Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01114/11
Data do Acordão:05/29/2014
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:LICENÇA DE LOTEAMENTO
PARECER FAVORÁVEL
DOMÍNIO PÚBLICO HÍDRICO
NULIDADE
PRINCÍPIO DO APROVEITAMENTO DO ACTO ADMINISTRATIVO
Sumário:I - No domínio do Dec. Lei n.° 560/71, de 17 de Dezembro e do Dec. Lei n.° 400/84, de 31 de Dezembro, é nulo o acto da câmara municipal de licenciamento de loteamento em parcelas privadas de leitos ou margens do domínio público hídrico que, na Região Autónoma da Madeira, não seja precedido de parecer favorável da Secretaria Regional do Equipamento Social.
II - Só pode recorrer-se ao princípio do aproveitamento do acto administrativo se o acto a proferir dever ter o mesmo conteúdo daquele cuja apreciação de validade se pretende. Não satisfaz esta exigência um parecer posterior, favorável ao licenciamento, mas com condições a que este não ficou subordinado.(*)
Nº Convencional:JSTA00068753
Nº do Documento:SA12014052901114
Data de Entrada:12/05/2011
Recorrente:CM DE SANTA CRUZ E A...., SA E OUTRO
Recorrido 1:C... E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF FUNCHAL
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM.
Legislação Nacional:DL 468/71 DE 05/11 ART5 N4 ART12 N2 ART32 ART17.
DL 287/73 DE 06/06 ART1 ART2 N1 ART14 N1.
DL 289/73 DE 06/06 ART2 N1 ART5 N1 B.
DL 93/90 DE 19/03.
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:
A Câmara Municipal de Santa Cruz, a A………., S.A. e B……….., L.da inconformados com a sentença do TAF do Funchal que, dando provimento ao recurso contencioso de anulação que C……………… e outros intentaram, declarou nulos os actos impugnados dela vieram interpor o presente recurso jurisdicional que remataram do seguinte modo:
1. Elidida que está a presunção da notificação do art.° 254°, n.º 6., do CPCivil, aplicável ex vi do art.° 1° da LPTA, demonstrada fica a tempestividade das alegações.
2. A sentença recorrida reconhece que o prédio em causa nos autos é, plenamente e em toda a sua extensão, propriedade privada, além do mais por se situar junto da crista de arriba alcantilada e tal lhe ser reconhecido pelo n.º 4, do art.° do DL n.º 468/71, de 5/11.
3. Todavia, e contraditoriamente, a mesma sentença considera ser necessário parecer do Secretário Regional do Equipamento Social, nos termos do art.° 12° do mesmo DL n.º 468/71, pretendendo qualificar, ou integrar, o prédio dos autos (ou parte dele), no conceito de “parcela privada de margem pública” ignorando, de todo, o que vem designado como tal, no art.° 5° do mesmo DL.
4. Na verdade, o terreno dos autos não foi objecto de reconhecimento como propriedade privada, por qualquer operação prevista no art.° 8° do DL.° 468/71, nem objecto de desafectação,
5. É que o terreno em causa não tem a natureza de propriedade privada por via de qualquer presunção, ou de operação de reconhecimento específico, mas antes pelo facto de o legislador ter dado um tratamento específico às regiões insulares (Madeira e Açores), excluindo do domínio público e considerando, antes, e à partida, objecto de propriedade privada os terrenos “junto à crista das arribas alcantiladas das respectivas ilhas”, como é o caso do prédio dos autos.
6. Por assim ser, como efectivamente é, a sentença recorrida enferma de erro manifesto, quando entende ter aplicação, no presente caso, o art.° 12.°, n.º 2, do DL n.º 4678/71 que, aliás, se refere tão só à Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos do Ministério das Obras Públicas.
7. Sucede que a descentralização que a Constituição de 1976 operou, em matéria de gestão urbanística, conferindo tal competência às autarquias (art.°s 6° e 237° da C.R.P.), implica a inconstitucionalidade do n.º 2 do art.° 12° do DL n.º 468/71.
8. Aliás, as normas em que se previa alguns recursos de decisões autárquicas, para os órgãos da Administração Central, foram tidas por inconstitucionais, e mesmo revogadas, pela Lei n.º 79/77, de 25/10, sendo manifesto que uma norma que subtrai, à partida, à administração autárquica a competência para licenciar obras locais é, manifestamente, inconstitucional.
9. Enferma, pois, o nº 2 do art.° 12° do DL n.º 468/71, de 5/11, de inconstitucionalidade e de ilegalidade, por violação do art.° 280.°, n.º 1, al.ª b) da CRP e do art.° 70°, n.º 1, alínea b) da LOFTC, tanto mais que o que se contem naquela disposição legal é uma verdadeira “licença” e não um mero parecer, como se refere na sentença recorrida.
10. Acontece ainda que, salvo o devido respeito, a sentença recorrida lavra ainda em confusão, entre actos de aprovação de loteamento e actos de controlo sobre execução de obras em geral os quais, de harmonia com o art.° 9.º do DL n.º 289/77, vigente ao tempo, são objecto de aprovação em separado, o que bem demonstra que, em qualquer caso, o n.º 2, do art.° 12.° do DL n.º 468/71, de 5/11, jamais poderia ser aplicável no presente caso.
11. Por sua vez, não tem sentido a sentença, ao afirmar que está em causa a prática, por órgão autárquico, de acto estranho às suas atribuições, o que implicaria a sua nulidade, por força da al.ª a) do n.º 1, do art.° 88° do DL n.º 100/84, de 29/03, com referência ao DL n.º 400/84, de 31/12, o que implica o entendimento de que a competência para licenciar operação de loteamento, caberia à Administração Central e, no caso em apreço, à Administração Regional.
12. Demonstrado que está a inconstitucionalidade do n.º 2 do art.° 12.° do DL n.º 468/71, afastada fica a aplicação art.° 88°, nº 1., alínea a) do DL nº 100/84, sendo certo que o art.° 65°, n.º 1 do DL n.º 400/84, de 31/12, aponta no sentido da competência para licenciar caber à autarquia.
13. Acresce que o DL nº 400/84, de 31/12, não tem aplicação no presente caso, uma vez que o seu art.° 85° é claro no sentido de que a sua aplicação às Regiões Autónomas depende de diploma regional de adaptação e este só veio a ser publicado em 1/10/1986 (Decreto Legislativo Regional nº 19/86/M, de 1/10), e a primeira deliberação impugnada nos autos data de 31-07-1985.
14. Ora, o diploma que antecedeu o DL nº 400/84, de 31/12, foi o DL nº 289/73, de 6/06, o qual não previa, entre os casos cominados de nulidade, a falta do parecer previsto no nº 2 do art.° 12° do DL nº 468/71, o que revela bem que a sentença recorrida andou mal.
15. Independentemente de tudo isto, a sentença recorrida andou mal, ao não fazer funcionar o princípio do aproveitamento dos actos administrativos, uma vez que a S.R.E.S. foi ouvida, e pronunciou-se favoravelmente, no loteamento em causa, pese embora, o mesmo seja de 05-09-1985 e a deliberação ser de 01-07-1985.
16. Todavia, o parecer do S.R.E.S. remete para o parecer 197, da D……………, ou seja, para os condicionamentos fixados por esta empresa, à qual a Câmara Municipal de Santa Cruz, por não dispor de pessoal especializado nesta área, havia recorrido, condicionamentos que ficaram, aliás, consignados no Alvará de Loteamento nº 63.
17. Estamos, pois, perante uma questão exclusivamente formal, pois, se (a ser exigível, e não é) o parecer deveria preceder a deliberação municipal, a verdade é que, sendo posterior, é concordante com a deliberação, que se louvou no parecer da D……….., em que a S.R.E.S. também se louvou, ou seja, há necessariamente, uma supressão da alegada irregularidade (e nunca nulidade) - a ser exigível e não era - pelo que haveria sempre uma sanação/ratificação que o princípio do aproveitamento dos actos administrativos exigia fosse tida em consideração (Vd., neste sentido, Acórdão do STA, de 11-10-2007).
