Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0389/15
Data do Acordão:07/08/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:RECURSO HIERÁRQUICO
ACTO DE INDEFERIMENTO
NOTIFICAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
INDICAÇÃO DOS MEIOS DE DEFESA
Sumário:I - A insuficiência do acto de notificação por falta de indicação dos meios de defesa não conduz à nulidade do acto, mas faculta ao notificado o direito de requerer a notificação dos elementos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, dentro do prazo fixado no nº 1 do art. 37º do CPPT; usando dessa faculdade, o prazo para reagir contra o acto tributário conta-se a partir da notificação dos requisitos omitidos ou da passagem de certidão que os contenha.
II - Não sendo exercida a faculdade prevista no art. 37º nº 1 do CPPT, a aludida omissão irreleva para afastar os efeitos normais da notificação já efectuada.
III - O prazo para deduzir impugnação judicial é um prazo de caducidade, de natureza substantiva, que se conta nos termos do art. 279º do Código Civil, como dispõe o art. 20º nº 1 do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00069281
Nº do Documento:SA2201507080389
Data de Entrada:03/31/2015
Recorrente:A... LDA
Recorrido 1:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LOULÉ
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:CONST05 ART268.
CPPTRIB99 ART20 N1 ART36 ART37 ART39 ART76 N2 ART102 N1 E.
CPTA02 ART58 N2 B N3 N4 A.
CPC13 ART138 N1 N4.
CCIV66 ART279.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC01064/11 DE 2012/06/06.; AC STA PROC0128/09 DE 2009/10/07.; AC STA PROC0632/09 DE 2010/05/12.; AC STA PROC0493/10 DE 2010/10/13.; AC STA PROC0789/10 DE 2011/01/12.; AC STA PROC055/11 DE 2011/05/11.; AC STA PROC0677/10 DE 2011/09/07.; AC STA PROC0291/12 DE 2012/05/16.; AC STA PROC0571/12 DE 2012/11/28.; AC STA PROC0836/12 DE 2013/03/13.; AC STA PROC01534/13 DE 2014/01/15.; AC STA PROC01108/12 DE 2014/01/22.; AC STA PROC01381/12 DE 2014/10/29.
Referência a Doutrina:JORGE LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED PAG333.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A…………….., LDA, com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida pelo TAF de Loulé que, julgando verificada a caducidade do direito de acção, rejeitou liminarmente a petição inicial da impugnação judicial deduzida contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social.

Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:

A. A Recorrente deduziu impugnação judicial contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social no valor de € 4.287,97.

B. A impugnação judicial da Recorrente foi enviada ao Centro Distrital de Segurança Social de Faro, através de fax, em 01 de Dezembro de 2014, tendo a decisão impugnada sido notificada à Recorrente em 29 de Julho de 2014.

C. A Mmª Juiz “a quo” rejeitou liminarmente a petição da Recorrente com fundamento na caducidade do direito de impugnar a decisão administrativa.

D. A Recorrente não pode aceitar a douta sentença, nem os seus fundamentos, porquanto a decisão impugnada, notificada à Recorrente em 29/07/2014, não fazia qualquer menção aos meios de defesa ao dispor da ora Recorrente, nomeadamente à forma e prazo, nem a partir de quando se iniciaria a correr o prazo para o efeito ou, sequer, qual o efeito decorrente da falta de impugnação do mesmo.

E. A falta de referência aos meios e prazos de reacção da Recorrente na notificação da decisão impugnada torna a mesma nula e, por isso, torna a decisão impugnável no prazo de um ano.

F. Dispõe a al. a) do nº 4 do art. 58º do CPTA que “desde que ainda não tenha expirado o prazo de um ano, a impugnação será admitida, para além do prazo de três meses da alínea b) do nº 2, caso se demonstre, com respeito pelo princípio do contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, por .... A conduta da Administração ter induzido o interessado em erro”.

