Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0244/18.9BELLE
Data do Acordão:02/13/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO
VALOR DA CAUSA
INDEFERIMENTO LIMINAR
INADMISSIBILIDADE DE CONVOLAÇÃO
Sumário:I - O valor da causa numa oposição à execução fiscal é, em regra, o da dívida exequenda (artigo 97.º-A, n.º 1, alínea e) do CPPT).
II - Nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 203.º do CPPT, o prazo de 30 dias para deduzir oposição à execução fiscal apenas se conta da primeira penhora não tendo havido citação pessoal.
III - Sendo manifestamente extemporânea a oposição deduzida encontra-se legalmente fundamentada a rejeição liminar da respectiva petição inicial (artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT).
IV - O erro na forma do processo – nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo – afere-se pelo pedido.
V - Sendo o pedido formulado de extinção da execução fiscal, não há dúvida quanto à propriedade do meio escolhido: a oposição à execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA000P24219
Nº do Documento:SA2201902130244/18
Data de Entrada:11/26/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório-
1 – A………….., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, de 4 de Julho de 2018, que, por extemporaneidade, rejeitou liminarmente a petição inicial de oposição por si apresentada contra a execução fiscal n.º 1104201001005260 e apensos, instaurada no Serviço de Finanças de Olhão para cobrança coerciva da quantia de €373.025,87, relativa a IRS.
O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões (que renumerámos):
a) A douta decisão recorrida fixa à presente acção o valor correspondente ao da execução fiscal;
b) O CPPT dispõe que o valor da acção corresponde ao montante da dívida, excepto, nos casos de penhora ou venda de bens, situação à qual corresponde o valor dos mesmos, se inferior.
c) O presente processo diz respeito à penhora de um imóvel, cujo valor venal foi fixado pela AT em doze mil, novecentos e quarenta e oito euros;
d) Logo, erra a douta decisão recorridos na parte em que fixa à acção o valor de trezentos e setenta e três mil, cento e cinquenta e seis euros e sessenta e nove cêntimos, por violação do artigo 97-A do CPPT.
e) Nos termos do n.º 2 do artigo 36.º do CPPT, as notificações dos actos devem conter «a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e o prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências».
f) O acto de liquidação de juros de mora vencidos exequendos não foi notificado ao contribuinte,
g) O artigo 204.º, n.º 1, alínea h) do CPPT (fundamentos da oposição à execução), admite a discussão de legalidade da dívida exequenda subjacente ao processo de execução fiscal, sempre que o sujeito passivo não tenha sido notificado das liquidações de imposto.
h) Porque ao recorrente não foi assegurado meio judicial de impugnação da referida liquidação de juros, o meio utilizado pelo ora recorrente nos presentes autos – oposição fiscal – é adequado a sindicar os vícios cometidos pela Autoridade Tributária.
i) A petição inicial foi apresentada dentro do prazo legal previsto no artigo 203.º do CPPT.
j) Assiste ao recorrente o direito de suscitar a ilegalidade do acto de liquidação, mediante oposição fiscal.
k) Ao particular é garantido o acesso à justiça, para tutela plena e efectiva dos seus direitos.
l) A notificação remetida pelo serviço de Finanças de Olhão, datada de 10.03.2018, no que concerne aos juros moratórios calculados pela AT, padece de erro grosseiro.
m) A referida liquidação é manifestamente ilegal e susceptível de causar prejuízos irreparáveis ao recorrente contribuinte.
n) Em caso de não admissibilidade da oposição fiscal atravessada (sic), nos termos do artigo 52.º e 94.º n.º 4, ambos do CPPT e artigo 97.º, n.º 3 da LGT, deverá ser ordenada a convolação do processo para o meio mais adequado,
o) Sendo este a revisão do acto tributário, nos termos do artigo 44 da Lei Geral tributária.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, assim se fazendo Justiça!

2 – A recorrida não contra-alegou.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer concluindo no sentido de que deve negar-se provimento ao recurso jurisdicional e manter-se a decisão recorrida na ordem jurídica.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -

4 – Questões a decidir
São as de saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao fixar o valor da causa e ao indeferir liminarmente, por extemporaneidade, a petição de oposição, bem como a de saber se devia ter sido ordenada a “convolação”.

