Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01613/16.4BEPRT
Data do Acordão:07/13/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IMPOSTO DE SELO
ISENÇÃO DE IMPOSTO DE SELO
COOPERATIVA
Sumário:Só depois do aditamento do n.º 14 ao artigo 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais pelo artigo 170.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março é que as Cooperativas ficaram isentas de imposto de selo referente à referida verba 28 e enquanto esta se manteve.
Nº Convencional:JSTA000P28031
Nº do Documento:SA22021071301613/16
Data de Entrada:05/14/2019
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:SACHE – SOLIDARIEDADE E AMIZADE, COOPERATIVA DE HABITAÇÃO ECONÓMICA, CRL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório

1.1. O REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou totalmente procedente a impugnação judicial da liquidação de imposto de selo do ano de 2015, efetuada em 2016/04/05, a que se reporta a nota de cobrança com o n.º 2016 001636984, sendo o montante total da colecta de € 56.830,20.

Impugnação esta que tinha sido deduzida por SACHE – SOLIDARIEDADE E AMIZADE, COOPERATIVA DE HABITAÇÃO ECONÓMICA, CRL, contribuinte fiscal n.º 500 793 190, com sede na Rua das Andresas, n.º 324, r/c, Sala 02, 4100-051 Porto.

O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificado da sua admissão, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…)

A. O presente recurso é interposto contra a sentença que declarou procedente a impugnação deduzida por Sache – Solidariedade e Amizade, Cooperativa de Habitação Económica, CRL, anulando a liquidação impugnada de Imposto do Selo referente ao ano de 2015 no montante global de € 56.830,20.

B. Está em causa a questão da aplicação às cooperativas da verba 28 da TGIS, para o que releva a introdução do quadro legal resultante Lei nº 55-A/2012, de 29/10, e da Lei nº 66-B/2012, de 31/12.

C. Quando o legislador veio aditar a verba 28 à TGIS viu-se obrigado a alterar a redação do artigo 1.° CIS acrescentando aos "atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos", as "situações jurídicas".

D. As novas "situações jurídicas" que o legislador tributa em sede de imposto do selo com a introdução da nova verba são a "propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1.000.000".

E. Quando se lê no Preâmbulo do CIS que "A reforma de 2000 marcou uma tendência para a alteração de uma das suas mais ancestrais características, que de imposto sobre os documentos se tende a afirmar cada vez mais como imposto sobre as operações que, independentemente da sua materialização, revelem rendimento ou riqueza" constata-se que a nova verba introduzida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, não reflete a anterior preocupação de fazer incidir "imposto sobre os documentos" e também não traduz a nova tendência aí apontada que vê o imposto do selo "como imposto sobre as operações".

F. Temos, assim, que esta norma de incidência (objetiva) não visa documentos ou operações, antes, preocupa-se em tributar ''situações jurídicas" estáticas, incidindo o imposto sobre o valor patrimonial dos imóveis, em tudo semelhante ao CIMI, mas sem que a receita obtida reverta a favor dos municípios. Essa maior aproximação com os princípios e regras presentes no CIMI faz com que o legislador para este remeta quando em causa esteja a aplicação da Verba 28.

G. Essa proximidade é tão mais notória quando se observa que o aditamento do n.º 6 ao artigo 7.º do CIS, ex vi artigo 3.º da Lei 55-A/2012, prescreve que "São ainda aplicáveis às situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral as isenções previstas no artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais", preceito este que enuncia isenções em sede de imposto municipal sobre imóveis.

H. Este regime jurídico especialmente criado, numa conjuntura económica própria, justifica que o legislador tenha criado uma solução única, no que resultou, relativamente à isenção prevista no n.º 12 do artigo 66-A do EBF - "os atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens" -, que o legislador nem tenha procedido do mesmo modo que o fez relativamente à alteração da redação efetuada no artigo 1.° CIS, onde acrescentou aos "atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos", as "situações jurídicas", nem tenha expressamente previsto no artigo 7.º do CIS a aplicação da isenção, e consequente afastamento da norma de incidência da verba 28, às realidades enunciadas no artigo 66.º-A, a exemplo do que fizera com o artigo 44.º do EBF.