G. Tal como, aliás, referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a pág. 390: “No caso da norma da alínea a) o que está em causa é, não já uma deficiência a nível das formalidades que publicitam o acto administrativo, mas a conduta da autoridade administrativa — consubstanciada na prática de actos jurídicos ou materiais — que tenha gerado a falsa expectativa da desnecessidade ou inconveniência da impugnação do acto, e, assim, induzindo o interessado a prescindir da apresentação em tempo oportuno da petição. Deste modo, a norma tutela os princípios da protecção da confiança e da boa-fé e dá concretização prática, no plano processual administrativo, ao disposto nos artigos 6º e 6º-A do CPA”.

H. Perante o teor da notificação, a qual não fez qualquer referência ao facto da Recorrente poder exercer o seu direito de impugnar a decisão em causa e qual o prazo para o efeito, foi defraudado o princípio da confiança.

I. A Mmª Juiz “a quo” contrapôs a esta argumentação os preceitos legais dos arts. 36º e 37º do CPPT.

J. Com base naqueles preceitos, considerou a Mmª Juiz “a quo”, que incumbia à Recorrente o ónus de exercer a faculdade conferida no nº 1 do art. 37º do CPPT, sob pena de se considerar sanado o vício previsto no nº 1 do artº 36º do mesmo diploma.

K. Não nos parece ser, salvo melhor opinião, este o espírito da lei, uma vez que o artº 37º do CPPT confere ao interessado a faculdade de exercer um direito, que é o de requerer que seja complementada a comunicação de decisão em matéria tributária, e que, caso o faça, o prazo para impugnar do acto conta-se a partir da recepção da notificação ou da certidão requerida.

L. Não dispõe, no entanto, que caso o interessado não requeira tal complemento, tenha como cominação a sanação do vício da notificação de decisão que lhe tenha sido efectuada.

M. Para além do mais, as normas invocadas pela Mmª Juiz “a quo”, ainda que de aplicação ao caso concreto, não excluem a aplicação da alínea a) do artº 58º CPTA, não sendo exigível à Recorrente que tivesse conhecimento dos prazos e meios ao seu dispor para apresentar a Impugnação judicial, pelo que a mesma sempre deveria ter sido admitida nos termos do disposto no supra referido artigo, pois ainda não havia decorrido o prazo de um ano desde a notificação.

N. Caso assim se não entenda, sempre se diz que o artigo 58º nº 3 do CPTA estipula que a contagem dos prazos de impugnação de actos administrativos anuláveis é de um ano para o Ministério Público e três meses nos restantes casos, pelo que obedece ao regime aplicável aos prazos para propositura de acções previstos no CPC, que diz, por remissão do nº 4 do seu artigo 138º, que essa contagem é contínua, mas que se suspende durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actas a praticar em processos que a lei considere urgentes (138º nº 1 do CPC).

O. Pelo que o prazo de caducidade de três meses suspendeu-se durante as férias judiciais, pois que o entendimento é o de que o prazo de três meses, previsto no artigo 58º nº 2 alínea b) do CPTA, para impugnação contenciosa de actos administrativos anuláveis, quando abranja período em que decorram férias judiciais, deve ser convertido em 90 dias para efeito da suspensão imposta pelo artigo 138º nº 1 e nº 4 do CPC, aplicável por força do artigo 58º nº 3 do CPTA, já que, conforme o critério estabelecido no artigo 279º alínea a) do CC, um mês são trinta dias de calendário.

P. Assim, a aplicação da norma do CPTA implica a consideração da suspensão do prazo durante aquele período, pelo que não se verifica a caducidade da presente acção.

Q. Nesse sentido vide o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 07/12/2011, proferido no processo 04027/10, disponível em www.dgsi.pt.

R. Desta feita, considerando que o ofício que integra o acto impugnado é datado de 25/07/2014 e que as férias judiciais decorreram entre 16 de Julho e 31 de Agosto de 2014, o prazo de 90 dias apenas se iniciou no dia 1 de Setembro de 2014.

