Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01783/13.3BEBRG
Data do Acordão:11/18/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
ERRO DE DIREITO
Sumário:I - O sujeito passivo considerou que o valor do desconto no preço final do produto vendido estava sujeito a tributação e teria que suportar esse encargo (situação que diverge daqueles casos em que o desconto é feito sobre o valor do bem, o que ocorre normalmente entre sujeitos passivos, pois nestes casos o IVA já não incide sobre o valor descontado), verificando-se que, nesta parte, as partes estão de acordo no que concerne à existência de erro na inclusão do valor dos descontos na matéria tributável do IVA, tendo a AT reconhecido isso mesmo na informação vinculativa que prestou a outros sujeitos passivos da mesma cadeia de supermercados.
II - Assim, estamos perante erro de direito, na medida em que a questão da inclusão do valor do desconto na matéria tributável do IVA contende com a interpretação de normas jurídicas e o quadro jurídico aplicável, pelo que não restam dúvidas que estamos perante erro de direito e não perante erro material (situação seria diversa se a situação não oferecesse dúvidas e a falta de dedução do imposto se devesse a falha ocasional dos serviços de contabilidade do sujeito passivo no preenchimento das declarações), impondo-se aqui sublinhar que, como ficou dito, só o erro material (erro no registo ou declaração) está abrangido pela previsão do nº 6 do artigo 78º do CIVA.
III - O prazo aplicável para reclamar do IVA entregue, em excesso, numa situação enquadrável no denominado erro de direito é de quatro anos, nos termos previstos no artigo 98º nº 2 do CIVA.
Nº Convencional:JSTA000P26776
Nº do Documento:SA22020111801783/13
Data de Entrada:01/10/2020
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A................, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
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Processo n.º 1783/13.3BEBRG (Recurso Jurisdicional)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 30-09-2019, que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida por “A………… S.A.”, anulando a decisão de indeferimento do recurso hierárquico no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a decisão de indeferimento do recurso hierárquico n.º R023 2013 000 984 interposto sobre a decisão que indeferiu o pedido de revisão do ato tributário, com referência às liquidações de IVA submetidas pela impugnante, respeitantes ao período compreendido entre Outubro de 2007 e Setembro de 2009.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

I - Salvo o devido respeito que nos merecem as opiniões e a ciência do Tribunal “a quo”, entende a Recorrente que a douta sentença, proferida a 2019.09.30, no âmbito do processo de Impugnação Judicial acima identificado, e que considerou o pedido da impugnante, ora recorrida, parcialmente procedente e, em consequência, anulou a decisão de indeferimento do recurso hierárquico n.º 2348201310000028, não se pode manter na ordem jurídica.

II - A Recorrente não se conforma com a sentença em causa, na medida em que entende que a mesma padece de erro de julgamento, em matéria de direito, ao ter concluído, em suma, que a decisão de indeferimento do recurso hierárquico n.º 2348201310000028 enferma de ilegalidade “ao considerar (erradamente) que o período de regularização de IVA a favor do sujeito passivo estava limitado ao prazo de dois anos (de acordo com a disposição prevista no n.º 6 do artigo 78.º do Código do IVA)” e, por outro lado, ao ter concluído ser aplicável ao caso concreto o prazo máximo de quatro anos previsto no nº 2 do artigo 98.º do Código do IVA, bem como o disposto no artigo 78º da LGT, por remissão do nº 1 do referido artigo 98.º do Código do IVA. Vejamos:

III - No caso em apreço trata-se, em termos substanciais, de saber se a impugnante pode regularizar a seu favor o IVA alegadamente liquidado a mais em vendas que terá efetuado, essencialmente a consumidores finais, após ter procedido ao registo a que se refere o artigo 45º do CIVA, e após ter incluído o IVA liquidado a mais nas correspondentes declarações periódicas apresentadas com referência aos períodos de outubro de 2007 a setembro de 2009.

IV - Tendo em conta tudo o que vem prescrito em matéria de regularização do IVA no artigo 78º do CIVA, impõe-se concluir que a regularização do imposto liquidado em excesso apenas pode ser efetuada no prazo de dois anos, conforme resulta dos números 3 e 6 do artigo 78º do CIVA.

V - Mesmo que se concedesse ter havido erro no apuramento do IVA sem que tenha existido qualquer repercussão nos seus clientes, a situação encontra-se, na mesma, sujeita ao mecanismo especial de correção previsto no nº 6 do artigo 78º do CIVA, não assistindo à impugnante o direito de optar entre a regularização do erro dentro dos prazos especiais previstos no CIVA, ou no prazo geral de revisão oficiosa de atos tributários prevista no artigo 78º da LGT.

