2 do artigo anterior;”.
14.
Pelo exposto, apesar do Douto Tribunal alterar a decisão recorrida e julgar a oposição improcedente, condena a Recorrente em custas, ou seja, se bem entendemos o alcance da condenação em custas, onera a FP (parte vencedora) com o pagamento da taxa de justiça paga (pela FP, no valor notificado pelo Tribunal para pagar) em 2.ª instância e em 1ª instância, sem a possibilidade de ser ressarcida pela parte vencida.
15.
Ora, a FP, como parte vencedora, não deverá ser lesada no pagamento de taxa de justiça (em 2.ª instância, no valor de € 510,00 e em 1ª instância no valor de €612,00) sem que a mesma possa ser restituída pela parte vencida, ou pelo tribunal, caso se entenda que este se deve substituir à Recorrida na responsabilidade por custas.
16.
Assim, entende a FP que o segmento decisório quanto à responsabilidade por custas merece ser reformado por outro que condene a Recorrida nas custas processuais, ou seja, deve ser alterada a condenação em custas no sentido infra proposto:
Onde se lê: “Custas pela recorrente”.
Deverá passar a ler-se: “Custas pela Recorrida nesta instância, e por ambas as partes, na 1ª instância, na proporção do respetivo decaimento, sendo este de 92,42% para a Oponente.”
Nestes termos e nos demais de Direito, se requer que seja determinada A REFORMA QUANTO A CUSTAS no sentido proposto pela Fazenda Pública.

Do requerimento supra apresentado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, vem A………… dizer e requerer o seguinte:


Não assiste razão à Requerente quanto à reforma das custas, nomeadamente nos termos requeridos.

Por outro lado, o Oponente não apresentou contra-alegações, nem recurso subordinado.

Pelo que, não deve o Oponente ser condenado nas custas quanto ao recurso apresentado pela Fazenda Pública.

Por outro lado, o Oponente apresentou um requerimento de Arguição de nulidades, que ainda não foi decidido.

Assim, deve ser indeferido o peticionado pela Fazenda Pública, com todas as consequências legais daí resultantes.

O que, desde já e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes.
Pede Deferimento.

Notificado para se pronunciar, o Magistrado do Ministério Público promoveu o seguinte:

1 – O Recorrido vem, a fls., arguir a nulidade do douto acórdão alegando que não pôde pronunciar-se face às alegações de recurso por não ter acesso às mesmas, as quais não lhe foram dadas a conhecer.
As alegações em causa foram enviadas pelo correio no decurso do mês de Maio de 2019.
A citada arguição de nulidade foi suscitada em tempo útil.
Consultado o processo, via SITAF, não se consegue vislumbrar, com segurança, o efectivo acesso às alegações de recurso por parte do Recorrido.
Assim, desde já se promove, que a Recorrente seja notificada para vir aos autos fazer prova de ter dado conhecimento, em tempo útil, das alegações de recurso ao Recorrido, a fim de nos pronunciarmos com segurança sobre a arguição de nulidade.
2 – Quanto à requerida reforma do Acórdão, quanto a custas, por parte da A.T., oportunamente nos pronunciaremos.

Notificada a Autoridade Tributária e Aduaneira do despacho e promoção do Ministério Público, vem, sobre o mesmo, pronunciar-se, dizendo o seguinte:

As alegações de recurso apresentadas nos presentes autos pela Fazenda Pública foram remetidas ao TAF de Castelo branco, por correio em 19.05.2017 (conforme consta do SITAF) e não, em Maio de 2019 como referido no parecer do Ministério Público agora notificado.
As mesmas não foram remetidas pela FP à parte contrária.
Conforme notificação em anexo, o TAF de Castelo Branco, por oficio datado de 5 de maio de 2017 notificou o ilustre mandatário da recorrida do despacho de admissão do recurso e para contra-alegar.
Vem agora o recorrido, após prolação de acórdão, arguir nulidade do mesmo, requerendo a sua notificação das Alegações de recurso por forma a poder apresentar contra-alegações.
Sobre a matéria estabeleceu o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 20.09.2017 no Processo n.º 01320/16, o seguinte:
“Sumário:
I - A falta de notificação das alegações de recurso, que deveria ter sido efectuada pela recorrente AT apresenta-se como mera irregularidade processual insusceptível de determinar a anulação dos termos processuais subsequentes, face ao disposto no art.º 195.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário por não estar em causa a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, que possa influir no exame ou na decisão da causa.
II - Os reclamantes foram notificados do despacho que admitiu o recurso e, nesta fase processual, apenas a omissão dessa notificação levaria à verificação de uma nulidade insanável com a consequente anulação dos termos processuais subsequentes.
III - A omissão da notificação das alegações de recurso é irrelevante para iniciar o prazo para o recorrente apresentar alegações por este prazo se contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso, quinze dias, a contar do termo do prazo para as alegações do recorrente, sendo que o prazo de apresentação destas é de quinze dias, a contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso.”
Ora, como já acima se disse, o recorrido foi notificado do despacho que admitiu o recurso e para, querendo, contra-alegar.
Sendo esse despacho que determina o seu prazo para contra-alegar nos termos do art. 282 do CPPT.
Também o prazo da recorrente para alegar é determinado por tal despacho, pelo que, seria no termo de tal prazo (que coincide com o inicio da contagem do prazo para apresentar contra-alegações) que deveria ter sido suscitada a invocada irregularidade (no prazo de 10 dias subsequentes à sua verificação), nos termos do disposto no art. 149.º do Código de Processo Civil, já não podendo ser suprimida tal omissão nesta fase processual.