I. Assim, resulta de todo o exposto que, é forçoso concluir, as cooperativas estão sujeitas e não isentas de IS da verba 28 da TGIS."

J. O objecto da presente impugnação judicial consiste na liquidação de Imposto do Selo referente a 2015, relativa ao artigo urbano inscrito sob o nº ……… (ex art ………) da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos, no valor de € 56.830,20, requerendo a impugnante a sua nulidade.

K. Em 31/12/2015 a impugnante consta como proprietária do prédio urbano inscrito na respetiva matriz predial da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos sob o artigo nº …….. e, por consulta à matriz predial, verifica-se que o imóvel tem o valor patrimonial tributário de € 5.683.020,38, com afetação habitacional, pelo que está sujeito a imposto do selo da verba 28.1 da tabela geral.

L. Nos termos do nº 4 do art.º 2.º do Código do Imposto do Selo (CIS), estão sujeitos ao imposto do selo previsto na verba 28.1 da tabela geral os proprietários, em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeitar, de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante na matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 por prédio com afetação habitacional, aplicando-se a taxa de 1%.

M. Como se vê, literalmente, o legislador, no artigo 66º-A, nº 12 do EBF, não isenta as cooperativas de IS sobre os "papéis" e "situações jurídicas" que inclui na norma de incidência, o que demonstra que não foi intenção sua isentar as cooperativas de todo o imposto do selo.

N. Acresce ainda que, nos termos do nº 6 do art.º 7º do Código do Imposto do Selo (ex vi artigo 3.º da Lei 55-A/2012), às situações previstas na Verba 28 da Tabela Geral só são aplicáveis as isenções previstas no art.º 44º do EBF.

O. Atualmente, com o “novo” art. 66º-A, nº 12, do EBF, ficaram isentos do imposto do selo todos os factos abrangidos por esse imposto, nos termos do art. 1º, nº 1, do Código do Imposto do Selo, desde que, nos termos do art. 3º, devessem ser as cooperativas a suportar o respetivo encargo.

P. No entanto, até à entrada em vigor da Lei nº 55-A/2012, a tributação em Imposto do Selo não abrangia qualquer situação jurídica estática, entendida no sentido de situação que não depende diretamente de qualquer conduta do obrigado tributário.

Q. Nessa medida, o mencionado art. 1º, nº 1, do Código do Imposto do Selo passou a referir, em vez de apenas "outros factos", a expressão "outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral".

R. Ficou legalmente determinado, assim, que a “situação jurídica” (estática) de proprietário a 31 de dezembro de cada ano, de que resulta o encargo do imposto do selo das cooperativas, seja considerada fundamento para a liquidação do imposto.

S. O sentido decisivo do nº 12 do artigo 66º-A do EBF, deve, assim, ser fixado com base numa interpretação declarativa, em que o sentido literal que o texto direta e claramente comporta deve ser assumido como cabendo no pensamento legislativo.

T. As realidades previstas pelo legislador no nº 12 do artigo 66.º-A do EBF - "atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens" - e no n.º 1 do artigo 1. º do CIS (até à redação dada pela Lei n. º 55-A/2012, de 29 de outubro) - "atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens" – coincidem.

U. Ou seja, a necessidade demonstrada, pelo legislador, em inserir as "situações" previstas na verba 28 TGIS demonstra que as realidades que se procuraram disciplinar são completamente novas, nunca tendo sido objeto de sujeição em sede de imposto do selo e consequente isenção, quer seja no CIS, quer seja no artigo 66. º - A do EBF.

