Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01555/11.0BEPRT 017/17
Data do Acordão:03/04/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NEVES LEITÃO
Descritores:IRC
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
INACTIVIDADE
INEXISTÊNCIA DE FACTO TRIBUTÁRIO
Sumário:I - Não se verifica o pressuposto do imposto se for demonstrada a ausência de obtenção de rendimento pelo sujeito passivo, em virtude da inactividade da empresa (art.1º CIRC)
II- A norma de incidência objectiva do art.53º nº4 CIRC (na redacção da Lei nº30-G/2000,29 dezembro), integrante do regime simplificado de tributação, exprimia uma presunção de lucro tributável, susceptível de ilisão pela prova da inexistência de obtenção de rendimento, sob pena de interpretação da norma inquinada por violação do princípio constitucional de tributação das empresas fundamentalmente pelo rendimento real (art.104º nº2 CRP; art.73º LGT)
Nº Convencional:JSTA000P25671
Nº do Documento:SA22020030401555/11
Data de Entrada:03/20/2017
Recorrente:A........ E AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:OS MESMOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: PROCESSO 1555/11.0BEPRT
1. RELATÓRIO

1.1. A Fazenda Pública interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 31 março 2016 que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…….. na qualidade de responsável subdsidiário, por reversão efectuada no processo de execução fiscal nº 3468200801007572 (Serviço de Finanças de Gondomar- 2), contra o indeferimento do recurso hierárquico tendo por objecto liquidações de IRC da sociedade B………, Lda. no montante global de € 4 679,36 (exercícios de 2003 a 2005)

1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:

A. A sentença recorrida proferida em 31.03.2016 pelo Douto Tribunal a quo julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações de IRC de 2003, 2004 e 2005 e correspondentes juros, que perfazem o total de € 4.679,36 ao abrigo da competência atribuída pelo art. 83°, nº1, al. b), do CIRC, dada a falta de entrega da declaração periódica de rendimentos a que se referia o art. 112° do CIRC.
B. As referidas liquidações foram impugnadas com apoio no art. 22°, nº4, da Lei Geral Tributária (LGT), na sequência da citação do impugnante após reversão do correspondente processo de execução fiscal, porquanto a sociedade sujeito passivo alegadamente não ter tido qualquer atividade desde 2002, conforme cessação em IVA declarada com data reportada a 31.12.2002, tendo apresentado declarações mod. 22 em 24.11.2009, sem indicação de qualquer valor a título de lucro tributável ou de matéria coletável, e registado a dissolução e encerramento da liquidação em 2009.
C. A douta sentença recorrida salienta que "dos autos não decorre qualquer factualidade quanto ao exercício de actividade por parte da devedora originária respeitante àqueles exercícios" de 2003, 2004 e 2005, e que por isso" não poderia ter sido presumido qualquer rendimento ao abrigo do art. 53° do CIRC, por inverificado o pressuposto do imposto, uma vez que este só seria de aplicar perante a existência de rendimentos", concluindo que "não resultando provada a obtenção de rendimentos pela sociedade, não há lugar à determinação do lucro tributável por aplicação do regime simplificado" decidindo pela anulação das liquidações de IRC dos exercícios de 2003 a 2005 aqui impugnadas.
D. Com o assim decidido não pode a Fazenda Pública, respeitosamente, conformar-se, porquanto entende, salvo o devido respeito e sem embargo de melhor opinião, por entender que a douta sentença sob recurso incorreu em erro de julgamento de direito, porquanto fez errónea interpretação e aplicação do disposto nos art.s 83°, nºs 1, al. b), e 10, e 53°, nº4, do CIRC, na redação vigente à data das liquidações mediatamente impugnadas, e 75°, nº1, da LGT, atentas as razões que de imediato passa a expor.
E. Por um lado, como é consabido, o conceito de cessação da atividade em sede de IVA não coincide com a cessação de atividade para efeitos de IRC, nem a cessação da atividade em IVA de uma sociedade determina ou obriga a que deva proceder à cessação em IRC, através da dissolução e liquidação dessa sociedade e ao registo do encerramento da liquidação.
F. A inatividade da sociedade não obsta a que esta possa ser sujeito passivo de imposto, pois, mantendo a sua existência jurídica e tributária, esta pode ter obtido rendimentos tributáveis, ainda que não resultantes do exercício do seu objeto social.
G. Por outro lado, a apresentação, em momento anterior às liquidações oficiosas de IRC de 2004 e 2005 mediatamente impugnadas, de declaração de autoliquidação do imposto (ainda que denominada pela declarante como sendo a "1ª declaração do ano") não tem como efeito a anulação daquelas liquidações nem infirma os pressupostos com base nos quais aquelas liquidações foram lançadas.
H. A este propósito, na perspetiva da Fazenda Pública, as liquidações impugnadas encontram seu fundamento nos preceitos aplicáveis do CIRC quando não seja entregue a declaração periódica de rendimentos dentro dos prazos estabelecidos pelo então art. 112° daquele diploma.
I. Além do mais, deve ter-se em conta que o legislador, para aplicação do princípio da prevalência da declaração do contribuinte na determinação da matéria tributável, previsto nos art.s 75°, nº1, da LGT e 59°, nº2, do CPPT, tanto num como noutro colocou a exigência de "apresentação nos termos da lei", em que se inclui o cumprimento dos prazos de entrega das declarações, que a própria lei precisamente estabelece.
J. No caso dos autos, a entrega das denominadas "1ª declaração do ano" para 2004 e 2005 ocorreu muito depois do prazo legalmente fixado para a sua apresentação, o último dia útil do mês de Maio, segundo o nº1 do art. 112° do CIRC, na redação então vigente.
K. Já quanto à declaração apresentada em relação ao ano fiscal de 2003, também como "1ª declaração do ano", esta ocorreu depois de emitida liquidação para o ano fiscal, sem que dê origem a liquidação de imposto a pagar de montante superior ao já liquidado ou reembolso inferior, acentuando a divergência entre o contribuinte e o serviço na qualificação de atos, factos ou documentos invocados, ou a fundada dúvida sobre a sua existência, ficando a sua valia condicionada à apreciação em sede de impugnação administrativa (art. 59°, nº5, do CPPT).
L. Com a omissão declarativa da sociedade gerida pelo impugnante, nos termos e prazos previstos no art. 112° do CIRC, a iniciativa do procedimento de liquidação, justificadamente, deixou de assentar na autoliquidação do sujeito passivo e transferiu-se para a AT, por força da lei, nos termos especialmente previstos para o caso, deixando de operar a presunção de verdade que aproveitaria à declaração periódica de rendimentos da sociedade se tivesse cumprido pontualmente a obrigação acessória de entrega da declaração de rendimentos nos termos da lei,
M. retornando-lhe o ónus de demonstrar que a sua matéria tributável é efetivamente inferior à oficiosamente apurada.
N. Quanto a este aspeto a Fazenda Pública assinala que o art. 75°, nº1, da LGT, mais do que não permitir reputar uma declaração periódica de rendimentos, apresentada fora do prazo legal previsto para o efeito, de verdadeira, não lhe confere a virtualidade de, só por si, servir de suporte para o desempenho do ónus do sujeito passivo de prova do excesso da quantificação.
O. E, porque a liquidação nos termos da al.b) do nº1 do art. 83° do ClRC assenta na determinação da matéria tributável por avaliação indireta, por se basear em rendimentos presumidos,
P. competia ao impugnante arguir e fazer prova dum suposto excesso de quantificação da matéria tributável determinada nesses termos, de acordo com o nº3 do art. 74° da LGT, demonstrando não apenas a pretensa inatividade, mas a falta de obtenção de rendimentos.
Q. A sentença recorrida, não obstante a alegação de ilegalidade das liquidações porque a sociedade sujeito passivo não teria tido qualquer atividade desde 2002, e que, por isso, não teria obtido rendimentos, não fixou nenhuma factualidade a este respeito, até porque o impugnante não fez prova dessa factualidade.
R. Ante a factualidade dada como provada na sentença não se pode declarar que os atos tributários impugnados, lançados com base na aplicação do n° 4 do art. 53° do ClRC e, portanto, no valor mínimo de rendimento a considerar segundo essa norma, não podem subsistir por não terem sido obtidos os rendimentos ficcionados, ou quaisquer rendimentos.
S. Deste modo, sempre com o respeito devido, e salvo melhor opinião, o recurso em apreço deverá ser declarado procedente, e a sentença recorrida, portanto, revogada, e seja declarado que a AT procedeu legitimamente à liquidação oficiosa de IRC para os anos de 2003, 2004 e 2005 por se verificar e não ter sido ilidida a presunção iuris tantum de obtenção de rendimentos consagrada na norma do nº4 do art. 53° do ClRC, e decidida a improcedência da impugnação.
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, e, consequentemente, decidida a improcedência da impugnação.
Termos em que deve ser dado provimento ao curso, revogando-se a douta sentença recorrida, e, consequentemente, decidida a improcedência da impugnação.

1.3. O recorrido apresentou apresentou contra – alegações (sem conclusões) com o seguinte teor:

A. Objecto do Recurso:
1.
A douta Sentença sob recurso julgou a questão sub judice com perfeita observância dos factos e da lei aplicável, não merecendo, pois, qualquer censura.
2.
Em boa verdade e no melhor direito, o Recurso não merece provimento.
3.
As Alegações apresentadas, salvo o devido respeito, assentam em pressupostos errados, não pondo em causa, como adiante melhor se explicita, a Sentença proferida.
4.
As alegações apresentadas não são mais do que um pedido de reapreciação da matéria alegada.
5.
Não se trata, assim, em bom rigor, de um recurso.
6.
Em nenhum momento das alegações apresentadas é posta em causa, ou sequer minimamente censurada, a decisão proferida, excepto em mero juízo conclusivo, em que se afirma que o Tribunal a quo aplicou mal a lei.
7.
Ora, no resto de recurso, não consta censura efectiva àquele julgamento dos factos e àquela aplicação da lei.
8.
Mais: O recurso não abrange a matéria de facto.
9.
Insurgindo-se a Fazenda Pública que não ficou provado que a sociedade devedora originária não tenha desenvolvido qualquer actividade desde 31/12/2002, data a partir da qual cessou a sua actividade para efeitos de IVA.

10.
Ora, quanto a este aspecto, a sentença recorrida é clara a referir que “dos autos não decorre qualquer factualidade quanto ao exercício de actividade por parte da devedora originária respeitante àqueles exercícios."
11.
Sendo, assim, patente que o Tribunal a quo não aplicou mal a lei ou confundiu conceitos, designadamente a cessação para efeito de IRC e para efeito de IVA.
12.
Por outro lado, o Impugnante alegou que a sociedade devedora originária não desenvolveu qualquer actividade desde a sua cessão para efeitos de IVA em 2002.
13.
Sendo certo que o Tribunal a quo determinou, por despacho, prescindir da produção de prova testemunhal, bastando-se, como refere na douta sentença, com a matéria de facto não impugnada e com os documentos juntos aos autos.
14.
Despacho sobre o qual não foi interposto recurso pela Fazenda Pública.
15.
Aceitando que, dos autos continha toda a prova necessária para ser proferida decisão de mérito.
16.
Ao invés, o Impugnante, apresentou recurso, cuja análise ficou para já prejudicada, pugnando por decisão diversa.
17.
Sendo certo que sempre terá que ser analisado no caso de procedência do recurso.
18.
Não pode agora a Fazenda Pública, apenas, porque a decisão lhe foi desfavorável, por em causa essa decisão, uma vez que se conformou com a mesma.
19.
Não pode, pois a Fazenda Pública obter a modificação da decisão quanto à matéria de facto, ou que sejam conhecidas questões relacionadas com a matéria de facto.
20.
O que, por si só, não seria possível uma vez que interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo - art.º 280.º n.º 1 in fine do CPPT.
21.
É manifesto que para o resultado pretendido com o recurso, a factualidade teria que ser diversa da que resultou provada.
22.
É manifesto ainda que com a factualidade provada a decisão só poderia ser a que foi proferida.
23.
Porquanto não se poderia presumir, como pretende a Fazenda Pública, que uma sociedade que tenha cessado a sua actividade em termos de IVA, tenha efectiva actividade quando todos os actos por si praticados tinham sempre que ser passiveis de tributação em IVA.
24.
Não tendo tido a sociedade qualquer actividade, não se vislumbra com poderá estar sujeita a pagamento de IRC, ou seja não é possível tributar rendimentos nulos.
26.
O Regime Simplificado de Tributação não é um mecanismo absoluto no que concerne à fixação da matéria colectável.
27.
Se uma empresa não tem um volume de negócios superior a 149.639,37 €, ou se não optou voluntariamente pelo regime geral, não constitui de modo absoluto que os seus rendimentos tributáveis não serão mais baixos ou nulos.
28.
Assim, o valor resultante do disposto no art.º 53 n.º 4 do CIRC constitui uma mera presunção que poderá ser elidível pelo contribuinte.
29.
Designadamente demonstrando que teve um rendimento tributável inferior ao ai disposto ou mesmo que teve rendimentos nulos.
30.
Sendo tal entendimento também explicitamente sufragado legalmente, vejamos:
31.
O Código de IRC emana no seu artigo 53 n.º 4, um valor que considera mínimo de colecta para os casos de tributação do regime simplificado.
32.
Com efeito, dispõe o n.º 16 do mesmo preceito que o montante mínimo ínsito no n.º 4 do art.º 53, não se aplica no caso quando estamos perante uma sociedade inactiva.
33.
Vejamos a redacção do art.º 53 n.º 16 c):
"16 - O montante mínimo do lucro tributável previsto na parte final do n.º 4 não se aplica:
c) Aos sujeitos passivos que não tenham auferido proveitos durante o respectivo período de tributação e tenham entregue a declaração de cessação de actividade a que se refere o artigo 33.º do Código do IVA." (Sublinhado nosso)
34.
Ora, no presente caso, a B….. cessou toda a sua actividade em 2002, aquando da data da Falência da sua sócia maioritária, o que ademais resulta de documentos juntos.
35.
Encontrando-se completamente inactiva desde essa data.
36.
Bem como cessou devidamente a sua actividade em termos do IVA nos termos do disposto do art.º 33 do CIVA, com data reportada a 31/12/2002, devidamente aceite pela Administração Fiscal.
37.
Sendo explícito que nos casos do art.º 53 n.º 16 c) do CIRC - aplicável às sociedades inactivas - não pode a Administração Fiscal presumir que o contribuinte teve rendimentos.
38.
Veja-se neste sentido o esclarecedor Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04-11-2009, Processo 0553/09 disponível www.dgsi.pt cuja cópia se junta em anexo - DOC. 18, onde sufraga:
"I - Não se demonstrando nos autos a obtenção de rendimentos pelo sujeito passivo, não há lugar à determinação do lucro tributável por aplicação do n.º 4 do artigo 53.º do Código do IRC (regime simplificado), pois que não se verifica o pressuposto do imposto (artigo 1º do Código do IRC), inexistindo facto tributário.
II - Mas mesmo que o sujeito passivo tivesse obtido rendimentos, o que não é o caso nos autos, o valor mínimo constante do n.º 4 do artigo 53.º do Código do IRC (na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 159/09, de 13 de Julho), sempre deverá ser entendido como mera presunção ilidível, por força do disposto no artigo 73.º da Lei Geral Tributária.
III - A regra estabelecida no artigo 73º da Lei Geral Tributária vale não apenas as normas de incidência tributária em sentido próprio, mas também em relação a outras normas que estabelecem ficções que influenciam a determinação da matéria colectável (quer directamente, através de valores ficcionados para a matéria colectável, quer indirectamente, ao fixarem ficcionadamente os valores dos rendimentos relevantes para a sua determinação), pois que o advérbio «sempre» aí utilizado inculca a ideia de tratar-se de um princípio basilar da globalidade do ordenamento jurídico tributário, corolário do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, assente no princípio da capacidade contributiva."
39.
É, pois, evidente que o Tribunal a quo, em face de se encontrar provado que a sociedade devedora originária cessou em termos de IVA em 2002 andou bem ao concluir este facto como bastante para proferir a decisão que proferiu.
40.
Por outro lado, as liquidações em causa nos autos não nasceram da iniciativa da Autoridade Tributária, mas sim do contribuinte que, apresentando as suas declarações, não teve como impedir as liquidações automáticas.
41.
Já quanto à bondade da aplicação da lei aos factos basta ler a decisão recorrida que esta está solidamente fundamentada nada lhe podendo ser apontada.
42.
Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso.
Em Conclusão, negando-se provimento ao recurso, far-se-á apenas JUSTIÇA.

