Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:019/18
Data do Acordão:01/25/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
EMPREITADA
RECEPÇÃO DE OBRA
Sumário:Não deve admitir-se revista de acórdão do TCA que no âmbito do Dec. Lei 59/99, de 2 de Março considerou não haver recepção definitiva tácita da obra, numa situação em que o dono da obra, antes de findo o prazo de garantia denunciou ao empreiteiro várias insuficiências e propôs uma vistoria conjunta para a sua identificação.
Nº Convencional:JSTA000P22838
Nº do Documento:SA120180125019
Data de Entrada:01/11/2018
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE CARREGAL DO SAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A………… SA recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, proferido em 15 de Setembro de 2017, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Viseu, que por seu turno julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL por si intentada contra o MUNICÍPIO DO CARREGAL DO SAL pedindo a declaração de nulidade ou anulação do accionamento por parte do réu do Seguro Caução e garantia relativos à empreitada de Reabilitação da rede Viária do Concelho de Carregal do Sal.

1.2. Pugna pela admissão da revista por ter havido “erro na fixação dos factos” a justificar a aplicação do art. 683º, 3 do CPC E 150º, 4 do CPTA.

1.3. A entidade recorrida pugna pela não admissão da revista, por entender que o que a recorrente verdadeiramente põe em causa é a matéria de facto assente nas instâncias e as ilações ou conclusões que os julgadores dela retiraram.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A questão a resolver nestes autos – tal como de resto a recorrente a delimita na conclusão 13ª – “resume-se a saber se as garantias, prestadas pela autora ao réu, foram ou não ilegal e abusivamente accionadas pelo réu”. Questão prévia a essa é, todavia, como também diz a recorrente (conclusão 14ª) a de saber se teve ou não lugar a recepção definitiva tácita da empreitada, ao abrigo do estabelecido no n.º 5, do art. 217, por remissão do art. 227º, n.º 3 do RJEOP-

3.3. Nos presentes autos a recepção provisória da obra ocorreu em 16 de Novembro de 2006. Pelo que, o prazo de cinco anos de garantia terminava em 16 de Novembro de 2011. Em 11 de Outubro de 2011, a autora, ora recorrente solicitou que fosse realizada a recepção definitiva da obra e libertadas as cauções. A entidade demandada com data de 11 de Novembro de 2011 (cinco dias antes de terminar o prazo da garantia) informou o recorrente de que a obra não se encontrava em condições de ser recebida, tendo proposto uma vistoria conjunta para assinalar as zonas a intervencionar.

Entretanto, como não ocorreu qualquer outra diligência, o recorrente sustenta que em 20-12-2011, ocorreu a recepção tácita definitiva da obra, nos termos do art 217º, n.º 5, do Dec. Lei 59/99, de 2 de Março.

Entendimento que o TCA afastou com o argumento de que ainda antes de decorrido o prazo final de garantia a entidade demandada informou o recorrente de que a obra, tendo em atenção os defeitos que apresentava, não podia ser recebida e propôs uma vistoria conjunta para assinalar as zonas a intervencionar.

Deste modo quando a entidade demandada propôs a realização de vistoria conjunta era porque não tinha a intenção de proceder à recepção definitiva, não podendo, por esse motivo, funcionar a presunção constante do art. 217º, n.º 5.

Aliás, continua o acórdão, posteriormente foi feita a vistoria conjunta e as partes procederam ao levantamento das deficiências existentes. “Assim, pelo exposto – diz o acórdão recorrido – conclui-se que tendo a entidade demandada informado o empreiteiro de que não podia ocorrer a recepção definitiva da obra devido às deficiências que essa mesma obra apresentava e tendo sido proposta a realização de uma vistoria conjunta, antes de expirar o prazo de garantia, não se pode concluir que ocorreu o deferimento tácito da mesma”.

3.4. Como decorre do exposto a questão essencial é a de saber se ocorreu ou não recepção definitiva tácita da obra, num caso em que o dono da obra, antes do fim do respectivo prazo denunciou a existência de deficiência e pediu a realização de uma vistoria conjunta com vista à sua identificação, no âmbito de vigência do Dec. Lei 59/99.

Trata-se, desde logo, de uma questão localizada no tempo. O regime actual previsto nos artigos 394º e 395º não é idêntico e, portanto, os termos de resolução da questão jurídica deste processo não são transponíveis para o futuro. Circunstância que retira à questão importância jurídica fundamental, na medida em que acaba por se limitar a presente litígio.

Não pode dizer-se, também, que a questão seja de importância social fundamental pois os valores envolvidos só por si não assumem essa dimensão (€ 75.238,09 mais € 6.187,50 – cfr. facto d) e e) da matéria de facto.

Finalmente a decisão recorrida mostra-se fundamentada com um discurso juridicamente plausível, citando no mesmo sentido um acórdão do Tribunal da Relação do Porto e do TCA Sul, não evidenciando assim erro manifesto ou grosseiro a exigir, só por si, a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do direito.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista

Custas pela recorrente.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.