Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01212/17 |
Data do Acordão: | 02/21/2018 |
Tribunal: | PLENO DA SECÇÃO DO CT |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | OPOSIÇÃO DE JULGADOS MESMA QUESTÃO DE DIREITO |
Sumário: | I - Atento o disposto no art. 27.º, alínea b) do ETAF, no art. 284.º do CPPT e no art. 152.º do CPTA, o recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após 1 de Janeiro de 2004 (data da entrada em vigor do ETAF de 2002) depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo. II - Se do confronto dos acórdãos não resulta verificada a divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o mesmo ser julgado findo, por falta de um dos pressupostos desse recurso de oposição de julgados, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 284.º do CPPT. |
Nº Convencional: | JSTA000P22939 |
Nº do Documento: | SAP2018022101212 |
Data de Entrada: | 11/08/2017 |
Recorrente: | A............, LDA |
Recorrido 1: | AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo por oposição de acórdãos
1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………, Lda.” (adiante Recorrente) veio, ao abrigo do disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido nestes autos em 13 de Julho de 2016 (fls. 182 a 187) e reformado por acórdão de 25 de Maio de 2017 (fls. 283 a 286) da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, invocando oposição com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 20 de Janeiro de 2016, proferido no processo n.º 1680/15 (Disponível em 1.2 Admitido o recurso, o Desembargador que no Tribunal Central Administrativo Sul relatou o acórdão recorrido, em face das alegações produzidas ao abrigo do disposto no art. 284.º, n.º 3, do CPPT, entendeu verificada a oposição de acórdãos e ordenou a notificação das partes para alegaram nos termos do n.º 5 do mesmo artigo. 1.3 A Recorrente apresentou alegações sobre o mérito do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.): «1) Após pedido de reforma, o TCA Sul veio modificar a matéria de facto fixando a data de entrada da impugnação judicial a 14.12.2017, ao contrário do estabelecido anteriormente que era 15.12.2010. 2) A recorrente considera existir oposição entre o acórdão proferido nos presentes autos e o acórdão do STA deliberado por unanimidade em 20.01.2016 (Proc. n.º 1680/15), em que votou a Sra. Juíza Conselheira Ana Paula Lobo como Relator e os Srs. Juízes Conselheiros Casimiro Gonçalves e Ascensão Lopes. 3) Com efeito, perante uma situação fáctica substancialmente idêntica, estando em causa o mesmo regime jurídico aplicável, a solução e a consequência jurídicas encontradas foram distintas. 4) Encontra-se em causa o regime instituído no n.º 4 do art. 40.º do CPPT, em conjugação com o estabelecido no art. 38.º e art. 39.º do CPPT e, bem assim, com o regime disposto no art. 254.º do CPC à data por remissão do art. 2.º do CPPT. 5) O Tribunal a quo, bem como TCA no seu acórdão agora em causa, considerou que “o documento que comprova o facto da notificação da decisão é o aviso de recepção da correspondência transmitindo tal decisão e, esse documento, sem lugar a dúvidas foi assinado a 26 de Novembro de 2010”. 6) Porém, esse entendimento, tendo em conta que está em causa “notificação aos mandatários”, impondo o n.º 4 do art. 40.º do CPPT que “as notificações sejam feitas por carta ou avisos registados”, não é acompanhado pela jurisprudência do STA, designadamente no acórdão do STA de 20.01.2016 ora em oposição, cujo entendimento vai no sentido de que o notificando, ora mandatário constituído, deve beneficiar sempre da presunção do 3.º dia posterior ao registo uma vez que a lei impõe a forma de notificação por “carta registada” e não outra, não podendo a Fazenda Pública retirar qualquer consequência desfavorável pelo facto de ter usado “aviso de recepção”, forma essa que não está legalmente prevista no regime da notificação ao mandatário. 7) A recorrente discorda dos argumentos de facto e de direito invocados pelo Tribunal a quo e exposto no acórdão do TCA. 8) Com efeito, entende a recorrente que a Fazenda Pública não cumpriu a forma imposta no n.º 3 do art. 40.º e que, além disso, tendo adoptado uma forma não prevista na lei, não podia retirar as consequências do regime estabelecido no n.º 3 do art. 39.º do CPPT, em conjugação com o n.º 1 do art. 38.º do CPPT. 9) Tratando-se de regime especial de notificação aos mandatários, a Fazenda Pública e o Tribunal estavam impedidos de ilidir, por si só, a presunção da notificação efectuada no 3.º dia posterior ao do registo, conforme o disposto no n.º 2 do art. 39.º do CPPT, em conjugação com o n.º 3 do art. 254.º do CPC, por remissão do art. 2.º do CPPT. 10) Entendimento esse que é seguido no acórdão do STA ora invocado e que a recorrente acolhe. 11) A recorrente apresentou o seu articulado tempestivamente, devendo a decisão ser revogada em conformidade por verificar erro de julgamento. 12) Estranhamente, não existe nos autos um “aviso registado” para poder determinar o termo inicial do prazo e assim poder questionar a tempestividade, facto esse que incumbia à Fazenda Pública que não logrou provar. 