Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0630/10.2BESNT
Data do Acordão:02/17/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
EXPROPRIAÇÃO
Sumário:I - A declaração de utilidade pública de uma expropriação, acompanhada, ainda, ad majorem, de autorização para a tomada de posse administrativa do bem envolvido (totalmente ou em parte), constitui uma inevitável, séria e prática contração dos direitos de qualquer proprietário, destacadamente, no que tange ao pleno e exclusivo exercício das faculdades de uso e fruição das coisas objeto daquela.
II - Essa compressão do direito de propriedade, existente, não encerra eficácia, extensível, ao ponto de impedir o proprietário/expropriado de, em especial, alienar o mesmo, isto é, exercer o seu direito de disposição da coisa/imóvel envolvido, pois, efetiva e legalmente, até ao dia da (eventual) adjudicação judicial da propriedade ao expropriante, aquele continua a deter a condição de titular do direito de propriedade do bem sob expropriação.
III - Ocorre a caducidade da isenção, prevista no art. 7.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), de que beneficiou a aquisição, feita pela impugnante, de prédio misto, integrante da parcela (rústica) submetida a expropriação por utilidade pública, por virtude de o mesmo (como todo ou amputado da área expropriada) não ter sido, comprovadamente, revendido, nos três anos seguintes à compra.
Nº Convencional:JSTA000P27206
Nº do Documento:SA2202102170630/10
Data de Entrada:10/01/2020
Recorrente:A.........LDA
Recorrido 1:AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.


A…….., Lda., …, recorre da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, em 18 de dezembro de 2019, que julgou improcedente esta impugnação judicial, apresentada contra decisão de indeferimento da reclamação graciosa do ato de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), identificada com o n.º 200926921403, de 4 de novembro de 2009, no montante de € 59.600,00.
A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

I - Considerando que parte do Prédio Rústico inscrito na Matriz sob o nº 70, da freguesia de Algueirão, Mem-Martins, correspondente a 17.202 m2, foi adjudicado à LUSOLISBOA - Auto-Estradas da Grande Lisboa, SA; que,

II - Por despacho publicado na 2ª Série do Diário da República, nº 91 de 12 de Maio de 2008, (cfr. doc. 3), a parcela acima indicada, foi objecto de expropriação a favor daquela entidade, passando esta a ser a legítima proprietária e não a ora impugnante; que,

III - A impugnante não exerce a posse sobre o prédio, nem pratica actos materiais sobre o mesmo, nem é seu legítimo proprietário, desde 12-05-08; que,

IV - A transferência de propriedade sobre aquela parcela do Prédio, teve lugar em data anterior ao período dos 3 anos previstos na Lei; Logo,

V - Beneficia a Recorrente da isenção prevista por lei, pois a propriedade sobre aquela parcela, transferiu-se em período inferior aos 3 anos, para a esfera patrimonial da LUSOLISBOA, SA;

VI - Ainda que a Recorrente pretendesse proceder à alienação da referida parcela, não a poderia concretizar, dentro do prazo, pois desde 12 de Maio de 2008, que está impedida de o fazer, conforme expropriação verificada; Por outro lado,

VII - A nota de liquidação, no valor de € 59.600,00 (cinquenta e nove mil e seiscentos euros), refere-se à totalidade do prédio em causa, ou seja, 90.840,30 m2 e a área que foi expropriada corresponde a 17.202,00 m2, pelo que a quantia a devolver seria a correspondente a esta, ou seja, € 11. 286,17 (onze mil duzentos e oitenta e seis euros e dezassete cêntimos) = € 59.600 x 17202 m2/90.840,30 m2; Pelo que,

VIII - Ainda que ocorresse uma posse precária e não uma efectiva transmissão de propriedade, o que é facto, que é a Recorrente viu-se impedida de proceder à alienação ou revenda da parcela em tempo e, como tal, beneficiar da isenção de IMT.

IX - Os pressupostos a que alude a norma do artº 7º do CIMT, mantém-se, com vista à isenção de IMT, não se verificando a causa de caducidade da isenção, prevista no artº 11º, nº 5, uma vez que a Recorrente viu-se impossibilitada de revender a parcela do prédio, atenta a expropriação verificada, invocando-se, assim,

X - Que a decisão recorrida determinou erradamente a aplicação do artº 11º, nº 5, do CIMT, devendo aplicar-se apenas a isenção a que alude o artº 7º, do mesmo diploma.

XI - Pelo que, pelos motivos atrás expostos, não se verificou a caducidade da isenção do imposto, devendo,

XII - Ser julgada procedente a impugnação, revogando-se a decisão recorrida condenando-se a Fazenda Pública à devolução de € 11.286,17 (onze mil duzentos e oitenta e seis euros e dezassete cêntimos), acrescida dos juros legais.

Termos em que deverá ser revogada a douta sentença.

Está certa a Recorrente que decidindo deste modo, V. Exas farão a costumada JUSTIÇA! »


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Não foi apresentada contra-alegação.

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A Exma. Procuradora-geral-adjunta emitiu parecer, no sentido da improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

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Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

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# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, encontra-se exarado: «

A. A 01.11.1986 a impugnante declarou início de actividade, encontrando-se registada com o CAE 068312 - Actividades de Angariação Imobiliária [cf. informação do cadastro fiscal a fls. 31 e 32 do PAT em apenso].

B. A 18.07.2006, no Cartório Notarial de Sintra, compareceram os representantes de B………. e da sociedade A……… Limitada, assinando um documento com a epigrafe “compra e venda” do qual consta, nomeadamente, que em nome do primeiro é vendido à segunda o “(...) prédio misto sito no lugar de ………, freguesia de Algueirão-Mem Martins, concelho de Sintra, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o número quatro mil novecentos e quinze, e que se compõe de: a) parte urbana, casa de rés-do-chão com duzentos e vinte metros quadrados, dependência com cento e sessenta e dois virgula trinta metros quadrados e logradouro com vinte e nove mil seiscentos e dezassete vírgula quarenta metros quadrados, e inscrito na matriz sob o artigo 164 com o valor patrimonial de 24.292, 51€; b) parte rústica - terreno de cultura arvense, pinhal, mato e horta com noventa mil oitocentos e quarenta vírgula trinta metros quadrados denominado …………… e inscrito na matriz sob o artigo 70 da Secção J com o valor patrimonial de 872,47€ (…) o preço da transmissão já recebido é de um milhão duzentos e trinta e dois mil euros dos quais cinquenta mil euros respeita à parte urbana e um milhão cento e oitenta e dois mil euros à parte rústica. A compradora destina o imóvel a revenda (…) As transmissões estão isentas do imposto municipal sobre a transmissão onerosa de imóveis ao abrigo do artigo 7.º do respectivo código.” [cf. cópia da escritura de compra e venda a fls. 17 a 20 dos autos].

C. Por despacho n.º 13267-A/2008, de 30.04.2008 do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, das expropriações de parcelas de terreno necessárias à construção da obra da A16-IC16, no qual se inclui o artigo U-164 e o artigo rústico 70, secção J, ambos da freguesia de Algueirão Mem Martins, pela área de 17.202 m2, mais autorizando a concessionária LusoLisboa - Autoestradas da Grande Lisboa, S.A. a tomar posse administrativa das mencionadas parcelas [cf. despacho n.º 13267-A/2008, publicado no Diário da República n.º 91, 2.ª Série, de 12.05.2008, 21278-(2)].

D. Através do ofício do Serviço de Finanças de Sintra 2 foi a impugnante notificada do teor da liquidação de IMT efectuada em resultado da caducidade da isenção do artigo 7.º do CIMT ao abrigo do qual foram adquiridos os artigos U-164 da freguesia de 111102 e R-70, fracção J, freguesia 111102, pelo montante total de €59.600,00 [cf. cópia do ofício a fls. 16 dos autos].

E. A 04.11.2009 compareceu o impugnante no Serviço de Finanças de Sintra 2 e declarou que pretendia pagar o IMT referente à compra identificada em B) supra [cf. cópia da declaração de liquidação modelo 1 de IMT a fls. 16 do processo de reclamação graciosa em apenso].

F. A 04.11.2009 foi emitida a liquidação de IMT em nome da impugnante identificada com o n.º 160409026921403, no montante de € 59.600,00 [cf. cópia do DUC de liquidação a fls. 14 do processo de reclamação graciosa].

G. A 04.11.2009 foi pago o montante supra identificado [cf. vinheta da Tesouraria aposta no DUC de liquidação a fls. 14 do processo de reclamação graciosa].

H. A 13.11.2009 foi pela impugnante apresentada reclamação graciosa contra o acto de liquidação de IMT identificado no ponto anterior [cf. carimbo aposto a fls. 4 do processo de reclamação graciosa em apenso].