5 – Matéria de facto
Na decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé objecto do presente recurso foram fixados os seguintes factos, tidos como relevantes para a apreciação liminar da tempestividade da oposição deduzida:
A) Em 15.02.2010 foi enviada a citação no âmbito do Processo de Execução Fiscal com o n.º 1104201001005260 ao executado, pelo serviço de Finanças de Olhão, por carta registada com aviso de recepção, via CTT – cf. doc 3 do processo de execução fiscal apenso aos autos;
B) Da certidão de dívida do Processo de Execução Fiscal com o n.º 1104201001005260 consta que a quantia exequenda daquele é de €373.156,69 – cf. doc. de fls. 2 do processo de Execução Fiscal apenso aos presentes autos;
C) Em 19.02.2010 foi recepcionada no Lote ……….., em Olhão, por B…………, a citação do executado, identificada na alínea anterior – cf. doc 3 do processo de execução fiscal apenso aos autos e acordo;
D) No aviso de recepção dos CTT, encontra-se assinalado com X um quadrado do qual consta a seguinte informação: “Por pessoa a quem foi entregue a carta e que se comprometeu após a devida advertência a entrega-la prontamente ao Destinatário” – cf. doc 3 do processo de execução fiscal apenso aos autos;
E) Em 10.03.2018 foi enviada via CTT, para a morada lote …………, em Olhão, a notificação de penhora endereçada ao executado – cf. doc. de fls. 35 do processo de execução fiscal apenso aos autos e acordo;
F) Em 18.03.2018 foi recepcionado pelo executado a notificação da penhora efectuada pela Administração Tributária do imóvel sito em ………., Castelo Branco com o artigo matricial …….., a qual foi enviada por carta registada com aviso de recepção enviado via CTT – cf. fls. 35 do processo de execução fiscal apenso aos autos e acordo:
G) Em 16.04.2018 foi remetida via CTT, para o Serviço de Finanças de Olhão, a petição inicial de oposição dos presentes autos – cf. doc. de fls. 5 dos autos.

6 – Apreciando.
6.1 do Valor da causa fixado
A sentença recorrida fixou à causa o valor de €373.156,69, conforme indicado no Processo de execução Fiscal junto aos autos, (cf. fls. 2 do Processo de Execução Fiscal apenso aos presentes autos), e correspondente à quantia exequenda. (cf. art.º 97.º-A n.º 1 alínea e) do CPPT) – cfr. sentença recorrida, a fls. 40 dos autos.
Alega o recorrente – cfr. conclusões a) a d) das suas alegações de recurso – que o presente processo diz respeito à penhora de um imóvel, cujo valor venal foi fixado pela AT em doze mil, novecentos e quarenta e oito euros, pretendendo que seja esse, e não o valor da execução, o valor que devia ter sido fixado à causa, ex vi do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)..
Entende o Ministério Público junto deste STA no seu parecer junto aos autos que bem decidiu a sentença recorrida ao atribuir à causa o valor da execução, pois a verdade é que, como deflui, claramente, da PI o que o recorrente contesta é a execução fiscal contra si instaurada pela AT, em que a quantia exequenda ascende a €373.156,69, pelo que, nos termos do já mencionado normativo, é este o valor a atribuir à ação.
Dispõe a alínea e) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, sob a epígrafe “Valor da causa”, que: «1. Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes: (…) e) No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior”.
Ora, compulsando o teor da petição inicial de oposição – a fls. 5 a 9 dos autos – verifica-se que nela o recorrente veio deduzir oposição à execução supra, (fls. 5 dos autos), com fundamento na prescrição da dívida tributária (fls. 6 dos autos), na nulidade do título executivo (fls. 6 a 8 dos autos) e na ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, no que concerne aos juros peticionados (fls. 8 dos autos), terminando com o pedido de extinção da execução fiscal.
Não há, na petição inicial de oposição, qualquer referência à penhora de imóvel, nem qualquer pedido com esta penhora relacionado, daí que seja manifestamente destituída de fundamento legal a pretensão do recorrente a que seja fixado à acção um valor diverso do da execução fiscal.

Nenhuma censura merece, pois, a decisão recorrida quando fixou à acção o valor correspondente ao da execução fiscal.