VI - Na verdade, tal como vem referido na informação nº 1812, de 2013.07.08, a que se faz referência na alínea K) do probatório: “O prazo estipulado no nº 6 do art.º 78º do CIVA, coincidente com o prazo de reclamação graciosa da autoliquidação, também à luz da jurisprudência comunitária é considerado como um prazo perfeitamente razoável para a correção de erros desta natureza, tal como se refere no Acórdão do TJUE de 8 de maio de 2008, Ecotrade c-95/07 e c-96/97.”, pelo que “(…) o recurso ao mecanismo da revisão oficiosa em caso de autoliquidação apenas será aplicável residualmente, quando o erro não esteja abrangido por qualquer dos prazos especiais de regularização previstos no artigo 78º do Código do IVA ou noutras normas legais constantes do mesmo diploma.”.

VII - Impõe-se, pois, concluir-se que, não tendo a impugnante procedido à regularização do IVA que considera ter liquidado em excesso, dentro do prazo de dois anos previsto no artigo 78º do CIVA, e não sendo a regularização obrigatória por implicar imposto a favor do sujeito passivo, encontra-se precludido o direito de efetuar a sua regularização após o termo do prazo de dois anos previsto nesta norma legal.

VIII - Em conclusão, diremos que, ao decidir como decidiu, o M. mo Juíz do Tribunal “a quo”, partindo de uma errónea consideração dos factos relevantes para a boa decisão da causa, elencados no probatório, incorreu, a nosso ver e salvaguardado o devido respeito por melhor entendimento, em erro de julgamento, em matéria de direito, violando, nomeadamente, o disposto no nº 6 do artigo 78º do CIVA.

IX - Importa referir, tal como decorre do ponto II (Garantias do Contribuinte) da informação nº 2325, de 2012.12.27, a que se faz referência na alínea H) do probatório, não se excluir, a priori, a possibilidade de os atos tributários de autoliquidação aqui em causa poderem ser revistos pela AT, no prazo geral de quatro anos, nos termos do disposto nos artigos 78º, nº 1 da LGT e 98º, nº 1 do CIVA.

X - Contudo, tendo sido entendido na informação nº 2325, de 2012.12.27, a que se faz referência na alínea H) do probatório, que o artigo 78º da LGT “(….) regula, com caráter genérico, os pressupostos da revisão dos atos tributários, sendo aplicável ao IVA em virtude do caráter geral da LGT e pelo disposto no nº 1 do artigo 98º do CIVA”, afigura-se-nos igualmente, tal como aí foi ainda entendido, o seguinte:

“(…)

18. Consistindo o objeto da presente petição no pedido de regularização a favor do sujeito passivo, de imposto (IVA) a mais liquidado em vendas efetuadas a consumidores finais, terá o mesmo de ser analisado de acordo com as normas legais especificas consignadas no Código do IVA, reguladoras da matéria em causa, uma vez que a possibilidade de revisão oficiosa a que se refere o art.º 78º da LGT, atendendo ao seu caráter geral, não pode sobrepor-se às normas reguladoras do respetivo imposto.

19. Isto porque, a revisão oficiosa da autoliquidação de IVA, consignada no art.º 78º da LGT, não pode prejudicar a imperatividade das normas especiais do Código do IVA, ou, caso assim se entendesse, tais normas ficariam desprovidas de qualquer efetividade.

20. De facto, não sendo a LGT uma lei reforçada na aceção do nº 3 do art.º 112º da Constituição da República Portuguesa (CRP), não pode sobrepor-se hierarquicamente aos códigos e demais leis tributárias vigentes.

XI - Assim, face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo o mesmo ser julgado procedente por provado e, em consequência, deve a decisão recorrida ser revogada, com todas as consequências legais, só assim se fazendo JUSTIÇA.

Pelo exposto e com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença, com todas as consequências legais, como é de inteira JUSTIÇA

A Recorrida “A……………, S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

I. O pedido de revisão oficiosa previsto no artigo 78.º da LGT, aplica-se a todos os impostos, pelo que será também aplicável em sede de IVA.

II. A aplicação do artigo 78.º do CIVA, embora se trate de uma norma especial, especificamente pensada para o IVA, não afasta a aplicação do artigo 78.º da LGT.

III. Qualquer interpretação segundo a qual determinada norma do Código do IVA afastou a aplicação de alguma garantia dos contribuintes prevista na LGT padecerá necessariamente de inconstitucionalidade orgânica (artigo 165º, n.º 1, alínea i) da CRP) e material (artigo 103.º, n.º 2 da CRP), neste último caso por as garantias dos contribuintes serem obrigatoriamente definidas por lei formal.