V. Essa necessidade de prever uma nova realidade, até aí não sujeita, e, consequentemente, também não isenta, é ainda demonstrada pelo artigo 7.º do CIS [no n.º 6] com a inclusão, nele expressamente feita, das situações previstas na verba 28 da Tabela Geral, e a aplicação a estas, apenas e só, das isenções previstas no artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, reforçando a natureza especial e excecional da medida, não devendo aproveitar a isenção subjetiva genérica inclusa no artigo 6. º do CIS (Aditado pela Lei n.º 55-A/2012 - 29/10).

W. Tal significaria uma desnecessária, e, até, inútil previsão legal, no referido artigo 7º, nº 6, se se considerasse à partida que a isenção subjetiva do artigo 6º tudo abarcaria.

X. Acresce ainda o facto de que, em matéria de benefícios fiscais, o legislador vincou, desde logo, no próprio Preâmbulo do EBF - marca característica dos benefícios fiscais -, o seu caráter obrigatoriamente excecional, devendo a concessão dos benefícios fiscais, que mais não são do que despesas fiscais por determinação legal expressa, ser ainda mais cuidada, dado que "as receitas são postas em causa com a concessão de benefícios, quando o País tem de reduzir o peso do défice público"

Y. E não parece, constituindo os benefícios medidas de caráter excecional instituídas para a tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores ao da própria tributação, que devam as cooperativas gozar de uma prerrogativa em sede de I.S. que noutros impostos não têm e que legitimem essas medidas que, de outro modo, seriam discriminatórias e, nessa medida, inconstitucionais por violação do artigo 13.º da C.R.P."

Z. Com a ressalva do sempre devido respeito, que é muito, a Fazenda Pública considera que a douta sentença, ao decidir como decidiu, encontra-se afectada por erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciado na errada interpretação e aplicação do disposto nos art. 1º, nº 1, 2º, nº 4, 3º, nº 3 al u), 4º, nº 2 e 6, 5º, al u) e 23º, nº 7 do CIS, art. 22º, nº 1 do CIS e Verba 28 da TGIS, art. 7º do CIS e 44º do EBF, art. 66º-A EBF, art. 8º e 113º, nº 1 do CIMI, e art. 13º CRP, pelo que a mesma deverá ser revogada e substituída por decisão que declare a Impugnante sujeita e não isenta de Imposto do Selo por aplicação às cooperativas da verba 28 da TGIS (art. 22º, nº 1 CIS).».

Pediu fosse concedido provimento ao recurso e fosse anulada a sentença recorrida, com as consequência legais.

A Recorrida apresentou contra-alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

1. A Recorrida é uma Cooperativa de Habitação Económica que tem por objeto principal a aquisição de fogos para a habitação dos associados, bem como a sua reparação e remodelação, e/ou a aquisição de terre-nos para edificação de fogos que, posteriormente, são vendidos aos co-operantes.

2. O prédio sujeito a tributação – à data inscrito sob o artigo urbano ………, da união de freguesias de Lordelo do Ouro e Massarelos – estava descrito na matriz como “terreno para construção” e tinha, e tem ainda, por finalidade os fins estatutários, estando, por via disso, não sujeito a tributação em sede de IMI.

3. Atualmente, este prédio encontra-se inscrito sob o artigo ………., da união de freguesias de Lordelo do Ouro e Massarelos e em regime de propriedade horizontal, sendo constituído por 8 edifícios destinados a habitação, a lugares de estacionamento e a estabelecimentos de serviços, compostos por 74 frações destinadas a habitação e 4 frações destinadas a serviços, num total de 78 frações autónomas.

4. Sem prejuízo da AT alegar que o prédio tinha afetação habitacional, à data das liquidações não havia sido emitida a licença de utilização, estando assim no campo das potencialidades e expetativas, sendo certo que esta podia, inclusive não ser emitida. Para além do facto da tributação ter de incidir sobre situações presentes e não futuras, a edificação e respetivo licenciamento incluiu frações destinadas a serviços, logo, sem afetação habitacional.

