Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0823/20.4BEALM |
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Data do Acordão: | 05/10/2023 |
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Tribunal: | 2 SECÇÃO |
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Relator: | JOSÉ GOMES CORREIA |
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Descritores: | TAXA DE OCUPAÇÃO DO SUBSOLO REPERCUSSÃO FISCAL CONSUMIDORES JUROS INDEMNIZATÓRIOS |
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Sumário: | I – Nos termos do artigo 85.º, n.º 3 da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, a taxa municipal de direitos de passagem e de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser reflectidas na factura dos consumidores. II – Não determinando a natureza privada da entidade que praticou o acto lesivo (repercussão ilegal) a sua exclusão do conceito de “serviços” previsto no artigo 43.º da LGT e estando verificados os demais pressupostos para atribuição de juros indemnizatórios previstos no mesmo preceito, deve concluir-se que não existe qualquer obstáculo a que seja reconhecido à repercutida (consumidor final) o direito a reaver o que ilegalmente lhe foi exigido e pagou e respectivos juros indemnizatórios. |
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Nº Convencional: | JSTA000P30981 |
Nº do Documento: | SA2202305100823/20 |
Data de Entrada: | 10/06/2022 |
Recorrente: | A..., S.A. |
Recorrido 1: | B..., S.A. – SUCURSAL PORTUGAL |
Votação: | UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT |
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Aditamento: | ![]() |
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Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório
Vem interposto recurso jurisdicional por A..., S.A., melhor sinalizada nos autos, visando a revogação da decisão de 09/05/2022, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra a B..., S.A. – Sucursal Portugal, também sinalizada nos autos, relativa ao pagamento da Taxa Municipal de Ocupação de Solo (TOS), no valor de € 41.071,43 €.
2) Ora, tal norma, não obstante de fazer parte do Orçamento de Estado que entrou em vigor no dia 1/Janeiro/2017, nunca chegou a entrar em vigor, pois não é eficaz. 3) Aliás, a norma contida no OE de 2017 serve apenas como ponto de partida para uma alteração de um quadro legal. 4) E é isto que decorre do artigo 70.º da Lei de Execução Orçamental para 2017 (Decreto-Lei n.º 25/2017, de 3 de Março) que deve ser considerado como um acto de interpretação autêntica do art. 85.º, n.º 3 da LOE de 2017, já que, provindo ambas as normas de fontes equivalentes (lei e decreto-lei têm igual valor, nos termos do disposto no art. 112.º, n.º 2 da CRP), uma (a mais recente) permite perceber o alcance que a outra (a mais antiga) é suposto ter. 5) A norma da Lei de Execução Orçamental define as condições em que o art. 85.º poderá vir a ser executado (cumprindo, dessa forma, a função de uma lei de execução orçamental). 6) Impõe um cumprimento do dever de comunicação das empresas titulares das infraestruturas do cadastro das suas redes até ao final do mês de abril de 2017 à DGAL e decorrido esse prazo as entidades reguladoras sectoriais avaliariam a informação recolhida e as consequências económico-financeiro das empresas operadoras, para que, posteriormente, tendo em conta essa avaliação o Governo proceda à alteração do quadro legal em vigor. 7) Só assim se cumprirá a proibição da repercussão da TOS prevista na LOE para 2017. 8) Sendo claro que este artigo vem dar aplicação ao que se previa na LOE 2017. 9) Pelo que sem a aprovação deste regime jurídico por parte do Governo não se pode considerar que tenha existido uma alteração normativa eficaz, nomeadamente, não se pode dizer que está em vigor a proibição da repercussão da TOS no consumidor final. 10) Tal entendimento tem sido consensual em várias instituições. 11) Em especial, o Governo que volta a inscrever tal compromisso, para alterar o quadro legal enquadrador da taxa de ocupação do subsolo em vigor, no art. 246.º, n.º 1 da LOE de 2019 (Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro), obrigação que deveria ser cumprida até ao final do 1º semestre de 2019 e, ainda, no art. 133.º da LOE de 2021 (Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro). 12) Admitindo por isso que não está em vigor a proibição da repercussão da TOS. 13) Acompanhando-se na íntegra a conclusão dos estudos da ERSE: “Concluímos, em suma, que a norma do n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016 é parcialmente ineficaz, seja porque não reúne as condições necessárias para projectar os seus efeitos na realidade, seja porque o legislador expressamente explicitou o condicionamento da produção de efeitos até ao momento da entrada em vigor do novo regime jurídico sobre a repercussão da TOS.” 14) E foi assim que entendeu, e muito bem, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto na douta decisão recorrida e, também, nos processos 144/21.5BEPRT, 111/21.9BEPRT e 769/21.9BEPRT sobre questão igual à que aqui está em causa, decidindo, em todos, que enquanto não existir um novo quadro legal sobre a matéria, persiste a possibilidade legal de repercussão da TOS nos consumidores, pelo que a repercussão não padece de ilegalidade. 15) E, ainda, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, nos processos n.º 4/21.0BEALM, 18/21.0BEALM, 58/21.9BEALM, 3/21.1BEALM, 14/21.7BEALM, 20/21.1BEALM, 267/21.0BEALM, 706/20.8BEALM. 16) Face ao exposto, a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não merece qualquer reparo pois cumpriu a Lei e o Direito. Termos em que, e nos mais de Direito que Vossas Excelências doutamente se dignarem suprir, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida, como é de inteira JUSTIÇA!