18. Quanto se referiu tem total aplicação ao decidido relativamente às deliberações da CM de Santa Cruz, de 31-07-1985, de 23-10-1985 e de 21-05-86, com base na mesma alegada falta do parecer do n.º 2, do art.° 12° do DL nº 268/71, de 5/11, sendo certo que ainda se lhes aponta a violação do DL n.º 448/91, de 29/11 e do DL nº 555/99, de 16/12 que, obviamente, não vigorava nos anos de 1985 e 1986, anos em que tiveram lugar as deliberações acima mencionadas.
19. Acontece que as deliberações de 31-07-1985 e de 2-10-1985 nada têm a ver com o licenciamento de obras, pelo que nunca se colocaria a necessidade do parecer do n.º 2 do art.° 12° do DL nº 468/71, e só a deliberação de 21-05-1986 diz a isso respeito, mas, ao tempo desta última deliberação, já existia o parecer favorável da SRES de 05-09-1985, sendo absurdo que o tivesse de repetir (nº 2, do art.° 12° do DL nº 468/71), pelo que a sentença recorrida lavra em manifesto erro.
20. Lavra a sentença recorrida em manifesto erro, também quando a propósito da deliberação de 10-05-2002 (que, por lapso, refere como de 2005), volta a colocar a questão de novo parecer da SRES, nos termos do n.º 2, do art.° 12.° do DL n.º 468/71, pois, trata-se de deliberação que se limita a uma mera alteração de licenciamento de obras de construção e não de alteração ao loteamento, pelo que é, igualmente, incompreensível a referência que a sentença faz aos DL.s n°400/84 e 448/91 que tratam de matérias de loteamento e não de obras de edificação.
21. No mais, aplica-se em relação a esta deliberação de 15-05-2002 e à posição assumida pela sentença, quanto se referiu em relação às demais deliberações, sendo incompreensíveis as referências a diversas disposições legais (que não lhe são aplicáveis) para imputar nulidade àquela deliberação.
22. Mal andou ainda a sentença, ao considerar nulas as deliberações de 26-11-98, de 28-12-2001 e de 10-05-2002, por falta da consulta prévia prevista no art.° 17° e Anexos I e II do DL n.º 93/90, de 19/03 (REN), pela razão simples de que, para além do mais, não tendo sido efectuada adaptação daquele diploma à Região, não está definida qual a entidade, a nível da RAM, a que caibam tais competências.
23. A confirmá-lo está o facto da própria sentença recorrida não referir qualquer diploma regional que procedesse a tal aplicação e como as competências não se presumem, devendo estar expressamente conferidas por lei (vd. art.° 29°/1 do CPA), estamos perante uma impossibilidade jurídica, sendo certo que a sentença recorrida confunde as competências de decisão da RAM com as competências das delegações regionais do Ministério do Ambiente, sendo estas que estão em causa, além de que a sentença recorrida, com o devido respeito, confunde “competências” com “atribuições”.
24. Acresce que, ao mesmo tempo que considera nulas as deliberações referidas, por falta da consulta prevista no art.° 17° do DL nº 93/90, a verdade é que a sentença não refere qual a entidade que, a nível regional, seria competente para tal, interpretando aquela norma em termos de violar o art.° 2° do CPA, pondo em causa o princípio da legalidade (art.° 3° do CPA e art.° 266° da C.R.P.).
25. Aliás, a interpretação dada pela sentença, no art.° 17° do DL nº 93/90, no sentido da sua aplicação à RAM inconstitucionaliza aquela disposição, por violação do princípio da legalidade da Administração Pública previsto nos art.°s 266° n°2, e 280°, nº 1, al.ª b) da CRP e 70°, nº 1 al.ª b) da LOFTC, inconstitucionalidade que, para todos os legais efeitos, se argui.
26. Acresce que a REN, por força do previsto no art.° 35°, nº 2, do RJIGT tem a natureza de plano sectorial, os quais, por força do art.° 11° da LBPOTU e art.° 3° do RJIGT, vinculam directamente as actividades públicas, mas não já os particulares, pelo que o regime da REN não pode ser parâmetro da legalidade dos actos de operações urbanísticas, por não terem eficácia directa perante os particulares.
27. Acresce que o terreno em causa nos autos não se inclui na REN, por estar fora do âmbito fixado no seu Anexo II.
28. Contrariamente ao afirmado na sentença recorrida, as deliberações de 26-11-1998 e de 28-12-2001, foram precedidas dos pareceres legais, designadamente da DRU da Secretaria Regional do Equipamento Social e Ambiente, que mereceu a concordância do Secretário Regional, parecer que as deliberações em causa respeitaram e que o Tribunal deu como provados (V. alíneas P, Q, R dos factos assentes).
29. Sucede que, no respeitante à deliberação de 28-12-2001, e mercê do DL° 555/99, de 16/12, ter sido suspenso pelo art.° 4º do DL n.º 177/2001, de 4/6, que alterou o DL nº 555/99, de 16/12, temos que este último diploma não lhe é aplicável, mas antes o DL nº 334/95, de 28/12 e pela Lei nº 26/96, de 1/08, já que o procedimento que deu lugar àquela deliberação teve início por requerimento de 18-09-2001.
30. A consequência é que, se aquela deliberação enfermava de qualquer vício (e não enferma) seria, de harmonia com o art.° 56.°, n.º 1, do DL nº 448/91, uma mera anulabilidade que está, de há muito, sanada.
31. Relativamente à deliberação de 26-11-98, o pedido de parecer à SRES e Ambiente foi solicitado por ofício de 28-10-1998, (doc. 2 junto com a p.i., a fls. 78) e no tocante à deliberação de 28-12-2001 o parecer foi solicitado por ofício de 07-11-2001 - doc. 5 junto com a p.i. a fls. 15 - V. alínea WW) dos factos provados.
32. É absurdo entender que falta o parecer legal pelo facto deste ter sido emitido pelo Governo Regional, uma vez que o Secretário Regional pode avocar competências dos Directores Regionais e nada impede que submeta matérias avocadas, ao Plenário do Governo Regional, que integra.
33. As deliberações de 31-07-85 e de 23-10-85, não podem ter violado o DL nº 555/99, de 16/12, que só entrou em vigor em Outubro de 2001 e foi objecto de parecer prévio que acolheu, e a deliberação de 23-10-1985, já não teria de ser objecto de parecer prévio, que constituiria acto inútil, sendo certo que o DL nº 289/73 não obrigava a isso.
34. Além de que a sentença recorrida, no respeitante à deliberação de 26-11-1998 ignorou a alteração introduzida no DL n.º 448/91, pelo DL n.º 334/95 e pela Lei n.º 26/91, de 1/08, decorre ainda do seu art.° 56.° que, a haver omissão quanto ao pedido de parecer, geraria uma mera anulabilidade, que há muito estaria sanada, sendo certo que o parecer da Direcção Regional de Turismo foi pedido, emitido e foi favorável.
35. Finalmente, a sentença recorrida considera ocorrer nulidade das deliberações de 26-11-1998, de 28-12-2001 e de 10-05-2001, por não ter sido observada a avaliação do impacto ambiental, não lhe assistindo qualquer razão.
36. Efectivamente, no tocante à deliberação de 26-11-98, não há lugar a tal avaliação, uma vez que não está em causa um “projecto”, mas apenas uma mera alteração das especificidades do alvará de loteamento, sendo que o Decreto Regulamentar nº 38/90 exige tal avaliação, apenas para unidades que comportem o alojamento de mais de 1000 pessoas, o que não é o caso.
37. Menos sentido tem exigir tal estudo de impacto ambiental em relação à deliberação de 10-05-2002, que diminuiu o número de quartos previstos no projecto inicial.
38. Acresce que, de harmonia com o DL nº 69/2000 (Ponto 12 do Anexo 1) o AIA só exigido para hotéis com capacidade superior a 220 camas, não tendo ficado provado que fosse esse o caso.
39. A sentença recorrida violou, entre outras disposições legais, as que são referidas nas conclusões anteriores.

