Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:083/15.9BALSB
Data do Acordão:01/30/2019
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:DECISÃO ARBITRAL
RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
Sumário:I - Nos termos do disposto no n.º 2 do art. 25.º do RJAT, as decisões arbitrais que conheçam de mérito são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, quando estejam em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
II - O RJAT não previu a possibilidade de recurso das decisões dos tribunais arbitrais para o Supremo Tribunal Administrativo por oposição com outras decisões dos tribunais arbitrais, possibilidade que também não resulta do art. 284.º do CPPT.
III - Tal opção legislativa resulta inequívoca da letra da lei (que constitui o princípio e o limite da tarefa hermenêutica, nos termos do art. 9.º, n.º 2, do CC) e da clara opção legislativa relativamente à justiça tributária arbitral, em que a regra é a irrecorribilidade, que só conhece as excepções expressamente previstas na lei.
Nº Convencional:JSTA00070853
Nº do Documento:SAP20190130083/15
Data de Entrada:01/28/2015
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Objecto:DECISÃO DO CAAD
Decisão:NÃO ADMITIR O RECURSO
Área Temática 1:PROCESSO TRIBUTÁRIO
Legislação Nacional:ARTIGOS 25º, N.º 2 DO RJAT E 284º DO CPPT
Aditamento:
Texto Integral: Recurso da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 87/2014-T

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada, invocando o disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpôs recurso da decisão arbitral (A Recorrente também interpôs, ao abrigo do art. 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, impugnação judicial da decisão arbitral para o Tribunal Central Administrativo (TCA) Sul e recurso da mesma decisão para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Neste último, por despacho da Juíza Conselheira relatora de 17 de Junho de 2015 (fls. 493 a 495), a instância ficou suspensa, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º, n.º 1, alínea c) e 279.º do Código de Processo Civil, até ao trânsito em julgado do acórdão a proferir pelo TCA Sul sobre a impugnação da decisão arbitral também objecto do presente recurso.
Em 16 de Julho de 2018, em resposta a ofício deste Supremo Tribunal, o TCA Sul informou que fora proferido acórdão em 23 de Março de 2017 nos autos de impugnação da decisão arbitral (processo n.º 8328/15), no sentido da improcedência da impugnação, enviando cópia do acórdão e informando que este já transitara em julgado (cfr. fls. 519 a 550 dos autos).
Por despacho da Juíza Conselheira relatora de 12 de Setembro de 2018 (cfr. fls. 604), foi determinada a cessação da suspensão da instância.
Por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Novembro de 2018, proferido pela formação a que alude o n.º 5 do art. 150.º do CPTA, decidiu-se «não admitir o […] recurso, por impossibilidade legal do seu objecto, ex vi do disposto no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA» (cfr. fls. 607 a 616). O texto do acórdão está disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8d8d85214f14770f8025834000519955.
Cumpre, pois, apreciar agora o recurso interposto, a título subsidiário, mediante invocação do art. 284.º do CPPT.) proferida em 9 de Dezembro de 2014 pelo Centro de Arbitragem Administrativa – CAAD no processo n.º 87/2014-T (Decisão que pode ser consultada em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPage=51&id=658.) por oposição com a decisão do mesmo tribunal arbitral proferida em 2 de Dezembro de 2013 no processo n.º 101/2013-T (Decisão que pode ser consultada em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPage=25&id=232.).
A Recorrente invoca que os referidos acórdãos arbitrais se encontram em oposição relativamente à questão da dedutibilidade dos encargos financeiros, tendo, a esse propósito, formulado as seguintes conclusões: «[…]

2. QUANTO À SUSCEPTIBILIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO COM FUNDAMENTO EM OPOSIÇÃO DE JULGADOS

VII. A teleologia imanente ao instituto da oposição de julgados é, em primeira linha, a necessidade de salvaguardar a segurança jurídica da parte afectada, permitindo-lhe que, em situações de divergência jurisprudencial, a solução jurídica possa ser reponderada, de modo a assegurar-se a igualdade na aplicação do direito exprimindo-se, em segunda linha, a função orientadora da jurisprudência que cabe aos Tribunais Supremos, conforme descrita na Conclusão I [(Na conclusão I. a Recorrente disse: «Ao RJAT é subsidiariamente aplicável o regime do recurso de revista previsto no artigo 150.º do CPTA, que encontra o seu fundamento na função “orientadora” da jurisprudência que cabe aos Tribunais Supremos, conferindo-se, deste modo, coerência e coesão a um corpo jurisprudencial denso e complexo que tenderia, naturalmente, para a desagregação».)].