S. O prazo de 90 dias, iniciado em 01/09/2014 teria o seu términus em 29/11/2014, o qual correspondia a um sábado, dia em que os tribunais se encontram encerrados, pelo que a prática do acto é transferida para o 1º dia útil seguinte, que foi o dia 01/12/2014, data em que a Recorrente apresentou a sua Impugnação.

T. Veja-se neste sentido o Ac. do TCAS de 19-01-2011, no Proc. nº 03889/10, in www.dgsi.pt. “... no âmbito do processo tributário judicial, o interessado tem o direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei, podendo ser lesivos, entre outros, o indeferimento, expresso ou tácito e total ou parcial, de reclamações, recursos ou pedidos de revisão ou reforma da liquidação — cfr. art.º 95.º, n.ºs 1 e 2 e alínea d) da LGT — sendo que tal prazo é de 90 dias a contar dos diversos factos que a lei elegeu como termo inicial ou dies a quo ou dies ex quo desse prazo, previstos nas várias alíneas e números do art.º 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), sendo que a fixação deste prazos, neste artigo, não prejudica outros prazos especiais fixados no mesmo Código ou em outras leis tributárias, como proclama o seu n.º 4.”.

U. Dispõe o art.º 76º, nº 2, do CPPT que: A decisão sobre o recurso hierárquico é passível de recurso contencioso, salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objecto. Ou seja, esta norma do nº 2, no caso de recurso hierárquico interposto de reclamação graciosa, expressamente atribui o direito de contra a respectiva decisão interpor recurso contencioso.

V. Conforme dispõe o art.º 101.º da LGT e 97.º do CPPT, a forma de reacção aí prevista, ao referir-se ao recurso contencioso, deve ser entendida como se referindo ao meio processual tributário judicial que legalmente caiba ao objecto desse meio gracioso, como acto lesivo que é, nos termos do disposto no art.º 95º da LGT.

W. Prevendo a lei o meio de reacção judicial contra tal acto de indeferimento (expresso) proferido no recurso hierárquico, o prazo para o efeito já se encontra previsto na alínea f) do n.º 1 do citado art.º 102.º, que o fixa, igualmente em 90 dias, a contar do conhecimento desse acto.

X. Pelo que, a impugnação judicial foi proposta em tempo, não se encontrando, assim, caducado o direito à acção.

Y. A douta sentença recorrida ao rejeitar liminarmente a impugnação judicial da Recorrente violou assim, entre outras normas, o artº 58º do CPTA.

Z. Pelo que, deveria a Impugnação da Recorrente ter sido admitida, por tempestiva, devendo a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra, a admitir a Impugnação Judicial da Recorrente. Nestes termos e nos melhores de direito e com o suprimento de Vossas Excelências, deverá ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, sendo esta substituída por outra que admita a Impugnação Judicial da Recorrente, seguindo o processo os seus ulteriores termos. Assim se fazendo a costumada Justiça.

1.2. O INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:

A) A Recorrente interpôs a presente acção de impugnação judicial ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 76.º do CPPT;

B) Sindicou o acto de indeferimento do recurso hierárquico, notificado à Impugnante em 29/07/2014;

C) Apresentou a competente acção judicial em 01/12/2014;

D) Nesta medida, atento o prazo processual previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 102º, acompanha-se o entendimento preconizado pelo tribunal a quo, o qual pugna pela extemporaneidade do meio processual utilizado, da acordo com o disposto no artigo 279.º do Código Civil, ex vi n.º 1 do artigo 20.º do CPP, portanto sem suspensão nas férias judiciais;

E) As notificações dos actos de liquidação oficiosa de contribuições para a segurança social, seguem o disposto no Código do Procedimento Administrativo, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 40º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CRC), logo, sem obrigatoriedade de indicação dos meios de reacção contenciosa, nos termos do artigo 68.º do CPA (considerando que ao acto cabia desde logo a reacção contenciosa aplicável) e artigo 60.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

F) No entanto os mesmos foram notificados com a notificação do acto de liquidação oficiosa de contribuições para a segurança social, em 19/03/2014.