Os Recorridos apresentaram contra alegações mas não formularam conclusões.
O Ex.mo Sr. PGA emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.


FUNDAMENTAÇÃO


I. MATÉRIA DE FACTO
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos:
A) Por requerimento datado de 13/06/1985, a primeira Recorrida Particular, “... desejando proceder ao loteamento dos terrenos parcialmente urbanizados da sua propriedade com a área de 24.040,50 m2, localizados no Sector denominado ………….., freguesia do ……….., concelho de Santa Cruz …”, requereu a “apreciação do presente projecto de loteamento” - cfr. doc junto n.° 1 (fls. 54).
B) Segundo expressava a Recorrida Particular, o “terreno objecto do loteamento possui as seguintes confrontações: Norte: Arruamento V5; Nascente: Caminho e A……………, S.A.R.L., Sul: mar; a Poente: Arruamento V6 e a requerente”, encontrando-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Cruz sob o número 9228, fls. 47, Livro B-32 e então inscritos na matriz predial respectiva sob os artigos 39/14 (parte), 39/19 (parte), 39/20 (parte), 39/21 (parte), 39/23 (parte), 39/24 (parte), 39/27 (parte), 68, 69, 70 parte), 71 (parte), 72 (parte), 81 (parte), 82 (parte), 83, 84 (parte) e 85/2 (parte). - cfr doc junto n.° 1 (fls. 54 e 21).
C) No dia 19 de Julho de 1985, a “D…………………., Lda.” emitiu o parecer n° 197 relativo às operações de loteamento requeridas, o qual se dá por integralmente reproduzido - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 51 e 52).
D) Na mesma data foi solicitado parecer ao Secretário Regional do Equipamento Social pelo Vereador, em regime de permanência. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 51 e 52).
E) A Câmara Municipal recorrida, deliberou, no dia 31/07/1985, nos termos seguintes: “Aprovado nos termos da informação do Gabinete Técnico”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 54).
F) Através do ofício com data de entrada nos serviços municipais de 5/09/1985, o Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social transmitiu o parecer deste, que aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 49 e 50).
G) A Recorrida Particular, por seu requerimento de 10/09 do mesmo ano, veio requerer a reapreciação dos elementos que juntou: “plantas n.ºs 4 e 5, respectivamente do loteamento e de esgotos - águas, electricidade, assim como a folha n.º 4 da Memória Descritiva, devidamente alteradas em conformidade com o Parecer no 197 da D……………., Lda.”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 58).
H) No dia 17 de Outubro de 1985, foi prestada a informação de fls. 58 e 58 v.° do documento n.º 1, que aqui se dá por reproduzida.
I) Por requerimento com data de entrada nos serviços da Autoridade Recorrida de 23/10/1985, a primeira Recorrida Particular requereu que “... em relação ao lote no 4 do loteamento urbano dos terrenos integrados no sector denominado …………., no sítio do ………….. para a Cidade, freguesia do ……………, concelho de Santa Cruz, seja mantida a área inicialmente prevista para o mesmo (1300 m2), em virtude do respectivo adquirente já ter assumido compromissos com a banca, para efeitos de empréstimo, indicando aquela área”. - doc. junto n.° 1 (fls. 24).
J) No mesmo dia a Câmara Municipal recorrida deliberou nos termos seguintes:
Deferido, a título excepcional e desde que fique garantida a passagem reservada aos peões na parte Sul do referido lote”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 24).
No dia 25/10/1985, o Presidente da CM de Santa Cruz emitiu o alvará de loteamento n.° 63 a favor da A……………, S.A.R.L. e relativo ao terreno “integrado no sector denominado …………, da ………, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. Nos termos do qual foi titulada a constituição de 14 lotes de terreno, com “... índices de ocupação e de construção para os lotes nos 1 a 4 de 0,25 e 0,35 e para os lotes 5 a 14, inclusive, 0,15 e 0,2” e “... áreas de construção para os lotes 1 a 4, inclusive, e 5 a 24, inclusive, são de 3928 m2 e 1902, respectivamente”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 21 a 23).
k) No dia 7/03/1986 a Recorrida Particular veio apresentar “os projectos das infra-estruturas referentes ao loteamento urbano aprovado integrados no sector …………”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls 12).
L) Por ofício com data de entrada de 13 de Março de 1986, o Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social manifestou a discordância deste com o alvará emitido. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 16 e 17).
M) A Câmara Municipal recorrida deliberou, na sua reunião de 21/05/1986, nos termos seguintes: “Aprovados. É fixado o prazo de um ano para a execução dos respectivos trabalhos”. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 12).
N) Em 28 de Novembro de 1998 (A indicação desta data deve-se a lapso uma vez que se menciona na al.ª P que os pareceres foram solicitados em 28/10/98 e que o parecer da SRU foi entregue em 10/11/98 (al.ª R). Deste modo, a data daquele requerimento que iremos considerar é a de 28/10/98.), a primeira Recorrida Particular veio, “na qualidade de proprietária dos lotes 1, 2, 12, 13, e 14, do Alvará de Loteamento n.° 63, emitido pela Câmara Municipal de Santa Cruz, em 25 de Outubro de 1985, totalizando assim a maioria de dois terços dos proprietários do referido alvará …”, “apresentar estudo de alteração às especificações do alvará de loteamento, nomeadamente, a unificação dos lotes 1, 2, 12, 13 e 14, para efeitos de construção de um empreendimento turístico, de acordo com o estudo em anexo” e solicitar a emissão do “... respectivo aditamento de alteração do alvará de loteamento n.° 63 de 5 de Outubro de 1985”. - cfr. doc. n.° 2 (fls. 80).
O) Instrui o requerido nomeadamente com memória descritiva, que aqui se dá por reproduzida. - cfr. doc. n.° 2 (fls. 105 e 106).
P) Por informação prestada pelos serviços no dia 28/10/1998 foi sugerida a solicitação de pareceres à “S. R. Equipamento Social e Ambiente, assim como à D. R. Turismo”, a qual foi deferida pelo Vereador recorrido por despacho do mesmo dia. - cfr. doc. junto nº 2 (fls. 80).
Q) O parecer àquele primeiro departamento do governo regional foi solicitado pelo oficio n.° 2570. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 78).
R) O Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social e Ambiente transmitiu, através do ofício com data de entrada de 10/11/1998 “... o parecer da DRU…” que mereceu a concordância deste, do teor seguinte:
“1 - No que concerne à junção dos lotes e à alteração funcional para efeitos turísticos, não se nos afigura, em termos urbanísticos e no âmbito do POTRAM, qualquer impedimento, pelo que poderá ser viabilizada a pretensão.
2 - Já no que respeita ao aumento da superfície de ocupação e índice de construção, é óbvio ser a proposta, em termos legais e urbanísticos, um volume desajustado, sendo impossível cumprir, face à área de terreno do requerente, os parâmetros de dimensionamento e cedências previstos na Portaria Regional no 9/95, de 3/02. Assim, julga-se que a proposta apresentada não é viável, por apresentar notoriamente uma sobrecarga numa zona que, pelo excesso de construção existente, se tomou numa zona urbanisticamente em vias de desclassificação, processo que deverá ser invertido e não acentuado.
3 - Por outro lado, o tipo de ocupação e área afecta à mesma, assim como a localização na área de estudo do POOC da Costa Funchal - Ponta de São Lourenço, requer a necessidade de parecer da APRAM.
4 - Caso a APRAM desbloqueie a área, e à semelhança do que foi viabilizado na alteração do alvará de loteamento do processo E………………., Lda. na mesma zona, os indicadores urbanísticos aceitáveis serão os seguintes:
4.1 - Índice máximo de construção 1.1 e não 1.8 como proposto.
4.2 - O projecto de arquitectura da unidade deverá prever lugares de estacionamento públicos e privados, de acordo com a Portaria Regional nº 9/95/M, de 3/02.
4.3 — O número máximo de pisos acima do arruamento não deverá ser superior a 3, com altura máxima de 9 metros.
4.4 — Deverá ser criada promenade pública em toda a frente sul do prédio rústico, com dimensionamento idêntico aos existentes na zona do Hotel ………., devidamente equipada com mobiliário urbano, sendo da responsabilidade do requerente a sua execução.” - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 76 e 77).

S) O Chefe de Divisão de Gestão Urbanística prestou no dia 12/11/1998, a seguinte informação:
1 - É pretendido com o presente estudo, efectuar alterações às especificações do Alvará de Loteamento n° 63/85 ao sítio do ………… para a Cidade, da …………. (sector ……….), com a finalidade de unificar os lotes 1 (3.365 m2), 2 (3.503 m2), 12 (777,5 m2), 13 (872,5 m2) e 14 (930 m2), para efeitos de construção no novo lote de um empreendimento turístico de quatro estrelas constituído por 267 quartos, áreas de reuniões, restaurantes, alinhamento comercial integrado, piscinas, squash, estacionamentos, etc. num total de 18.940 m2 de construção.
2 - A proposta de alteração mereceu parecer favorável da Secretária Regional do Equipamento Social e Ambiente (SRESA), através do seu oficio n° OF 11.694 de 1998/11/10, desde que fosse reduzido «o aumento da superfície de ocupação e índice de volume da construção», nos termos indicados no referido parecer da S.R.E.S.A., garantindo-se ainda o cumprimento da Portaria Regional n° 9/95, no que diz respeito a estacionamentos públicos e privados, assim como a promenade pública na frente Sul do novo lote.”.- cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 72 e 73).

T) O Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, no dia 12/11/1998, exarou o seguinte despacho:
Certifique-se de conformidade com a presente informação e remeta-se à reunião para ratificação”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 72).
U) A Câmara Municipal Recorrida deferiu o requerido pela recorrida particular por deliberação tomada na sua reunião do dia 26/11/1998. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 72).
V) Aos 4/12/1998 foi emitido o alvará respectivo que titulou a alteração ao alvará de loteamento n° 63, a qual alteração consistiu na anexação dos lotes 1, 2, 12, 13 e 14, com inclusão de 690 m2 da área da vereda da partilha dos lotes objecto da unificação, para efeitos de construção no novo lote de um empreendimento turístico. - cfr. doc. junto nº 2 (fls. 42, 16 e 17, 66, 69 e 70).
W) O índice de construção passou para 1.1, o número de pisos acima do arruamento não podia ser superior a três, com a altura máxima de nove metros, devendo ser criada promenade pública em toda a frente Sul do prédio rústico, com dimensionamento idêntico ao existente na zona do Hotel …………… - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 42,16 e 17, 66, 69 e 70).
X) Aos 7/01/1999, o Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social e Ambiente comunicou que o ponto 4.4 do seu ofício no 11696 de 8/11/09 passava a ter a seguinte redacção:
4.4 — Criação de uma promenade pública em toda a frente sul do prédio, com as características e em condições idênticas ao estabelecido para o loteamento da “E………………..., Lda. “, na mesma zona”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 65).
Y) Por seu turno, a Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Turismo e Cultura transmitiu, pelo ofício com data de entrada de 15/02/1999, a seguinte informação da Direcção Regional do Turismo:
“No que concerne à localização da unidade, nada há a opor.
Relativamente ao aspecto funcional, de acordo com as peças escritas e desenhadas, a proposta apresenta condições, em princípio, para vir a ser classificada como Hotel de 4 estrelas.
Contudo, a referida classificação só poderá ser atribuída após a apresentação do projecto de arquitectura, à escala 1/100, instruído com os elementos previstos na Portaria n.° 1064/97, de 21 de Outubro, de modo a serem avaliados os requisitos previstos no Decreto Regulamentar n.° 36/97 e respectivo anexo I, bem como a respectiva capacidade … .” - Cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 75)