VIII. As razões subjacentes ao recurso por oposição de julgados justificam a existência de uma lacuna legal patente, no artigo 25.º do RJAT, que deverá ser integrada através da admissão da possibilidade de recurso por oposição de julgados, tendo como “decisão fundamento” uma decisão arbitral proferida no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa. Pois, não só o artigo 25.º do RJAT demonstra a existência de preocupação do legislador com a salvaguarda da segurança jurídica e da igualdade e com a unidade e coerência da jurisprudência arbitral, como são aqui aplicáveis, mutatis mutandis, os fundamentos referidos na Conclusão III [(Na conclusão III. a Recorrente disse: «III. Para além disso, atentos os fundamentos do recurso de revista das decisões dos Tribunais Centrais Administrativos, o espírito subjacente a estes implica que, por interpretação extensiva, sejam igualmente abrangidas pelo artigo 150.º do CPTA as decisões arbitrais proferidas pelo Centro de arbitragem administrativa.
a. Desde logo porque, à semelhança das decisões proferidas pelos Tribunais Centrais administrativos, as decisões arbitrais não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário.
b. A jurisprudência dos tribunais arbitrais a funcionar junto do Centro de Arbitragem Administrativa tem hoje um papel fundamental no desenvolvimento do direito e da justiça tributária.
c. Os tribunais arbitrais são uma categoria de tribunal, sendo considerados órgãos jurisdicionais pela Lei e, também, pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, pelo que as suas decisões produzem um impacto no sistema de justiça tributário não inferior ao de uma decisão proferida no âmbito de um tribunal administrativo e fiscal.
d. O desfasamento temporal das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais a funcionar junto do Centro de Arbitragem Administrativa, face às decisões transitadas em julgado dos tribunais administrativos e fiscais (em especial, dos Tribunais Centrais Administrativos e do Supremo Tribunal Administrativo), levou a que os referidos tribunais arbitrais estejam a produzir decisões sobre matérias inovadoras sobre as quais os tribunais administrativos e fiscais superiores só se pronunciarão dentro de alguns anos».)].

IX. Igualmente, verifica-se, que, no domínio do mesmo quadro normativo (artigo 23.º do Código do IRC) e factual (dedutibilidade de gastos financeiros relativos ao mesmo financiamento, deduzidos pelo mesmo contribuinte, nos exercícios de 2008 e 2009), existe uma contradição de julgados.

X. Efectivamente, a Decisão Arbitral Fundamento adoptou a perspectiva (defendida pela Recorrente) de que a dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros em causa deve ter por referência o momento em que o financiamento ocorreu, em frontal oposição com a Decisão Arbitral Recorrida que considera relevante o momento posterior à fusão, quando tais encargos são deduzidos.

XI. Entende, assim, a Recorrente que estão reunidos os pressupostos processuais para se considerar a existência de uma contradição de julgados, susceptíveis de fundamentar o recurso para este Tribunal, com fundamento em oposição de julgados.

[…]».
Juntou parecer subscrito pelo Professor Rui Duarte Morais (cfr. fls. 450 a 472), no qual se sustenta, designadamente, a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência relativamente a oposição surgida entre decisões arbitrais.

1.2 A Recorrida contra-alegou, sendo que, relativamente a este recurso, sustentou a não admissibilidade do recurso, com conclusões do seguinte teor: «[…]

S. Quanto ao Recurso por oposição de julgados de decisões arbitrais, o RJAT não prevê no artigo 25.º do RJAT, a admissibilidade de recursos por oposição de julgados de decisões arbitrais.