5. O n.º 6, do art.º 7.º do CIS, estabelece que «são ainda aplicáveis às situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral as isenções previstas no art.º 44.º do EBF».

6. A intenção legislativa que está na origem da norma do n.º 6 do art.º 7.º do Código do IS, é a de alargar às situações abrangidas pelo art.º 44.º do EBF, que contempla apenas a isenção de IMI, a isenção da verba 28.1 da TGIS.

7. Do n.º 6, do art.º 7.º do CIS, não decorre que apenas subsistem as isenções do art.º 44.º do EBF; antes coloca em evidência que outras isenções subsistem, como é o caso da isenção prevista no n.º 12, do art.º 66.º-A do EBF, que versa especificamente sobre a isenção de imposto de selo.

8. Se a intenção legislativa tivesse sido a de retirar a isenção de IS relativamente à verba n.º 28 da Tabela não poderia deixar de estabelecer essa restrição no lugar próprio, ou seja, no mesmo art.º 66.º-A do EBF.

9. A intenção do n.º 6, do art.º 7.º do CIS, foi manifestamente a de alargar e não a de restringir o âmbito de isenção. Na verdade, graças a essa norma, entidades não isentas de imposto de selo passaram a estar isentas relativamente à verba 28.1 da TGIS, o que sem ela não sucederia.

10. Salienta-se o n.º 3, do art.º 9.º do CC.: “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”).

11. A Recorrida está isenta do pagamento de Imposto de Selo sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens, quando esse imposto constitua seu encargo, nos termos do disposto no n.º 12, do art.º 66.º-A do EBF.

12. A revisão do regime de benefícios fiscais às cooperativas inseriu-se num conjunto de reformas fiscais que teve em vista a eliminação de regimes especiais de tributação e de regimes de isenção. O que restou do Estatuto Fiscal Cooperativo (EFC) no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) foi o núcleo duro dos benefícios fiscais às cooperativas, ou seja, os benefícios sem os quais deixaria de fazer sentido um regime de tributação mais favorável a estas entidades.

13. Não faria sentido que o legislador, na vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF), tivesse alterado o regime fiscal das cooperativas através da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, e, com a introdução da verba 28.1 da TGIS, através da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, ou seja, em menos de um ano, viesse fazer das cooperativas sujeitos passivos numa situação específica como era a prevista na verba 28.1 da TGIS.

14. Ao contrário do defendido pela Recorrente, o legislador não viu necessidade de repetir no CIS o que já resultava da norma genérica prevista no n.º 12, do art.º 66.º-A do EBF, daí não ter feito referência expressa, nesse artigo, à verba 28.1 da TGIS. No entanto, após a posição assumida pela AT e de muitas decisões jurisprudenciais sobre o assunto, através da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que aprova o orçamento de Estado para o ano de 2016, vem deixar clara a sua posição sobre o tema, prevendo expressamente no n.º 14, do art.º 66.º-A do EBF: “As cooperativas de habitação e construção estão isentas de imposto do selo previsto na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.”.

15. O legislador, através da Lei n.º 55-A/2012, pretendeu apenas regular uma fórmula de consolidação orçamental para o ano de 2012. Esta norma de incidência (objetiva) respeitava ao imposto sobre o valor patrimonial dos imóveis, em tudo semelhante ao CIMI, mas sem que a receita obtida revertesse a favor dos municípios.

16. Quanto à inserção do art.º 66.º-A no EBF, o legislador pretendeu que as cooperativas ficassem isentas de imposto de selo em todos os factos sujeitos a tributação nessa sede e que constituíssem seu encargo, até porque, como defende a Recorrente, a passagem do EFC ao EBF representou, em matéria de imposto de selo, um alargamento das categorias de situações abrangidas pela isenção.