Z) Pelo requerimento com data de entrada de 15/031999, a recorrida particular requereu a “apreciação (...) de um ante-projecto para a construção de uma unidade hoteleira de 5 estrelas, denominado F………… ..“, “... com a capacidade de 199 quartos, 10 suites e suas instalações complementares, incluindo instalações balneares marítimas a ser concessionada pela Administração de Portos da Região Autónoma da Madeira”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 1).
AA) A qual unidade hoteleira seria edificada no lote de terreno resultante da alteração do alvará de loteamento n° 63, através da unificação dos lotes nos 1, 2, 12, 13 e 14, com a área total de 10.140 m2.
BB) O Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, por despacho de 22/03/1999, ordenou fosse o recorrido particular notificado para instruir o requerimento com documentos em falta e solicitou parecer ao Serviço Regional de Protecção Civil e à Direcção Regional do Turismo. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 13).
CC) Por requerimento com data de entrada de 9/04/1999, a recorrida particular requereu a junção de três dos documentos solicitados e, quanto à sua legitimidade, afirma que “é hábito nas construções para a Indústria do Turismo, que beneficiam de isenção de Sisa, as escrituras Públicas de titularidade do terreno só se efectuaram após a Certificação da Utilidade Turística Prévia, que normalmente é publicada no Diário da Republica após a aprovação do anteprojecto que se encontra em fase de análise, pelo que o mesmo só poderá ser exibido conjuntamente com o projecto de execução da obra.” - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 13).
DD) A 11/05/1999, o Gabinete de Gestão e Urbanismo informou o mesmo Vereador do seguinte:
Tratando-se de um ante-projecto (Req.to 863-E de 99/03/15), estamos perante um pedido de informação prévia pelo que julgamos não haver necessidade do documento comprovativo da legitimidade do requerente.
Os pedidos de informação prévia não estão sujeitos ao parecer do serviço regional de protecção civil”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 13).
EE) Através do ofício n.º 769, de 30/04/1999 e com data de entrada de 3/05 do mesmo ano, a Secretaria Regional do Turismo e Cultura, através da Chefe de Gabinete do Secretário Regional, comunica o parecer da Direcção Regional de Turismo, que nesta sede dá-se por integralmente reproduzido. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 14).
FF) No dia 11 de Maio de 1999, o Chefe de Divisão de Gestão Urbanística elabora informação de fls. 17 e 16 do documento junto n.° 2, que aqui se dá por reproduzida.
GG) No dia 13/05/1999, o Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, ao abrigo de subdelegação de competências do Presidente da Câmara, profere o seguinte despacho:
Deferido desde que a proposta cumpra com o índice de construção de 110% que os lugares de estacionamento privados se encontrem de acordo com a portaria 9/95 de 3 de Fevereiro. Que o número máximo de pisos acima do arruamento não seja superior a 3 com a altura máxima de 9 metros. Que seja criada uma promenade pública em toda a frente Sul devidamente equipada com mobiliário urbano, nos termos o oficio 12788 de 98/12/17 da SRESA.” - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 17 e 18).
HH) O recorrido particular, por requerimento, com data de entrada de 27/12/2000 ………… requer a apreciação do “... projecto-base para a construção de uma unidade Hoteleira de 5 estrelas, denominado F………….. com a capacidade de 200 quartos, e 12 suites e respectivas instalações complementares...”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 20 vº.)
II) Incluindo “instalações balneares marítimas a ser concessionada pelo Departamento Competente do Governo Regional da Madeira” conforme memória descritiva então junta, que dá-se por integralmente reproduzida. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 20vº, 26 e 35).
JJ) O Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, por despacho de 8/01/2001, ordenou a notificação do recorrido particular para este apresentar os documentos em falta e expressos em informação da Chefe do Gabinete de Gestão e Urbanismo. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 20 v°, 20 e 36).
KK) A 16/11/2001, o recorrido particular requereu a junção certidão do registo predial. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 38 a 44).
LL) No dia 31 do mesmo mês e ano, o mesmo Vereador solicitou pareceres à Secretaria Regional dos Assuntos Sociais e Parlamentares, Serviço Regional de Protecção Civil, Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes, ao Chefe de Gabinete do Secretário Regional de Turismo e Cultura e à Delegação de Saúde de Santa Cruz. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 45 a 48).
MM) O Serviço Regional de Protecção Civil, pelo oficio n.º 298/2001, de 15/03/2001 e com data de entrada 19 do mesmo mês e ano, fez ver que “... as consultas (...) (para efeitos de parecer) (...) devem ser acompanhadas pelos respectivos “estudos/projectos de segurança contra riscos de incêndio”, elaborados em conformidade com o disposto na portaria 1063/97, de 21 de Outubro . - cfr. doc. junto n.° 2 (fls 51).
NN) No dia 28 de Março desse ano, o mesmo Vereador solicitou ao recorrido particular “... o projecto contra riscos de incêndio.” – cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 52).
OO) O Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social e Transportes, por oficio com data de entrada de 11/04/2001, comunica ao Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz que o Conselho do Governo do dia 5/04 tomou a seguinte Resolução:
Tendo sido analisado, nos termos da Portaria nº 229/90, de 10 de Dezembro, o pedido de parecer sobre a Unidade Hoteleira F…………, requerido por B……….., Lda., foi deliberado devolver o processo, para decisão, à autarquia, posto que o alvará de loteamento em que se insere o empreendimento foi alterado, respeitando os pressupostos do parecer da SRES, transmitido através do n/ ofício 11694, de 98.11.09.
Competirá agora à autarquia nos termos da legislação em vigor, a verificação da conformidade do projecto em apreço, com o alvará de loteamento aprovado”.- cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 53 e 54).
PP) No dia 21/05/2001, o Arq. G……………….. presta a informação de fls. 55 e 56 do documento n. ° 2, que aqui se dá por reproduzida e foi junto aos autos o parecer da Delegação de Saúde. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 57).
QQ) No dia 5/06/2001, o Vereador com o Pelouro das Obras Particulares notifica o recorrido particular de que, “... após reunião do executivo e por análise à informação do Gabinete de Gestão e Urbanismo, verifica-se que a proposta não está de conformidade com o alvará de loteamento, pelo que convidamo-los a suprir as deficiências referidas na informação do Gabinete de Gestão e Urbanismo.” - cfr. doc. junto n.º 3.
RR) No dia 26/07 do mesmo ano, o Presidente da Câmara Municipal, atendendo à “reunião ocorrida ontem, 25 de Julho, pelas 11 horas, na Câmara Municipal de Santa Cruz , comunicou à Recorrida Particular que “convidamos-vos a apresentarem requerimento de alteração do alvará de loteamento nos termos combinados, fazendo menção obrigatória do seguinte:
Reunir autorizações autenticadas da legitimidade de 2/3 dos proprietários dos lotes constantes no alvará, com vista à autorização da referida alteração;
A nível de parâmetros urbanísticos, a cércea é de 15 metros, considerados a partir da cota de soleira, implantada à cota intermédia do lote 11, referenciada ao Caminho Municipal dos ....., sendo o número máximo de pisos referenciado à cota da soleira é de 4 (quatro)”. - cfr. doc. junto n.° 4.
SS) O ora recorrido particular, por requerimento de 18/09/2001, requereu “…autorização para a alteração do alvará de loteamento... (...), cuja cércea será de 15 metros considerados a partir da cota de soleira, implantada à cota intermédia do lote referenciado ao Caminho Municipal dos …………., sendo o número máximo de pisos referenciado à cota da soleira de 4 (quatro).” - cfr. doc. junto n.° 5. (fls. 7).
TT) Instruiu o peticionado com a respectiva memória descritiva e parâmetros numéricos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos. - doc. junto n.° 5 (fls. 8 a 12).
UU) O Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, por despacho de 27/09/2001, ordenou fosse o recorrido particular notificado do teor da informação da Chefe do Gabinete de Gestão e Urbanismo, que aqui se tem por reproduzido. - doc. junto n.° 5 (fls. 7 vº).
VV) Por requerimento com data de entrada de 30/10/2001, o recorrido particular juntou aos autos procedimentais os documentos solicitados. - Cfr. doc. junto n° 5 (fls. 13).
WW) E por oficio de 11/11/2001, foi solicitado parecer à Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes sobre a alteração ao alvará de loteamento n.° 63/85. - cfr. doc. junto n.° 5 (fls. 15).
XX) O Chefe de Gabinete do Secretário Regional do Equipamento Social e Transportes, por oficio com data de entrada de 13/12/2001, comunica o teor da seguinte resolução do Conselho de Governo:
Tendo sido analisado, nos termos da Portaria no 229/90, de 10/12, o pedido de alteração de alvará de loteamento, no Sítio dos …….., ……… - Santa Cruz, em que é requerente, B…………, Lda., foi deliberado que atendendo a que a requerente já apresentou na Câmara Municipal (...) as declarações de anuência de 2/3 dos proprietários do loteamento, é viabilizada a construção da unidade hoteleira proposta”. - cfr. doc. junto (fls. 14).
YY) A Câmara Municipal recorrida, por deliberação de 28 do mesmo mês e ano, deliberou no sentido da aprovação do requerido “com o votos do PSD e com voto contra do Senhor Vereador Doutor ……. e abstenção do Senhor Vereador ……….”. - cfr. doc. junto n.° 5 (fls. 14).
ZZ) No dia 28/01/2002, foi emitido o “Aditamento ao alvará de loteamento n° 63/85”, nos termos do qual o lote A passou a ter a seguintes especificações:
Cércea - 15.00; Número máximo de pisos - 9, sendo quatro pisos acima da cota de soleira.”.- cfr. doc. junto n.° 6 (fls.1).
AAA) No mais, conforme do alvará expressamente consta, “são mantidas as restantes especificações do alvará emitido, bem como da alteração emitida por esta Câmara Municipal em 04 de Dezembro de 1998”. - cfr. doc. junto n.° 6 (fls. 1).
BBB) No dia 9 de Maio de 2002 o requerido particular deu entrada um requerimento pelo que submetia à “apreciação de V. Exa, o projecto de alterações, com base na notificação a que se refere o ofício no 1165, datado de 22/04/2002, e do aditamento ao Alvará de loteamento no 63/85, emitido em 28 de Janeiro de 2002.”. - cfr. doc. junto n.° 7 (fls. 10).
CCC) O recorrido aí informa que a “alínea D do oficio n.° 1165, relativamente ao parecer da Direcção Regional de Turismo, o mesmo foi já emitido, e declarado de utilidade Turística Prévia, através do Despacho n.° 75/99, publicado na II Série - número 108 de 4 de Junho de 1999 do Jornal Oficial”. - cfr. doc. junto n.° 7 (fls. 10).
DDD) No dia seguinte, ou seja a 10 de Maio de 2002, a Câmara Municipal recorrida deliberou aprovar o requerido “por unanimidade”. - cfr. doc. junto n.° 7 (fls. 10).
EEE) Tal deferimento foi comunicado ao recorrido particular por oficio datado de 22 do mesmo mês, tendo sido notificado para no prazo de 180 dias apresentar os projectos de especialidade. - cfr. doc. junto n.° 7 (fls. 10).
FFF) O prédio rústico sobre o qual a primeira recorrida particular requereu o licenciamento de todas as operações de loteamento e obras de urbanização fica situado no sítio do ....., para a Cidade, freguesia do ………., concelho de Santa Cruz - cfr. docs. juntos nos 1 (fls. 54, 28 a 47, 24), 2 (fls. 80, 89 a 125, 58 a 60), 5, 6, 7 e 8.
GGG) E com inclinação contínua no sentido do mar (sul e nascente) sem ser muito acidentada e que a “…costa é formada por falésias rochosas de rara beleza, com pequenas praias de grande seixo...” - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 48).
HHH) O dito prédio, como mostram as plantas de localização e de implantação com que as Recorridas Particulares instruíram os diversos procedimentos administrativos, tem por limite Sul e Oeste o Mar. - cfr. docs. juntos n.°s. 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2 e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls. 37 a 58).
III) Todas e cada uma das operações de loteamento que as Recorridas Particulares requereram, quer a inicial quer as sucessivas alterações, incidem sobre esse mesmo prédio que vai até ao Mar. - cfr. docs. juntos n.°s. 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2 e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls. 37 a 58).
JJJ) E as obras de urbanização ficam implantadas no terreno que directamente confina com o Oceano Atlântico. - cfr. docs. juntos n.°s. 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2 e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls.37 a 58).
KKK) Como demonstram as diversas plantas com que as Recorridas Particulares instruíram os procedimentos administrativos e que aqui se dão integralmente por reproduzidas para todos os efeitos legais, inexiste a Sul e a Oeste qualquer distância entre as operações requeridas e as águas do Mar. - cfr. docs. juntos n°s 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2 e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls. 37 a 58).
LLL) As águas do Mar do Oceano Atlântico banham directamente parte do terreno objecto das operações de loteamento e das obras de urbanização. - cfr. docs. juntos n.°s. 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2 e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls. 37 a 58).
MMM) A implantação e a situação física e real do prédio contígua às águas do Mar mantêm-se inalterada desde 1985 até à presente data. - cfr. docs. juntos n.°s. 1 (fls. 35 a 37), 2 (fls. 26, 73, 107 a 119), 5 (fls. 17), 6 (fls. 2e 3), 7 (fls. 26 a 45) e 8 (fls. 37 a 58).
NNN) De todos e de cada um dos descritos procedimentos administrativos não consta demonstrado a existência de qualquer acto de licença praticado pela Capitania do Porto do Funchal, Direcção Geral de Portos, Direcção Geral dos Recursos Naturais ou Instituto da Água.
OOO) Nem qualquer contrato de concessão de usos privativos que incida sobre o trato de terreno contíguo e sobranceiro ao Mar e situado naquele troço da respectiva costa marítima.
PPP) Dos mesmos procedimentos administrativos não consta nem está demonstrada a existência de qualquer delimitação de margens dominiais.
QQQ) Em todos e em cada um dos procedimentos administrativos em apreço e relativos ao licenciamento das operações de loteamento e obras de urbanização a Autoridade Recorrida não realizou consultas nem obteve autorizações da Capitania do Porto do Funchal, Direcção Geral de Portos, Direcção Geral dos Recursos Naturais ou Instituto da Água.
RRR) A extremidade do mesmo terreno que a Norte confina com o Caminho Municipal dista menos de duzentos metros das águas do mar.
SSS) Não foi ouvida a entidade referida nos artigos 17°, n.°s. 1 e 3 e 4°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 93/90, de 19 de Março.
TTT) Não foram ouvidas a Direcção Regional de Habitação, Urbanismo e Ambiente (DRHUA), a Direcção Regional do Urbanismo e Ambiente (DRAU), a Direcção Regional do Urbanismo (DRU), e a Direcção Regional de Ordenamento do Território (DROT).
UUU) As deliberações da Câmara Municipal Recorrida de 31 de Julho de 1985 e de 23 de Outubro de 1985 não foram precedidas de qualquer parecer da DRUHA.
VVV) Com efeitos, no que tange à primeira deliberação a mesma foi adoptada na data indicada, ou seja, doze dias depois de ter sido solicitado parecer à Secretaria Regional do Equipamento Social. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 56, 49 e 50).
WWW) Sem que este departamento o tivesse ainda emitido - o que só veio a suceder no dia 5/09/1985 - ou decorrido o prazo legal para tanto e depois de ter obtido um parecer de uma firma de arquitectos, a “D………………, Lda”. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 56, 49, 50, 51 e 52).
XXX) Quanto à segunda deliberação, a mesma incidiu, como a primeira Recorrida Particular de forma expressa refere — … devidamente alteradas em conformidade com o Parecer n.° 197 da D…….…” -, sobre alterações das operações de loteamento já deferidas pela deliberação da Autoridade Recorrida de 31 de Julho de 1985.
YYY) Não foram ouvidos de novo os indicados órgãos centrais.
ZZZ) O titular do departamento do governo regional em causa manifestou a sua estranheza e discordância relativamente ao alvará emitido pela Autoridade Recorrida. - cfr. doc. junto n.° 1 (fls. 16 e 17).
AAAA) A deliberação da Autoridade Recorrida de 28/12/2001 não foi antecedida de parecer da Secretaria Regional do Equipamento Social do Governo Regional - DROT.
BBBB) Nem os próprios os órgãos municipais solicitaram à DROT a emissão de parecer.
CCCC) Já no que se refere à deliberação da Câmara Municipal, datada de 26/11/1998, tal acto foi precedido do parecer da então DRU.
DDDD) O qual foi solicitado no dia 28/10/1998 e emitido no dia 9/11 do mesmo ano. - cfr. doc. junto n.º 2 (fls. 76 e 77).
EEEE) O transcrito parecer da DRU diz que o aumento de superfície de ocupação e índice de construção seria “impossível cumprir, face à área de terreno do requerente, os parâmetros de dimensionamento e cedências previstos na Portaria Regional n.° 9/95, de 3 de Fevereiro”.- cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 76 e 77).
FFFF) Razões pelas quais aquela Direcção Regional julgou que a “... proposta apresentada não é viável, por apresentar notoriamente uma sobrecarga numa zona que, pelo excesso de construção existente, se tornou numa zona urbanisticamente em vias de desclassificação, processo que deverá ser invertido e não acentuado” - cfr. doc. junto n.°2 (fls.76 e 77).
GGGC) Ainda quanto à deliberação da Câmara Municipal Recorrida de 26 de Novembro de 1998 não foi ouvida previamente a Direcção Regional do Turismo (DRT).
HHHH) Por outro lado, como do requerimento da Requerida Particular consta, esta apresentou um “... estudo de alteração às especificações do alvará de loteamento…” - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 80).
IIII) Por outro lado, a completa execução dos actos recorridos provocará um completo desfiguramento e alteração na paisagem natural envolvente da costa do sítio do ……… para a Cidade e da freguesia do ………
JJJJ) A alteração daquele solo das margens do mar, nomeadamente com os trabalhos que já na presente data já decorrem e com a edificação do prédio projectado, será visível a várias dezenas de quilómetros de distância.
KKKK) E entre a vista do Mar ou da terra irão interpor-se às obras de urbanização e as construções previstas nas operações de loteamento licenciadas pela Autoridade Recorrida e já projectadas.
LLLL) No atinente aos actos administrativos das Autoridades Recorridas praticados nos procedimentos administrativos de alteração de operações de loteamento já licenciadas e cujo objecto recaia sobre um empreendimento hoteleiro - deliberações de 26 de Novembro de 1998, de 28 de Dezembro de 2001 e de 10 de Maio de 2002 da Câmara Municipal - a unidade hoteleira, como a Recorrida Particular declarou, seria dotada de 599 (quinhentos e noventa e nove) camas e 267 (duzentos e sessenta e sete) quartos. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 105, 106, 107, 72).
MMMM) Como incluiria área de reuniões, restaurantes, bases, esplanada, alinhamento comercial integrado, piscinas, squash, estacionamentos, jogos, massagem, sauna, vapor, jacuzzi, ginásio, cabeleireiro, etc. - cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 111 a 120, 72).
NNNN) Por outro lado, a instalação hoteleira seria, nos termos do concebido e declarado pela Recorrida Particular, “um empreendimento turístico” ou “uma unidade hoteleira”, de “cinco estrelas” e denominado “F……….”.- cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 80 e 105, 1, 20 v.).
OOOO) A DRT, face ao pretendido, afirma que as instalações poderão vir a ser classificadas como “Hotel de 4 estrelas” e os serviços camarários apontam que a Recorrida Particular pretende construir ”…um empreendimento turístico de quatro estrelas…”- cfr. doc. junto n.° 2 (fls. 75 e 72).
PPPP) Ora, nos procedimentos administrativos em apreço em momento algum foi realizado qualquer estudo/avaliação de impacte ambiental, nem a respectiva licença resulta demonstrada nos autos.
QQQQ) Nem tão pouco a Autoridade Recorrida solicitou previamente à prolação dos actos impugnados o parecer obrigatório das indicadas entidades exteriores ao município.
RRRR) Como em momento algum solicitaram ou exigiram às Recorridas particulares a apresentação prévia do documento comprovativo da declaração de impacte ambiental (DIA).
SSSS) Os recorrentes são cidadãos de nacionalidade portuguesa e encontram-se todos no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos. - documento junto n.° 8.
TTTT) Têm a sua residência permanente ao “………”, sito na Rua ……….., sítio do ……….. para a Cidade, freguesia do ……….., concelho de Santa Cruz, como consta do intróito da presente petição de recurso. - cfr. doc. junto n° 8.
UUUU) Na mencionada freguesia do ……… estão recenseados e inscritos nos respectivos cadernos eleitorais e são eleitores, sendo titulares dos cartões nºs .........., ......... e ........... - cfr. doc. junto n.° 8.
VVVV) Na morada indicada têm o seu domicílio fiscal e aí são colectados e contribuintes das contribuições directas do Estado, sendo que são titular dos números de contribuinte fiscal n.°s. .........., ......... e ......... - cfr. doc. junto n.° 8.
WWWW) O terreno objecto dos presentes autos situa-se junto à crista de uma arriba. - cfr relatório pericial de fls. 566 a 572 e 592.
XXXX) O terreno objecto dos autos, apesar da sua proximidade com a arriba ou falésia, não se situa sobre uma ou outra em toda a sua extensão mas somente na sua zona Oeste. - cfr relatório pericial de fls. 566 a 572 e 592.
YYYY) A arriba varia, ao longo de toda a extensão do terreno, de um talude abrupto na sua zona Oeste para um talude mais suave na zona central e zona Este. - cfr relatório pericial de fls. 566 a 572 e 592.
ZZZZ) A unidade hoteleira mencionada na alínea anterior tem 195 quartos. - cfr. doc. de fls 559 e 560 e depoimento das testemunhas H………….. e I………..
AAAA) A construção tem capacidade de alojamento superior a 200 (duzentas) camas, dependendo o seu número da opção a tomas por quartos individuais ou duplos e do seu número. - cfr. doc. de fls 559 e 560 e depoimento das testemunhas H………. e I………..

ADITA-SE À MATÉRIA DE FACTO.
BBBB) O ofício 1165 da Câmara Municipal de Santa Cruz mencionado na al.ª BBB do probatório tem o seguinte teor:

“Assunto: “Notificação
De acordo com o Vosso requerimento datado de 13.07.2001, registado na Secretaria do Serviço de Obras sob o n.º 3078, pelo presente informo V. Ex.as que a proposta edificativa é viável, desde que sejam observados os seguintes aspectos:
a) O passeio marítimo deverá ter a largura mínima de 4 metros, mantendo as mesmas características do existente, criando-se rampas com inclinação máxima de 10% em substituição das escadarias, para melhor acessibilidade. Deverão também ser contempladas bacias para colocação de Palmeiras, mobiliário urbano idêntico ao existente e ligação ao Hotel …………..;
b) O pontão de acesso ao mar deverá interceptar o passeio marítimo à mesma cota e não desnivelado;
c) Deverão ser revistos os materiais a aplicar na cobertura do Edifício sugerindo-se revestimento em telha tipo lusa ou aba e canudo;
d) Será solicitado parecer à Direcção Geral de Turismo.”

FACTOS NÃO PROVADOS
A unidade hoteleira apresentada pelo recorrido particular, B…………….., Lda., e aprovada pela recorrida em 10-5-2002, está dotada de 599 (quinhentos e noventa e nove) camas e 267 (duzentos e sessenta quartos). - cfr doc. de fls 559 e 560.


II. O DIREITO.
Resulta do anterior relato que a A…………….., S.A. requereu à Câmara Municipal de Santa Cruz, em 13/06/85, o loteamento de um terreno de que era proprietária, que confrontava com o mar, o que levou a que aquela autarquia solicitasse ao Secretário Regional do Equipamento Social (doravante SRES) parecer sobre a viabilidade dessa pretensão. E, em 31/07/85, sem ter ainda recebido esse parecer, o que só ocorreu em 5/09/85 (Onde se disse que “não se vê inconveniente na aprovação do loteamento proposto” desde que fossem satisfeitos os condicionamentos nele indicados.), aquela Câmara aprovou esse loteamento (1.º acto impugnado), o que determinou a emissão, em 25/10/85, do correspondente alvará, a que foi dado o número 63/85, onde se especificaram as áreas dos 14 lotes aprovados, se indicou quais os índices de ocupação e construção de cada um deles, se exigiu que fosse assegurada uma passagem para o mar afecta ao domínio público e se fixou o prazo para a conclusão das infra-estruturas a realizar (fls. 83/85 e fls. 91).

Em 23/10/85, isto é, entre a data da aprovação do loteamento e data da emissão do correspondente alvará, a Requerente solicitou que a área inicialmente prevista para o lote n.º 4 fosse mantida, requerimento que a Câmara deferiu nesse mesmo dia nos seguintes termos: ”Deferido, a título excepcional e desde que fique garantida a passagem reservada aos peões na parte sul do referido lote.” (2.º acto impugnado) (al.ªs I e J do probatório).

Em 7/03/1986, a Requerente apresentou os projectos das infra-estruturas do citado loteamento que a Câmara, na sua reunião de 21/05/1986, aprovou fixando o prazo de um ano para os respectivos trabalhos (3.º acto impugnado), apesar de, em 13 desse mês de Maio, ter recebido um ofício do SRES onde este manifestou incompreensão pelo facto de não ter sido alterada dimensão do lote n.º 4 - já que entre ele e o mar não ficava uma faixa de acesso ao mar afecta ao domínio público - e dos índices de ocupação e construção excederem o indicado em projecto, lembrando ainda que, nos termos legais, a cedência das áreas deveria preceder a emissão do alvará de loteamento (ponto L do probatório e fls. 39).

Em 28/11/98, isto é, mais de 12 anos depois, a A……………, S.A., requereu a alteração daquele alvará solicitandoa unificação dos lotes 1, 2, 12, 13 e 14 para efeitos de um empreendimento turístico” o que levou a que fossem solicitados pareceres à Secretaria Regional do Equipamento Social e Ambiente (doravante SRESA) e à Direcção Regional de Turismo, tendo aquela Secretaria Regional concordado com a junção dos lotes e a sua alteração funcional para efeitos turísticos mas discordado do aumento da superfície de ocupação e índice de construção por ser “impossível cumprir, face à área de terreno do requerente, os parâmetros de dimensionamento e cedências previstos na Portaria Regional nº 9/95, de 3/02. Assim, julga-se que a proposta apresentada não é viável, por apresentar notoriamente uma sobrecarga numa zona que, pelo excesso de construção existente”. Acrescentou, no entanto, que se a APRAM aceitasse a requerida alteração, o índice máximo de construção seria de 1.1, o número de pisos acima do arruamento não poderia exceder 3 e que a altura máxima do empreendimento não podia ser superior a 9 metros (ponto R do probatório). Por sua vez o Chefe de Divisão de Gestão Urbanística prestou, em 12/11/98, a informação transcrita na al.ª S do probatório e a Câmara, por deliberação de 26/11/98, deferiu essa alteração (4.º acto impugnado) emitindo, em 4/12/98, o alvará 63/85 devidamente corrigido onde se fixou que a unidade hoteleira a construir teria de respeitar as condicionantes indicadas pela SRESA (fls. 95). Já depois de proferido aquele acto foi recebido o parecer da Direcção Regional de Turismo (em 15/02/99) onde dizia que não se opunha à localização do hotel mas que não tinha dados que lhe permitissem classificá-lo para efeitos turísticos (al.ª Y do probatório).

Após a aprovação dessa alteração ao loteamento e a emissão do correspondente alvará a citada A…………. apresentou (em 15/03/99) um ante-projecto para a construção de um hotel de 5 estrelas com a capacidade de 199 quartos e 10 suites o que levou a que fossem solicitados pareceres ao Serviço Regional de Protecção Civil e à Direcção Regional de Turismo. Esta Direcção Regional enviou o seu parecer, que deu entrada em 3/05/99, discordando da proposta por ela apresentar “uma volumetria relativamente excessiva; a implantação do edifício «agarrado» à falésia poderá descaracterizar a paisagem natural da ordem marítima daquela zona. …. Relativamente ao índice de construção do projecto, a Câmara Municipal deverá verificar se o mesmo cumpre com o previsto com o previsto para aquela zona.” Por sua vez o Chefe de Gestão Urbanística da Câmara informou que o ante-projecto não respeitava o que fora autorizado pelo alvará visto o índice de construção ser de 1.8, a cércea variar entre 6 e 14 metros e não ter sido apresentada uma solução para a «promenade» (fls. 148 e 149 e pontos Y, Z e AA do probatório). Todavia, e apesar disso, em 13/05/99, o Vereador com o Pelouro das Obras Particulares, ao abrigo de delegação de competência, aprovou esse ante-projecto com a condição de serem cumpridas as condicionantes constantes do alvará (vd. GG do probatório).
E mais de 18 meses depois da aprovação do referido ante projecto foi apresentado, em 27/12/2000, um “projecto-base para a construção de uma unidade hoteleira de 5 estrelas … com a capacidade de 200 quartos e 12 suites e respectivas instalações complementares”, (vd. HH do probatório) o que levou a que fossem solicitados novos pareceres à Secretaria Regional dos Assuntos Sociais e Parlamentares, ao Serviço Regional de Protecção Civil, à Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes, ao Chefe de Gabinete do Secretário Regional de Turismo e Cultura e à Delegação de Saúde de Santa Cruz.
O Serviço de Protecção Civil respondeu, em 15/03/20001, dizendo que não lhe tinham sido enviados os elementos indispensáveis a emitir parecer pelo que solicitou esse envio (vd. LL, MM e NN do probatório) e o Secretário Regional do Equipamento Social e Transportes comunicou, em 10/04/2001, à Câmara que o Conselho do Governo decidira devolver o processo para que a autarquia decidisse se o projecto estava conforme com o alvará de loteamento. A Câmara, concluindo que não estava, notificou a Requerente para suprir as deficiências de que ele padecia. Simultaneamente, o Presidente da Câmara, em 26/07/2001, aconselhou a Requerente a solicitar uma nova alteração do alvará o que a Requerente fez apresentando, em 18/09/2001, novo requerimento onde pedia uma nova alteração do alvará por forma a que se autorizasse uma construção com uma cércea de 15 metros e um número de pisos de 4 acima da soleira e juntando aos autos os documentos que lhe haviam sido solicitados (OO a VV do probatório).
Apesar do parecer ter sido pedido à Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes foi o Conselho do Governo que respondeu dizendo que analisou “o pedido de alteração do alvará de loteamento” e que, atendendo a que mais de 2/3 dos proprietários tinham concordado com essa alteração, decidiu viabilizar “a construção da unidade hoteleira proposta” (XX do probatório). Por isso a Câmara, por deliberação de 28/12/2001, aprovou a alteração do alvará (5.º acto impugnado) passando a permitir-se uma construção com uma cércea de 15 metros e um número de pisos de 9, sendo 4 acima da soleira (YY, ZZ e AAA do probatório e fls. 234).

