Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01145/11 |
Data do Acordão: | 03/28/2012 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | DULCE NETO |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FUNDAMENTOS PRESTAÇÃO DE GARANTIA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO ERRO NA FORMA DE PROCESSO INCONSTITUCIONALIDADE |
Sumário: | I – A competência para a decisão do pedido de prestação de garantia ou de dispensa dessa prestação, quando formulado no âmbito de oposição à execução fiscal e visando a suspensão desta, cabe ao órgão da execução fiscal e não ao tribunal. II – O erro na forma do processo afere-se pela adequação do meio processual à pretensão que se pretende fazer valer em juízo, pelo que se o pedido formulado é de que seja extinta a execução fiscal e, em alternativa, que ela seja suspensa, é adequado o meio processual de oposição à execução fiscal. III – A alegação de inconstitucionalidade das normas do CPPT que permitem a prática de actos no processo judicial de execução fiscal por órgãos de natureza administrativa, designadamente o acto de citação, consubstancia fundamento legítimo de oposição à execução fiscal. IV – A norma do CPPT que atribui competência ao órgão de execução fiscal para ordenar a citação, não é inconstitucional, pois não atribui aos órgãos da administração competências que a Constituição da República Portuguesa reserva aos tribunais. V – Pode constituir fundamento de oposição à execução fiscal, subsumível à alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, o desrespeito pela suspensão da execução fiscal na pendência de impugnação judicial quando tenha sido prestada ou constituída garantia, quando o executado tenha sido dispensado de prestá-la, ou quando existam bens penhorados que garantam o pagamento da dívida exequenda e do acrescido. |
Nº Convencional: | JSTA00067499 |
Nº do Documento: | SA22012032801145 |
Data de Entrada: | 12/16/2011 |
Recorrente: | A..., LDA |
Recorrido 1: | FAZENDA PÚBLICA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL |
Objecto: | SENT TAF VISEU PER SALTUM |
Decisão: | PROVIDO |
Área Temática 1: | DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO |
Área Temática 2: | DIR CONST - GARANTIAS ADMI |
Legislação Nacional: | LGT98 ART52 N4 ART97 N3 CPPTRIB99 ART98 N4 ART103 N4 ART170 ART183 N1 ART204 N1 I CPC96 ART199 ART715 ART726 ART729 ART730 ART749 ART762 N1 |
Jurisprudência Nacional: | AC STA PROC910/10 DE 2010/12/07; AC STA PROC907/10 DE 2010/12/16; AC STA PROC662/11 DE 2011/11/16; AC STJ PROC3981/02 DE 2002/12/12; AC STA PROC1053/11 DE 2012/03/14 |
Referência a Doutrina: | RODRIGUES BASTOS NOTAS AO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 3ED PAG262. ANTUNES VARELA IN RLJ N115 PAG245. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A……, LDª, com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou “improcedente a oposição” que deduziu à execução fiscal contra si instaurada para cobrança de dívida de IRC referente ao exercício de 2005 e respectivos juros compensatórios, por ter julgado que se verificava erro na forma de processo utilizada. 1.1. Rematou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: A) O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a oposição à execução, por erro na forma de processo e, uma vez que, alegadamente, não foi invocado nenhum dos fundamentos elencados no n.º 1 do artigo 204.° do CPPT. B) A pretensão da A…… de oposição à execução respeita o elenco taxativo do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, bem como a pretensão por si deduzida tem viabilidade e concludência. C) Na petição de oposição à execução foram invocados, em suma, os seguintes vícios: (i) a inconstitucionalidade orgânica e material das normas do CPPT que determinam a prática de funções jurisdicionais pelo Serviço de Finanças no âmbito da execução fiscal, em especial o n.º 1 do artigo 188.° do CPPT; (ii) a pendência de processo contencioso com efeito suspensivo. D) O primeiro dos vícios apontados pela A…… na sua petição de oposição é enquadrável na última alínea do n.º1 do artigo 204.