1.3. O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto do Supremo Tribunal emitiu douto parecer no sentido de que a decisão recorrida devia ser confirmada, com a seguinte argumentação:

«Concluindo-se que o meio processual adequado é a impugnação judicial, meio este utilizado pela Recorrente, o prazo para a sua apresentação é de 3 meses, ao abrigo do disposto na alínea e) do nº 1 do artigo 102º do CPPT […].

Por outro lado e nos termos do artigo 20º, nº 1, do CPPT, o referido prazo conta-se nos termos do artigo 279º do Código Civil. […]

Atento que o prazo se iniciou em 30/07/2014, dia seguinte ao dia em que a Recorrente foi notificada, termina a 30/10/2014, tal como foi considerado na sentença recorrida.

Nos termos do citado normativo o prazo não se interrompe em férias judiciais, pois só no caso de o prazo terminar em férias judiciais é que o mesmo se transfere para o primeiro dia útil, como se alcança da alínea e) do referido artigo 279º do Código Civil.

Ora, não há fundamento legal para aplicação das normas do CPTA, como invoca a Recorrente, a qual certamente elabora em erro por a impugnação judicial ter sido interposta do indeferimento do recurso hierárquico. Mas só no caso de tal decisão ser impugnada contenciosamente através da acção administrativa especial (anterior recurso contencioso de que fala o nº 2 do artigo 97º do CPPT) é que há lugar à aplicação das normas do CPTA, cujo artigo 58º, nº 3, remete para a regras do CPC, o que não é o caso dos autos.

Invoca a Recorrente que a notificação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico não continha informação sobre os meios de reação contenciosa e respectivos prazos, o que configura nulidade da notificação e lhe confere o prazo de 1 ano para impugnar aquela decisão.

A decisão recorrida não deu como assente essa omissão da notificação, embora a tivesse apreciado. Mas a corresponder à verdade, essa falta não tem as consequências que a Recorrente pretende retirar da situação, como se concluiu na decisão recorrida. Com efeito, pese embora decorra do disposto do nº 2 do artigo 36º do CPPT que as notificações devem conter os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, só se verifica a nulidade da notificação na falta de indicação do autor do acto e no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que se decidiu, do seu sentido e da sua data – nº 9 do artigo 39º do CPPT.

No caso da falta de menção dos meios de defesa e respectivos prazos dispõe o nº 1 do artigo 37º do CPPT que pode nesse caso o interessado requerer, no prazo de 30 dias, que lhe sejam notificados os requisitos omitidos, diferindo-se o início do prazo de impugnação, nesse caso, para a data daquela notificação ou da entrega da certidão com esses elementos em falta. E tratando-se de uma faculdade do interessado é óbvio que se não exercer essa faculdade a irregularidade da notificação fica sanada, como se entendeu na decisão recorrida citando doutrina avalizada.

Como se deixou exarado na decisão recorrida e é jurisprudência pacífica, o prazo de apresentação da impugnação judicial é um prazo peremptório, motivo pelo qual, decorrido que seja, caduca o respectivo direito de acção - neste sentido cfr., entre outros, o acórdão do STA de 06/10/2005, processo nº 0392/05.

Atento que aquando da apresentação da impugnação judicial já havia decorrido o prazo de 3 meses previsto no artigo 103º, nº 1, alínea e) do CPPT, a acção é intempestiva e como tal deve ser rejeitada.»

1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir em conferência.

2. Em causa neste recurso está a decisão de indeferimento liminar de petição inicial de impugnação judicial apresentada em 01/12/2014 contra o acto de indeferimento de recurso hierárquico notificada através de ofício datado de 25/07/2014.