IV. A norma contida no n.º 6 do artigo 78.º do CIVA é uma disposição especial para efeitos do previsto no n.º 2 do artigo 98.º do CIVA, limitando-se o seu campo de aplicação às situações de erros materiais ou de cálculo.

V. No caso dos presentes autos estava em causa a errada aplicação do direito, nomeadamente, em sede de IVA, na determinação do valor tributável nas operações em que aplicava descontos em talões de vendas junto de consumidores finais, mais concretamente uma situação de errónea interpretação de normas de incidência para os efeitos do artigo 16.º do CIVA, pelo que está em causa um erro de direito e não um erro material ou de cálculo.

VI. O erro em que incorreu a Recorrida não se enquadra no denominado erro material ou de cálculo, pelo que não lhe poderá ser aplicável o regime previsto no artigo 78.º, n.º 6 do Código do IVA.

VII. O prazo aplicável para reclamar do IVA entregue, em excesso, numa situação enquadrável no denominado erro de direito é de quatro anos, nos termos previstos no artigo 98.º, n.º 2 do CIVA (neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 01427/14, de 28-06-2017).

VIII. O teor do n.º 2 do artigo 78.º da LGT, com a redação em vigor à data dos factos, considerava "erro imputável aos serviços" o erro na autoliquidação, pelo que na situação sub judice, tratando-se de um erro na autoliquidação, mais concretamente, de um erro de direito na interpretação do disposto no artigo 16.º, n.º 6, alínea b) do Código do IVA, sempre será subsumível ao conceito de "erro imputável aos serviços" e, nesse sentido, suscetível de apreciação em sede de pedido de revisão oficiosa, conforme resulta da interpretação conjugada do artigo 98.º do Código do IVA e do artigo 78.º da LGT.

IX. Tendo-se alicerçado na aplicação das normas legais em vigor à data dos factos e na posição defendida pelos Tribunais Superiores nesta matéria, não padece a douta sentença recorrida do erro na apreciação da matéria de direito que lhe é imputado pela Recorrente.

Nestes termos, não deve ser dado provimento ao recurso apresentado pela Fazenda Pública, assim se fazendo JUSTIÇA!”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao ter determinado a anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, o que passa por saber se a inclusão do valor dos descontos na matéria tributável do IVA constitui um erro de direito e se nessa situação o prazo de correcção da autoliquidação é ou não de 4 anos como entendeu o tribunal “a quo”, ou de apenas de 2 anos, como entendeu a AT e defende a Recorrente.


3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

A) A impugnante pertence ao grupo B…………. - cfr. documento de fls. 4 do processo administrativo;

B) No âmbito da política comercial adotada, durante o período compreendido entre outubro de 2007 e setembro de 2009, efetuou descontos em talão nas vendas realizadas junto dos consumidores finais, liquidando IVA sobre o valor total da fatura antes de descontos - cfr. documento de fls. 11 do suporte físico dos autos;

C) O IVA da parte relativa ao desconto não era pago pelo consumidor final, mas sim pela ora impugnante - cfr. documento de fls. 11 e 12 do suporte físico dos autos;

D) Esta prática foi também adotada por outras sociedades do grupo B………….. (nomeadamente, ……………, S.A; …………, S.A.; …………., S.A.; ……………, S.A.; …………., S.A.), as quais solicitaram um pedido de informação vinculativa no intuito de ver confirmado o correto tratamento em sede do IVA a conferir aos descontos concedidos aos clientes por via da utilização de talões e de cartões de desconto - cfr. documento de fls. 4 do processo administrativo;

E) A proposta de tratamento do IVA indicada pelas empresas requerentes no pedido de informação vinculativa, foi acolhida pela Administração Tributária, tendo sido sancionado o seguinte entendimento:

“(…)

CONCLUSÃO

27- Face ao que antecede, temos que:

DESCONTOS CONCEDIDOS PELA REQUERENTE

a) valor acumulado em cartão de desconto/talão configura um desconto, nos termos da alínea b) do n.º 6 do artigo 16.º do Código do IVA e, por consequência, o referido montante, aquando da sua utilização, deve ser excluído do valor tributável dos artigos vendidos;