Em 9/05/2002, a Requerente dirigiu ao Presidente da Câmara requerimento submetendoapreciação de V. Ex.cia o projecto de alterações, com base na notificação a que se refere o ofício n.º 1165, datado de 22/04/2002, e do aditamento ao Alvará de loteamento no 63/85, emitido em 28 de Janeiro de 2002. A alínea D do oficio n.º 1165, relativamente ao parecer da Direcção Regional de Turismo, o mesmo foi já emitido, e declarado de utilidade Turística Prévia, através do Despacho n.º 75/99, publicado na II Série - número 108 de 4 de Junho de 1999 do Jornal Oficial” (al.ªs BBB e CCC do probatório e fls. 238 dos autos). Alterações essas que foram aprovadas por unanimidade em 10/05/2002 (6.º acto impugnado) (al.ª DDD do probatório). O que levou a que a Requerente fosse notificada, por ofício de 22/05/2002, para, no prazo de 180 dias, “fazer entrega dos projectos de especialidades, respeitantes à obra em epígrafe.” (fls. 244)

É a legalidade de cada um deste conjunto de distintos e intrincados actos – que longa e cronologicamente se descreveram para uma mais fácil e mais clara compreensão dos problemas suscitados -que os Recorridos impugnaram no TAF do Funchal e que a sentença sob censura declarou nulos, decisão que os Recorrentes não aceitam pelas razões sumariadas nas conclusões do seu recurso.
Analisemos, pois, se a sentença fez correcto julgamento ao declarar nulos tais actos.

1. Se bem virmos, apesar da floresta das deliberações impugnadas e das formalidades que as precederam, o que verdadeiramente temos perante nós é, por um lado, o licenciamento de um loteamento e as sucessivas alterações que nele se introduziram e, por outro, a alteração de um projecto da construção de um hotel projecto esse que, tanto quanto os autos nos permitem ver, ainda não tinha sido aprovado aquando da propositura do recurso contencioso.
Por isso, e porque tais actos podem ser reunidos em dois grupos, mais não fora pela proximidade temporal da sua prática e, consequentemente, pela identidade da legislação aplicável, por uma questão de lógica e de clareza, a análise da legalidade de cada um desses actos será feita, se tal se revelar necessário, inserindo cada um deles no respectivo grupo.
Nesta conformidade, e tendo em conta que a prática de tais actos ocorreu ao longo de 17 anos (entre 1985 e 2002) e que aquela legislação variou substancialmente durante esse período, a primeira tarefa será a que identificar com rigor as normas que hão-de ser tidas em conta na mencionada análise já que, de outra forma, não será possível decidir com acerto.

2. O primeiro grupo desses actos respeita ao loteamento que veio a ser titulado pelo alvará n.º 63/85 - a deliberação de 31/07/85, que o aprovou, e a de 23/01/85, que deferiu a manutenção da área inicialmente prevista para o lote 4 – e à aprovação das respectivas infra-estruturas – deliberação de 21/05/86os quais foram declarados nulos por ter sido entendido que esse licenciamento, por força do se dispunha no DL 468/71, de 5/11, dependia de parecer favorável da Secretaria Regional do Equipamento Social (SRES) e deste não ter sido prestado ou tê-lo sido já depois de aquela aprovação ter ocorrido. Actos que não podiam ser «salvos» com recurso ao princípio do aproveitamento do acto uma vez que esta invocação só seria profícua se os pareceres daquela entidade tivessem sido prestados, ainda que fora de prazo, e houvesse a certeza de que os mesmos não poderiam alterar o sentido das decisões impugnadas e não era possível ter essa certeza.
Vejamos, pois.

2. 1. No período que vai de 31/07/85 a 21/05/86 vigoravam na Região Autónoma da Madeira os DL.s 468/71 – que fixou o regime dos leitos das águas do mar, correntes de água, lagos e lagoas, bem como as respectivas margens e zonas adjacentes (seu art.º 1.º) – e o DL. n.º 287/73, de 6/06 (Com efeito, apesar de qualquer dessas 3 deliberações ter sido tomada após a entrada em vigor do DL 400/84, de 31/12, a verdade é que a aplicação deste diploma só se estendeu à Madeira a partir da publicação do Decreto Legislativo Regional n.º 19/86/M, de 1/10 (art.º 85.º/2 do DL 400/84 e art.º 1.º do Decreto Regional), pelo que nas datas em que tais actos foram proferidos era o DL 287/73 que vigorava naquela Região Autónoma.) – que regia o loteamento de prédios destinados à construção e as respectivas obras de urbanização – pelo que será à luz das suas normas que se terá de aferir a legalidade dos actos praticados nesse período.

O art.º 2.º/1 daquele DL 289/71 estatuía que:
“1. A câmara municipal pronunciar-se-à depois de ouvido o seu serviço de obras e urbanização quando chefiado por engenheiro, arquitecto ou agente técnico de engenharia, ou, na sua falta, o gabinete técnico da junta distrital, a respectiva comissão de arte e arqueologia e a Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, nos termos a fixar em despacho do Ministro das Obras Públicas, bem como as entidades cujos pareceres, autorizações ou aprovações condicionem a localização ou o licenciamento das obras a realizar.
2. Os pareceres da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização e de outras entidades dependentes do Governo serão dispensados sempre que as operações previstas no artigo anterior se conformarem com o plano de urbanização aprovado nos termos do Decreto-Lei n.º 560/71, de 17 de Dezembro, e tenham sido ouvidos os serviços municipais ou o gabinete técnico referido no n.º 1.

E o art.º 14.º/1 do mesmo diploma dispunha que Os actos das câmaras municipais respeitantes a operações de loteamento quando não sejam precedidas de audiência da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização ou das entidades referidas no n.º 1 do art.º 2.º, nos casos em que é devida, ou quando não sejam conformes com o seu parecer ou decisão do Ministro respectivo são nulos e de nenhum efeito.” (Disposição que, no essencial, foi replicada no art.º 65.º/1 DL 400/84 onde se lê: São nulos os actos das câmaras municipais respeitantes a operações de loteamento ou obras de urbanização que não sejam precedidos da audiência das entidades que devam ser consultadas, quando não sejam conformes com qualquer dos respectivos pareceres vinculativos ou resoluções ou quando não tenham sido submetidos a ratificação ou a contrariem, conforme os casos.”) Sendo que as entidades referidas naquele art.º 2.º eram aquelas “cujos pareceres, autorizações ou aprovações condicionem a localização ou o licenciamento das obras a realizar.”

Por sua vez, o art.º 5.º/4 do DL 468/71 estabelecia que se consideravam “objecto de propriedade privada, nos arquipélagos da Madeira e dos Açores, os terrenos tradicionalmente ocupados junto à crista das arribas alcantiladas das respectivas ilhas.” (Os 3 primeiros números deste normativo tinham a seguinte redacção:
“1. Consideram-se do domínio público do Estado os leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais leitos e margens lhe pertençam, e bem assim os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos públicos do Estado.
2. Consideram-se objecto de propriedade privada, sujeitos a servidões administrativas, os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos particulares, bem como as parcelas dos leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis que forem objecto de desafectação ou reconhecidas como privadas nos termos deste diploma.
3. Consideram-se objecto de propriedade privada, sujeitas a restrições de utilidade pública, as zonas adjacentes.”). E complementarmente, o seu art.º 12.º estatuía:
“1. Todas as parcelas privadas de leitos ou margens públicos estão sujeitas às servidões estabelecidas por lei e, nomeadamente, a uma servidão de uso público no interesse geral do acesso às águas e da passagem ao longo das águas, da pesca, da navegação ou flutuação, quando se trate de águas navegáveis ou flutuáveis, e ainda da fiscalização e polícia das águas pelas autoridades competentes.
2. Nas parcelas privadas de leitos ou margens públicos, bem como no respectivo subsolo e no espaço aéreo correspondente, não é permitida a execução de quaisquer obras, permanentes ou temporárias, sem licença do Ministério das Obras Públicas, pela Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos.
3. Os proprietários de parcelas privadas de leitos ou margens públicos estão sujeitos a todas as obrigações que a lei estabelece no que respeita à execução de obras hidráulicas, nomeadamente de correcção, regularização, conservação, desobstrução e limpeza.
4. …… ” (Sublinhados nossos.)
A leitura conjugada destas normas permite-nos retirar algumas conclusões decisivas para a resolução do presente caso.
Desde logo, a de que já no domínio do DL 289/73 o licenciamento das operações de loteamento competia às Câmaras e que ele seria nulo se não fosse precedido dos pareceres, autorizações ou aprovações que condicionavam a sua localização.
Depois, a de que as parcelas privadas confinantes com o mar estavam não só sujeitas às servidões administrativas legalmente estabelecidas como as obras que nelas se pretendessem executar dependiam de licença da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos (Ministério das Obras Públicas).
Por outro lado, a de que as consultas a entidades externas ao município destinadas a colher os referidos pareceres, autorizações ou aprovações só eram indispensáveis se a lei, formal e expressamente, as exigisse pelo que essa indispensabilidade não poderia ser colhida em normas genéricas ou definidoras de princípios gerais.
Finalmente, a de que sendo a parcela em causa propriedade privada da Requerente as actividades que nela se pretendiam exercer não dependiam da licença ou autorização que os Recorrentes contenciosos anteviram, designadamente da Capitania do Porto do Funchal, da Direcção Geral dos Portos e da Direcção Geral dos Recursos Naturais (art.ºs 5.º/4 e 17.º do citado DL 468/71).

Podemos, assim, ter como certo que qualquer uma das três primeiras deliberações será nula se não foi precedida dos pareceres, autorizações ou aprovações que deveriam ter sido obrigatoriamente colhidas e que nenhuma censura será devida à sentença se for de entender que o DL 468/71 obrigava a que a Secretaria Regional de Equipamento Social emitisse parecer antes da prolação dessas deliberações já que foi o convencimento de que este era obrigatório e de que não foi emitido, ou que o foi depois dessa prolação, que motivou a declaração da sua nulidade.