13) No entanto, tendo em conta a informação dos CTT nos autos que fixou o registo de envio a 25.11.2010, ao beneficiar da presunção dos três dias, a recorrente só podia ser considerada notificada a 29.11.2010 (2.ªf), tendo até 14.12.2010 para deduzir impugnação judicial, o que a recorrente cumpriu fazendo por meios electrónicos nos termos legais. 14) Pelo exposto, encontram-se violados os n.ºs 1 e 3 do art. 40.º do CPPT, n.º 1 do art. 38.º, n.º 1 e n.º 2 do art. 39.º do CPPT, e bem assim, por remissão do art. 2.º do CPPT, o disposto no art. 254.º do CPC à data dos factos. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, sendo a decisão recorrida revogada e determinada a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para que se conheça dos fundamentos da impugnação judicial deduzida». 1.4 A Fazenda Pública não contra-alegou. 1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o Supremo Tribunal Administrativo «não deve conhecer do objecto do recurso». Isto, depois de enunciar os termos do recurso e elencar os requisitos legais do recurso por oposição de acórdãos, com a seguinte fundamentação: «[…] Apreciação do caso concreto: -Acórdão recorrido -Acórdão fundamento A distinção das questões jurídicas apreciadas nos acórdãos em confronto resulta da circunstância de no acórdão recorrido não estar em causa uma dicotomia de notificações e a eleição daquela relevante para o exercício do direito, enfrentada pelo acórdão fundamento». 1.6 Colheram-se os vistos dos Conselheiros da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal. 1.7 Cumpre apreciar e decidir. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 O acórdão recorrido efectuou o julgamento de facto nos seguintes termos: «1) Previamente à instauração da presente impugnação a 14 [(Permitimo-nos corrigir a data, de acordo com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 25 de Maio de 2017 (cfr. fls. 283 a 286), que procedeu à reforma do acórdão que conheceu do recurso, proferido em 13 de Julho de 2016 (fls. 182 a 187).)] de Dezembro de 2010 [fls. 2 dos autos], a Impugnante havia reclamado graciosamente da liquidação de imposto Municipal de Sisa ora aqui também em causa, o que fez a 28 de Junho de 2010 [fls. 2 desse procedimento, com o n.º 1503201004005821, do Serviço de Finanças de Cascais, integrado no processo administrativo]. 2) A decisão desse procedimento viria a ser tomada a 23 de Novembro de 2010, no sentido do indeferimento da reclamação [cfr. fls.74 desse procedimento], por despacho que lhe foi notificado pelo seguro do Correio e sob aviso, a 26 desse mês, na pessoa do seu Ilustre Mandatário [fls.84 (aviso de recepção) desse procedimento], tendo sido frustrada a notificação, pela mesma via, da própria, por não ter ido reclamar à Estação dos Correios a correspondência registada que lhe foi remetida, depois de ninguém ter atendido, na sua sede, o carteiro [fls. 80, 81 e 82 desse procedimento (a correspondência em causa, com a menção aposta de “não atendeu às 13h36m de 26 de Novembro de 2010”- e com remessa à remetente Administração Tributária em 9 de Dezembro de 2010].”». 2.1.2 O acórdão fundamento considerou a seguinte factualidade (Porque o texto foi retirado da base de dados do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P., os trechos que permitiriam a identificação dos contribuintes envolvidos encontra-se substituídos por reticências.): «a. Em 12.01.2011, foi instaurado contra B…………, no Serviço de Finanças de Setúbal-2, o processo de execução fiscal n.º 3530201101002520 por dívidas de IRS e respectivos juros compensatórios do ano de 2007, no montante de € 17.916,87 (cfr. fls. 1 - 1v. do processo de execução fiscal apenso); b. Em 21.03.2011, foi registada a penhora sobre a fracção autónoma designada pela letra “D”, do prédio sito na Rua ………, n.º …, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………, concelho de Setúbal, sob o artigo n.º 1074 (cfr. fls. 21v. do processo apenso); c. Em 21.05.2013 foi a ora Reclamante citada como credora com garantia real para reclamar créditos (cfr. fls. 30 - 30v. do processo apenso); d. Em 06.06.2013, a aqui Reclamante reclamou os seus créditos, juntando procuração designando a sua mandatária (cfr. fls. 66 - 70 do processo apenso); e. Em 19.06.2013, a Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal-2 proferiu despacho no qual determinou proceder à venda do imóvel penhorado, referido na alínea b) supra, fixando o valor base da mesma, assim como as respectivas modalidades (cfr. fls. 33 - 33v. do processo apenso); f. Em 24.06.2013, foi a ora Reclamante notificada pessoalmente do despacho referido na alínea anterior (cfr. fls. 37v. - 38 do processo apenso); g. Em 25.09.2013, o bem foi adjudicado à proposta apresentada por C…………, pelo valor de € 25.172,88 (cfr. fls. 42 do processo apenso); h. Em 28.10.2013, a mandatária da ora Reclamante foi notificada, nos termos do art. 245.º, n.