MOMENTO A QUE SE REPORTA O DESCONTO CONTIDO EM CARTÃO E/OU TALÃO
b) Na produção de efeitos dos descontos o que releva é o momento em que o mesmo se efetiva sendo a esse momento que se reporta a determinação do valor tributável da operação, conforme preceitua a alínea b) do n.º 6 do artigo 16.º do CIVA;
c) O desconto deve ser imputado, de forma proporcional, às compras realizadas às diferentes taxas de IVA
DESCONTO CONCEDIDO POR OUTROS HIPERMERCADOS
d) Os talões materializam para a Requerente o direito de receber do hipermercado um reembolso correspondente ao desconto feito ao consumidor, pelo que a quantia representada pelo valor dos talões constitui, para a Requerente, um elemento do ativo que é realizado no momento do seu reembolso, e que estes devem ser considerados como meio de pagamento;

e) O valor da contraprestação recebida pela Requerente é constituído pela totalidade do preço do bem transmitido, ou seja, pelo montante pago em dinheiro pelo cliente acrescido do valor acumulado em cartão/talão, reembolsado pelo hipermercado, que promoveu o referido desconto, conforme decorre da conjugação do estabelecido no n.º 1 do artigo 16.º do CIVA com a jurisprudência do Tribunal de Justiça;

f) O reembolso do desconto rebatido consubstancia uma operação fora do campo de imposto
(…)” – cfr. documento de fls. 10 a 15, 17 a 22; 25 a 30; 33 a 38; 41 a 46 do processo administrativo;
F) Com base na resposta obtida ao pedido de informação vinculativa e contrapondo com os procedimentos, em sede do IVA, até então adotados, a impugnante concluiu que liquidou IVA em excesso, no montante de € 83.761,64, nos períodos compreendidos entre outubro de 2007 e setembro de 2009 - cfr. documento de fls. 6 e 7 do processo administrativo;

G) Por conseguinte, em 28.02.2012, a impugnante apresentou pedido de revisão do ato tributário relativo às liquidações de IVA dos períodos de imposto compreendidos entre os meses de outubro de 2007 a setembro de 2009, ao longo do qual, seguindo o entendimento perfilhado pela Autoridade Tributária na resposta ao pedido de informação vinculativa e após a realização de uma revisão interna de procedimentos, concluiu que:

“(…)

15. O IVA liquidado e entregue em excesso para os períodos de imposto compreendidos entre outubro de 2007 a setembro de 2009 totaliza o montante de € 83.761,64 conforme doc. 6.

Face ao exposto, vem a requerente solicitar a revisão dos atos tributários nos termos do artigo 78.º da LGT para os períodos de imposto compreendidos entre outubro de 2007 (inclusive) a setembro de 2009 (inclusive) no montante global de € 83.761,64.

Vem requerer também o pagamento de eventuais juros indemnizatórios que se mostrem devidos pelo pagamento do imposto em excesso, nos termos do artigo 43.º da LGT. (…)”.

- cfr. documento de fls. 3 a 48 do processo administrativo;

H) Por despacho de 2012.12.27 do Senhor Subdiretor-Geral da Área de Gestão Tributária do IVA, exarado na informação n.º 2325, de 2012.12.27 foi indeferido o pedido de revisão oficiosa apresentado pelo ora impugnante, sustentando tal decisão nos seguintes argumentos:

“(…)

40. Logo, por tudo o anteriormente exposto, terá de concluir-se que, ultrapassado o prazo de retificação da fatura, previsto no artigo 78.º do Código do IVA, não pode o contribuinte suscitar por qualquer meio a legalidade da autoliquidação do IVA.

(…)

45. Face a todas as considerações precedentes e verificadas as disposições legais referidas, conclui-se o seguinte:

Tal como se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, a revisão dos atos tributários, pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo da reclamação administrativa, ou por iniciativa da administração tributária no prazo de quatro anos após a liquidação, referindo o n.º 2 do mesmo artigo que, sem prejuízo dos ónus legais de reclamação ou impugnação pelo contribuinte, considera-se imputável aos serviços, para efeitos do n.º 1, o erro na autoliquidação.

O mecanismo de apuramento do IVA, pelas suas características, tem perfeito enquadramento no conceito de autoliquidação, pelo que os erros praticados na autoliquidação poderiam ser revistos pela administração tributária no prazo de quatro anos, e de acordo com a jurisprudência do STA sem que o sujeito passivo tivesse apresentado reclamação prévia, caso o Código do IVA não estipulasse prazos e condições especiais para as regularizações, como é o caso das situações abrangidas pelo artigo 78.º do referido diploma.

Pelo exposto, terá de concluir-se que a pretensão da requerente não pode ser acolhida, por falta de disposição legal que a sustente, pois que, e de acordo com o disposto nas normas antes referidas, no caso da liquidação de IVA, ainda que indevido, e não havendo qualquer disposição legal que possibilite a sua posterior regularização, terá o mesmo que ser entregue nos cofres do Estado. (…)”.