A..., S.A. veio recorrer para o STA, ao abrigo do disposto no artigo 280º do CPPT, da sentença proferida pelo TAF de Almada que julgou improcedente a Impugnação Judicial que apresentou, contra a liquidação da taxa municipal de ocupação do subsolo (TOS), respeitante ao mês de Março de 2019, no montante de 41.071,43, a que se refere a factura n.º ...90 emitida em 09.04.2019 Os fundamentos do Recurso constam dos termos conclusivos das Alegações de Recurso apresentadas pela Recorrente, cujo teor aqui se reproduz para todos os legais efeitos. A entidade recorrida apresentou Contra-Alegações, cujo teor aqui se reproduz para todos os legais efeitos, defendendo a manutenção do decidido. A questão a apreciar consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito ao considerar legal a repercussão sobre o consumidor final da taxa de ocupação do subsolo, relativa ao período de Março de 2019. A recorrente discorda do decidido, defendendo que a partir de 1 de Janeiro de 2017, a repercussão da TOS nos consumidores finais passou a ser expressamente proibida por entender que a proibição de repercussão ao consumidor final que decorre do 85.º n.º 3 da LOE de 2017 não entrou em vigor em 1.01.2017 nem nunca chegou a ser eficaz como decorre do artigo 70.º da Lei de Execução Orçamental para 2017 (Decreto-Lei n.º 25/2017, de 3 de Março). Tendo em conta os fundamentos do recurso, Importará, portanto, interpretar o teor dos preceitos legais citados pela Recorrente para saber se o nº3 do artigo 85º do LOE de 2017 entrou, ou não, em vigor em 01.01.2017. O artigo 85º da Lei nº 42/2016, de 28 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado (OE) para 2017 dispõe: “ Taxas de direitos de passagem e de ocupação do subsolo 1 - Para efeitos de liquidação da taxa municipal de direitos de passagem e da taxa municipal de ocupação do subsolo, as empresas titulares das infraestruturas comunicam a cada município, até 31 de março de 2017, o cadastro das suas redes nesse território, devendo proceder à atualização da informação prestada até ao final do ano. 2 - Na ausência da comunicação a que se refere o número anterior, o município presume que as infraestruturas estão localizadas na totalidade dos metros lineares da respetiva rede viária urbana. 3 - A taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores. 4 - No primeiro semestre de 2017, é revista a Lei das Comunicações Eletrónicas, aprovada pela Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro.” O teor do artigo 70º do Dec.- Lei nº 25/2017, de 3 de Março, diploma de execução da Lei do Orçamento, é o seguinte: “ 1 - O cumprimento do dever de comunicação previsto no n.º 1 do artigo 85.º da Lei do Orçamento do Estado é assegurado, até 31 de março de 2017, pelas empresas titulares das infraestruturas junto de cada município e atualizado até ao final do ano, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do mesmo artigo. 2 - No caso de o município ser detentor de informação do cadastro das redes de infraestruturas, ou tiver pleno acesso à mesma através de plataforma online, este dispensa a empresa titular das infraestruturas em questão, por solicitação desta, da prestação inicial da informação, devendo a mesma ser atualizada até ao final do ano, conforme o estatuído no referido artigo 85.º 3 - Até ao final do mês de abril de 2017, os municípios dão conhecimento à DGAL da informação a que se referem os números anteriores, nos termos por esta definidos. 4 - Decorrido o período previsto para a prestação de informação, as entidades reguladoras setoriais em razão da matéria avaliam a informação recolhida e as consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas. 5 - Tendo em conta a avaliação referida no número anterior, o Governo procede à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores.” Em 2017 nada foi aprovado em execução do desiderato do legislador e, posteriormente, na Lei nº 71/2018, de 31 de Dezembro, que aprovou o OE para 2019, o legislador voltou a prever no artigo 246º uma autorização ao Governo para revisão do quadro legal de enquadramento da taxa de ocupação do subsolo, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores, todavia, também, nesse período, nada foi aprovado e só em Janeiro de 2021, por despacho conjunto dos ministros de estado e das finanças, da modernização do estado e da administração pública e do ambiente e da ação climática - despacho nº 315/2021, publicado no Diário da República n.