º 2, do CPPT, da decisão de verificação e graduação de créditos e respectiva liquidação (cfr. fls. 71v. do processo apenso); i. Em 08.11.2013, a Reclamante apresentou pedido de anulação de venda (cfr. carimbo do correio a fls. 56 e fls. 55 a 62 do processo apenso); j. Por despacho da Directora de Finanças de Setúbal, datado de 31.01.2014, o pedido de anulação de venda referido na alínea anterior foi indeferido, com base na sua extemporaneidade e por falta de fundamento (cfr. fls. 148 - 153v. do processo apenso); k. Em 14.02.2014, a Reclamante foi notificada, na pessoa da sua mandatária, do despacho de indeferimento referido na alínea anterior, enviado por correio registado com data de emissão de 13.02.2014 (cfr. confissão - artigo 32.º da petição inicial; fls. 154 e Aviso de Recepção assinado, de fls. l54 v. do processo apenso); l. Com data de registo de 26.02.2014, deu entrada na Direcção de Finanças de Setúbal a presente reclamação (cfr. informação de fls. 57 dos autos); m. Por ofício da Unidade Orgânica 2 deste Tribunal, datado de 16.04.2014, e com cópia do despacho de fls. 75 dos autos, foi a Reclamante notificada para, no prazo de 10 dias, pagar multa de 0,5 UC, acrescida de 25%, nos termos do disposto nos n.ºs 5 e 6 do art. 139.º do CPC, sob pena de não se considerar válido o acto processual extemporaneamente praticado (cfr. fls. 75 - 76 dos autos); n. A Reclamante foi notificada do ofício referido na alínea anterior em 17.04.2014, conforme informação da página dos CTT de fls. 137 dos autos. o. A Reclamante não procedeu ao pagamento da multa referida em n) supra (cfr. fls. 78 dos autos)». 2.2 DE DIREITO 2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Pretende a Recorrente a uniformização da jurisprudência relativamente a uma alegada questão fundamental de direito, que diz que tem a ver com «o regime instituído no n.º 4 [(Apesar de a Recorrente reiteradamente se referir ao n.º 4.º do art. 40.º do CPPT, pensamos que se trata de um lapso de escrita, tanto mais que o art. 40.º deste Código não tem n.º 4: a Recorrente pretenderá dizer n.º 3 onde escreveu n.º 4.)] do art. 40.º do CPPT, em conjugação com o estabelecido no art. 38.º e art. 39.º do CPPT e, bem assim, com o regime disposto no art. 254.º do CPC à data por remissão do art. 2.º do CPPT». 2.2.2 DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS 2.2.2.1 Ao presente processo é aplicável o regime legal resultante do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) de 2002, nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro. 2.2.2.2 Começaremos por apreciar se estão verificados os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios, já que a sua inexistência obstará, lógica e necessariamente, ao conhecimento do mérito do recurso. 2.2.2.2.1 O acórdão recorrido, negando provimento ao recurso interposto pela Impugnante (e ora Recorrente), confirmou a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou caducado o direito de impugnar por considerar que à data em que foi apresentada a petição inicial (que a sentença situou em 15 de Dezembro de 2010, mas o acórdão recorrido, após reforma, corrigiu para 14 de Dezembro de 2010) estava já esgotado o prazo de 15 dias para deduzir impugnação judicial [cfr. art. 102.º, n.º 2, do CPPT, ulteriormente revogado pela alínea d) do art. 16.º da Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro], a contar da data em que foi notificado à Impugnante, na pessoa do seu mandatário, o indeferimento da reclamação graciosa. Isto porque considerou que a notificação ocorreu em 26 de Novembro de 2010, data em que foi assinado o aviso de recepção, e o termo do prazo ocorreria em 11 de Dezembro seguinte, sábado, motivo por que, nos termos da alínea e) do art. 279.º do Código Civil, se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, 13 de Dezembro de 2010. 2.2.2.2.2 No acórdão fundamento decidiu-se o recurso, interposto por uma credora com garantia real sobre o bem imóvel penhorado e vendido em sede de execução fiscal, da sentença que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o indeferimento pelo órgão da execução fiscal do pedido de anulação de venda, com fundamento em caducidade do direito de acção. 2.2.2.2.3 Do confronto entre os arestos em confronto resulta que apenas naquele que ora vem invocado como fundamento do recurso foi suscitada, tratada e resolvida a questão de saber se nas situações em que a notificação ao mandatário judicial tenha sido efectuada por carta registada com aviso de recepção, quando a lei apenas exige como formalidade a carta registada, se pode considerar como data da notificação aquela em que foi assinado o aviso de recepção, quando anterior à que resulta da presunção consagrada no n.º 3 do art. 254.º do CPC, na sua versão anterior à actual. 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - Atento o disposto no art. 27.º, alínea b) do ETAF, no art. 284.º do CPPT e no art. 152.º do CPTA, o recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após 1 de Janeiro de 2004 (data da entrada em vigor do ETAF de 2002) depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo. II - Se do confronto dos acórdãos não resulta verificada a divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o mesmo ser julgado findo, por falta de um dos pressupostos desse recurso de oposição de julgados, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 284.º do CPPT. * * * 3. DECISÃO Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em pleno, em julgar findo o recurso. Custas pela Recorrente. |