° do CPPT: a inconstitucionalidade invocada consubstancia fundamento que, desde logo, não envolve a apreciação da legalidade da liquidação da quantia exequenda, nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título, sendo provada, simplesmente, a partir de documentos - in casu, pelo documento de citação da A…… para a execução fiscal -, sendo certo que afecta a eficácia do acto de citação e consequente exigibilidade da dívida exequenda. E) No que se refere ao segundo dos fundamentos invocados, relativo à pendência de processo contencioso com efeito suspensivo - fundamento que não foi apreciado pelo Tribunal a quo -, a jurisprudência e a doutrina têm vindo a entender que nas situações em que a exigibilidade da dívida seja afectada por qualquer motivo não definitivo, mas meramente temporário, esse motivo possa ser invocado em sede de oposição à execução, que terá por objecto, então, a suspensão da execução (Vide, LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Anotado, 5ª Edição, 2007, Vislis Editores, pág. 371; CARLOS PAIVA, in O Processo de Execução Fiscal, 1ª Edição, 2008, Almedina, pág. 117; Ac. STA, de 13/12/2000, proc. nº. 25610; Ac. TCA Sul, proc. nº. 6016/01). F) Tanto a doutrina, como a jurisprudência, enquadram tal fundamento na disposição residual da alínea i) do n.° 1 do artigo 204.° do CPPT. G) A pendência de processo contencioso com efeito suspensivo invocada na petição inicial constitui, igualmente, fundamento legal e legítimo de oposição à execução, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT. H) Não é manifesta a improcedência deste fundamento - que não foi, sequer, apreciado na sentença ora posta em crise - porquanto se encontra pendente processo de impugnação das liquidações em causa (processo n.º 229/10.3BEVIS) e o pedido de dispensa de prestação de garantia. I) Não se verifica, in casu, qualquer erro na forma de processo, nem improcedência dos fundamentos alegados, devendo, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, com as demais consequências legais. J) A sentença recorrida viola o disposto no artigo 204.°, n.° 1, alíneas i), do CPPT.
A) A letra do n.º 4 do artigo 103.° do CPPT, ao invés de referir que a impugnação obsta à instauração da execução fiscal, vem estatuir que a «impugnação tem efeito suspensivo». B) O «efeito suspensivo» referido diz respeito à cobrança da prestação tributária, o que se pode traduzir tanto numa não instauração do processo de execução fiscal (nos casos em que a impugnação judicial foi deduzida antes do termo do prazo de pagamento voluntario), como num não prosseguimento do mesmo processo (nas situações em que o mesmo já tiver sido instaurado). C) Procurar limitar o âmbito de aplicação do disposto no n.º 4 do art.° 103.° do CPPT às situações em que a execução não se encontre ainda instaurada é - no modesto entender da A…… - uma interpretação que se distancia em demasia da letra da do n.º 4 do artigo 103.° do CPPT, especialmente quando conjugada com as restantes disposições legais pertinentes, como o são o artigo 169.°, n.º 1, do CPPT ou o artigo 52.°, n.ºs 1 e 2 da LGT. D) Não fará sentido admitir que o efeito suspensivo referido no n.º 4 do artigo 103.° do CPPT se traduza em obstar à instauração da execução, e não se traduza igualmente em suspender uma execução já instaurada. E) O Tribunal, perante um pedido de prestação de garantia em caso de apresentação de impugnação, averiguará previamente, através da administração tributária, qual o montante da garantia (vide, neste sentido, o corpo do texto do Acórdão do STA, de 27.05.2009, proferido no processo 0129/09, disponível em www.dgsi.pt), quer já se encontre instaurada a execução fiscal, quer ainda não se encontre pendente. Isto porque, F) Mesmo nas situações em que não se encontra, ainda, instaurado o processo de execução fiscal, a garantia a prestar tem de cobrir, nos termos do disposto no n.º 5 do art.° 199.° do CPPT (ex vi artigo 103.°, n.º 4, in fine, do CPPT), para além do valor da divida exequenda, juros de mora e custas, ainda 25% da soma destes montantes, informação de que o Tribunal não dispõe directamente. G) Havendo uma remissão expressa no n.º 4 do artigo 103.° do CPPT para o disposto no n.º 5 do artigo 199.° do mesmo diploma, não se compreende como pode o Juiz a quo pretender que, nos casos em que não foi instaurada, ainda, execução fiscal, seja pelo singelo e inferior valor da impugnação que o Tribunal aferirá o valor da garantia a prestar. H) A jurisprudência pacificamente aceita, nos casos em que a execução fiscal já se encontra pendente, que a garantia requerida nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 103.° do CPPT seja prestada perante o Tribunal (vide, a título de exemplo, o Ac. do STA, de 27.05.2009, proferido no processo 0129/09, disponível em www.dgsi.pt). I) Igualmente a doutrina corrobora este entendimento de que, em caso de apresentação de impugnação judicial, o Tribunal é o órgão competente para apreciar da prestação de garantias, mesmo que o processo de execução já tenha sido instaurado. Veja-se, por exemplo, o ensinamento do Prof. Doutor Rui Duarte Morais, in A Execução Fiscal, 2ª edição, Almedina, 2006, pág. 79 ou Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado, Vol. II, Áreas Editora, 2007, página 245. J) No que respeita à impugnação judicial, é, assim, unanimemente aceite, em face da redacção do n.º 4 do artigo 103.° do CPPT, que a competência para a decisão sobre a aceitação das garantias que visem o efeito suspensivo da execução fiscal cabe ao Tribunal. K) No que concerne à oposição judicial à execução, a autorizada doutrina, mormente o Prof. Doutor Rui Duarte Morais (in A Execução Fiscal, 2ª edição, Almedina, 2006), defende que a competência para a decisão sobre a aceitação das garantias que visem o efeito suspensivo da execução fiscal cabe, igualmente, ao Tribunal, porquanto existe um paralelo entre a impugnação judicial e a oposição à execução. L) A causa de suspensão da execução tanto no caso da impugnação judicial, como no caso da oposição à execução, é a instauração de uma fase judicial do processo. Na verdade, é em virtude da apresentação do articulado dirigido ao tribunal tributário que, cumulativamente com a prestação de garantia, se suspende a execução (cf., para a oposição à execução, os artigos 212.° e 169.°, n.os 1 e 5, do CPPT). Não o contrário, não por força da mera prestação de garantia. M) Tanto no caso da impugnação, como no caso da oposição, não tem qualquer sentido útil que se proceda à penhora de bens do executado sem que se decida da questão - prévia - de atribuição a essa fase judicial iniciada (impugnação ou oposição) de efeito suspensivo, mediante a prestação (ou dispensa de prestação) de garantia, requerida pelo impugnante ou oponente. E se na impugnação o Tribunal que decide da questão “prévia” da aceitação de garantias para obter a suspensão da execução, faz todo o sentido, por uma identidade de situações e fundamentos já evidenciada, que na oposição também o seja. N) O disposto no artigo 103.°, n.º 4, do CPPT é aplicável directamente à oposição a execução por força da remissão do artigo 212.° do mesmo Código. E, na verdade, a remissão do artigo 212.° para os «termos deste Código», remete para o regime da suspensão da execução e prestação de garantia em caso de apresentação de impugnação judicial (cf. as disposições conjugadas dos artigos 212.°, 169.°, n.° 5, 169.°, n.º 1 e 103.°, n.º 4, todas do CPPT). O) O disposto no art.° 199.° do CPPT apenas se aplica à impugnação judicial por força da remissão da parte final do artigo 103.°, n.º 4, do CPPT, sendo que essa remissão deixa de fora o n.º 8 desse artigo 199.°. P) Para que o artigo 199.° do CPPT - que consagra o regime da prestação de garantia em caso de pagamento em prestações - seja aplicável à oposição a execução, tem de beneficiar igualmente de uma remissão expressa para o efeito, sendo que a remissão existente em sede de efeitos suspensivos da apresentação da oposição a execução - o artigo 212.° do CPPT - remete para o regime da impugnação judicial. Q) O Executado que pretenda suspender a execução fiscal pela prestação de garantia na pendência de oposição à mesma, tendo-o requerido espontaneamente na petição de oposição, verá tal apreciação da prestação de garantia ser da competência do Tribunal. R) Sendo o Tribunal a decidir da prestação de garantia, com vista à suspensão do processo de execução, então, deverá ser também o Tribunal a decidir da isenção da prestação dessa mesma garantia, que logra alcançar o mesmo efeito. Nestes termos, deverá dar-se provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o despacho recorrido, declarando o Tribunal competente para apreciar o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado cumulativamente com a petição de oposição à execução, com todas as consequências legais.
A nosso ver a aplicação do n° 4 do artº. 103° tem essencial pertinência na primeira das situações referida, antes da instauração da execução, para obstar à instauração. Nos demais casos a prestação de garantia é, e deve ser, a bem da tutela jurisdicional efectiva, porque se garante maior eficácia/celeridade, requerida e prestada no processo executivo. A propósito vejam-se os art°s. 103° n° 4 que remete para o art°. 199°, o qual se insere no título da Execução fiscal. Do artigo 199°, n° 5 resulta que a garantia é calculada/prestada pelo valor da dívida exequenda; ora não existindo execução o cálculo/prestação tem de ser aferido, excepcionalmente, pelo valor atribuído pelo autor à Impugnação. Quem, melhor que o Órgão de Execução Fiscal (adiante OEF) para averiguar e decidir, em primeira linha, nos termos e para os efeitos do n° 9 do art°. 1990 da diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia. Como compatibilizar a celeridade que se impõe, com a necessidade de obter a concordância da administração tributária sobre a idoneidade da garantia nos termos do n° 2 do 199°. Sempre que haja, durante a existência da garantia, algum facto originador de alterações (cessação da garantia; diminuição ou reforço) é necessário que haja, sempre ou quase sempre, a audição/intervenção da Administração Tributária. Também se insere no Título da execução fiscal o artº 151º, n°1, que define "à contrário" a competência do OEF, nesta se integrando a da decisão, em primeira linha, sobre a prestação, cálculo e demais incidentes da garantia. O que se vem de dizer da prestação da garantia deve entender-se como extensível, por razões facilmente compreensíveis, à situação do pedido de dispensa de garantia. No caso presente é inequívoco, porque estamos perante autos de oposição, incidente da execução fiscal, que esta não só existe como é pressuposto destes autos. Assim, pelas razões sumariamente indicadas, a bem da tutela jurisdicional efectiva, e necessária celeridade e eficácia, inste a Oponente a requerer a prestação de garantia no processo executivo, devendo de tal requerimento dar nota nestes autos.
− a existência de motivo legal para a suspensão da execução fiscal, não só por força do pedido de isenção da prestação de garantia que requer em simultâneo com a instauração desta oposição como, também, conjugado com a impugnação judicial que vai instaurar no prazo legal de que dispõe para o efeito – cfr. artigos 12.º a 22.º da petição inicial. Fundamentos que a levaram a formular o pedido de extinção da execução fiscal ou, em alternativa, a sua suspensão; e em simultâneo, articulou um pedido de dispensa de prestação de garantia – cfr. artigos 23.º e seguintes da petição inicial. A sentença recorrida julgou improcedente a oposição na consideração de que «a Oponente não alega nenhum dos fundamentos elencados no nº 1, do artº 204º, do CPPT, e como tal, a forma de processo adequada ao caso concreto não pode ser a oposição», acrescentando que embora face ao disposto nos artigos 97.°, n.° 3 da LGT e 98.º, n.° 4 do CPPT se deva ordenar a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado, o certo é que, no caso, independentemente de estar ainda em prazo, com base nos fundamentos invocados «é manifesto que estes não constituem fundamento de impugnação judicial, pois nela não são invocados vícios que afectem a validade do acto de liquidação mas sim a exigibilidade da divida, daí que a possibilidade de convolação não seja admissível. Estou certo que impugnação já foi deduzida.». Todavia, e apesar deste julgamento sobre o erro na forma de processo, o Meritíssimo Juiz acabou por se pronunciar sobre o fundamento da inconstitucionalidade, afirmando, em suma, que não obstante a natureza judicial do processo de execução fiscal há actos na execução que podem ser praticados pela administração tributária, como é o caso do acto de citação. «Na verdade, o acto de dar a conhecer ao executado a interposição contra ele da execução ou a chamá-lo ao processo, não implica qualquer decisão relativa à composição do litígio ou do conflito de interesses existente. A AF não vai decidir nada mas apenas dar conhecimento do que existe. (...) Ora, tal como se deixou já explicado no acórdão proferido por esta Secção de Contencioso Tributário no recurso n.º 0662/11, de 16/11/2011, perante a verificação do erro na forma do processo e da impossibilidade de convolação para a forma processual tida por adequada, ao Juiz nada mais cumpria decidir. «Não cumpria, designadamente, tecer quaisquer considerandos em torno da admissibilidade dos fundamentos invocados na petição inicial como fundamentos de oposição à execução fiscal e, muito menos, sobre o mérito dos mesmos. (...) Nessa circunstância, todos os considerandos aduzidos na decisão recorrida a esse propósito devem considerar-se como um obiter dictum, «uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que motivou e estruturou a decisão» (Neste sentido, por mais recente, o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Julho de 2010, proferido no processo com o n.º 547/10». Como se sabe, o erro na forma de processo, contemplado no artigo 199.º do Código de Processo Civil (CPC), consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, pelo que o acerto ou o erro na forma de processo se tem de aferir pelo pedido formulado na acção. É, pois, pelo pedido, ou seja, pela pretensão que o requerente pretende fazer valer, que se determina a propriedade ou impropriedade do meio processual empregue para o efeito (Cfr., entre outros, RODRIGUES BASTOS, in “Notas ao Código de Processo Civil”, 3ª ed., 1999, pág. 262; ANTUNES VARELA, in RLJ 115, pág. 245 e segs; Acórdão do STJ de 12/12/2002, no Rec. nº 3981/02, in Sumários, 12/2002; Acórdão da R.Coimbra de 14/3/2000, in BMJ 495, pág. 371; Ac. R.Évora de 12/11/98, in Col.Jur. Ano XXIII, T5, pág. 256; Acórdão da R.Lisboa de 19/1/1995, in Col.Jur. Ano XX, T1, pág. 95, e Acórdão da R.Porto de 5/7/1990, in Col.Jur. Ano XV, T4, pág. 201.). Quer isto dizer, que a correcção ou incorrecção do meio processual empregue pelo autor (nomeadamente no que concerne ao tipo de acção por si escolhido para atingir o fim por si visado) afere-se pela pretensão de tutela jurisdicional que o mesmo pretende atingir; e a chamada inadequação ou inidoneidade do meio processual utilizado consiste, precisamente, na discrepância ou desarmonia entre a espécie processual de que se lançou mão e o propósito que, com ela, processualmente se visava atingir. No que concerne ao processo de oposição a execução fiscal, ele visa, em regra, a extinção (total ou parcial) da execução fiscal, mas pode também ter por finalidade a suspensão da execução – como acontece nos casos em que a exigibilidade da dívida está temporariamente suspensa, designadamente por força da concessão de uma moratória, da suspensão da eficácia do acto de liquidação ou da própria suspensão da execução fiscal. Ora, lida a petição inicial e o pedido que nela é formulado, verifica-se que o Oponente pretende obter, em primeira linha, a extinção da execução face à invocada inconstitucionalidade das normas do CPPT que permitem a prática de funções jurisdicionais pela administração tributária enquanto órgão da execução fiscal e, em alternativa, a suspensão da execução face à instauração de processo de impugnação judicial e pedido de isenção de prestação de garantia. Tal pedido adequa-se perfeitamente ao processo de oposição à execução, pelo que se nos afigure incorrecta a decisão proferida em 1ª instância no sentido de que a Oponente incorreu em erro na forma de processo. A circunstância de as causas de pedir gizadas não constituírem, porventura, fundamentos válidos de oposição à luz do disposto no artigo 204.º do CPPT, não constitui motivo para dar por verificada uma nulidade processual por erro na forma de processo, mas, antes, motivo para a improcedência do pedido com base nessa causa de pedir. Pelo que se impõe conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida.
Revogada a decisão, cumpre conhecer em substituição nos termos do n.º 1 do artigo 753.º do CPC (Trata-se de situação diferente daquela que, também relativa a conhecimento em substituição, encontra previsão no n.º 2 do artigo 715.º do CPC previsto para os recurso de apelação e que é aplicável ao Supremo Tribunal dado que o art. 726.º do CPC não afasta a sua aplicação ao recurso de revista. Esse preceito dirige-se àquelas situações em que o tribunal recorrido entrou na apreciação do mérito da causa mas não tomou conhecimento de certas questões por força da solução que deu ao litígio. Só em tais situações é que o Supremo Tribunal, se entender que o recurso procede e nada obsta à apreciação dessas questões, conhecerá delas no mesmo acórdão em que revoga a decisão recorrida.), aplicável ao recurso de revista interposto para o Supremo Tribunal Administrativo por força do disposto nos artigos 749.º, 762.º, nº 1 e 726.º, todos do Código de Processo Civil, desde que não esteja em causa matéria de facto, já que, nesse caso, seria de dar cumprimento ao disposto nos arts. 729.º e 730.º do CPC.
3.2. Quanto à inconstitucionalidade material das normas do Código de Procedimento e Processo Tributário que permitem a prática de funções jurisdicionais por órgãos de natureza administrativa, argumenta a Recorrente que este fundamento se enquadra na previsão da alínea i) do artigo 204.ºdo CPPT, por consubstanciar fundamento que não envolve a apreciação da legalidade da liquidação da quantia exequenda nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título. E, na verdade, assim é. A invocada inconstitucionalidade é susceptível de afectar a validade dos actos de cobrança coerciva praticados pelo órgão da execução fiscal, designadamente o acto de instauração da execução fiscal e de citação do executado, e de determinar a extinção do respectivo processo, constituindo fundamento válido de oposição subsumível na alínea i) do artigo 204.º do CPPT, na medida em que não envolve a apreciação da legalidade da liquidação da quantia exequenda nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título, sendo demonstrável por prova documental. Tal não significa, porém, que tal fundamento deva proceder, pois a natureza judicial do processo de execução fiscal não impede a prática, pelos órgãos da administração tributária, de actos de natureza não jurisdicional, não sendo inconstitucionais as normas que atribuem competência ao órgão de execução fiscal para a prática de actos de natureza não jurisdicional, designadamente para o acto de citação. Como se deixou explicado no recente acórdão proferido por esta Secção de Contencioso Tributário, de 14/03/2012, no recurso n.º 1053/11-30, que sufragamos sem reservas de convicção, «Resulta do disposto no artº 103º, nº 1 da Lei Geral Tributária que o processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional. Sendo garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária, nos termos do número anterior (nº 2 do mesmo normativo). 3.3. Quanto à instauração de processo de impugnação judicial para discussão da legalidade do acto de liquidação do tributo que constitui a dívida exequenda e seu efeito suspensivo sobre a execução por força do pedido de isenção de prestação de garantia. |