- cfr. documento de fls. 52 a 64 do processo administrativo;

I) A impugnante foi notificada da decisão indicada na alínea precedente, por carta registada com aviso de receção (RC 9344 1377 9 PT), assinado em 8.01.2013 - cfr. documento de fls. 63 do processo administrativo;

J) Em 8.02.2013, a impugnante apresentou, por carta registada, recurso hierárquico da decisão notificada, reiterando o entendimento e conclusões apresentados no pedido de revisão do ato tributário - cfr. documento de fls. 66 a 79 do processo administrativo;

K) Por despacho de 2013.07.31, do Subdiretor-Geral exarado na informação n.º 1812, de 2013.07.08 foi indeferido o pedido de recurso hierárquico interposto pela ora impugnante, sustentado nas seguintes considerações:

“(…)

15. Por conseguinte, o recurso ao mecanismo da revisão oficiosa em caso de autoliquidação apenas será aplicável residualmente, quando o erro não esteja abrangido por qualquer dos prazos especiais de regularização previstos no artigo 78.º do Código do IVA ou noutras normas legais constantes do mesmo diploma.

16. Logo, por tudo o anteriormente exposto, terá de concluir-se que, não tendo a recorrente procedido à regularização do imposto que considera ter liquidado em excesso, dentro do prazo de dois anos previsto na citada norma, e não sendo a regularização obrigatória por implicar imposto a favor do sujeito passivo, preclude o direito de efetuar a sua regularização após o termo do prazo referido naquela norma legal.

(…)

CONCLUSÃO

20. No seguimento de tudo o anteriormente exposto, e ressalvando a questão da regularização efetuada pela recorrente antes referida e que deverá ser alvo de análise pela DF de Viana do Castelo, propõe-se o indeferimento total do presente recurso hierárquico. (…)” - cfr. documento de fls. 114 a 119 do processo administrativo;

L) A impugnante foi notificada da decisão indicada na alínea precedente, por carta registada com aviso de receção (RC 9344 0373 7PT), assinado em 2.08.2013 - cfr. documento de fls. 120 do processo administrativo.


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Factos Não Provados:
Com relevo para a decisão, inexistem.
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Motivação:
A decisão da matéria de facto, efetuou-se com base no exame e análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes do processo principal, bem como do respetivo processo administrativo, conforme o especificado nas várias alíneas da factualidade dada como provada, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal.
Formou-se, ainda, a convicção do Tribunal para a fixação da matéria de facto dada como provada nos depoimentos das testemunhas Dra. …………… (diretora financeira da impugnante) e o Dr. …………. (revisor oficial de contas que prestou serviços à ora impugnante).
As testemunhas inquiridas, após explicarem a sua razão de ciência (conforme se deixou dito), demonstraram ter um conhecimento direto e privilegiado do objeto em discussão. Ambas as testemunhas depuseram de forma espontânea, clara, circunstanciada e objetiva, merecendo, por isso, a credibilidade o Tribunal, razão pela qual foi valorizada positivamente a versão dos acontecimentos que carrearam, através dos depoimentos, para estes autos, conjugada com o princípio da livre apreciação da prova,
Estes depoimentos não foram contrariados por qualquer outra prova, complementando-se entre si e corroborando a versão apresentada pela impugnante.”

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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que julgou parcialmente procedente a acção intentada contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico, por sua vez apresentado da decisão de indeferimento de pedido de revisão de ato tributário, por ter concluído que o acto apontado enferma de ilegalidade “ao considerar (erradamente) que o período de regularização de IVA a favor do sujeito passivo estava limitado ao prazo de dois anos (de acordo com a disposição prevista no n.º 6 do artigo 78.º do Código do IVA)” e bem assim por considerar ser aplicável ao caso concreto o prazo máximo de quatro anos previsto no nº 2 do artigo 98.º do Código do IVA, bem como o disposto no artigo 78º da LGT, por remissão do nº 1 do referido artigo 98.º do Código do IVA.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que está em causa, em termos substanciais, saber se a impugnante pode regularizar a seu favor o IVA alegadamente liquidado a mais em vendas que terá efetuado, essencialmente a consumidores finais, após ter procedido ao registo a que se refere o artigo 45º do CIVA, e após ter incluído o IVA liquidado a mais nas correspondentes declarações periódicas apresentadas com referência aos períodos de Outubro de 2007 a Setembro de 2009, sendo que, tendo em conta tudo o que vem prescrito em matéria de regularização do IVA no artigo 78º do CIVA, impõe-se concluir que a regularização do imposto liquidado em excesso apenas pode ser efetuada no prazo de dois anos, conforme resulta dos números 3 e 6 do artigo 78º do CIVA e mesmo que se concedesse ter havido erro no apuramento do IVA sem que tenha existido qualquer repercussão nos seus clientes, a situação encontra-se, na mesma, sujeita ao mecanismo especial de correcção previsto no nº 6 do artigo 78º do CIVA, não assistindo à impugnante o direito de optar entre a regularização do erro dentro dos prazos especiais previstos no CIVA, ou no prazo geral de revisão oficiosa de atos tributários prevista no artigo 78º da LGT, pois que, tal como vem referido na informação nº 1812, de 2013.07.08, a que se faz referência na alínea K) do probatório:”O prazo estipulado no nº 6 do art.º 78º do CIVA, coincidente com o prazo de reclamação graciosa da autoliquidação, também à luz da jurisprudência comunitária é considerado como um prazo perfeitamente razoável para a correção de erros desta natureza, tal como se refere no Acórdão do TJUE de 8 de maio de 2008, Ecotrade c-95/07 e c-96/97.”, pelo que “(…) o recurso ao mecanismo da revisão oficiosa em caso de autoliquidação apenas será aplicável residualmente, quando o erro não esteja abrangido por qualquer dos prazos especiais de regularização previstos no artigo 78º do Código do IVA ou noutras normas legais constantes do mesmo diploma.”.