º 6/2021, Série II de 2021-01-11, páginas 222 – 223 - é que foi determinada a constituição de um grupo de trabalho «com o objetivo de alterar o quadro legal enquadrador da TOS atualmente em vigor, nos termos estabelecidos pelo artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, artigo 70.º do Decreto -Lei n.º 25/2017, de 3 de Março, e artigo 246.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro». A busca do sentido a imprimir aos preceitos legais em questão tem que ser efectuado à luz dos princípios gerais interpretativos previstos no artigo 9º do Código Civil, nos termos do nº 1 do artigo 11º da LGT ( “Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.”). Dispondo o artigo 9º do Código Civil : “1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.” Como resulta do disposto no n.º 3 do art. 9.º do Código Civil, na fixação do sentido e alcance da lei o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Por outro lado, como decorre do n.º 2 do mesmo art. 9.º do Código Civil, em sede de interpretação normativa não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. O nº1 do aludido preceito estabelece que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”. Portanto, a letra da lei exerce a função de um limite, nos termos do art. 9º, nº 2: não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo “ que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. Tendo presentes aquelas regras, o que se constata, salvo o devido respeito por opinião contrária, quer dos termos do artigo 85º da LOE de 2007 quer do teor do artigo 70º do Dec.- Lei nº 25/2017, de 3 de Março, é que de nenhum dos preceitos legais, ou da sua conjugação, resulta que o nº3 do citado artigo 85º não tenha entrado em vigor em 01-01-2017. Com efeito, o artigo 85º , nº3 da LOE de 2017 não refere que “serão pagas” ou “poderão vir a ser pagas”, antes referindo “são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores” e no que respeita ao artigo 70.º do Decreto-Lei de Execução Orçamental, esta norma não é exequível por si mesma, e nem sequer programática, limitando-se o legislador do Decreto-Lei de Execução Orçamental a abrir a porta para, em função da avaliação das consequências no equilíbrio económico-financeira das empresas operadoras de infraestruturas, vir a ser alterada, por via legislativa, a proibição de repercussão que consta do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017 mas, através da referida norma, o legislador não revogou a norma do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017, nem sequer estabeleceu que ela terá inexoravelmente de ser revogada. Acresce que da redacção dos preceitos em causa o que resulta, salvo melhor juízo, é que o “ artigo 70.º respeita à execução de uma norma (a do nº1), mas não à do n.º 3 do artigo 85.º da Lei do Orçamento do Estado. Em consequência, salvo melhor juízo, terá de concluir-se, como a Recorrente, no sentido de que a partir da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2017 e sem necessidade de qualquer acto legislativo ou regulamentar adicional, a repercussão da TOS aos consumidores finais passou a ser ilegal pelo que a douta sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação dos preceitos legais aplicáveis, ficando prejudicada a apreciação dos restantes fundamentos invocados. Quanto ao pedido de juros indemnizatórios: O regime previsto no artigo 43º da LGT normativo visa facilitar a reparação do contribuinte pelo dano provocado pelo pagamento indevido de uma prestação tributária e insere-se na relação entre a Administração Tributária e o contribuinte e com base no “erro imputável aos serviços”. Como já decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, de que é exemplo o douto Acórdão do STA proferido em 02-12-2020, no processo 0185/18.0BEPRT, cuja parte do respectivo sumário se transcreve: “ … II - Não é imputável à entidade municipal nem aos seus órgãos ou serviços o acto impugnado de repercussão do valor de um tributo municipal que não foi por eles praticado nem de alguma forma determinado.” Estando em causa, no caso em análise, uma relação jurídica entre duas entidades privadas, diversa da relação jurídica tributária que se estabelece entre a AT e o contribuinte, salvo melhor juízo, à reparação de danos decorrente da ilegalidade da repercussão não é aplicável o regime previsto no artigo 43º da LGT, sem prejuízo do direito da impugnante/ora recorrente vir a ser ressarcida pelos danos sofridos a efetivar no âmbito de ação de responsabilidade civil. * Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais. * 2. FUNDAMENTAÇÃO: 2.1. - Dos Factos: Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão: A. Pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 3 de abril, foram aprovadas as minutas dos contratos de concessão de distribuição regional de gás natural, em regime de serviço público, a celebrar entre o Estado Português e as sociedades C..., S.A.; D..., S.A.; E..., S.A.; F..., S.A.; G..., S.A.; H..., SA - facto não controvertido - cf. artigo 65.º da petição inicial e artigo 29.º da contestação - e Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, publicada em Diário da República, 1.ª série, n.º 119, de 23.06.2008, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. B. O contrato de concessão da atividade de distribuição de gás natural entre o Estado Português e a concessionária G..., S.A., cuja minuta foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros a que se refere a alínea antecedente, prevê, quanto aos «direitos e obrigações da concessionária», o seguinte: “Cláusula 7.ª Direitos e obrigações da concessionária 1 - (…) 2 - Assiste à concessionária o direito de repercutir sobre os utilizadores das suas infra-estruturas, quer se trate de entidades comercializadoras de gás ou de consumidores finais, o valor integral de quaisquer taxas, independentemente da sua designação, desde que não constituam impostos diretos, que lhe venham a ser cobrados por quaisquer entidades públicas, direta ou indiretamente atinentes à distribuição de gás, incluindo as taxas de ocupação do subsolo cobradas pelas autarquias locais. 3 - Na sequência do estabelecido no n.º 2 e no que respeita às taxas de ocupação do subsolo a liquidar pelas autarquias locais que integram a área da concessão, os valores pagos pela concessionária em cada ano civil serão repercutidos por município sobre as entidades comercializadoras utilizadoras das infra-estruturas ou sobre os consumidores finais servidos pelas mesmas nos termos a definir pela ERSE.” - facto não controvertido - cf. artigos 67.º e 68.º da petição inicial e Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, publicada em Diário da República, 1.ª série, n.º 119, de 23 de junho de 2008, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. C. A 09.04.2019, a Entidade Demandada emitiu, em nome da Impugnante, a fatura n.º ...90, referente ao mês de março de 2019, no montante total de 774.480,59 €, na qual está incluído o valor de 41.071,43 €, correspondente à taxa de ocupação do subsolo - cf. fatura junta como doc. ... da petição inicial, a fls. 59 a 63 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida. D. A 06.05.2019, a Impugnante pagou a fatura referida na alínea anterior - cf. documento n.º ... junto com a petição inicial, a fls. 64 dos autos. * 2.2.- Motivação de Direito O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º, al. e) do CPPT. No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou improcedente a impugnação, padece de erro de julgamento, por considerar legal a repercussão sobre o consumidor final da taxa de ocupação do subsolo, relativa ao período de Março de 2019, quando a repercussão ao consumidor final passou a ser expressamente proibida a partir de 01.01.2017, como decorre do 85.º n.º 3 da LOE de 2017, acrescendo que verificando-se a repercussão da TOS pela B..., existe fundamento legal para o pagamento de juros indemnizatórios à Recorrente, ao abrigo do artigo 43.º da LGT, na medida em que se verificou o pagamento indevido de um tributo, cujo erro não é (seguramente) imputável a esta. As questões aqui tratadas são, em ampla medida, idênticas – até pela quase integral similitude do quadro conclusivo das alegações – aquelas já tratadas, com a devida profundidade e detalhe, no recente acórdão deste Supremo Tribunal, de 8 de Março de 2023, lavrado no Processo n.º 39/21, disponível em www.dgsi.pt, envolvendo inclusivamente as mesmas partes, e onde se pode ler, em jeito conclusivo: “I – Nos termos do artigo 85.º, n.º 3 da Lei n.º 42/2016, de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2017), a taxa municipal de direitos de passagem e de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas e não podem ser reflectidas na factura dos consumidores. II – Sendo a citada norma válida e plenamente eficaz desde 1 de Janeiro de 2017, é ilegal o acto de repercussão que posteriormente à sua entrada em vigor foi incluído em factura de consumo de gás e suportado pelo consumidor final. III - A actividade ou prestação de um serviço público essencial não perde a sua natureza pública administrativa pela circunstância de ser desenvolvida por uma pessoa colectiva de direito privado (no caso constituída sob a forma de sociedade anónima), nem o acto de repercussão, realizado ao abrigo de um direito legalmente reconhecido, deixa de ser materialmente tributário apenas por ter sido praticado por uma concessionária (de serviço publico essencial), pelo que, os valores cobrados ao consumidor na parte que respeitam à contrapartida da utilização pela concessionária do bem de domínio público ainda possuem a natureza de créditos tributários.” Acresce que, por seu turno, tal aresto já se valia da decisão pioneira constante do Processo n.º 2/21, de 23 de Fevereiro de 2023, cuja fundamentação se seguiu de perto, aresto este igualmente livremente disponível em www.dgsi.pt. Assim sendo, e por concordarmos integralmente com aquele Acórdão, assim como com a vasta fundamentação ali expendida, limitamo-nos a remeter para o respectivo teor, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido no que respeita e responde à primeira questão acima colocada pela Recorrente. * Importa ainda responder à questão da condenação em juros indemnizatórios, decretada pela sentença recorrida. E, também a esse respeito, julgamos que carece de sustento o presente Recurso, como este Supremo Tribunal já teve oportunidade de explanar na decisão pioneira sobre esta matéria, constante do Processo n.º 2/21, de 23 de Fevereiro de 2023, igualmente disponível em www.dgsi.pt e onde, a título conclusivo, se pode ler: “Não determinando a natureza privada da entidade que praticou o acto lesivo (repercussão ilegal) a sua exclusão do conceito de “serviços” previsto no artigo 43.º da LGT e estando verificados os demais pressupostos para atribuição de juros indemnizatórios previstos no mesmo preceito, deve concluir-se que não existe qualquer obstáculo a que seja reconhecido à repercutida (consumidor final) o direito a reaver o que ilegalmente lhe foi exigido e pagou e, bem assim, o direito a receber o valor correspondente aos juros indemnizatórios, calculados à taxa de 4%, desde a data em que esse pagamento indevido se verificou até efectivo e integral pagamento.”. Destarte e porque também a tal respeito entendemos ser de acompanhar integralmente a fundamentação e sentido decisório ínsitos no mencionado aresto, limitamo-nos a remeter para o respectivo teor, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e se encontra livremente acessível em www.dgsi.pt. Por todo o exposto, mais não resta do que concluir que assiste razão à Recorrente, pelo que se impõe conceder provimento ao presente Recurso, nos mesmos termos * 3.– DECISÃO
Face a tudo quanto ficou exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em, concedendo provimento, ao recurso: A) Revogar a sentença recorrida; B) Julgar ilegal e anular o acto de repercussão impugnado, integrado na factura n.º ...90, referente ao mês de Março de 2019, no montante € 41.071,43 €; C) Condenar a Recorrida a devolver à Recorrente o valor referido em B), acrescido de juros, contados à taxa de 4%, desde a data do pagamento indevido (06.05.2019) até à data da integral e efectiva devolução daquela importância. Custas pela Recorrida em 1ª instância e neste Supremo Tribunal Administrativo. * Lisboa, 10 de Maio de 2023. - José Gomes Correia (relator) – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (Voto a decisão). |