17. É certo que o n.º 1, do art.º 1.º do CIS, na redação da Lei n.º 55-A/2012, passou a incluir a expressão «situações jurídicas» e o n.º 12, do art.º 66.º-A do EBF, não possui essa expressão – porque como já alegado, o legislador não viu necessidade de se repetir nessa norma – mas tal não significa o afastamento da isenção das cooperativas a essa específica verba de imposto de selo. Essa opção linguística não pode ter a interpretação defendida pela AT, nem fazia qualquer sentido, quer pelo curto espaço de tempo decorrido desde a revisão do regime de benefícios fiscais das cooperativas, na vigência do PAEF e do seu alargamento, quer pelo facto do legislador aplicar a isenção a todas as entidades previstas no art.º 44.º do EBF [ou seja, não fazia sentido isentar essas entidades e excluir dessa isenção as cooperativas que sempre beneficiaram de um estatuto fiscal privilegiado (como era o EFC e passou a ser o art.º 66.º-A do EBF)].

18. Já quanto à incidência subjetiva, a Recorrente alega que, com a Lei n.º 55-A/2012, foi também aditado o n.º 4 ao art.º 2.º, estabelecendo-se aí que, nas situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral, são sujeitos passivos do imposto os referidos no art.º 8.º do CIMI.

19. Ora, sem prejuízo de, a 31 de dezembro de 2015, a Requerida constar como proprietária do prédio e ser sujeito passivo, está isenta do pagamento de IMI, nos termos do disposto no n.º 9, do art.º 66.º-A do EBF. Essa é outra razão pela qual só se pode entender que a isenção prevista no n.º 12, do art.º 66.º-A do EBF, abrange a tributação prevista na verba 28.1 da TGIS, porquanto trata da tributação de um facto jurídico consubstanciado na titularidade de um direito real sobre um bem imóvel com determinadas características em 31 de dezembro de cada ano, não fazendo qualquer sentido que uma cooperativa beneficiasse de isenção de IMI no que respeita aos imóveis de que é proprietária e não ficasse isenta da verba 28.1 da TGIS, atentos os seus fins estatutários.

20. A expressão “situações jurídicas” prevista no n.º 1, do art.º 1.º do CIS, na redação da Lei n.º 55-A/2012, não tem a virtualidade de afastar da isenção da verba 28.1 da TGIS as cooperativas que, em regime próprio e mais favorável, beneficiam de isenção de imposto de selo sobre os atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens, quando este imposto constitua seu encargo.

21. Os argumentos da Recorrente, salvo o devido respeito, não têm cabimento legal, nem podem ter procedência. Na verdade, para os que não a tinham como clara, a intenção do legislador ficou expressa através da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que aprova o orçamento de Estado para o ano de 2016, prevendo expressamente no n.º 14, do art.º 66.º-A do EBF: “As cooperativas de habitação e construção estão isentas de imposto do selo previsto na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.”, e fê-lo sem distinguir se está em causa uma “situação jurídica estática” ou outra qualquer!

22. Não incorreu, assim, o digníssimo Tribunal “a quo” em erro de julgamento sobre a matéria de direito ou na errada interpretação ou na violação de qualquer disposição legal!

23. Apesar da revogação do Estatuto Fiscal Cooperativo, foi intenção do legislador manter os benefícios fiscais atribuídos às Cooperativas, designadamente os que se reportam a IRC, IMI, IMT e IMPOSTO DE SELO, pelo que aditou o art.º 66.º-A no Estatuto dos Benefícios Fiscais.

24. No n.º 9 da supra citada norma legal, ficou estabelecida a isenção subjetiva das Cooperativas quanto a IMI e, no n.º 12, quanto a IMPOSTO DE SELO.

25. O ato tributário em apreço enferma assim de ilegalidade, como bem decidiu o digníssimo Tribunal “a quo”, pelo que tal decisão não merece qualquer censura, devendo ser confirmada.».