T. Pelo que carece de fundamento legal a admissibilidade do meio de recurso em questão.

U. Por outro lado e sem conceder, nunca se verificariam os pressupostos de admissibilidade do recurso de oposição de julgados constantes do artigo 284.º do CPPT, nomeadamente, identidade substancial das situações fácticas em confronto, e divergência de soluções quanto à mesma questão de direito.

V. Na medida em que a decisão fundamento sustenta-se no momento temporal de aferição da relevância dos custos no interesse da Requerente;

W. Ao passo que a decisão ora Recorrida, decide tendo por base a falta de demonstração da indispensabilidade dos custos/gastos imposto para efeitos fiscais pelo artigo 23.º do CIRC, dado faltar a necessária afectação dos custos ao interesse empresarial e actividade produtiva próprios da Requerente.

X. Pelo que não existe identidade não só de facto, mas de direito.

Y. Ainda assim, à cautela, não poderia ser admissível a dedutibilidade dos encargos financeiros, porquanto os gastos indispensáveis devem corresponder àqueles contraídos no interesse da empresa.

Z. Sucede que a Recorrente não demonstrou a dedutibilidade de tais gastos.

AA. Por outro lado, como refere e bem a douta decisão arbitral, o facto de certos encargos financeiros serem fiscalmente dedutíveis anteriormente no âmbito da determinação da matéria colectável de uma certa sociedade não significa que o sejam necessariamente nos mesmos termos no âmbito da sociedade que por fusão incorporou aquela.

BB. Não excluindo, a necessidade de demonstrar que o financiamento se mantém alocado à mesma finalidade».

1.3 O Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que o recurso não deve ser admitido, com a seguinte fundamentação:

«[…] A nosso ver o presente recurso por oposição de julgados não é admissível.
Resulta do preâmbulo do DL 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o RJAT, a regra geral da irrecorribilidade das decisões arbitrais.
Tal regra decorre da própria Lei de autorização legislativa (artigo 124.º/ h) da Lei 3-B/2010, de 20 de Abril).
Não obstante, de jure condito, da decisão arbitral cabe recurso para o TC ou STA, nos termos do estatuído no artigo 25.º do RJAT.
Cabe, ainda, impugnação da decisão arbitral nos termos do disposto nos artigos 27.º e 28.º do RJAT.
No caso em que o Tribunal Arbitral seja a última instância de decisão de litígios tributários, a decisão é susceptível de reenvio prejudicial em cumprimento do estatuído no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
É este o regime dos recursos das decisões arbitrais em matéria tributária.
Como refere Carla Castelo Trindade, em Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, anotado, 2016, página 472 “O legislador deu ao contribuinte duas hipóteses de escolha: ou intenta acção pelos meios tradicionais, ou recorre à arbitragem. Se o contribuinte opta por esta segunda via, sabe de antemão que não terá possibilidade de recorrer ou impugnar a decisão arbitral – excepto nos casos previstos nos artigos 25.º e 27.º – e aceita os riscos inerentes à escolha que tomou.
Por estas razões, não se vislumbra qualquer tipo de violação constitucional na regra da irrecorribilidade, nem sequer de injustiça ou desigualdade. E, aliás, como constata LOPES DE SOUSA – contra si advogando – a regra da irrecorribilidade é «abstractamente neutra, pois tanto priva dele o contribuinte como a Fazenda Pública» e «de forma semelhante, o défice de imparcialidade, se, eventualmente, vier a ocorrer, tanto pode ser desfavorável ao contribuinte como à Administração Tributária”.
O Pleno da SCT do STA já se pronunciou no sentido de as decisões do CAAD, em matéria tributária, não serem recorríveis, nomeadamente através do recurso por oposição de acórdãos regulado no artigo 284.º do CPPT (acórdão do PLENO da SCT do STA, de 25/01/2017-P. 0862/16, disponível em www.dgsi.pt).
Pode ler-se nesse aresto o seguinte: “Na verdade, a possibilidade de impugnação das decisões do CAAD esgota-se nos meios previstos naqueles artigos 25.º, 27.º e 28.º, não sendo admissível a utilização dos meios processuais recursivos previstos no CPPT para as decisões dos tribunais tributários proferidas no âmbito do processo judicial tributário, nomeadamente, o recurso previsto no artigo 284.º do CPPT.