Sobre o requerimento supra, A………… vem expor e requerer o seguinte:


O Recorrido mantém tudo o alegado no seu requerimento de arguição de nulidades.

Não assiste razão à Representante da Fazenda Pública quanto à extemporaneidade do Recorrido vir suscitar a irregularidade/nulidade por falta da notificação das alegações de recurso apresentadas pela mesma.

As contra-alegações é a resposta às alegações feitas pela parte que recorre.

Ora, se o Recorrido não tem conhecimento das alegações apresentadas, em virtude da Fazenda Pública não as ter notificado à parte contrária, nem o douto tribunal, o Recorrido não pode apresentar as suas contra-alegações.

Sendo certo que, o prazo de 15 dias para contra-alegar inicia-se a partir da data em que são notificadas as alegações pela parte que recorre.

Ora, não tendo sido notificadas as alegações ao Recorrido, nem os atos posteriores praticados no processo, o Recorrido, desconhece se a Fazenda Pública apresentou ou não as alegações, se o recurso ficou deserto, bem como o teor das alegações.

Pelo que todas as peças processuais praticados nos processos, após a contestação, são notificados pelas partes, umas às outras, como decorre da lei.

Tanto assim é que quando não é apresentado o comprovativo da notificação das peças à parte contrária de quem as apresenta, o douto Tribunal notifica a parte para vir juntar o comprovativo de notificação.

O que nos presentes autos não aconteceu.
10º
Apenas tendo o Recorrido sendo notificado do douto Acórdão, o recurso de arguição de nulidades é tempestivo, visto que foi o primeiro ato praticado nos autos após o conhecimento de tal omissão.
11º
Assim, tendo a Fazenda Pública admitido que não notificou o Recorrido das alegações apresentadas, nem tendo o douto Tribunal suprimido tal omissão, deve ser julgado procedente, por provado, o requerimento de arguição de nulidades apresentado pelo Recorrido, com todas as consequências legais daí resultantes.
12º
O que desde já e aqui se requer.
Pede Deferimento.”

O Magistrado do Ministério Público emitiu o parecer que se segue:

1 – Ressalva-se, desde já, o lapso existente na nossa anterior promoção no que respeita à data mencionada de “(…) 05.05.2019 (…)”, que deve ser considerada 05.05.2017.
2 – O Recorrido A………… vem, por requerimento de fls. , arguir a nulidade do douto Acórdão proferido neste STA, invocando o disposto nos artigos 195º e 149º, do CPC.
Alega, não ter tido conhecimento do teor das alegações recursivas e por isso não pôde contra-alegar.
Discorda-se, desde já, da argumentação do arguente e isto porque:
Constata-se, porém, que, em 05.05.2017, o Recorrido foi notificado da admissão do recurso em causa e para contra-alegar, se assim o entendesse.
Face ao disposto no artigo 279º, nº 2 do CPPT o prazo para alegações do recorrido é igual ao do recorrente e conta-se a partir do termo final do prazo para alegações deste, sendo que a falta de alegações pelo recorrido não lhe traz negativamente quaisquer consequências legais. É uma faculdade que lhe assiste que pode usar ou não e que lhe pode eventualmente vir a ser útil.
“Terá, porém, de as apresentar se pretender impugnar o despacho de admissão do recurso no que concerne à própria admissão ou ao efeito fixado (art. 687º, nº 4, do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto) ou suscitar qualquer questão prévia (arts. 702º, nº 2, 703º, nº 2 e 704º, nº 2 e 749º do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto) ou requerer a ampliação do objecto do recurso (art. 684º A do CPC) ou indicar peças processuais de que pretendem certidão para instruir recurso (art. 742º, nº 2, do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto).” Ver anotação ao artigo 279º do CPPT, in C.P.P.T. anotado por Jorge Lopes de Sousa, vol. IV, 6ª edição, a pág. 444.
Ora, constatamos que o agora arguente nada fez para saber o que se passava no processo após a supra citada notificação.
Ao manter-se em inacção perante tal notificação demonstrou conformação com a matéria recursiva.
Daí, não dever, agora, vir invocar nos termos em que o vem fazer, requerer a nulidade do douto acórdão que lhe não é favorável.
O que o Recorrido pretende é ver reanalisada nesta instância a matéria discutida nos autos, face à decisão do douto Acórdão.
Deve, pois, ser indeferida a requerida nulidade, louvando-nos, para o efeito, na doutrina emanada no douto Ac. Deste STA, de 20.09.2017, in Proc. nº 01320/16.
Invoca, ainda, que o disposto no artigo 282º, nº 3 do CPPT é inconstitucional por violação ao disposto no artigo 3º, nº 3 do CPC e 20º, nºs 1 e 4 da CRP por não assegurar às partes um processo justo e equitativo.
Também, aqui, não assiste razão ao Recorrido, face ao que atrás ficou exarado. Não existe nenhuma inconstitucionalidade, não se mostrando, “in casu”, nenhuma ofensa à Lei Fundamental.
Deve, pois, ser indeferido o requerido.
2 – AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA vem requerer a reforma do Acórdão quanto a custas, a fls., .
Entende-se assistir razão à requerente, já que a mesma obteve êxito no recurso por si intentado.
Daí, dever ser isenta de custas, devendo as mesmas recair sobre o Recorrido.

*

Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1.- Motivação de Direito

No caso, em face dos termos em que foram enunciados os requerimentos, tanto pelo requerente particular, como pela Autoridade Tributária e Aduaneira, as questões que cumpre decidir subsumem-se a saber se (i) o acórdão padece de nulidade, por o requerente/recorrido particular não ter podido pronunciar-se, dado que não foi notificado quer das alegações de recurso, quer do despacho que apreciou as alegadas nulidades invocadas no recurso, quer ainda do despacho que mandou subir o recurso ao STA, se (ii) o disposto no artigo 282º, nº 3 do CPPT é inconstitucional por violação ao disposto no artigo 3º, nº 3 do CPC e 20º, nºs 1 e 4 da CRP, tendo em conta que não assegura às partes um processo justo e equitativo e se (iii) o acórdão merece ser reformado por outro que condene a Recorrida nas custas processuais, tal como entende a Autoridade Tributária e Aduaneira.
Vejamos.

Da nulidade por falta de notificação das alegações ao recorrido

Patenteiam os autos, em decorrência dos documentos a eles juntos, que, em 05.05.2017, o Recorrido foi notificado da admissão do recurso em causa e para contra-alegar, se assim o entendesse.
Nos termos do disposto no artigo 282º, nº3 do CPPT o prazo para alegações do recorrido é igual ao do recorrente e conta-se a partir do termo final do prazo para alegações deste, sendo que a falta de alegações pelo recorrido não lhe traz negativamente quaisquer consequências legais. É uma faculdade que lhe assiste que pode usar ou não e que lhe pode eventualmente vir a ser útil.
Na esteira de Jorge Lopes de Sousa, vol. IV, 6ª edição, a pág. 444 em anotação ao artigo 282º do CPPT, in C.P.P.T. Anotado, “Terá, porém, de as apresentar se pretender impugnar o despacho de admissão do recurso no que concerne à própria admissão ou ao efeito fixado (art. 687º, nº 4, do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto) ou suscitar qualquer questão prévia (arts. 702º, nº 2, 703º, nº 2 e 704º, nº 2 e 749º do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto) ou requerer a ampliação do objecto do recurso (art. 684º A do CPC) ou indicar peças processuais de que pretendem certidão para instruir recurso (art. 742º, nº 2, do CPC, na redacção anterior ao DL nº 303/2007, de 24 de Agosto).”
Mas, como enfatiza a EPGA, constatamos que o agora arguente nada fez para saber o que se passava no processo após a supra citada notificação pelo que, ao manter-se em inacção perante tal notificação demonstrou conformação com a matéria recursiva.
Afigura-se-nos, por isso, que não é lícito ao recorrido vir agora requerer a nulidade do douto acórdão que lhe não é favorável visando claramente ver reanalisada nesta instância a matéria discutida nos autos, face à decisão do Acórdão reclamado.
Pontifica a respeito a doutrina provinda no Ac. Deste STA, de 20.09.2017, in Proc. nº 01320/16 em cujo discurso jurídico se verteu:
“Nos termos do disposto no art.º 281.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, os recursos serão interpostos, processados e julgados como os agravos em processo civil, devendo, ainda obedecer às seguintes regras específicas dos processos judiciais tributários nos termos do art.º 282.º do Código de Processo e Procedimento Tributário:
«1 - A interposição do recurso faz-se por meio de requerimento em que se declare a intenção de recorrer.
2 - O despacho que admitir o recurso será notificado ao recorrente, ao recorrido, não sendo revel, e ao Ministério Público.
3 - O prazo para alegações a efectuar no tribunal recorrido é de 15 dias contados, para o recorrente, a partir da notificação referida no número anterior e, para o recorrido, a partir do termo do prazo para as alegações do recorrente.».
A primeira questão a dilucidar reporta-se a saber se a falta de notificação ao recorrido das alegações de recurso do recorrente constitui nulidade insanável. Para tanto carecia tal falta de constar do elenco normativo das nulidades insanáveis previstas pelo legislador tributário no art.º 98.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, onde tal irregularidade não foi inserida.
Os reclamantes foram notificados do despacho que admitiu o recurso e, nesta fase processual, apenas a omissão dessa notificação levaria à verificação de uma nulidade insanável com a consequente anulação dos termos processuais subsequentes. Assim, a falta de notificação das alegações de recurso, que deveria ter sido efectuada pela recorrente AT apresenta-se como mera irregularidade processual insusceptível de determinar a anulação dos termos processuais subsequentes, face ao disposto no art.º 195.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário por não estar em causa a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, que possa influir no exame ou na decisão da causa.
A omissão da notificação das alegações de recurso é irrelevante para iniciar o prazo para o recorrente apresentar alegações por este prazo se contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso, quinze dias, a contar do termo do prazo para as alegações do recorrente, sendo que o prazo de apresentação destas é de quinze dias, a contar da data em que foi notificado o despacho que admitiu o recurso.
Não compete ao Tribunal notificar a apresentação das alegações de recurso, pelo que não se verifica qualquer omissão de formalidade legal praticada pelo Tribunal.
Os reclamantes, esgotado o prazo dos recorrentes apresentarem alegações, não tendo delas sido notificados, poderão solicitá-las junto da recorrente, ou do tribunal, mas o seu prazo para contra-alegações não fica suspenso ou interrompido por não terem tido acesso às alegações de recurso.”
Termos em que não se verifica a nulidade em apreço.

*

Mas o requerente assaca, ainda, que o disposto no artigo 282º, nº 3 do CPPT é inconstitucional por violação ao disposto no artigo 3º, nº 3 do CPC e 20º, nºs 1 e 4 da CRP por não assegurar às partes um processo justo e equitativo.
Todavia, dúvidas não subsistem de que a falta de notificação das alegações ao recorrido constitui mera irregularidade nos termos previstos no artigo 195º, nº 1, do CPC, subsidiariamente aplicável.
A notificação tinha como finalidade proporcionar ao recorrido o direito de defesa o qual é um direito fundamental que, tal como o direito de acção, integra o direito de acesso aos tribunais, pressupondo a sua garantia um acto que dê ao réu o conhecimento efectivo do acto que o podia prejudicar.
O acto fundamental de comunicação entre o tribunal e o recorrido in casu tinha uma dupla função de transmissão de conhecimento e de convite para a defesa.
Sendo o princípio do contraditório um dos princípios estruturantes do processo civil verdadeiramente integrando a sua espinha dorsal, constituindo uma regra com poucas excepções (cfr. artº 3º nº 2 do CPC), o acto de comunicação (omitido) em causa revestia-se de primordial importância pois que, ao rigor com que ela se efectuasse estavam incindivelmente ligadas a validade e regularidade da instância, por isso a lei a rodeando de tantas cautelas, disciplinando-a em pormenor pois constitui um acto essencial para efeitos de realização do princípio do contraditório, visto que dá à contraparte a oportunidade de defesa.
E tudo isso para que, caso o recorrido queira realmente defender-se, o possa fazer com toda a eficácia, deste modo se assegurando a igualdade das partes que também é princípio fundamental do processo, garantindo-se simultaneamente a independência e a equidistância em relação aos litigantes que o juiz deve guardar.
Mas a relevância do papel da notificação não vai ao ponto de a sua falta constituir uma nulidade insuprível.
Com o CPC actual essa falta é, como já dissemos, uma nulidade sanável bastando, para tanto, que a parte tenha intervindo no processo sem arguir logo a falta dela (artº 199º do CPC).
A tipicidade dos casos de nulidade dos atos vem enumerada no art° 195° CPC, segundo o qual:
“1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.
3 - Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo.”
O certo é que inexistiu nulidade processual que influísse na decisão da causa pois não ficou coarctada ao recorrido a possibilidade de reagir ao recurso interposto.
Com efeito, a nulidade relatada e que no entender do recorrido foi cometida, só teria relevo em face da preterição do seu direito e interesse que pudessem ficar obstaculizados pela irregularidade em causa.
Destarte, impõe-se-nos concluir que o recorrido foi devidamente notificado do requerimento de interposição do recurso inexistindo uma irregularidade processual que haja prejudicado as suas possibilidades de defesa.
Neste ponto, o requerente assenta o objecto da arguição no acto de processo que deveria ter sido observado, o que é, salvo o devido respeito, de todo, irrelevante na medida em que o juízo de apreciação sobre a validade dos actos praticados repousa na conformidade entre o que foi feito e o que é estatuído como formalidade na norma que rege o caso concreto.
Assim, a relação de adequação afere-se tendo em conta os actos que concretamente foram praticados e se mostram documentados no processo.
Conclui-se, em tal desiderato, que se deu pleno cumprimento ao princípio do contraditório que, como supra se afirmou, é a trave mestra do sistema processual civil e, segundo Lebre de Freitas, (cfr. José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C. P. Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.96), é a garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo.
O que vale por dizer que, na acepção dada, não foi prejudicada a defesa do recorrido, volvendo espúrias as asserções por ele vertidas quanto aos efeitos da preterição da formalidade que sinaliza.
Destarte, não ocorre qualquer inconstitucionalidade, por não se antolhar, a ofensa à Lei Fundamental mencionada pelo arguente, devendo ser indeferido o requerido.
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Por seu turno, a AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA vem requerer a reforma do Acórdão quanto a custas, pelos fundamentos que ficaram expostos.
E aqui julgamos que assiste razão à requerente, já que a mesma obteve êxito no recurso por si intentado.
Como decorre dos artº 613º, nºs 1 e 2, 614º, nº1 e 616º, nº1, do CPC, aplicáveis ex vi do artº 2º, al. e) do CPPT, conquanto com a prolação do Acórdão ficasse esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, pode ter lugar a sua correcção por iniciativa do Tribunal quanto a custas, se aquele for omisso nessa matéria ou incorrer em lapso manifesto na condenação.
No caso vertente, houve decisão com condenação do recorrente em custas.
Ora, o artigo 527º do C.P.C, prescreve que a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a ela houver dado causa, vigorando no C.P.C, em matéria de custas, o princípio da causalidade: paga as custas a parte que lhes deu causa, isto é, que pleiteia sem fundamento, que carece de razão no pedido formulado, que, em suma, exerce no processo uma actividade injustificada.
Destarte, a actuação da lei não deve traduzir-se num sacrifício patrimonial para a parte em benefício da qual essa actuação se realizou, pois é interesse do Estado que a utilização do processo não acarrete prejuízo ao litigante que tem razão, pois que, como se expende no Ac. da Relação de Coimbra de 7/3/95, in C.J., tomo II, pág. 10: "A responsabilidade pelo pagamento das custas assenta na ideia de que não deve pagar custas a parte que tem razão".
Sendo a asserção inversa verdadeira, como nos presentes autos foi o recorrido que lhes deu causa dado que decaiu totalmente, teria de vigorar o princípio da justiça gratuita para o vencedor.
Assim, colhe de pleno a suscitação feita pela AT de reforma do Acórdão quanto a custas já que o recorrente obteve ganho de causa.

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3.- Decisão:

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em:
(i) Indeferir a arguição de nulidade do acórdão e a suscitação de inconstitucionalidade;
(ii) reformar o Acórdão proferido quanto a custas, devendo constar do mesmo a final, "Custas pelo recorrido” em vez de "Custas pelo Recorrente".

Custas pelo requerente do incidente de nulidade de acórdão (cfr. artº. 527.º n.º1 do CPC, subsidiariamente aplicável ex vi do artº 2º al. e) do CPPT) fixando-se em 2 Ucs. a taxa de justiça (cfr.artº.7 e Tabela II, do R.C. Processuais).
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Lisboa, 18 de Novembro de 2020. - José Gomes Correia (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo José Rodrigues Antunes.