1.2. Remetidos os autos a este tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto lavrou douto parecer, onde formulou a seguinte conclusão:

«O recurso merece provimento.

A sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão com o seguinte dispositivo:

- declaração de inaplicação da isenção estabelecida no art.66º-A nº12 EBF à situação de tributação prevista na verba 28.1 TGIS (redação da Lei nº 83-C/2013,31 dezembro)

- devolução do processo ao tribunal recorrido para apreciação da questão prejudicada pela solução da questão da isenção».

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Dos fundamentos de facto

Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: «(...)

1) Em 05-04-2016 foi emitida liquidação de I.S., relativa ao ano de 2015 e ao artigo urbano inscrito sob o nº ……… (ex art ……….) da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos da qual consta o seguinte:

- Identificação do prédio: 131218 – Lordelo do Ou – U – 00………

- Verba da TGIS: 28.1

- Valor patrimonial (€): 5.683.020,38

- Taxa (%): 1,00

- Colecta (€): 56.830,20

- Fls. 16 dos autos aqui reproduzida.

2) Em 31-12-2015 a impugnante, “Sache – Solidariedade e Amizade, Cooperativa de Habitação e Económica, CRL, NIF 500793190” consta como proprietária do prédio urbano inscrito na respetiva matriz predial da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos sob o artigo nº ……….. – Cfr. PA apenso;

3) O prédio referido no ponto 1) é um terreno para construção. - Fls 17 e 18. ».



3. Dos fundamentos de Direito

Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou totalmente procedente a impugnação judicial da liquidação de imposto de selo referente ao ano de 2015, no valor de € 56.830,20, decorrente da aplicação da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo, ao prédio com o artigo matricial n.º ………., da freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos, concelho do Porto, anulando essa liquidação.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente Fazenda Pública, por entender que a douta sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito. No seu entendimento, o artigo 66.º-A, n.º 12, do Estatuto dos Benefícios Fiscais não isenta as Cooperativas de imposto de selo sobre “situações jurídicas”, incluindo a situação jurídica de proprietário a 31 de dezembro de cada ano.

A questão fundamental a decidir é, por isso, a de saber se o artigo 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redação anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, isentava as Cooperativas da tributação em imposto de selo sobre as situações a que alude a verba n.º 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo.

Ora, o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou sobre esta questão, no recente acórdão de 10/03/2021, tirado no processo n.º 01719/15.7BEPRT. Tendo ali concluído que só depois do aditamento do n.º 14 ao artigo 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais pelo artigo 170.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março é que as Cooperativas ficaram isentas de imposto de selo referente à referida verba 28 e enquanto esta se manteve.

E é esse entendimento que aqui se reitera e para o qual se remete, dispensando-se a junção de cópia ou a transcrição da respetiva fundamentação por a mesma se encontrar disponível em redação integral no endereço electrónico www.dgsi.pt.

De salientar que aquele processo, que correu termos entre as mesmas partes, respeitou a uma situação em tudo idêntica à dos presentes autos, porque a liquidação teve origem na situação de proprietária sobre o mesmo prédio, sendo a única diferença a assinalar o facto de ali ter estado em causa a liquidação de 2014 e aqui estar em causa a liquidação de 2015.

Pelo que a adoção da mesma solução jurídica nos presentes autos se impunha até para assegurar uma interpretação e aplicação uniformes do direito a todos os casos que mereçam tratamento análogo, nos termos do artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil.

Pelo que o recurso merece provimento.



4. Conclusão

Só depois do aditamento do n.º 14 ao artigo 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais pelo artigo 170.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março é que as Cooperativas ficaram isentas de imposto de selo referente à referida verba 28 e enquanto esta se manteve.



5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e julgar improcedente a impugnação.

Custas pela RECORRIDA.

Lisboa, 13 de julho de 2021

Assinado digitalmente pelo Relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento.

Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Anabela Ferreira Alves e Russo