Aliás, e como bem se percebe da leitura do disposto nos artigos 25.º e 27.º acima referidos o recurso previsto para o STA, e a impugnação que for dirigida ao TCA, encontram a sua regulamentação nestes preceitos legais e ainda nas regras do CPTA referentes ao recurso de uniformização de jurisprudência e ao recurso de apelação, e já não nas regras dos recursos previstos no CPPT.
De igual modo já este Supremo Tribunal ponderou no acórdão datado de 27.05.2015, recurso n.º 01033/14, a inadmissibilidade legal de outras espécies de recursos além daqueles que se encontram taxativamente previstos nas normas em apreço.
Sendo, por natureza, as decisões do CAAD em matéria tributária irrecorríveis e inimpugnáveis, tal como se lê do preâmbulo do referido DL n.º 10/2011, tendo em conta a razão de ser da sua criação, excepto nos casos especialmente previstos, cfr. arts. 25.º e 27.º do RJAT, não faria qualquer sentido que se abrisse a porta ao uso dos recursos expressamente previstos para os processos judiciais tributários, uma vez que, nesse caso, estar-se-ia a permitir uma segunda instância de recurso/impugnação, assim se defraudando a razão de ser que justifica a existência da arbitragem tributária”.
Parece, pois, que não é admissível recurso por oposição de decisões arbitrais em matéria tributária».

1.4 Cumpre apreciar e decidir, sendo que, antes do mais, cumpre conhecer a questão da admissibilidade do presente recurso.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DO RECURSO DA DECISÃO ARBITRAL PARA O SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO – SUA INADMISSIBILIDADE

