Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0745/15 |
Data do Acordão: | 01/24/2018 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | DULCE NETO |
Descritores: | IRC CIRCULAR |
Sumário: | Mostra-se afectado por vício de violação de lei o acto de autoliquidação de IRC efectuado em obediência às instruções constantes no ponto 7. da Circular nº 7/2004, de 30.03, da Direção de Serviços do IRC, na medida em que nela se estabelece um método ilegal de afectação de encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais. |
Nº Convencional: | JSTA00070503 |
Nº do Documento: | SA2201801240745 |
Data de Entrada: | 06/15/2015 |
Recorrente: | FAZENDA PÚBLICA |
Recorrido 1: | A......, SGPS, S.A. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | IMPUGN JUDICIAL |
Objecto: | SENT TAF AVEIRO |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO |
Área Temática 1: | DIR FISC - IRC |
Legislação Nacional: | CC ART8 N3. CPPTRIB99 ART55 ART61 LGT ART68-A ART74 N3 ART87 - ART90 ART81 N1 ART85. CONST ART104 N2 ART112 N5 ART103 N1. |
Jurisprudência Nacional: | AC STA PROC0227/16 DE 2017/03/08.; AC STA PROC01229/15 DE 2017/05/31.; AC STA PROC01292/16 DE 2017/11/29. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a fls. 318 e segs. dos autos, que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade A…………, SGPS, S.A. deduziu contra o indeferimento do recurso hierárquico que apresentou contra o acto de autoliquidação do IRC relativo ao exercício de 2008, no montante de € 396.764,89, anulando-o parcialmente e reconhecendo à impugnante o direito a juros indemnizatórios sobre o montante pago e a reembolsar. I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………, SGPS, S.A. do indeferimento do recurso hierárquico apresentado contra a autoliquidação de IRC, referente ao exercício de 2008, pretendendo a recorrente Fazenda Pública a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação improcedente. II. O objecto do presente recurso prende-se com a análise à invocada inconstitucionalidade formal da Circular 7/2004, de 30 de Março, a cujo conteúdo a impugnante recorreu para o apuramento dos encargos financeiros inscritos na aludida autoliquidação. Da inconstitucionalidade formal da Circular 7/2004, de 30 de Março III. O douto Tribunal, estribando-se numa decisão do CAAD (não transitada em julgado) concluiu pela imputação à Circular em causa de “vício de inconstitucionalidade formal, por violar os princípios da legalidade e da reserva de lei da Assembleia da República, consagrados nos artigos 103.º nº 2 e 165º nº 1 alínea i) da CRP”. IV. Assim, e atendendo a que foi esta a fundamentação exarada na peça decisória, é neste âmbito que nos moveremos, procurando demonstrar que: (a) a Circular 7/2004 não padece de qualquer vício de inconstitucionalidade e, (b) ainda que assim não fosse, incumbiria ao douto Tribunal a quo apurar se a autoliquidação está ou não conforme o previsto no artigo 31º do EBF para, assim, efectuar um juízo de legalidade ou ilegalidade de tal acto. V. Ora, o douto Tribunal a quo parte da seguinte premissa “o artigo 32º [do EBF] não dispõe quanto à forma como se devem concretizar os encargos financeiros associados a aquisições de participações sociais”, pelo que “a Circular 7/2004, de 30 de Março, veio estabelecer, no seu ponto 7, um método que permite a afectação dos passivos aos diferentes activos das SCPS’s” o que colide com os “princípios da legalidade e reserva formal da Assembleia da República, consagrados nos artigos 103º, nº 2 e 165º nº 1 alínea i) da CRP”, os quais “estabelecem a regra de reserva de lei para a criação e determinação dos elementos essenciais dos impostos, não podendo os mesmos deixar de constar de diploma legislativo”. VI. Conclui o douto Tribunal que a Circular 7/2004, na medida em que introduz “uma métrica para quantificar os encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, afecta a medida da tributação do contribuinte” e, consequentemente, acaba