I. Por despacho de 26.03.2010 do Chefe de Divisão da Justiça Administrativa foi determinado o indeferimento da reclamação graciosa identificada no ponto anterior [cf. despacho e informações conexas a fls. 34 a 36 do processo de reclamação graciosa em apenso e fls. 13 a 15 dos autos].

J. Através do ofício n.º 026781, de 30.03.2010, da Direcção de Finanças de Lisboa, recebido a 05.04.2010, foi a impugnante notificada da decisão identificada no ponto anterior [cf. ofício a fls. 38 do processo de reclamação graciosa em apenso e fls. 12 dos autos e aviso de recepção assinado a fls. 67 do processo de reclamação graciosa em apenso].

K. A 20.04.2010 foi apresentada a petição inicial que deu origem à presente acção [cf. vinheta dos CTT aposta a fls. 3 dos autos]. »


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A única questão colocada neste apelo reconduz-se à avaliação do julgamento concretizado na sentença recorrida, no sentido de determinar se padece de erro ao decidir julgar improcedente a impugnação judicial, no pressuposto de que se tinha, efetivamente, verificado, como sustentado pelos serviços da autoridade tributária e aduaneira (AT), a causa de caducidade de isenção do IMT, prevista e imposta pelo artigo (art.) 11.º n.º 5 do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT); em concreto, não ter sido vendido um prédio misto, pela sociedade impugnante (dedicada a atividades de angariação imobiliária), nos três anos seguintes à aquisição, efetuada com o propósito de revenda.

Na decisão recorrida, resumidamente, desenvolveu-se o raciocínio de que a pretensão da impugnante, de anular o ato tributário de liquidação, quanto à incidência de IMT sobre uma parcela de 17.202 m2 da parte rústica daquele prédio misto, por, antes do decurso do relevante triénio, haver sido objeto de declaração de expropriação por utilidade pública, com caráter de urgência, tendo a expropriante tomado posse administrativa da mesma, não merecia acolhimento, porque esta “posse era precária, não correspondendo a uma efectiva transmissão de propriedade”, que só ocorreu (ocorre, em geral) “mediante a adjudicação judicial, a que alude o n.º 5 do artigo 51.º do Código de Expropriações”. Se bem alcançamos o sentido desta argumentação, o julgador entende que só com a emissão do despacho previsto no art. 51.º n.º 5 do Código das Expropriações (CdE) (Anexo à Lei n.º 168/99 de 18 de setembro.) e não com o ato de declaração de utilidade pública, se transfere a propriedade dos imóveis para o expropriante, pelo que, in casu,a impugnante não ficou impedida de revender o prédio misto em causa e, em particular, a parcela expropriada, até à conclusão do prazo de três anos sobre a data da aquisição (18 de julho de 2006). Já, nos antípodas, a rte defende que a propriedade sobre a disputada parcela de terreno se transferiu para a esfera patrimonial da sociedade expropriante “em período inferior aos 3 anos”, pelo que, ficou “impedida de proceder à alienação ou revenda da parcela em tempo e, como tal, beneficiar (em definitivo) da isenção de IMT” (usufruída aquando da compra).

Quid iuris?

Além da objetividade do citado art. 51.º n.º 5 (com o complemento, relevante, do n.º 6) do CdE (5 - Depois de devidamente instruído o processo e de efectuado o depósito nos termos dos números anteriores, o juiz, no prazo de 10 dias, adjudica à entidade expropriante a propriedade e posse, salvo, quanto a esta, se já houver posse administrativa, e ordena simultaneamente a notificação do seu despacho, da decisão arbitral e de todos os elementos apresentados pelos árbitros, à entidade expropriante e aos expropriados e demais interessados, com indicação, quanto a estes, do montante depositado e da faculdade de interposição de recurso a que se refere o artigo 52º.

6 - A adjudicação da propriedade é comunicada pelo tribunal ao conservador do registo predial competente para efeitos de registo oficioso.), várias normas que enformam o regime jurídico das expropriações, por utilidade pública, na nossa opinião, apontam, no que tange à matéria em discussão neste recurso, no sentido de, por princípio, se entender que a transmissão da propriedade dos imóveis expropriados (e do correspondente direito de propriedade, enquanto veículo jurídico do gozo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas, designadamente, corpóreas), somente, tem lugar aquando da sua adjudicação judicial, por intermédio de ato do juiz competente, à entidade expropriante, sendo que, só depois da emissão daquele, a adjudicação (e inerente aquisição) da propriedade, a esta, pode ser registada e tornar-se oponível a terceiros.
Assim, estabelecendo um paralelo de comparação com a fase liminar, dos processos expropriativos, da declaração de utilidade pública e autorização de posse administrativa, importa ter presente e valorar que tal proclamação “caduca se não for promovida a constituição da arbitragem no prazo de um ano ou se o processo de expropriação não for remetido ao tribunal competente no prazo de 18 meses” - art. 13.º n.º 3, mesmo a atribuição de caráter urgente à expropriação (que, também, pode caducar), apenas, confere à expropriante “a posse administrativa dos bens expropriados” - art. 15.º n.º 2 e mesmo, nos casos de expropriações urgentíssimas, decorrentes de calamidade pública ou de exigências de segurança interna ou de defesa nacional, o Estado ou as autoridades públicas por este designadas ou legalmente competentes só “podem tomar posse administrativa imediata dos bens destinados a prover à necessidade que determina a sua intervenção”, com dispensa de formalidades prévias - art. 16.º.
Quanto à posse, embora sendo administrativa (no sentido de ser investida administrativamente, na sequência de autorização da entidade (administrativa) competente) (Por contraposição à posse (civilista), prevista e regulada no art. 1251.º segs. do Código Civil (CC).), o que poderia indiciar uma, induzida, força maior, é seguro, por vontade do legislador, não implicar, de forma alguma, a adjudicação da propriedade, sendo, ainda, certo que a mesma não constitui elemento imprescindível para o decurso dos atos e procedimentos de expropriação (quer totais, quer parciais), em virtude de a necessária autorização poder ser concedida em qualquer fase desta, até ao (e/ou no) momento de adjudicação judicial da propriedade. Ainda, uma manifestação de que com a conferência da posse administrativa nenhuma parcela da propriedade do bem expropriado é transferida, está a necessidade incontornável, de regra geral, ter lugar uma vistoria ad perpetuam rei memoriam, destinada, além do mais, a descrever o local, em especial, construções existentes, cujo valor, devido ao proprietário, tem de integrar a justa indemnização a fixar e paga a este, por manter essa qualidade até ao momento da adjudicação da propriedade à expropriante.
Finalmente, com relevo nesta tarefa de identificar o momento da transferência da propriedade dos bens expropriados para a esfera jurídica do expropriante, atente-se em que nas “expropriações por utilidade pública é lícito à entidade expropriante desistir total ou parcialmente da expropriação enquanto não for investido na propriedade dos bens a expropriar”, acrescendo que, “(s)e a desistência da expropriação se verificar após a investidura da entidade expropriante na posse dos bens a expropriar, as partes podem converter, por acordo, o processo litigioso em processo de reversão, previsto nos artigos 74.º e seguintes, através de requerimento conjunto a apresentar em juízo” - cf. art. 88.º n.ºs 1 e 3 do CdE.

Neste ponto, temos de, por um lado, sufragar a decisão recorrida, quanto ao entendimento, em conclusão, no pressuposto de que a propriedade do bem expropriado só se transferiu para a entidade expropriante na data da respetiva adjudicação judicial (Apesar de não se encontrar comprovada, nos factos assentes, é seguro (porque, além do mais, a impugnante não defende o contrário) ter ocorrido após o dia 4 de novembro de 2009.), de não resultar “dos autos que a sociedade impugnante tenha revendido parte ou integralmente o prédio misto identificado em B) dos factos assentes no prazo de três anos, deixaram de estar reunidos os pressupostos para a isenção de IMT, nos termos do artigo 11.º, n.º 5 do CIMT” e, por outro, verificar se o mesmo pode ser condicionado e afastado, pelo argumento aduzido pela rte (de que a propriedade sobre a disputada parcela de terreno se transferiu para a esfera patrimonial da sociedade expropriante, em 30 de abril de 2008 (data do despacho que declarou a utilidade pública da expropriação e autorizou a tomada de posse administrativa), ou seja, antes de decorridos três anos sobre o dia (da aquisição) 18 de julho de 2006, pelo que, ficouimpedida de proceder à alienação ou revenda da parcela em tempo e, como tal, beneficiar (em definitivo) da isenção de IMT).

É evidente que a declaração de utilidade pública de uma expropriação, acompanhada, ainda, ad majorem, de autorização para a tomada de posse administrativa do bem envolvido (totalmente ou em parte), constitui uma inevitável, séria e prática contração dos direitos de qualquer proprietário, destacadamente, no que tange ao pleno e exclusivo exercício das faculdades de uso e fruição das coisas objeto daquela. Por outras palavras, o dono de um imóvel atingido por um ato de expropriação, a partir daquela declaração (e assunção de posse), fica impossibilitado de usar e fruir do mesmo, na medida em que essa atuação conflitue e seja capaz de pôr em causa a prática de atos e procedimentos próprios do processo de expropriação, nomeadamente, a realização de obras que a entidade expropriante tenha de levar a cabo na área/espaço daquele (Como, à semelhança, sucede nos casos de requisição de bens (propriedade privada) imóveis e direitos a eles inerentes, em que o proprietário pode “(u)sar, com os seus trabalhadores e utentes em geral, durante o período de tempo que durar a requisição, o imóvel, mantendo neste a actividade normal, desde que não se mostre incompatível, afecte, impeça ou, por qualquer modo, perturbe a preparação e a realização da actividade a assegurar; - art. 86.º n.º 1 alínea a) do CdE.).
Contudo, tal compressão do direito de propriedade, existente, não encerra eficácia, extensível, ao ponto de impedir o proprietário/expropriado de, em especial, alienar o mesmo, isto é, exercer o seu direito de disposição da coisa/imóvel envolvido, pois, efetiva e legalmente, até ao dia da (eventual) adjudicação judicial da propriedade ao expropriante, aquele continua a deter a condição de titular do direito de propriedade do bem sob expropriação. A única condição a satisfazer, numa hipótese dessas, é a de tornar conhecida, do potencial adquirente, a pendente situação de expropriação, a qual, necessariamente, se transferirá para a propriedade do novo dono.
Poderá argumentar-se que, no comércio imobiliário, a probabilidade da venda de bens em processo de expropriação é residual, ao ponto de, praticamente, impossível. Podendo ser, assim, numa perspetiva económico-financeira, do ponto de vista jurídico essa possibilidade existe, é exequível, pelo que, sempre competirá ao interessado em aproveitar benefícios, entre outros, tributários, ligados à uma concreta impossibilidade de alienação/revenda, alegar e comprovar circunstancialismo fáctico, capaz de demonstrar tal inviabilidade.
Na situação aprecianda, face ao conteúdo dos factos provados, a sociedade impugnante/rte nada demonstrou, como capaz de nos permitir concluir que a não revenda, da parcela de terreno, com a área de 17.202 m2, integrante da parte rústica do prédio misto identificado no ponto B., antes de 18 de julho de 2009, se ficou a dever, direta e necessariamente, à circunstância de, em 30 de abril de 2008, ter sido declarada a sua expropriação por utilidade pública e tomada posse da mesma pela entidade expropriante. Aliás, estando em causa uma expropriação parcial, 17.202 m2 de um total de 90.840,30 m2 (menos de 20%), da parte rústica de um prédio misto (Com a área total (urbana + rústica) de 120.840 m2 (mais de 12 ha).), sendo seu propósito (refirmado com este recurso) a revenda, resulta pouco compreensível (na perspetiva de querer beneficiar da isenção de IMT conferida aquando da aquisição) não ter providenciado pela alienação atempada, cumprindo o espectro de 3 anos (Mesmo a partir da declaração de utilidade pública da expropriação, dispondo de 14 meses e alguns dias.), das parcelas, com áreas enormes, não afetadas pelo ato de expropriação, o que, além de lhe permitir perceber grande parte (cerca de 80%) do montante da isenção, ajudaria numa demonstração de que a parte expropriada não pôde ser vendida por causa desse ónus.
Em suma, ainda que diferenciando e alargando um pouco a perspetiva do tribunal recorrido, confluentemente, entendemos, tal como este (e a AT), que ocorreu a caducidade da isenção, prevista no art. 7.º do CIMT, de que beneficiou a aquisição, feita pela impugnante, do prédio misto, integrante da parcela (rústica) submetida a expropriação por utilidade pública, por virtude de o mesmo (como todo ou amputado da área expropriada) não ter sido, comprovadamente, revendido, nos três anos seguintes ao dia 18 de julho de 2006.

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# III.


Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso.

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Custas pela recorrente.

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[texto redigido em meio informático e revisto]


Lisboa, 17 de fevereiro de 2021. – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.