Com efeito, por decisão proferida a fls. 70 e seguintes, o tribunal recorrido rejeitou liminarmente, por extemporânea, a petição de impugnação, com a seguinte fundamentação:

«Em matéria de notificação dos atos tributários, em especial, e dos atos administrativos, em geral, estabelecem os arts. 36.º e 37.º do CPPT e 268.º da CRP, no que ao caso releva, o seguinte: […]

Decorre deste enquadramento legal que as notificações dos atos em matéria tributária, conterão sempre, além do mais, os meios de defesa e prazo para reagir contra o ato notificado e que, caso a comunicação da decisão em matéria tributária não contenha a indicação dos meios de reação contra o ato notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento.

Assim, no caso, designadamente, de falta de indicação na notificação dos meios de reação contra ato notificado, e respetivos prazos, o interessado poderá requerer a passagem de certidão que os contenha, no prazo 30 dias, sendo que, na falta de tal requerimento, o vício do ato de notificação ficará sanado ou, pelo menos deixará de ser relevante para afastar os efeitos normais da notificação, designadamente para determinação do termo inicial dos prazos de impugnação graciosa ou judicial — cfr. neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA […]

Sufragando tal entendimento, concluímos, deste modo, que a circunstância de a Impugnante não ter sido notificada acerca dos meios de defesa contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico não contende com a eficácia e validade da notificação, uma vez que não demonstrou nos autos ter requerido a notificação com os elementos em falta, ou passagem de certidão que os contivesse.

Assim sendo, e determinando a lei que a impugnação judicial deve ser apresentada no prazo de três meses — cfr. art.º 102.º, n.º 1, al. e), e 76º, n.º 2, ambos do CPPT — a contagem do referido prazo efetua-se nos termos do disposto nas als. b), c) e e) do art.º 279.º do Código Civil, ex vi do art.º 20.º, n.º 1, do CPPT, ou seja, de forma contínua, sem qualquer suspensão no período de férias judiciais. […]

Ora, em face de tudo quanto se expôs, e tendo em conta o prazo de 3 meses previsto no art.º 102º, n.º 1, al. e), do CPPT, o respetivo termo inicial do prazo de impugnação (partindo da alegação da Impugnante que, expressamente, reconhece ter recebido a notificação em 29.07.2014 — cfr. ponto 11 do requerimento de fls. 63), ocorreu em 30.07.2014, primeiro dia seguinte àquele em que ocorreu a notificação, terminando em 30.10.2014, dia que não coincide com sábado, domingo, feriado ou férias judiciais.

Conclui-se pois, que quando a petição inicial foi apresentada, em 01.12.2014 (cfr. fls. 2 dos autos), estava já caducado, há muito, o direito de impugnar. […].

Dissente a Recorrente do assim decidido, advogando que a falta de indicação dos meios de defesa torna a notificação da decisão nula, e que nos termos do que dispõe o art. 58º, nº 4, al. a), e nº 2, al. b), do CPTA, e atento o princípio da confiança, a impugnação podia ser apresentada no prazo de um ano, sendo que a ausência de utilização da faculdade prevista no art. 37º do CPPT não tem por efeito sanar o vício de que possa padecer a notificação; mais defende que o prazo para apresentar a impugnação se suspendeu durante as férias judiciais, nos termos da disciplina contida no art. 58º, nº 3, do CPTA e no art. 138º, nºs 1 e 4, do CPC, concluindo, por isso, que a decisão de rejeição liminar da impugnação violou, entre outras, a norma contida no art. 58º do CPTA.

As questões que se colocam neste recurso são, assim, as de saber se a falta de indicação dos meios de defesa na notificação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico determina a nulidade dessa notificação, e se o prazo para deduzir impugnação judicial contra essa decisão se suspende durante as férias judiciais.

2.1. Da nulidade da notificação

A notificação em causa refere-se ao acto de indeferimento de recurso hierárquico interposto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra acto de liquidação de contribuições para a Segurança Social.