1.4 O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (processo físico fls.254/255)

1.5.Após os vistos dos juízes conselheiros adjuntos cumpre apreciar e decidir em conferência

2.FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DE FACTO
A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos:

1) Os sócios da sociedade B………, Lda., NIPC ………., constituída em 13.01.2000, eram C……….., D……….., E……… e F…….., Lda. e gerentes D……… e A…….. - cfr. certidão permanente a fls. 66 e 67 dos autos.
2) Por sentença de 24.04.2002 proferida no âmbito do processo n,º 162/2001 foi declarada a falência da sociedade F……., Lda. - cfr. fls. 68 dos autos.
3) Em 5.12.2007 foi emitida a liquidação n.º 20078310018710 em nome de B……., Lda. relativa a IRC do exercício de 2003, no montante de €1.402,57 - cfr. fls. 23 e 24 dos autos.
4) O Serviço de Finanças de Gondomar 3 emitiu em 8.02.2008 a certidão de dívida n.º 2008/128667 por falta de pagamento da liquidação a que se alude 3) em resultando na instauração do processo de execução fiscal n.º 3468200801007572 - cfr. fls. 17 e 35 dos autos.
5) Em 20.10.2009 foi exarada a acta n.º 1 da Assembleia Geral da sociedade B…………., Lda., determinando a dissolução da actividade da sociedade e aprovando as contas e balanço final do exercício final reportados à data da dissolução, com declaração simultânea da sociedade - cfr. fls. 84 a 89 dos autos.
6) Em 24.11.2009 B……….., Lda. apresentou a declaração de IRC, Mod. 22 do exercício de 2003 com lucro tributável a zero - cfr. fls. 90 a 94 dos autos.
7) Em 24.11.2009 B………., Lda. apresentou a declaração de IRC, Mod. 22 do exercício de 2004 com lucro tributável a zero - cfr. fls. 95 a 99 dos autos.
8) Em 24.11.2009 B………., Lda. apresentou a declaração de IRC, Mod. 22 do exercício de 2005 com lucro tributável a zero - cfr. fls. 169 a 173 dos autos.
9) Em 9.12.2009 foi emitida a liquidação n.º 20092310403013 em nome de B…………., Lda. relativa a IRC do exercício de 2004, no montante de €1.654,26 - cfr. fls. 26 e 27 dos autos.
10) Em 11.12.2009 foi emitida a liquidação n.º 20092310403031 em nome de B……….., Lda. relativa a IRC do exercício de 2005, no montante de €1.622,53 - cfr. fls. 30 dos autos.
11) As liquidações descritas em 3), 9) e 10) foram emitidas atendendo a mínimo de lucro tributável como decorre do enquadramento no regime simplificado - cfr. fls. 43 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
12) A sociedade B………., Lda., NIPC …….. cessou actividade para efeitos de IVA em 31.12.2002 e em sede de IRC em 25.11.2009 - cfr. informação de fls. 18 dos autos e fls. 30 e 31 do PA junto aos autos.
13) O Serviço de Finanças de Gondomar 3 emitiu em 8.02.2010 a certidão de dívida n.º 2010/106664 por falta de pagamento da liquidação a que se alude em 9) resultando na instauração do processo de execução fiscal n.º 34682010010035488 - cfr. fls. 17 e 35 dos autos.
14) O Serviço de Finanças de Gondomar 3 emitiu em 11.02.2010 a certidão de dívida n.º 2010/122835 por falta de pagamento da liquidação a que se alude em 10) resultando na instauração do processo de execução fiscal n.° 3468201001003780 - cfr. fls. 17 e 36 dos autos.
15) No âmbito dos processos de execução fiscal descritos em 4), 13) e 14), o Chefe do Serviço de Finanças de Gondomar 2 proferiu em 6.07.2010 despacho de reversão em nome de A………...
16) Em 30.07.2010 A………. apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 reclamação graciosa respeitante às liquidações de IRC a que se alude em 3), 9) e 10) - cfr. fls. 37 a 42 dos autos.
17) Do indeferimento da reclamação graciosa descrita em 16) foi deduzido recurso hierárquico em 1.10.2010 - cfr. tis. 45 a 57 dos autos.
18) O recurso hierárquico descrito em 17) foi indeferido por despacho de 19.01.2011 da Directora de Serviços da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas - cfr. tis. 59 dos autos.

2.2. DE DIREITO
2.2.1. Questão decidenda: pressupostos legais da aplicação do regime simplificado de tributação do rendimento das pessoas colectivas (art.53º nº1 CIRC redacção da Lei nº 30-G/2000,29 dezembro)

2.2.2. Apreciação jurídica
O regime simplificado de tributação do rendimento das pessoas colectivas, (introduzido pela Lei nº 30-G/2000,29 Dezembro), constituía uma alternativa ao regime regra fundado no rendimento real, aplicando-se a empresas com reduzida dimensão, cujo volume total anual de proveitos não ultrapassava € 149 639,37 (art.53º nº1 CIRC renumeração do DL nº 198/2001,3 Julho)
A simplicidade do regime prosseguia objectivos de combate à fraude e à evasão fiscal e de eficácia na cobrança da colecta do imposto
A revogação do regime pelo art.92º nº2 Lei nº 3-B/2010,28 abril (Lei OGE 2010) não tem consequência no caso concreto, em virtude do princípio geral da aplicação da lei no tempo, segundo o qual só dispõe para o futuro (art.12º nº 1 CCivil)
A inserção sistemática da norma em causa no Capítulo III (Determinação da matéria colectável) Secção V (Determinação do lucro tributável por métodos indirectos) constitui um relevante subsídio para a sua interpretação.
Versando sobre a quantificação da prestação tributária surge, logicamente, após o Capítulo I (Incidência) e o Capítulo II (Isenções) e aponta inequivocamente no sentido de se tratar de norma que respeita à determinação do lucro tributável e não ao pressuposto do imposto (art.1º CIRC)
A aplicação do regime simplificado tem como pressuposto necessário a existência de base tributável, consubstanciada no lucro resultante do exercício da actividade da sociedade comercial (art.3º nº1 al. a) e 53º nº1 CIRC)
Apesar de a personalidade jurídica não ser pressuposto da qualidade de sujeito passivo, é indispensável a verificação do pressuposto do imposto como facto constitutivo da relação jurídica, ou seja, a obtenção de rendimentos, mesmo que provenientes de actos ilícitos (arts.1.º e 2º als. b) e c) CIRC)
Mesmo havendo rendimentos o valor mínimo constante da norma, entendido como mera presunção de rendimento, será sempre ilidível (art.73º LGT aplicável a todas normas que influenciam directa ou indirectamente a determinação da matéria colectável)
A tese da Fazenda Pública (aplicação do regime simplificado segundo um critério forfetário, independentemente do apuramento de rendimento positivo, nulo ou negativo) é inaceitável:
a) constitui violação do princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real; admitindo-se a tributação do rendimento normal por aplicação de métodos indirectos, mas nunca a tributação de um rendimento inexistente, equiparado a confisco fiscal (art.104º nº2 CRP RC/97);
b) constitui violação do princípio constitucional da igualdade (na sua vertente de tratamento diferenciado de situações diferentes),ao tributar identicamente empresas em actividade que geram lucro e empresas inactivas, sem fundamento material bastante (art.13º CRP)
c) radica em interpretação da norma sobre o rendimento tributável que ficciona um rendimento inexistente para o submeter a tributação

No caso concreto, apesar de declarado a cessação da actividade para efeitos de IRC apenas em 2009,o sujeito passivo procedeu à entrega das declarações de IRC mod.22 dos exercícios de 2003,2004 e 2005 com lucro tributável zero (factos provados 6),7),8) e 12))
Neste contexto, por inexistência do pressuposto do imposto (rendimento obtido no período de tributação por uma entidade classificada como sujeito passivo) não existe fundamento legal para a aplicação do regime simplificado na determinação presumida do montante do lucro tributável
Jurisprudência conforme: acórdãos STA – STC 4.11.2009 processo 553/09;
17.11.2010 processo 609/10; 22.03.2011 processo 988/10


3.DECISÃO
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar na ordem jurídica a sentença recorrida
Custas pela recorrente Fazenda Pública (art.527º nºs 1/2 CPC)

Lisboa, 4 março 2020. – José Manuel de Carvalho Neves Leitão (relator) – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.