Tal significa que, não tendo a impugnante procedido à regularização do IVA que considera ter liquidado em excesso, dentro do prazo de dois anos previsto no artigo 78º do CIVA, e não sendo a regularização obrigatória por implicar imposto a favor do sujeito passivo, encontra-se precludido o direito de efectuar a sua regularização após o termo do prazo de dois anos previsto nesta norma legal.

Que dizer?

Para cabal enquadramento da realidade em equação, importa notar que a decisão recorrida ponderou que no período compreendido entre Outubro de 2007 e Setembro de 2009, a ora Recorrida efectuou descontos em talão nas vendas que efectuou junto dos consumidores finais, tendo liquidado IVA sobre o valor total da factura antes de descontos, pelo que em parte esse imposto era por esta suportado, referindo também que no âmbito de informação vinculativa a AT considerou que “o valor acumulado em cartão de desconto/talão configura um desconto, nos termos da alínea b) do nº6 do artigo 16º do Código do IVA e, por consequência, o referido montante, aquando da sua utilização, deve ser excluído do valor tributável dos artigos vendidos” e ainda que em 28/02/2012, a ora Recorrida apresentou pedido de revisão do ato tributário relativo às autoliquidações de IVA do período compreendido entre Outubro de 2007 e Setembro de 2009, no âmbito do qual peticionou a devolução do montante de € 83.761,64 euros, acrescidos dos juros indemnizatórios devidos, pedido este que foi indeferido, com o fundamento de já ter sido ultrapassado o prazo de rectificação da facturação previsto no artigo 78º do CIVA.
Em termos de análise, a decisão recorrida, louvando-se na doutrina do acórdão do STA de 12/07/2006, proc. 0402/06, e em doutrina aí apontada, entendeu que “o erro de onde deriva a liquidação de IVA em excesso relaciona-se com uma errada interpretação, por parte da impugnante, do disposto no artigo 16º, nº6, alínea b) onde expressamente se consagra a exclusão do valor tributável dos descontos, abatimentos e bónus concedidos”, “pelo que o lapso incorrido pela impugnante não se enquadra no denominado erro material ou de cálculo, (…) mas, diversamente, no denominado erro de direito, (…) por isso, ao pedido de revisão oficiosa de atos tributários …seria aplicável o prazo de quatro anos…”, o que conduziu à procedência parcial da impugnação.

Neste domínio, é sabido que o artigo 78º do CIVA prevê as regularizações a favor do sujeito passivo em determinados casos, designadamente nas situações em que, após o registo referido no artigo 45º, houver lugar a concessão de descontos, como ocorreu no caso retratado nos autos.
Por sua vez dispõe o nº 6 do mesmo artigo 78º que “A correcção de erros materiais ou de cálculo no registo a que se referem os artigos 44.º a 51.º e 65.º, nas declarações mencionadas no artigo 41.º e nas guias ou declarações mencionadas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 67.º é facultativa quando resultar imposto a favor do sujeito passivo, mas só pode ser efectuada no prazo de dois anos, que, no caso do exercício do direito à dedução, é contado a partir do nascimento do respectivo direito nos termos do n.º 1 do artigo 22.º, sendo obrigatória quando resulte imposto a favor do Estado”.