Na tese da Recorrente, tal notificação padece de nulidade por falta de indicação dos meios de defesa legalmente facultados, o que, no seu entender, lhe confere o direito de impugnar a decisão no prazo de um ano, à luz da disciplina contida na alínea a) do nº 4 do art. 58º do CPTA.

Ora, é incontroverso que os actos administrativos, de que os actos em matéria tributária são uma espécie, estão sujeitos a notificação em harmonia com as exigências axiológicas contidas no nº 3 do art. 268.º da Constituição, e, nesta decorrência, o art. 36º, nº 2, do CPPT estabelece que «As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências.».

Todavia, o art. 39º do CPPT, que disciplina em matéria da perfeição das notificações, apenas comina com a nulidade a situação de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data.

Além disso, o art. 37º, do CPPT, estabelece, no seu nº 1, que, «Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento», e determina, no seu nº 2, que «Se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida.».

O que significa que a insuficiência da notificação por falta de indicação dos meios de defesa não conduz à nulidade do acto, mas faculta ao notificando o direito de requerer a notificação dos elementos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, dentro do prazo fixado no nº 1 do artigo 37º, e, usando dessa faculdade, o prazo para reagir (graciosa ou contenciosamente) contra o acto tributário conta-se a partir da notificação dos requisitos que haviam sido omitidos ou da passagem de certidão que os contenha.

Ora, a consequência de, na circunstância, nada ser requerido nos moldes definidos no art. 37º redunda na irrelevância da aludida insuficiência para afastar os efeitos normais da notificação já efectuada, como explica JORGE LOPES DE SOUSA (In Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 5ª ed., anotação 3 ao artigo 37º, pág. 333.), nos seguintes termos: «Será tendo em conta esta possibilidade de sanação que deverá ser interpretada a norma da alínea a) do nº 1 do art. 102.º, em que se estabelece como início do prazo de impugnação judicial e de reclamação graciosa o «termo do prazo para pagamento voluntário das prestações legalmente notificadas ao contribuinte». Com efeito, se se entendesse que apenas quando as notificações são efectuadas em total sintonia com o legalmente estabelecido elas têm potencialidade para conferir eficácia aos actos notificados, esta norma do nº 2 do art. 37.º não teria qualquer alcance nos casos de «reclamação» e de «impugnação», que nela são referidos, pois, tratando-se de casos em que a notificação não tenha sido integralmente efectuada em conformidade com a lei, seriam casos em que o prazo de impugnação judicial e de reclamação não se iniciaria enquanto não ocorresse uma notificação em absoluta conformidade com a lei. Por isso, a única interpretação que confere sentido útil à inclusão daquelas referências à «reclamação» e à «impugnação», parece ser a de que se, não for requerida a notificação dos requisitos omitidos, no prazo referido no nº 1, a omissão deixa de ser relevante para afectar a produção de efeitos do acto de notificação e, consequentemente, ficará assegurada a eficácia do acto notificado.».

Daí que se imponha concluir, como se concluiu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7/10/2009, no processo nº 128/09, que «a notificação sem todos os requisitos exigidos, mas que contenha aqueles sem os quais ela é considerada nula, indicados no n.º 9 do art. 39.º do CPPT, não deixará de valer como acto de comunicação ao destinatário quanto a tudo o que comunicou, produzindo os efeitos próprios de uma notificação quanto àquilo de que o informou, só não produzindo, no caso de o destinatário utilizar tempestivamente a faculdade prevista no art. 37.º, n.º 1, do CPPT, o efeito de determinar o início dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa do acto notificado.».

Entendimento este que, de resto, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a plasmar, reiteradamente, em muitos outros acórdãos, como sejam, designadamente, aqueles que proferiu em 12/05/2010, no processo nº 632/09, em 13/10/2010, no processo nº 493/10, em 12/01/2011, no processo nº 789/10, em 22/01/2014, no processo nº 1108/12, e em 29/10/2014, no processo nº 1381/12.