3. As parcelas privadas de leitos ou margens públicas estão sujeitas a servidões legais, designadamente a de acesso às águas, e nelas não é possível executar quaisquer obras sem previamente ter sido obtida licença da Direcção dos Serviços Hidráulicos – no caso da Madeira pela SRES (art.º 32.º do DL 468/71 e art.º 2.º do DL 365/79, de 4/09). E, sob pena de nulidade, as Câmaras não podem licenciar tais operações sem, previamente, colherem os pareceres legalmente exigidos (art.ºs 14.º/1 e 1.º e 2.º/1 do DL 289/73).
A sentença considerou que o terreno cujo loteamento foi pedido se situava numa arriba que confrontava com o mar e integrava a propriedade privada da Requerente, pelo que o seu licenciamento competia à Câmara Municipal. Afirmações que não só não são objecto de controvérsia como de cujo acerto não se pode duvidar.
Onde a divergência surge é no facto dela ter dito que, de acordo com as transcritas normas, previamente ao requerido licenciamento, “impunha-se a existência de um parecer prévio por parte da SRES quanto à deliberação da Autoridade Recorrida de 31/07/85 … o que não sucedeu” já que a Câmara tinha deliberado “antes de conhecer o parecer da SRES …. o que inquina aquela decisão municipal de nulidade, por força do disposto no art.º 88.º do DL 100/84, de 29/03 e do art.º 65.º/1 do DL 400/84, de 31/12.” E que tal acto não podia ser «salvo» com apelo ao princípio do aproveitamento dos actos.
Será que este julgamento merece ser sufragado?

Nada havia que censurar se o que estivesse em causa na deliberação de 31/07/85 fosse a autorização para a execução de obras no terreno da Recorrida particular. Mas não é isso que está em causa já que o que se discute não é o licenciamento ou a execução de quaisquer de obras mas, apenas e tão só, o licenciamento do loteamento daquele prédio. Ou seja, e dito de forma diferente, o que se discute não é a questão de saber se aquela deliberação autorizou de forma indevida a execução de obras mas se a divisão em parcelas de uma propriedade dependia de parecer favorável de uma determinada entidade exterior à Câmara.
Por essa razão o art.º 12.º do DL 468/71 é imprestável para justificar que o loteamento da parcela de terreno da Requerente estava, obrigatoriamente, sujeito ao parecer prévio favorável da referida Secretaria Regional e que, por ser assim, a sua falta determinava a nulidade da deliberação que o autorizava.

Todavia, isso não significa que aquele loteamento pudesse ser licenciado sem que a SRES tivesse de emitir o seu parecer uma vez que, nos termos do transcrito art.º 2.º/2 do DL 289/73, os pareceres das entidades dependentes do Governo que se tenham de pronunciar só serão dispensados se aquela operação for conforme o plano de urbanização e tenham sido ouvidos os serviços municipais ou o gabinete técnico referido no seu n.º 1.
Ora, não estando provado que a requerida operação estivesse conforme o plano de urbanização é manifestamente evidente que a legalidade da mesma dependia da mesma só ter sido aprovada depois de emitido o parecer da SRES.
E a verdade é que a SRES foi solicitada a emitir esse parecer e que ele foi prestado só que essa pronúncia foi enviada à Câmara já depois de proferida a deliberação impugnada e sem que se tivesse aguardado o decurso do prazo estipulado no art.º 5.º/1/b) do DL 289/73. (al.ªs C e F) do probatório). Daí que inexistisse parecer expresso nem falta de parecer para os efeitos do art.º 17.º do mesmo diploma.
O que, por si só, determina a nulidade deste acto.

Os Recorrentes sustentam que esse parecer viabilizava a pretensão da Requerente do loteamento e que, por isso, se justificava fazer apelo ao princípio do aproveitamento do acto. Mas não têm razão.
Com efeito, este Supremo tem vindo, uniformemente, a afirmar que o princípio do aproveitamento do acto – segundo o qual não se justifica a anulação de um acto, mesmo que enferme de um vício de violação de lei ou de forma, sempre que o acto que haja de proferir não possa ter outro conteúdo senão o que lhe foi dado ou não possa ser menos lesivo para o interesse que se visa acautelar do que o acto que se pretende anular – só pode ser aplicado quando o acto a proferir tenha de ter o mesmo conteúdo que o que se quer anular. Ora, no caso, não é possível afirmar que, atento o conteúdo do mencionado parecer, o novo acto tivesse de ser o deferimento do pedido de loteamento. Nessas circunstâncias vem sendo dito que a prática da irregularidade se torna irrelevante e que, em obediência ao princípio da economia dos actos, se deve privilegiar a manutenção do acto “porque a economia de meios é, também em si, um valor jurídico, correspondendo a uma das dimensões indispensáveis do interesse público.” (Acórdão do Pleno de 12/11/2003, rec. 41291) (Vd., entre muitos outros, Acórdãos de 27/9/00 (rec. 41.191), de 2/3/00, (rec. 43.390), de 23/1/01 (rec. 45967), de 7/11/01 (rec. 38983), de 13/2/02 (rec. 48.403), de 2/5/02 (rec. n.º 48.403), de 12/3/03 (rec. 349/03), de 1/4/03 (rec. 42.197), de 14/5/03 (rec. 495/02) e de 11/10/2007 (rec. 1521/02).).

Ora, o que se diz no mencionado parecer é que “não se vê inconveniente no loteamento proposto pela A………………, SARL, desde que satisfaça os condicionamentos expressos no Parecer 197 da D……….. sobre o mesmo. Além disso recomenda-se que a Câmara ao emitir o respectivo alvará de loteamento o faça nos termos do DL 289/73, de 6/06, e fica sujeito a acordo entre o Município e o interessado quanto aos modos e prazos de execução das obras de infra-estruturas urbanas e de equipamento de interesse colectivo e à atribuição dos respectivos encargos.” Indicando-se a seguir as obrigações que poderiam ser exigidas ao loteador.
O que significa que o conteúdo do parecer a que os Recorrentes apelam com vista a «salvar» a deliberação de 31/07/85 não serve para esse efeito uma vez que o mesmo, apesar de afirmar que não vê inconveniente no deferimento do loteamento, faz depender essa possibilidade do cumprimento de um determinado número de condições a incluir no alvará (que, de resto, nele não vieram a constar). Deste modo, e sendo condicional, não se pode afirmar que a deliberação impugnada só poderia ter o conteúdo que lhe foi dado.
O que impede o recurso ao princípio do aproveitamento do acto como pretendem os Recorrentes.

E, ao invés do que se alega, a obrigatoriedade daquele parecer não pode ser considerada como uma privação ou uma limitação inconstitucional de uma competência dos municípios – o licenciamento de obras – e, portanto, como fundamento da inconstitucionalidade da norma em causa uma vez que essa competência continua a ser das Câmaras e de nenhum modo é beliscada pelo que se estatui no art.º 12.º/2 do DL 468/73, como o comprova o facto de pertencer àquela a última palavra em matéria de licenciamento das obras de urbanização ainda que a mesma possa só ser ditada depois de colhidas determinadas pronúncias.

Finalmente, ainda se dirá a legalidade desta deliberação não poderá ser aferida em função do que se dispunha DL 93/90 (Que reformulou o regime da Reserva Ecológica Nacional.), de 19/03, visto a sua prática ter precedido a publicação deste diploma e anteriormente a essa publicação não haver normas que fizessem depender a legalidade do loteamento de parecer das entidades a quem competia zelar pela REN.

Nenhuma censura merece, por isso, a sentença quando declarou nula esta deliberação.

4. Os restantes actos impugnados - a deliberação de 23/01/85, que deferiu a manutenção da área inicialmente prevista para o lote 4, a deliberação de 21/05/86, que aprovou os projectos de infra-estruturas, a deliberação de 26.11.1998, que aprovou alterações ao alvará emitido em 1985 com vista a possibilitar a construção de uma unidade hoteleira, a deliberação de 28.12.2001, que aprovou novas alterações a esse alvará, autorizando a que aquela construção tivesse um índice construtivo mais elevado do que o inicialmente aprovado, e a deliberação de 10.05.2002, que aprovou o projecto de alterações àquele empreendimento – são actos consequentes da deliberação de 31/07/85.
Com efeito, são consequentes os actos que foram proferidos ou dotados de certo conteúdo em razão da existência de actos anteriores supostamente válidos que lhes servem de causa, base ou pressuposto ou os que “cuja prática ou sentido foram determinados pelo acto agora anulado ou revogado, e cuja manutenção é incompatível com a execução da decisão anulatória ou revogatória. Só quando se verificar esta incompatibilidade com a execução da sentença anulatória é que os actos consequentes se podem considerar nulos, directa e automaticamente; caso contrário, nem anuláveis são." (Esteves de Oliveira e outros, CPA Anotado, comentário ao art.º 133). Ou, na definição que lhe deu o Acórdão deste Tribunal de 17/01/2008 (rec. 925/07) “são os que estão intrinsecamente dependentes de um outro, anterior, de tal modo que se o acto primário não puder manter-se na ordem jurídica o subsequente também não pode subsistir. O acto consequente está para o seu antecessor assim como, num silogismo, a conclusão está para as respectivas premissas. Esta relação de dependência é de carácter substantivo e não meramente formal, situando-se no âmago do lado interno dos actos, nos respectivos conteúdos. Nessa medida, o acto consequente é aquele cujo conteúdo depende do conteúdo de outro.” - com sublinhado nosso
O que significa que só pode falar-se em acto consequente quando se verifique uma relação de dependência entre ele e o acto que o precede e que essa dependência é substancial e que, por ser assim, o último acto não faça sentido nem possa ser compreendido sem o primeiro.

Os actos consequentes são nulos, “desde que não haja contra interessados com interesse legítimo na manutenção do acto consequente” (art.º 133.º/2/i) do CPA) excepção esta que não funciona “se o contra interessado no acto consequente era também o contra interessado no acto anulado ou revogado e, nessa qualidade participou nos respectivos processos.” (Esteves de Oliveira e outros in CPA Anotado, 2.ª ed., pg. 651). O que é situação que ora se verifica.
Sendo assim, e sendo que nenhuma das deliberações posteriores à deliberação de 31/07/85 faz sentido com a nulidade desta é forçoso concluir que todos esses actos são também nulos.

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em negar provimento ao recurso e, com a presente fundamentação, em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelos Recorrentes, com excepção da Câmara Municipal atenta a sua isenção.

Lisboa, 29 de Maio de 2014. – Alberto Acácio de Sá Costa Reis (relator) – Jorge Artur Madeira dos SantosAntónio Políbio Ferreira Henriques.