Pois bem, no caso concreto dos autos, como já ficou enunciado, a situação configurada respeita aos descontos efetuados no âmbito de acções de promoção por um sujeito retalhista aos seus clientes (consumidores finais), seja em cartão, seja em talões. Nestes casos, o valor do IVA está incluído no valor do preço, pelo que se este beneficia de desconto, que é activado posteriormente ao acto de venda do produto, o benefício obtido pelo consumidor final compreende redução do preço do bem, no qual está incluído o correspondente valor do imposto, sendo que a ora Recorrida nas declarações periódicas que apresentou no período compreendido entre Outubro de 2007 e Setembro de 2009 não considerou a falta de cobrança do valor do imposto nos descontos e promoções do produtos vendidos, suportando dessa forma o encargo daí resultante (por declarar um valor superior do imposto liquidado ao efectivamente realizado e nessa medida se reflectir no seu direito de dedução do imposto suportado a montante).
Tal significa que o sujeito passivo considerou que o valor do desconto no preço final do produto vendido estava sujeito a tributação e teria que suportar esse encargo (situação que diverge daqueles casos em que o desconto é feito sobre o valor do bem, o que ocorre normalmente entre sujeitos passivos, pois nestes casos o IVA já não incide sobre o valor descontado), verificando-se que, nesta parte, as partes estão de acordo no que concerne à existência de erro na inclusão do valor dos descontos na matéria tributável do IVA, tendo a AT reconhecido isso mesmo na informação vinculativa que prestou a outros sujeitos passivos da mesma cadeia de supermercados.

Neste ponto, revela-se pertinente a consideração da distinção entre erro de direito e erro de facto, sendo que neste último domínio, Afonso Arnaldo e Tiago Albuquerque Dias (“Afinal qual o prazo para deduzir IVA? Regras de Caducidade e (In)segurança Jurídica”, in AA. VV., Sérgio Vasques (coord.), Cadernos IVA 2014, Coimbra, Almedina, 2014, p. 44), citados na decisão recorrida, defendem que “os erros a que se refere o número 6 do artigo 78.º do Código do IVA se reconduzem às situações em que o sujeito passivo se equivoca na materialização do acto de dedução ou liquidação, nomeadamente, por lapso na transcrição de valores ou por razões aritméticas, i.e., em ambas as situações erros menores e evidentes”, ou seja, “estarão abrangidos por estes conceitos de erro (tipicamente) as situações em que o sujeito passivo se engana a efectuar uma operação aritmética, nomeadamente, quando pretende apurar o imposto dedutível contido numa factura (com IVA incluído) de serviços de um fornecedor (erro de cálculo), ou, ainda que efectuando correctamente o cálculo, comete lapso na inscrição do montante do imposto a deduzir na declaração periódica (erro material)”, o que significa que estão, pois, abrangidas pelo erro de facto “as situações em que o sujeito passivo efectua uma incorrecta representação da realidade factual (a qual determina a sua subsunção a uma norma incorrecta)”, mais referindo que “O erro de facto que não origine um consequente erro de direito, não terá qualquer relevância para estes efeitos, porquanto o mesmo não terá qualquer influência no quantum do imposto a deduzir ou a liquidar”.
Por contraposição, o erro de direito verifica-se nas “situações em que, não obstante a correta representação da realidade factual, o sujeito passivo se equivoca na determinação da norma aplicável”, ou seja, em que se verifica um erro de enquadramento, por o sujeito passivo ter feito uma incorrecta interpretação da situação fática ou uma errada aplicação do direito e, consequentemente, liquida ou deduz imposto a mais ou a menos.

Assim sendo, e voltando ao caso em análise, e ponderando os dados postos em evidência, tal como se aponta no parecer subscrito pelo Ex.mo Magistrado do Ministério Público, resulta claro que estamos perante erro de direito, como aliás parece reconhecer a própria Recorrente, na medida em que a questão da inclusão do valor do desconto na matéria tributável do IVA contende com a interpretação de normas jurídicas e o quadro jurídico aplicável, pelo que não restam dúvidas que estamos perante erro de direito e não perante erro material (situação seria diversa se a situação não oferecesse dúvidas e a falta de dedução do imposto se devesse a falha ocasional dos serviços de contabilidade do sujeito passivo no preenchimento das declarações), impondo-se aqui sublinhar que, como ficou dito, só o erro material (erro no registo ou declaração) está abrangido pela previsão do nº 6 do artigo 78º do CIVA (O nº6 do artigo 78º do CIVA “refere-se expressamente ao erro material ou de cálculo, como o erro na soma, a inscrição, na transcrição das facturas para o registo ou dos registos para as declarações, incluindo ainda a duplicação, a omissão; excluindo, assim, o erro de direito resultante de uma aplicação indevida de normas” - Patrícia Noiret Cunha, Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Anotações ao CIVA, ISG, 2004, pág.461).
Além disso, como bem refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, tal como apontado na decisão recorrida, na resposta ao pedido de informação vinculativa solicitado por várias empresas do Grupo B…………. [alínea E)] a opção por excluir do valor tributável os descontos, abatimentos e bónus concedidos resulta, não só da legislação nacional, mas também do entendimento da União Europeia consubstanciada na decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) no processo C-126/88, de 27 de março de 1990 (Caso Boots Company, PLC) onde entendeu que a expressão “descontos e abatimentos concedidos ao adquirente ou ao destinatário, no momento que a operação se realiza”, constante do artigo 11.º A) 3 b) da Sexta Diretiva abrange a diferença entre o preço normal de venda ao público dos bens fornecidos e o montante de dinheiro efetivamente recebido pelo retalhista por aqueles bens no momento em que este aceita do cliente um voucher (ou talão de desconto), dado ao cliente numa compra anterior efetuada ao preço normal de venda ao público”. Esta temática veio ainda a ser discutida e clarificada pelo TJUE nos Acórdãos relativos aos processos C-566/07, C-489/09 e C-588/10, o que evidencia bem a complexidade da matéria e as dúvidas que se suscitam quanto à sua interpretação.