por desenvolver “o conteúdo da norma de incidência objectiva de IRC” sendo, assim, “formalmente inconstitucional por não constar de diploma emanado da Assembleia da República, em matéria que se insere na reserva de lei formal da Assembleia da República”. VII. Com o devido respeito que tal decisão nos merece, não podemos perfilhar o entendimento agora sintetizado. VIII. Entre os princípios consagrados na denominada “Constituição Fiscal” avulta o princípio da legalidade (nº 2 do artigo 103º da CRP). IX. O douto Tribunal recorrido considerou que a Administração desenvolveu o conteúdo da norma de incidência objectiva de IRC e, como tal, realiza uma “ilegítima regulação da incidência do imposto”. X. Impõe-se, portanto, saber se a Administração extravasou as suas competências ou se, face à indeterminação legal do artigo 31º nº 2 do EBF, se limitou a concretizar aquela norma, de molde a diminuir o grau de incerteza no que se refere à aplicação daquele regime. XI. É certo que o legislador, ao elaborar o texto do artigo 31º do EBF, não definiu qualquer método de afectação dos encargos financeiros — no entanto, tal indeterminação legal não preclude a possibilidade de a Administração emanar orientações genéricas como a que se pôs em crise nos presentes autos. XII. É que “a administração fiscal tem uma tarefa de conformação das situações da vida em concreto, através de uma margem de livre apreciação, nomeadamente quanto à determinação e quantificação da matéria tributável”. XIII. Não obsta a este entendimento a invocação de que o princípio da legalidade conduz a que a incidência do imposto em causa (IRC) tenha de ser determinada pelo poder legislativo, pois o invocado artigo 165º nº 1 alínea i) da CRP não significa que exista uma reserva absoluta de lei formal que exclua uma margem de livre apreciação na aplicação da lei por circular ou por acto administrativo. XIV. Na verdade, a interpretação que a Administração realize ou venha a realizar “não tem força de lei, não adquire o carácter de vinculatividade próprio das normas legais, não é interpretação autêntica e, por isso, a sua legalidade pode ser sempre questionada”. XV. Isto é, a actuação da Administração (a emanação daquela orientação genérica) não tem, nem pretende ter, força de lei. XVI. Por conseguinte, a AT, ao interpretar e aplicar aquela norma, tendo observado os critérios de interpretação das normas fiscais, bem como todo o bloco de legalidade, realizou unia “interpretação defensável”, pelo que deve ser reconhecida àquela uma margem de livre apreciação, que nada tem quer ver com o exercício de qualquer poder legislativo. XVII. Refira-se ainda que, sendo as circulares uma das modalidades de tipificação administrativa, são inegáveis as suas vantagens no ordenamento fiscal, quer para a administração, quer para os administrados. XVIII. Como subsídio argumentativo, diga-se que “se a lei fiscal é indeterminada, se os seus pressupostos e conteúdo não são formulados de modo suficientemente claro, de tal forma que o sujeito passivo não reconhece, imediatamente, a partir dela, a sua situação jurídica, não podendo assim orientar a sua conduta por ela, então há lugar importante para os regulamentos ou circulares tipificantes”. Ademais, XIX. Não sendo a Circular 7/2004 inconstitucional (ou ainda que o fosse), cremos que incumbiria ao douto Tribunal a quo, para que pudesse considerar a impugnação procedente, aferir da adequação da interpretação tipificada em tal Circular com o regime do artigo 31º do EBF. XX. A via mais acertada a ser seguida pelo douto Tribunal a quo consistiria em pôr em confronto a previsão e a estatuição do artigo 31º do EBF (mormente o seu nº 2) com a interpretação vertida na Circular 7/2004 e, se esta interpretação se revelasse contrária àquela norma, então a liquidação realizada com base em tal interpretação seria de anular. XXI. No entanto, como vimos, a AT, em estrita observância dos critérios de interpretação das normas fiscais, apresentou — de entre as várias soluções possíveis — uma “interpretação defensável”, pelo que XXII. Caberia ao contribuinte decidir, de forma livre, se seguiria ou não tal solução e, não seguindo, caber-lhe-ia solicitar a intervenção dos tribunais, competindo a estes, em última instância, apreciaras posições conflituantes e decidir de acordo com a lei, controlando os limites internos e externos à margem de livre apreciação que é concedida à Administração. XXIII. Por fim, no que respeita à alegada imposição, com eficácia externa, desta Circular aos contribuintes, diga-se que até agora a doutrina e a jurisprudência constitucional vinham propugnando o entendimento de que as instruções emanadas pela Administração não vinculavam os contribuintes nem mesmo, como é natural e decorre do princípio da separação de poderes, os Tribunais. XXIV. É certo que as circulares e demais instruções externalizam a interpretação e a aplicação que a AT faz das normas tributárias, mas apenas porque tais instruções são divulgadas junto dos contribuintes.´ XXV. Mas tal não significa que tais circulares produzam efeitos externos inelutáveis na esfera jurídica dos contribuintes, impondo-se como lei às relações jurídico-tributárias, tanto mais que XXVI. no caso em apreço, a AT se limitou a converter em Circular a sua posição sobre uma determinada matéria de natureza fiscal, tendo o contribuinte seguido (de forma não coactiva) essa posição. XXVII. Porém, o facto de o contribuinte ter, num primeiro momento, perfilhado o entendimento da AT não consubstancia a atribuição de eficácia externa àquela ou a qualquer outra Circular. XXVIII. EM SÍNTESE, e em face do que vimos expondo, cremos resultar à saciedade que a Circular 7/2004 não padece de qualquer vício de inconstitucionalidade, além de que a interpretação que nela se sustenta, em confronto com o normativo legal em apreço, se revela como defensável e, como tal, despida de qualquer ilegalidade que se lhe queira assacar. XXIX. Por conseguinte, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito e violou, por erro de aplicação e de interpretação, o disposto no nº 2 do artigo 103º e a alínea i) do nº 1 do artigo 165º, ambos da CRP, bem como o artigo 31º do EBF, devendo assim, ser revogada, com as legais consequências. Do valor do processo e da questão da indemnização XXX. A impugnante atribuiu à causa o valor de € 30.001,00 (alínea do nº 1 do artigo 552ºdo CPC), valor que a FP não impugnou (nº 1 do artigo 305º do CPC). XXXI. Sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, compete ao Juiz fixar o valor da causa (nº 1 do artigo 306º do CPC) atendendo aos critérios estabelecidos no artigo 97º- A do CPPT. XXXII. Quando o não faça no momento devido (na sentença, nos termos do nº 2 do artigo 306º do CPC), sempre poderá fixar o valor da causa no despacho que admita o recurso da decisão proferida (nº 3 do artigo 306º do CPC). XXXIII. Não o tendo feito em qualquer destes momentos — e tendo-se esgotado o seu poder jurisdicional no caso em apreço — deverão baixar os presentes autos para que o valor seja objecto de fixação, prosseguindo-se a normal tramitação subsequente (vide, entre outros, o acórdão do TCA Norte de 16-09-2011, processo nº 00638/11.0BEPRT). XXXIV. Por conseguinte, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação do disposto no artigo 306º do CPC. XXXV. Conexa com esta conduta omissiva praticada pelo douto Tribunal a quo surge a questão do conhecimento do pedido de indemnização. XXXVI. Atendendo unicamente ao vertido na parte final do pedido formulado pela impugnante, o douto Tribunal recorrido entendeu que o mesmo se enquadraria no disposto no artigo 61º do CPPT, condenando a AT no pagamento dos juros respectivos. XXXVII. Porém, sabendo-se que apenas serão devidos juros indemnizatórios caso o contribuinte tenha procedido ao pagamento do imposto, tal decisão foi tomada sem que o douto Tribunal haja cuidado de averiguar se o imposto em causa nos autos se encontrava pago e desde quando. XXXVIII. Por conseguinte, também por este motivo deverão os autos baixar à 1ª Instância, de molde a que os mesmos possam ser instruídos em conformidade. XXXIX. Por conseguinte, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação do disposto no artigo 61º do CPPT. Questões decidendas: - legalidade da dimensão interpretativa do art. 32º nº 1 EBF (renumeração e redacção constantes do DL nº 108/2008, 26 junho) alcançada pela Circular nº 7/2044, de 30 março da DSIRC; - legalidade dos juros indemnizatórios atribuídos ao sujeito passivo do IRC autoliquidado. 1. O princípio da legalidade tributária exprime-se na seguinte formulação: «Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes» (art. 103º nº 2 CRP; art. 8º nº 1 LGT). Constituem declinações deste princípio: a) a reserva relativa da Assembleia da República em matéria de criação de impostos (art. 165º nº 1 al. i) CRP numeração da RC/97). b) a exigência de conformação, por actos legislativos, dos elementos modeladores dos impostos, indicados no art.103º nº 2 CRP (art. 112º nºs 1 e 2 CRP). c) a impossibilidade de integração analógica das lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República (art. 11º nº 4 LGT). 2. «As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades» (art.32º nº 1 EBF com a renumeração constante do art.3º nº 1 DL nº 108/2008, 26 junho). A norma transcrita estabelece um equilíbrio entre o direito das SGPS a usufruírem da não tributação das mais-valias geradas pela venda de participações sociais e a impossibilidade de dedução do valor correspondente aos encargos financeiros em que tenham incorrido para a aquisição dessas participações, configurando uma equação benefício-custo de resultado neutro As circulares consistem em orientações genéricas de carácter administrativo, vinculativas para a administração tributária, visando a uniformização da interpretação e aplicação de normas tributárias pelos serviços (art.55º CPPT) Em abstracto é admissível que as circulares, enquanto instrumentos de doutrina administrativa, procedam à densificação de conceitos indeterminados constantes das normas tributárias. No caso concreto a Circular nº 7/2004, 30 março, da DSIRC estabelece uma fórmula para a imputação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais (com preterição da regra da dedutibilidade dos encargos financeiros e reflexo na determinação do lucro tributável do sujeito passivo) desta forma desenvolvendo o conteúdo da norma de (não) incidência objectiva, com violação do princípio da legalidade tributária [art. 23º nº 1 al. c) CIRC; cf. transcrição do ponto 7. da Circular, na fundamentação da sentença, fls.267/268]. Referências jurisprudenciais: - acórdão arbitral 21.12.2012 processo nº 24/2012 (parcialmente transcrito na fundamentação da sentença); e, designadamente, acórdãos STA-SCT 21.03.2007 processo nº 1180/06; 11.04.2007 processo nº 35/07; 26.04.2007 processo nº 7/07; 6.06.2007 processo nº 804/06; 18.09.2008 processo nº 202/08 (definição pela Circular nº 19/89 da DSIVA do conceito de oferta de pequeno valor) Referência doutrinária: João Taborda da Gama in Estudos em memória do Prof. Doutor J.L. Saldanha Sanches Volume III, Coimbra Editora, Setembro 2011 3. Juros indemnizatórios A sua atribuição e extensão têm fundamento legal indiscutível na anulação parcial da autoliquidação por erro imputável aos serviços (art. 43º nºs 1 e 2 LGT; art. 61º nº 1 al. a), 3, 4 e 5 CPPT). Não se justifica a ampliação da matéria de facto, face à comprovação do pagamento do imposto autoliquidado pelo sujeito passivo (informação da Autoridade Tributária e Aduaneira a fls. 401). 1. A ora impugnante apresentou em 29.05.2009 a declaração de rendimentos modelo 22 de (IRC respeitante ao exercício económico do ano de 2008 – (cfr. fls. 19 a 21 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas). 2. Na declaração modelo 22 identificada em 1), quadro 07, procedeu à autoliquidação no valor de € 396.764,89 respeitante a encargos financeiros – (facto admitido por acordo, e fls. 19 destes autos). 3. O valor do encargos referidos em 2) correspondem ao estipulado nas orientações genéricas publicadas pela Administração Tributária mediante Circular 7/2004 de 30.03.2004 – (facto admitido por acordo e fls. 22 destes autos). 4. Em 30.05.2011, a ora impugnante apresentou reclamação graciosa contra a autoliquidação do IRC do ano de 2008 – (cfr. fls. 71 destes autos e que aqui se e dá por reproduzida). 5. A reclamação graciosa foi indeferida por despacho proferido em 10.08.2012 e com os fundamentos exarados a fls. 73 a 90 dos autos e que se dão por reproduzidas. 6. Em 20.11.2012 apresentou recurso hierárquico – (cf. fls. 93 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas). 7. Em 31.05.2013 foi notificada do despacho de indeferimento que recaiu sobre o recurso hierárquico identificado em 6. – (cfr. fls. 61 a 66 dos autos e que aqui se dão por reproduzidas). 3. A presente impugnação judicial foi deduzida contra o indeferimento do recurso hierárquico que a sociedade A………., SGPS, S.A. apresentou após o acto de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2008, no montante de 396.764,89 euros, e onde suscita a ilegalidade do método de cálculo assumido pela Administração Tributária e plasmado na Circular 7/2004 da Direção de Serviços de IRC, método que, na sua óptica, é ilegal e conduziu a um erro no apuramento do imposto que autoliquidou, na medida em que se trata de um método indireto de tributação não previsto na lei e que a Constituição não permite. Neste contexto, advogou que a orientação genérica vertida na Circular 7/2004 viola a lei, quer quanto à sua aplicação no tempo, quer pelo método que impõe, sendo inconstitucional. Debruçando-se sobre a questão, o Mmº Juiz do Tribunal “a quo” julgou procedente a impugnação na consideração de que é inconstitucional, por ofender os princípios da legalidade e da reserva de lei da Assembleia da República, consagrados nos arts. 103º, nº 2 e 165º, nº 1, al. i) da CRP, a fixação, através da Circular 7/2004, de uma fórmula de alocação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais que concretizou, nela desenvolvendo o elemento objectivo do tipo tributário. «Com efeito, a determinação da forma de apuramento do montante de encargos financeiros não pode ser efetuada por circular, pois tal implicaria permitir que uma instrução administrativa procedesse à determinação de normas de incidência objetiva de imposto, o que determina, atenta a natureza divisível do ato tributário de autoliquidação de IRC do ano de 2008 em questão, a sua anulação parcial, nos termos do artigo 135º do CPA». É contra essa decisão que se insurge a Fazenda Pública, ora recorrente, insistindo que a orientação vertida na Circular 7/2004 – que serviu de suporte ao acto impugnado – se encontra em conformidade com o quadro constitucional e legal vigente, não afrontando os aludidos princípios constitucionais. Tal questão foi já decidida nesta Secção do Supremo Tribunal Administrativo nos acórdãos proferidos em 8/03/207, no proc. nº 0227/16, de 31/05/2017, no proc. nº 01229/15, e de 29/11/2017, no proc. nº 01292/16, nos quais, com fundamentação que merece a nossa adesão, se concluiu no sentido da correcção do julgado, isto é, que estabelecendo um método indirecto e presuntivo, no que diz respeito à afectação de encargos financeiros para efeitos de cálculo do lucro tributável, o nº 7 da Circular nº 7/2004 afronta o princípio da legalidade tributária. Deste modo, e atendendo também à regra constante nº 3 do art.º 8º do C.Civil – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito – bem com à falta de nova argumentação que nos leve a inflectir ou a divergir do entendimento ali firmado, limitar-nos-emos a remeter para a fundamentação que consta do acórdão proferido no proc. nº 0227/16, que aqui se acolhe e subscreve na íntegra. |