E, sendo claro que a falta de indicação dos meios de defesa não podia determinar a nulidade da notificação em causa nos autos, é também fora de dúvida que, ao contrário do que vem dito pela Recorrente, tal falta, não sendo apta para a induzir em erro, também não contende com o princípio da confiança, desde logo porque essa omissão não tem a virtualidade de criar quaisquer expectativas dignas de tutela jurídica, e, como se viu, a Recorrente podia, se assim o entendesse, requerer a notificação dos elementos omitidos, nos termos consignados no art. 37º do CPPT.

Aliás, a eventual nulidade da notificação também não teria como efeito a concessão do prazo de um ano para impugnar a que a Recorrente alude, pela comezinha razão de que nenhum efeito produziria.

Improcedem, pois, as conclusões do recurso no que tange às consequências jurídicas da invocada falta de indicação dos meios de defesa.

2.2. Da suspensão do prazo para deduzir a impugnação

Em defesa da tempestividade da impugnação, sustenta ainda a Recorrente que nos termos do que dispõem os arts. 58º, nº 3, do CPTA, e 138º, nºs 1 e 4 do CPC, o prazo para impugnar não corre durante as férias judiciais, e que, nessa circunstância, tendo em conta que foi notificada da decisão em 29 de Julho de 2014, e que as férias judiciais decorreram entre 16 de Julho e 31 de Agosto de 2014, o prazo legal de 90 dias para impugnar só se iniciou em 1 de Setembro de 2014, terminando em 29/11/2014, que, sendo sábado, se transferiu para o 1º dia útil seguinte, ou seja, 01/12/2014, data em que apresentou a petição de impugnação.

Em primeiro lugar, cumpre referir que o CPPT rege os prazos para a impugnação judicial, e, por conseguinte, na ausência de lacuna legal nesta matéria, é totalmente deslocada a invocação das regras contidas no art. 58º do CPTA.

Ora, como é jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal (Cfr., entre outros, os acórdãos proferidos pelo STA em 11/05/2011, no processo nº 55/11, em 7/09/2011, no processo nº 677/10, em 6/06/2012, no processo nº 1064/11 (Pleno), em 16/05/2012, no processo nº 291/12, em 28/11/2012, no processo nº 571/12, em 13/03/2013, no processo nº 836/12, e em 15/01/2014, no processo nº 1534/13.), o prazo para deduzir impugnação judicial é um prazo de caducidade, de natureza substantiva, que se conta nos termos do artigo 279º do Código Civil, como dispõe o artigo 20º, nº 1, do CPPT.

Na verdade, «o CPPT estabelece que, quando estamos perante a apresentação de uma impugnação judicial, não estamos ainda no processo judicial, estamos aquém dele. E depois consigna que nestes casos não se deve aplicar a forma de contagem própria do CPC, mas sim nos termos do CC» - Ac. do STA de 16/5/2012, no processo nº 291/12. Significa isto que o prazo para deduzir impugnação judicial não se suspende nas férias judiciais, como acontece com os prazos processuais, mas se o seu termo ocorrer nesse período transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, como preceitua a alínea e) do artigo 279º do Código Civil.

No caso vertente, considerando que a impugnante foi notificada do acto de indeferimento do recurso hierárquico em 29 de Julho de 2014, e que o prazo para deduzir a impugnação era de 90 dias, impõe-se concluir que tal prazo, tendo o seu início em 30/07/2014, terminou em 27 de Outubro de 2014.

E, sendo este um prazo peremptório, é fora de dúvida que, aquando da apresentação da impugnação, em 1/12/2014, se extinguira já há muito o direito de impugnar, tal como se julgou na decisão recorrida.

Razão por que a sentença recorrida não merece a censura que lhe vem dirigida.

3. Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 8 de Julho de 2015. – Dulce Neto (relatora) – Ascensão LopesAragão Seia.