Sobre esta matéria, cabe ainda ter presente o Ac. deste Tribunal de 28-06-2017, Proc. nº 01427/14, www.dgsi.pt, no qual, perante situação similar, ainda que relativa ao apuramento do “pro-rata”, se deixou exarado:
“…
É de concluir que a Autoridade Tributária e Aduaneira, através da Direção de Serviços do Imposto sobre o valor Acrescentado (O aresto refere-se ao ofício circulado nº 30.082/2005 de 17/11, em cujo ponto 9.3 se adoptou o seguinte entendimento: «Regularizações previstas no nº 6 do artº 71º Trata-se da correcção de erros materiais ou de cálculo efectuados nos registos ou nas declarações periódicas. Consideram-se erros materiais ou de cálculo aqueles que resultam de erros internos da empresa e não têm qualquer interferência na esfera de terceiros. Normalmente consistem em erros na transcrição das facturas para os registos ou dos registos para a declaração periódica, não compreendendo os que estão assinalados no ponto 8 do presente ofício-circulado. A regularização deste tipo de erros é facultativa se for a favor do sujeito passivo e só pode ser efectuada no prazo de dois anos».), separou, nitidamente, o que considerou serem erros materiais ou de cálculo circunscrevendo-os, basicamente, a operações mecânicas (erros de transcrição ou de registo na declaração periódica) das não mecânicas, ou seja, das que implicam interpretação da lei para a utilização dos métodos de dedução do IVA (designadamente alteração do método de dedução do imposto nos sujeitos passivos mistos, ou apuramento pro rata).

(…)
Como já se referiu a situação em apreciação não se enquadra no denominado erro material ou de cálculo mas diversamente no denominado erro de direito como sustenta o impugnante. Por isso o prazo para formular o pedido de revisão, em sede de IVA, a que se referem os presentes autos era de quatro anos e não de dois pelo que o presente recurso merece provimento. Do exposto resulta que procede a argumentação do recorrente quando sustenta que o prazo aplicável para reclamar da dedução do imposto entregue em excesso é o previsto no artigo 98.º, n.º 2 do CIVA, ou seja, quatro anos e não o prazo de dois anos, previsto no artigo 78.º, n.º 6 do mesmo diploma, dado que este se circunscreve à correcção de erros materiais ou de cálculo”.

Em suma, tendo presente que a AT nem sequer chegou a apreciar a legalidade da liquidação, indeferindo ab initio o pedido formulado, com base na sua extemporaneidade e na impossibilidade de, in casu, o sujeito passivo poder lançar mão do pedido de revisão oficiosa do ato tributário e bem assim que o erro de onde deriva a liquidação de IVA em excesso relaciona-se com uma errada interpretação, por parte da ora Recorrida do disposto no artigo 16.º, n.º 6, alínea b) onde expressamente se consagra a exclusão do valor tributável dos descontos, abatimentos e bónus concedidos, pois que o lapso em apreço não se enquadra no denominado erro material ou de cálculo (nomeadamente, erro na inscrição do montante de imposto ou falha numa operação aritmética), mas diversamente, como se referiu, no denominado erro de direito (de facto, não restam dúvidas de que a ora Recorrida fez uma errada aplicação do direito, nomeadamente, em sede do IVA, na determinação do valor tributável nas operações em que aplicava descontos em talões de vendas junto de consumidores finais), temos que concluir que será sempre aplicável o limite máximo para reembolso liquidado e entregue em excesso previsto no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA como se entendeu no Ac. deste Tribunal de 28-06-2017, Proc. nº 01427/14, acima apontado, assiste ao sujeito passivo o prazo de 4 anos para a revisão do ato tributário (auto-liquidação), pelo que a decisão da AT de indeferir o pedido de revisão não podia manter-se, tal como se entendeu na sentença recorrida, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação, ainda que com a especificidade de a anulação da decisão de recurso hierárquico abranger a anulação da decisão de indeferimento do pedido de revisão, por ser este o objecto mediato da impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 18 de Novembro de 2020. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.