6.2 Do indeferimento liminar da petição de oposição por extemporaneidade
A sentença recorrida, a fls. 101 a 104 dos autos, rejeitou liminarmente a oposição deduzida pelo ora recorrente, com fundamento na caducidade do direito de deduzir oposição, atendendo a que o recorrente foi pessoalmente citado no âmbito do processo executivo em 19 de Fevereiro de 2010, como o próprio reconhece no n.º 5 da sua petição de oposição (a fls. 6 dos autos), era de 30 dias o prazo para deduzir oposição (artigo 203.º n.º 1, alínea a) do CPPT), acrescido de 5 dias de dilação (ex vi do disposto no artigo 245.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil) pois a citação pessoal foi efectuada em pessoa diversa do citado, pelo que, tendo a petição inicial sido remetida por correio no dia 16.04.2018, forçoso será concluir pela verificação da excepção peremptória de caducidade do direito de acção do executado e consequentemente rejeição liminar da petição inicial – cfr. sentença recorrida, a fls. 39, verso, dos autos.
Não se conforma com o decidido o recorrente, alegando que não foi notificado do acto de liquidação de juros de mora vencidos, que os pode sindicar em oposição porque de tal liquidação não foi notificado e a notificação remetida pelo serviço de Finanças de Olhão, datada de 10.03.2018, no que concerne aos juros moratórios calculados pela AT, padece de erro grosseiro, é manifestamente ilegal e susceptível de causar prejuízos irreparáveis ao recorrente contribuinte.
O Ministério Público junto deste STA no seu parecer junto aos autos considera que tendo a PI sido apresentada em 16/04/2018 é axiomático que se mostra caducado o direito de deduzir oposição judicial, facto determinante de rejeição liminar da PI, nos termos do disposto no artigo 209.º/1/a) do CPPT, como bem decidiu a sentença sindicada. (acórdão do STA, de 22/2/2017 – P. 0706/16, citado na sentença recorrida e disponível em www.dgsi.pt.
Vejamos.
O prazo para deduzir oposição à execução fiscal encontra-se estabelecido no artigo 203.º do CPPT e conta-se, nos termos da alínea a) do seu n.º 1, Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora.
No caso dos autos, houve, em 2010, citação pessoal do executado – cfr. as alíneas A) a B) do probatório, contando-se desta, porque a houve, o prazo para deduzir oposição.
A notificação da penhora no imóvel - que teve lugar em 2018 (cfr. as alíneas E) e F) do probatório) -, apenas poderia relevar para efeitos de determinação do termo inicial de contagem do prazo para deduzir oposição se em momento anterior o executado não tivesse sido citado pessoalmente para a execução, o que não é manifestamente o caso dos autos.
Observe-se, aliás, que na sua petição de oposição, o recorrente admite ter sido citado em 19 de Fevereiro de 2010 (cfr. o n.º 5 da PI de oposição, a fls. 6 dos autos), nenhum vício atribuindo a esta citação, que, como bem decidido, foi válida e regularmente efectuada.

É, pois, como decidido, manifestamente extemporânea a oposição deduzida, encontrando-se legalmente fundamentada a rejeição liminar da respectiva petição (artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT).

6.3 Da não convolação
Alega, por fim, o recorrente que, em caso de não admissibilidade da oposição fiscal deve ser ordenada a convolação do processo para o meio mais adequado – ex vi do disposto no artigo 52.º e 98.º n.º 4, ambos do CPPT e artigo 97.º, n.º 3 da LGT – que o recorrente entende ser a revisão do acto tributário, nos termos do artigo 44 da Lei Geral Tributária.
A sentença recorrida considerou não haver lugar à convolação requerida pelo oponente em articulado superveniente, pois esta pressupõe a existência de erro na forma do processo – que, no caso, não se verifica em face do pedido de extinção da execução formulado pelo oponente na sua petição e porque a forma processual escolhida pelo executado mostra-se adequada à natureza dos fundamentos que servem de base à pretensão (cfr. sentença recorrida, a fls. 39, verso dos autos).
Também o Ministério Público junto deste STA se pronuncia no sentido de que Inexiste, à evidência, erro na forma de processo, pelo que não faz qualquer sentido falar em convolação do processo, nem sequer discutir se os factos integradores da causa de pedir (prescrição, nulidade do título executivo e ilegalidade concreta da liquidação de juros de mora) constituem ou não fundamento de oposição.
De facto, pressuposto da convolação do meio processual inadequadamente utilizado no meio processual adequado é a existência de erro na forma do processo, como decorre do disposto no n.º 3 do artigo 97.º da Lei Geral Tributária e no n.º 4 do artigo 98.º do CPPT, devendo a convolação ser determinada quando a tal não obste a intempestividade do pedido para ser apreciado no meio processual próprio, caso em que tal convolação redundaria num acto inútil.
No caso dos autos, o pedido formulado pelo oponente – de extinção da execução – é o pedido próprio do meio processual que utilizou.
Ora, como ainda recentemente reafirmou este STA – cfr. o Acórdão de 23 de Janeiro último, proferido no processo n.º 287/18.2BELRA -, O erro na forma do processo – nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo – afere-se pelo pedido e Sendo o pedido formulado de extinção da execução fiscal, não há dúvida quanto à propriedade do meio escolhido: a oposição à execução fiscal.
Bem decidiu, pois, a sentença recorrida ao não determinar a convolação requerida, pois inexiste erro na forma do processo.
O que se disse não obsta, porém, a que o recorrente possa ainda, querendo, requerer ao órgão de execução fiscal o reconhecimento de nulidades insanáveis do processo de execução fiscal, pois que estas podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final - cfr. o n.º 4 do artigo 165.º do CPPT -, bem como o reconhecimento da prescrição por parte da AT, que não está dependente de prazo (artigo 175.º do CPPT) e mesmo pedir a revisão oficiosa da liquidação dos juros, com fundamento em erro imputável aos serviços (artigo 78.º, n.º 1 da LGT).
Não pode é, pelo supra exposto, convolar-se a petição de oposição apresentada em requerimento a dirigir ao órgão de execução fiscal, pois não há erro na forma do processo, pressuposto necessário de tal convolação.

Pelo exposto se conclui que o recurso não merece provimento.
- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 13 de Fevereiro de 2019. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Francisco Rothes – Aragão Seia.