Diz o n.º 2 do art. 25.º do RJAT: «A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo». Ou seja, só há recurso da decisão arbitral para o Supremo Tribunal Administrativo por oposição de julgados quando aquela decisão esteja em oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com um acórdão proferido por um tribunal tributário estadual de hierarquia superior, isto é, um dos tribunais centrais administrativos (Norte e Sul) ou o Supremo Tribunal Administrativo.
É o que resulta inequivocamente da letra da lei que, não sendo o único elemento a considerar na tarefa hermenêutica, é o que constitui o seu ponto de partida e «[c]omo tal cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer “correspondência” ou ressonância nas palavras da lei» (J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 182. O mesmo Autor, na pág. 189, explicita: «A letra (o enunciado linguístico) é, assim o ponto de partida. Mas não só, pois exerce também a função de um limite, nos termos do art. 9.º, n.º 2: não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) “que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. Pode ter de proceder-se a uma interpretação extensiva ou restritiva, ou até porventura a uma interpretação correctiva, se a fórmula verbal foi sumamente infeliz, a ponto de ter falhado completamente o alvo. Mas, ainda neste último caso, será necessário que do texto “falhado” se colha pelo menos indirectamente uma alusão àquele sentido que o intérprete venha a acolher como resultado da interpretação».), como resulta do disposto no n.º 2 do art. 9.º do Código Civil.
Cumpre aqui recordar que a possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo das decisões proferidas em sede de arbitragem tributária não estava sequer prevista na autorização legislativa constante da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, que aprovou o Orçamento do Estado para 2010 (O art. 124.º, n.º 1, alínea h), da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, diz: «A consagração, como regra, da irrecorribilidade da sentença proferida pelo tribunal arbitral, prevendo a possibilidade de recurso, para o Tribunal Constitucional, apenas nos casos e na parte em que a sentença arbitral recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade ou aplique norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada».), e apenas foi introduzida no RJAT para os casos de contradição entre as decisões arbitrais e acórdãos proferidos por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo próprio Supremo Tribunal Administrativo, na sequência do debate na Assembleia da República (Sobre a questão, desenvolvidamente, CARLA CASTELO TRINDADE, ob. cit., pág. 483. ).
Pode concordar-se ou não com a opção legislativa, mas, a nosso ver, não há dúvida de que, como resulta do seu art. 25.º, n.º 2, do RJAT, as decisões arbitrais que conheçam de mérito são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo apenas quando estejam em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (Neste sentido, também JORGE LOPES DE SOUSA, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, págs. 230/233. ).
Aliás, já assim decidiu este Supremo Tribunal (Vide, em situação em tudo idêntica, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Novembro de 2018, proferido no processo n.º 164/18.7BALSB, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3a440761d7e89c5780258359004e9cd4.) e é numerosa a jurisprudência no sentido de apenas conhecer dos recursos de decisões arbitrais nos casos em que a lei expressamente prevê esses meios de reacção e lhe defere competência para o efeito (Vide também os acórdãos, uns do Pleno, outros da formação do n.º 5 do 150.º do CPTA, da mesma Secção:
- de 2 de Dezembro de 2015, proferido no processo n.º 180/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8f5455db06aad09180257f17004d5164;
- 14 de Maio de 2015, proferido no processo n.º 359/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/69f538ae4fdacfc780257e490056e4b9;
- de 27 de Maio de 2015, proferido no processo n.º 1033/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d9ac61be8ce794ee80257e57003a8869;
- de 20 de Janeiro de 2016, proferido no processo n.º 726/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3ea5bfcf33ebc94f80257f4e004b963e;
- de 16 de Março de 2016, proferido no processo n.º 275/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8d253facda5da0b880257f8b003d6842;
- de 20 de Abril de 2016, proferido no processo n.º 243/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/956c788cad9b34f780257fa2004b7063;
- de 16 de Novembro de 2016, proferido no processo n.º 650/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b1b47d2e95afe3dd80258073004f2a57;
- de 25 de Janeiro de 2017, proferido no processo n.º 862/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/abac776d16093945802580c100352d38;
- de 3 de Maio de 2017, proferido no processo n.º 1334/16, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/25ce510a2e107ffa80258122004a118b;
- de 7 de Novembro de 2018, proferido nos presentes autos, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8d8d85214f14770f8025834000519955.).
Por outro lado, o recurso previsto no art. 284.º do CPPT não só está previsto apenas para os acórdãos proferidos em processos judiciais tributários previsto naquele Código [cfr. art. 279.º, n.º 1, alínea a)], como também dele resulta que apenas existe para dirimir a oposição entre esses acórdãos e os anteriores que sejam proferidos em processos judiciais.
Assim, parafraseando o aresto que nestes autos já julgou inadmissível o recurso ao abrigo do art. 150.º do CPTA, também agora diremos, relativamente ao recurso interposto ao abrigo do art. 284.º do CPPT, que, perante a manifesta e inequívoca vontade do legislador de consagrar como regra a da irrecorribilidade da decisão arbitral, não se vê como curial, adequado ou sequer possível sem quebra da legalidade, que, por mera via jurisprudencial, em substituição do legislador, este Supremo Tribunal possa admitir recurso por oposição de acórdãos arbitrais.
Por tudo quanto deixámos dito, o recurso não será admitido.


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2.2 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Nos termos do disposto no n.º 2 do art. 25.º do RJAT, as decisões arbitrais que conheçam de mérito são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, quando estejam em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.

II - O RJAT não previu a possibilidade de recurso das decisões dos tribunais arbitrais para o Supremo Tribunal Administrativo por oposição com outras decisões dos tribunais arbitrais, possibilidade que também não resulta do art. 284.º do CPPT.

III - Tal opção legislativa resulta inequívoca da letra da lei (que constitui o princípio e o limite da tarefa hermenêutica, nos termos do art. 9.º, n.º 2, do CC) e da clara opção legislativa relativamente à justiça tributária arbitral, em que a regra é a irrecorribilidade, que só conhece as excepções expressamente previstas na lei.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em pleno, acordam em não admitir o presente recurso.

Custas pela Recorrente.

Comunique-se ao CAAD.


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Lisboa, 30 de Janeiro de 2019. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes.