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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01244/18.4BELRA
Data do Acordão:09/08/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS
PAGAMENTO POR CONTA
CAUSAS DE EXCLUSÃO
ILICITUDE
Sumário:I - A "descrição sumária dos factos" imposta pelo artº.79, nº.1, al.b), do R.G.I.T., enquanto requisito da decisão administrativa de aplicação de coima, deve ser interpretada à luz das garantias do direito de defesa, constitucionalmente assegurado (artº.32, nº.10, da C.R.P.), sendo satisfeito quando a descrição factual que consta da decisão de aplicação de coima seja suficiente para permitir ao arguido aperceber-se dos factos que lhe são imputados e poder, com base nessa percepção, defender-se adequadamente.
II - Tal requisito da decisão administrativa de aplicação de coima deve ser examinado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê a infracção concretamente imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão se reconduzem aos que integram o tipo-de-ilícito em causa.
III - O artº.114, nºs.1 e 2, do R.G.I.T., visa as situações de retenção na fonte, quer a título definitivo, quer por conta do imposto devido a final, a tal se reconduzindo o elemento objectivo do tipo respectivo. Já no nº.5, do mesmo preceito, se prevêem várias situações em que não há falta de entrega de prestação tributária recebida e que deva ser entregue à A. Fiscal, mas sim omissões que têm como consequência a falta de cobrança de imposto devido (cuja punibilidade o legislador equipara à citada falta de entrega da prestação tributária), nomeadamente, nos casos de falta de pagamentos por conta que o sujeito passivo deva efectuar, por conta do imposto devido a final, assim se remetendo para a violação das regras do pagamento por conta previstas nos artºs.104, 105 e 107, do C.I.R.C.
IV - A inexistência/insuficiência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta o pagamento por conta em falta, tem por consequência a exclusão da ilicitude da sua conduta no tocante à omissão do contribuinte, raciocínio que se deve aplicar, também, no caso de não ocorrer a liquidação da segunda prestação de pagamento por conta, prevista para o mês de Setembro do respectivo ano fiscal (cfr.nºs.1 a 3 do probatório supra; artº.31, do C. Penal; artº.2, nº.1, do R.G.I.T.).
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P28105
Nº do Documento:SA22021090801244/18
Data de Entrada:05/14/2021
Recorrente:A....., LDA
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"A…………, L.DA.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto decisão proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Leiria, constante a fls.58 a 63-verso do presente processo de recurso de contra-ordenação, através da qual julgou procedente a apelação deduzida pela sociedade ora recorrente e, em consequência, aplicou à sociedade arguida uma coima especialmente atenuada no valor de € 23.000,00, ao abrigo do artº.32, do R.G.I.T., em virtude da prática de contra-ordenação punida pelo artº.114, nº.2, do mesmo diploma, tudo no âmbito do processo de contra-ordenação nº.3603-2018/6000002427.0, o qual corre seus termos no 2º. Serviço de Finanças de Leiria.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.66 a 72-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-A decisão, da AT, de aplicação da coima em causa à Recorrente é omissa quanto a dois requisitos essenciais, a saber: A) a invocação da existência de imposto liquidado no exercício anterior ao da alegada falta de entrega de pagamento por conta; B) o montante desse imposto liquidado (critério para determinação do valor do pagamento por conta no exercício seguinte);
2-Tal omissão afeta a decisão punitiva com uma irregularidade consistente na falta (ou incompleta) descrição sumária dos factos, descrição esta que é exigida no art. 79, nº 1, al. b), do RGIT;
3-A qual, por sua vez, conduz à nulidade insuprível da decisão de aplicação da coima, nos termos do disposto no art. 63, nº 1, al. d), do RGIT;
4-Devendo, por esta razão, ser declarada nula a decisão proferida pela AT de aplicação à Recorrente da coima aqui em causa;
Para além disso,
5-Na douta sentença aqui posta em crise está em causa a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 2, proferida no âmbito do processo de contraordenação nº 36032018060000024270, que condenou a arguida no pagamento de uma coima no valor de € 45.000,00, pela falta de entrega do pagamento por conta referente ao mês de setembro de 2015, conduta supostamente prevista e punida pelos artigos 104.º, nº 1, alínea a) do CIRC e 114º, nºs 2 e 5, alínea f) e 26.º, n.º 4 do RGIT;
6-Assim, o presente recurso tem por objeto a douta decisão proferida no Despacho Decisório recorrido, no qual, a final, se julgou improcedente o recurso interposto pela sociedade arguida e manteve a sua condenação pela falta de entrega do segundo pagamento por conta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 104.º do CIRC, p.p. nos, n.º 2 e alínea f) do n.º 5 do art.º 114.º do RGIT, não obstante ter reduzido a coima de € 45.000,00 para € 23.000,00, e decidido, em suma o seguinte: “de nada valem os argumentos da Recorrente, que aliás só comprovam que a infração foi cometida”;
7-Douta sentença essa que, a nosso ver, e salvaguardado o devido e merecido respeito que a mesma merece, bem como, salvaguardado ainda o devido respeito por melhor entendimento, padece de uma errada aplicação e interpretação do Direito;
8-A Mma Juíza, entendendo que a questão principal em análise nos presentes autos constituída pela “exclusão da ilicitude” não se verificava, uma vez que, de acordo com o exposto na decisão “é inequívoco que a Recorrente cometeu a infração que lhe é imputada - não procedeu a entrega do segundo pagamento por conta que era devido, o que não lhe permitido por qualquer mecanismo legal, ao contrario do que sucede com o terceiro pagamento, que pode ser dispensado nos termos do artigo 107.° do Código do IRC. O segundo pagamento, na verdade, tem obrigatoriamente de ser efetuado, sendo que a circunstância relatada pela Recorrente apenas poderá, no final do exercício, resultar num reembolso de imposto por parte da Autoridade Tributária”;
9-Ora, na decisão aqui tomada a Mma Juíza do TAF de Leiria fixou a sua decisão numa interpretação normativa enviesada, sem cuidar da ratio legis, dos artigos 104.º, 105.º e 107.º do CIRC e n.º 2 e alínea f) do n.º 5 do art.º 114.º do RGIT;
10-Salvo o devido respeito por melhor entendimento, afigura-se-nos que a questão em apreço nos presentes autos não poderá ser decidida sem que se faça apelo, para além dos dispositivos anteriormente referidos, aos preceitos do n.º 1 do art.º 4.º e artigo 33.º, ambos da LGT, artigo 90.º do CIRC, artigo 31.º do Código Penal e n.º 1 do art.º 103.º da Constituição da República Portuguesa;
11-Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar os pagamentos, líquido das retenções na fonte;
12-Assim, o “pagamento por conta” é, nos próprios termos da lei, uma entrega pecuniária antecipada, feita, por conta do imposto devido afinal, no processo de formação do facto tributário;
13-Se nenhuma quantia pecuniária houver de ser antecipadamente entregue por conta do imposto devido a final, no concernente ao período de formação do facto tributário, por inexistência de (suficiente) lucro tributável revelado pela contabilidade, aquele pagamento por conta não tem fundamento substantivo;
14-Se não houver lucro tributável, não há imposto devido e não se verifica o evento jurídico material de que a lei faz depender a punição, já que não se verifica a lesão do interesse protegido pelos n.ºs 2 e 5/f) do artigo 114.º do RGIT;
15-Os n.ºs 1, 2 e alínea f) do art.º artigo 114.º do RGIT apenas prevê a punição como contraordenação, pela falta de pagamento por conta do imposto devido a final, pelo que quando a final não for devido imposto não se verifica a prática de contraordenação por não estar preenchido o tipo incriminatório;
16-Se não houver imposto devido (por não haver lucro tributável), a punição, para além de não respeitar a norma tipificadora da infração, desrespeitaria também a valoração jurídica decorrente da harmonia do sistema fiscal, onde se contêm normas a requerer a tributação de acordo com o lucro tributável do período e segundo a capacidade contributiva do devedor - conforme, aliás, a uma visão do Direito como ordem jurídica sistémica e unitária, onde, a propósito, ganham proeminência os princípios constitucionais da tributação do lucro real, da justiça, da legalidade e da proporcionalidade;
17-A conduta da Recorrente, não preenche os pressupostos do ilícito contra-ordenacional tipificado nos n.ºs 1, 2 e alínea f) do art.º artigo 114.º (por não ter ocorrido imposto a final apurado, mas antes reembolso devido no período em causa), razão pela qual padece a douta sentença recorrida do invocado erro de direito;
18-A que acresce ainda o facto de ocorrer uma exclusão da ilicitude no tocante à sua conduta omissiva (art.º 31.º CP), motivo pelo qual deverá a recorrente ser absolvida;
19-Nestes termos, e salvo o devido respeito por melhor entendimento, ao contrário do que foi decidido na douta sentença ora posta em crise, deveria ter sido julgado procedente na totalidade o recurso de contraordenação intentado pela Arguida, com o consequente afastamento da ordem jurídica a decisão de aplicação de coima proferida pelo Serviço de Finanças de Leiria 2 no processo de contraordenação fiscal n.º 36032018060000024270;
20-Em conformidade com o exposto, deverá a douta sentença recorrida ser revogada, e substituída por outra que absolva a arguida, nos termos constantes da presente motivação, com todas as legais consequências – o que se requer;
21-Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, deverá ser revogada a douta sentença recorrida, com a consequente absolvição da arguida, como é de inteira JUSTIÇA.
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Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância de recurso.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo provimento do recurso (cfr.fls.85 a 90 do processo físico).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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O despacho recorrido julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.58-verso a 61 do processo físico):
1-Em 31.07.2015 a Recorrente efetuou um primeiro pagamento por conta em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), referente ao exercício de 2015, no valor de € 151.945,48 (cf. comprovativo de fls. 32 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2-Em 31.05.2016 a Recorrente apresentou a sua declaração de rendimentos de modelo 22, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) referente ao ano de 2015, tendo aí declarado matéria coletável no valor de € 670.801,17 (cf. declaração de fls. 27 e seguintes do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3-Em 28.06.2016 a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a favor da Recorrente a liquidação de IRC n.º 2016 2510220086, referente ao exercício de 2015, com um valor a reembolsar de € 1.615,22 (cf. liquidação de fls. 33 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4-Em 22.02.2018 a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu auto de notícia com o n.º C0001871068/2018, no qual pode ler-se o seguinte (cf. auto de fls. 4 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“(…)
ELEMENTOS QUE CARATERIZAM A INFRAÇÃO
Infração 1
1. Imposto/Trib.: Imposto sobre o Rendimento Pessoas Coletivas (IRC)
2. Valor da prestação tributária em falta: 151.945,48
3. Período a que respeita a infração: 2015/09
4. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 2015-09-30
5. Normas infringidas: Artº 104 nº1 a) CIRC – Falta de entrega de Pagamento por Conta
6. Normas punitivas: Artº 114 nº 2, 5 f) e 26 nº 4 do RGIT – Falta de entrega de prestação tributária
Verifiquei, pessoalmente, na data e local referidos no quadro 03, que o sujeito passivo identificado no quadro 01, não entregou, para o período e até à data referida, respetivamente, em 2 e 3 do quadro 02, o pagamento por conta, o que constitui infração às normas previstas em 5, punível pelas disposições referidas em 6, do mesmo quadro. Nos termos do Artº 8º do RGIT é (são) responsável(eis) pela prática das infrações descritas, e, cumulativamente com esta, é(são) subsidiariamente responsável(eis) nos termos do nº 3 do mesmo artigo, os(s) Administradores(es)/Gerente(s) em funções à data do termo do prazo para cumprimento da obrigação.
(…)”;
5-Em 23.02.2018 o SF de Leiria 2 instaurou o processo de contraordenação n.º 36032018060000024270 contra a Recorrente (cf. auto de fls. 3 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6-Em 26.02.2018 o Chefe do SF de Leiria 2 emitiu Notificação para apresentação de defesa (Art.º 70.º, nº 1 do Regime Geral das Infrações Tributárias) no âmbito do processo de contraordenação n.º 36032018060000024270, dirigida à Recorrente (cf. notificação de fls. 6 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7-Em 15.03.2018 a Recorrente apresentou junto do SF de Leiria 2 a sua defesa escrita no âmbito do processo de contraordenação n.º 36032018060000024270 (cf. defesa de fls. 7 e seguintes do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8-Em 07.06.2018 o Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Leiria determinou o prosseguimento dos autos no processo de contraordenação n.º 36032018060000024270 (cf. despacho de fls. 16 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
9-Em 04.07.2018 o Chefe do SF de Leiria emitiu “Decisão da fixação da coima” no âmbito do processo de contraordenação n.º 36032018060000024270, dirigida à Recorrente, na qual pode ler-se o seguinte (cf. decisão de fls. 19 e 20 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“(…)
Descrição Sumária dos Factos
Ao(À) arguido(a) foi levantado Auto de Notícia pelos seguintes factos:
1. Imposto/Trib.: Imposto sobre Rendimento Pessoas Coletivas (IRC);
2. Valor da prestação tributária em falta: 151.945,48;
3. Período a que respeita a infração: 2015/09;
4. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 2015-09-30, os quais se dão como provados.
Normas Infringidas e Punitivas
Os factos relatados constituem violação do(s) artigo(s) abaixo indicado(s), punidos pelo(s) artigo(s) do RGIT referidos no quadro, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 05/07, constituindo contraordenação(ões).

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Responsabilidade contraordenacional
A responsabilidade própria do(s) arguido(s) deriva do Artº 10º da Lei Nº 25/2006, de 30/06, concluindo-se dos autos a prática, pelo(s) arguido(s) e como autor(es) material(ais) da(s) contraordenação(ões) identificada(s) supra.
Medida da Coima
Para fixação da(s) coima(s) em concreto deve ter-se em conta a gravidade objetiva e subjetiva da(s) contraordenação(ões) praticada(s), para tanto importa ter presente e considerar o(s) seguinte(s) quadro(s) (Artº 27 do RGIT):

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DESPACHO
Assim, tendo em conta estes elementos para a graduação da coima e de acordo com o disposto no Artº 79º do RGIT aplico ao arguido a coima de Eur. 45.000,00, cominada no(s) Art(s)º Artº 114 nº 2, 5 f) e 26 nº 4º do RGIT, com respeito pelos limites do Artº 26º do mesmo diploma, sendo ainda devidas custas (Eur. 76,50) nos termos do Nº 2 do Dec-Lei Nº 29/98 de 11 de fevereiro.
Notifique-se o arguido nos termos da presente decisão, juntando-se-lhe cópia, para, efetuar o pagamento da coima com benefício de redução no prazo de 15 dias (78º/2 RGIT) ou sem benefício de redução no prazo de 20 dias, podendo neste último prazo recorrer judicialmente (79º/2 RGIT), sob pena de cobrança coerciva, advertindo-o de que vigora o Princípio de Proibição de «Reformatio in Pejus» (em caso de recurso não é suscetível de agravamento, exceto se a situação económica e financeira do infrator tiver melhorado de forma sensível).”;
10-Em 04.07.2018 o SF de Leiria 2 emitiu ofício com o assunto Notificação artº 79º nº 2 RGI” no âmbito do processo de contraordenação n.º 36032018060000024270, dirigido à Recorrente (cf. notificação de fls. 21 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa…".
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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "…Para prova dos factos acima elencados sob os números 1. a 10., foi determinante a análise dos elementos juntos aos autos pela entidade administrativa, bem como pela Recorrente com o recurso apresentado, todos constantes do processo físico, conforme supra se encontra devidamente identificado em frente a cada um dos pontos do probatório – cf. artigos 374.º e 376.º do Código Civil…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a decisão recorrida julgou procedente a apelação deduzida pela sociedade recorrente e, em consequência, aplicou à sociedade arguida uma coima especialmente atenuada no valor de € 23.000,00 e ao abrigo do artº.32, do R.G.I.T., em virtude da prática de contra-ordenação prevista e punida pelos artºs.104, nº.1, al.a), do C.I.R.C., e 114, nºs.1., 2 e 5, al.f), e 26, nº.4, todos do R.G.I.T.
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Desde logo, diremos que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.412, nº.1, do C.P.Penal, "ex vi" do artº.3, al.b), do R.G.I.T., e do artº.74, nº.4, do R.G.C.O.).
O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e como supra se alude, que ao contrário do decidido pelo Tribunal "a quo", se verifica a nulidade do despacho de aplicação de coima por violação do artº.63, nº.1, al.d), "ex vi" do artº.79, nº.1, al.b), ambos do R.G.I.T., pois que a mesma decisão de aplicação de coima é omissa quanto a dois requisitos essenciais, a saber: a invocação da existência de imposto liquidado no exercício anterior ao da alegada falta de entrega de pagamento por conta; e o montante desse imposto concretamente liquidado. Que se verifica uma incompleta descrição sumária dos factos. Que a sentença recorrida violou o disposto nos artºs.63, nº.1, al.d), e 79, nº.1, al.b), ambos do R.G.I.T. (cfr.conclusões 1 a 4 do recurso) com base em tal argumentação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal pecha.
Diz-nos o artº.63, nº.1, al.d), do R.G.I.Tributárias, que constitui nulidade insuprível do processo de contra-ordenação fiscal, além do mais, a falta dos requisitos legais da decisão de aplicação de coima, nulidade esta de conhecimento oficioso, conforme estatui o nº.5, da citada norma legal (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/10/2018, rec.1004/17.0BEPRT; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/01/2019, rec.207/17.1BEVIS; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/05/2020, rec.1070/18.0BEALM; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.444).
Por sua vez, o artº.79, nº.1, do mencionado diploma (na esteira do artº.58, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo dec.lei 433/82, de 27/10), consagra os requisitos que a decisão administrativa de aplicação de coimas deve conter e que são:
1-A identificação do arguido e eventuais comparticipantes;
2-A descrição sumária dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas;
3-A coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação;
4-A indicação de que vigora o princípio da proibição da "reformatio in pejus";
5-A indicação do destino das mercadorias apreendidas;
6-A condenação em custas.
Não havendo na fase decisória do processo contra-ordenacional que corre pelas autoridades administrativas a intervenção de qualquer outra entidade que não sejam o arguido e a entidade administrativa que aplica a coima, os requisitos previstos neste artigo para a decisão condenatória do processo contra-ordenacional devem ser entendidos como visando assegurar ao arguido a possibilidade de exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão. Por isso, as exigências aqui feitas deverão considerar-se satisfeitas quando as indicações contidas na decisão sejam suficientes para permitir ao arguido o exercício desses direitos.
Reflexamente, a exigência de fundamentação da decisão, com indicação dos elementos que contribuíram para a fixação da coima, impõe à autoridade administrativa uma maior ponderação, ínsita na necessidade de racionalização do processo lógico e valorativo que conduziu a essa fixação, e assegura a transparência da actuação administrativa, para além de facilitar o controlo judicial, se a decisão for impugnada.
Porém, é a necessidade de conhecimento daqueles elementos para a defesa do arguido e o carácter de direito fundamental que o direito à defesa assume (cfr.artº.32, nº.10, da C.R.Portuguesa) que justificam que se faça derivar da sua falta uma nulidade insuprível, nos termos do artº.63, nº.1, al.d), do R.G.I.T. (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/10/2018, rec.1004/17.0BEPRT; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/01/2019, rec.207/17.1BEVIS; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/05/2020, rec.1070/18.0BEALM; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.517 e seg.; Isabel Marques da Silva, Regime Geral das Infracções Tributárias, Cadernos IDEFF, nº.5, 3ª. edição, 2010, Almedina, pág.143 e 144).
Concretamente, quanto à "descrição sumária dos factos" referida acima, não impõe o artº.79, nº.1, al.b), do R.G.I.Tributárias, a enumeração dos factos provados e não provados, bem como uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, conteúdo que é exigido pelo artº.374, nº.2, do C.P.P., para as sentenças proferidas em processo criminal.
Trata-se, neste artº.79, nº.1, al.b), do R.G.I.T., de estabelecer um regime de menor solenidade para as decisões de aplicação de coimas comparativamente com as sentenças criminais, regime esse justificável pela menor gravidade das sanções contra-ordenacionais. O que exige esta norma, interpretada à luz das garantias do direito de defesa, constitucionalmente assegurado (artº.32, nº.10, da C.R.P.) é que a descrição factual que consta da decisão de aplicação de coima seja suficiente para permitir ao arguido aperceber-se dos factos que lhe são imputados e poder, com base nessa percepção, defender-se adequadamente. Tal requisito da decisão administrativa de aplicação de coima deve ser examinado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê a infracção concretamente imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão se reconduzem aos que integram o tipo-de-ilícito em causa (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 27/6/2007, rec.353/07; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/10/2018, rec.1004/17.0BEPRT; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/05/2020, rec.1070/18.0BEALM; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/10/2020, rec.266/19.2BELRS; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág. 518).
No caso concreto, conforme se retira da matéria de facto, é imputado ao arguido a prática, enquanto autor material, de contra-ordenação punível nos artºs.114, nºs.2 e 5, al.f), e 26, nº.4, do R.G.I.T., consubstanciando a A. Fiscal tal conduta como falta de entrega da prestação tributária (cfr.nºs.4 e 9 do probatório).
O citado artº.26, nº.4, do R.G.I.T., limita-se a consagrar uma elevação para o dobro dos limites mínimo e máximo das coimas previstos nos diversos tipos-de-ilícito contra-ordenacional quando tenham por sujeito infractor uma pessoa colectiva, sociedade, ainda que irregularmente constituída, ou outra entidade fiscalmente equiparada (cfr.Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.294 e seg.; João Ricardo Catarino e Nuno Victorino, Direito Sancionatório Tributário, Anotações ao Regime Geral, Almedina, 2020, pág.263 e seg.).
Pelo que, a punibilidade da conduta imputada à sociedade ora recorrida no âmbito dos presentes autos se reconduz ao citado artº.114, nºs.1, 2 e 5, al.f), do R.G.I.T., na versão em vigor no ano de 2015 (versão da Lei 64-B/2011, de 30/12 - O.E. de 2012), a qual tinha o seguinte conteúdo:
Artigo 114.º
(Falta de entrega da prestação tributária)

1-A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
2-Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 15% e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
(…)
5-Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária:
(...)
f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta.

Por prestação tributária entende-se qualquer tributo que caiba cobrar à Administração Fiscal ou à Administração da S. Social (cfr.artº.11, al.a), do R.G.I.T.).
Com a utilização da expressão "prestação tributária deduzida" pretendeu o legislador aludir a todas as situações em que é apurada uma prestação tributária, isto é, uma quantia de imposto nos termos do artº.11, al.a), do R.G.I.T., pelo sujeito passivo e através de uma subtracção de uma quantia global, sendo que tal montante tem de ser entregue à A. Fiscal (cfr.Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.813 e 814; João Ricardo Catarino e Nuno Victorino, Direito Sancionatório Tributário, Anotações ao Regime Geral, Almedina, 2020, pág.1069 e seg.).
Não existindo dolo, a falta de entrega da prestação nos termos da lei é susceptível de constituir a infracção por negligência, prevista no nº.2 deste artigo, sendo esta a espécie (ao nível do nexo de culpa - cfr.artº.24, nº.1, do R.G.I.T. (No R.G.I.T., ao contrário do que sucede no R.G.C.O. - artº.8, nº.1 - consagra-se, genericamente, a punibilidade a título de negligência, afastando-se a punição a este título apenas quando existir disposição expressa em sentido contrário - cfr.citado artº.24, nº.1, do R.G.I.T.).) de contra-ordenação imputada ao arguido neste processo (cfr.nº.9 do probatório supra).
No nº.5 do preceito sob exegese, prevêem-se várias situações em que não há falta de entrega de prestação tributária recebida e que deva ser entregue à A. Fiscal, mas sim omissões que têm como consequência a falta de cobrança de imposto devido (cuja punibilidade o legislador equipara à citada falta de entrega da prestação tributária), nomeadamente, nos casos de falta de pagamentos por conta que o sujeito passivo deva efectuar, por conta do imposto devido a final, assim se remetendo para a violação das regras do pagamento por conta previstas, no ano de 2015, nos artºs.104, 105 e 107, do C.I.R.C. (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/10/2019, rec.329/18.1BELLE; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.812).
Revertendo ao caso dos autos, a decisão de aplicação da coima imputa à sociedade arguida a violação da norma constante do artº.104, nº.1, al.a), do C.I.R.C. (falta de entrega de pagamento por conta), mais indicando como normas punitivas os artºs.114, nºs.2 e 5, al.f), e 26, nº.4, ambos do R.G.I.T., onde se estabelece a moldura sancionatória aplicável à falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, expressamente equiparada à falta de entrega da prestação tributária.
Por outro lado, embora a alusão à falta de entrega de pagamento por conta não esteja referida na componente da decisão administrativa que tem como epígrafe "Descrição Sumária dos Factos", antes na componente "Normas Infringidas e Punitivas", não deixa de assumir relevância como efectiva descrição da factualidade que integra o tipo legal de contraordenação imputada à arguida, permitindo-lhe o pleno exercício do direito de defesa (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/12/2019, rec.203/18.1BEMDL; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/02/2021, rec.3404/19.1BEPRT).
Noutra vertente, a análise do teor da defesa apresentada no articulado do recurso judicial (cfr.requerimento junto a fls.24 a 26 do processo físico), revela a clara compreensão pela sociedade arguida de que lhe está a ser imputada a falta de prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, em consequência argumentando, além do mais, que o valor do primeiro pagamento por conta efectuado consumiu todo o imposto apurado no exercício em causa, situação que exclui a ilicitude do seu comportamento.
Neste contexto o binómio formado pela descrição sumária dos factos e pela indicação das normas infringidas e punitivas cumpre, sem reserva, o objectivo
visado com o requisito legal, permitindo à arguida o exercício esclarecido do seu direito de defesa, como efectivamente se verificou, assim nenhum relevo tendo a aduzida, por parte da apelante, incompleta descrição sumária dos factos em sede administrativa de decisão de aplicação da coima (a invocação da existência de imposto liquidado no exercício anterior ao da alegada falta de entrega de pagamento por conta; e o montante desse imposto concretamente liquidado).
Por último, sempre se dirá que os mencionados elementos, o volume de negócios e a colecta do ano de 2014, tal como o cálculo do valor de cada pagamento por conta no ano de 2015, constam da informação prévia à decisão de aplicação de coima, a tais dados fazendo menção a sociedade arguida no articulado do recurso judicial.
Com estes pressupostos, sem necessidade de mais amplas considerações, o Tribunal nega provimento a este alicerce do recurso.
Aduz o recorrente, igualmente e em síntese, que o "pagamento por conta" é, nos próprios termos da lei, uma entrega pecuniária antecipada, feita, por conta do imposto devido a final, no processo de formação do facto tributário. Que o artº.114, do R.G.I.T., apenas prevê a punição como contraordenação, pela falta de pagamento por conta do imposto devido a final, pelo que, quando a final não for devido imposto, não se verifica a prática de contraordenação por não estar preenchido o tipo incriminatório. Que a conduta da recorrente não preenche os pressupostos do ilícito contra-ordenacional tipificado no citado artº.114, por não ter ocorrido imposto a final apurado, mas antes reembolso devido no período em causa, razão pela qual padece a sentença recorrida de erro de direito. Que deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a sociedade arguida com todas as legais consequências (cfr.conclusões 5 a 20 do recurso) com base em tal argumentação pretendendo concretizar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal pecha.
No âmbito do Código do I.R.C., enquanto regime de pagamento antecipado do imposto (diferente é o pagamento especial por conta previsto no artº.106, do C.I.R.C.), o pagamento por conta é devido pelos sujeitos passivos que exerçam, a título principal, actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como pelas entidades não residentes com estabelecimento estável em território nacional (cfr.artº.104, nº.1, do C.I.R.C.; artº.33, da L.G.T.).
Os pagamentos por conta (com vencimento nos meses de Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável) devem ser calculados com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquido das retenções na fonte. Por outro lado, a lei prevê que o contribuinte fique dispensado de tal obrigação quando tenha tido, no exercício anterior, um lucro inferior a determinado montante (€ 200,00). Por último, se o valor do lucro tributável do exercício em curso for inferior ao do anterior, os pagamentos por conta a que o sujeito passivo está obrigado resultam excessivos, assim correspondendo ao adiantamento de um imposto não devido. Para obviar a essas situações a lei permite que o sujeito passivo suspenda os pagamentos por conta, mais concretamente, o terceiro pagamento a realizar em 15 de Dezembro do próprio ano (cfr. artºs.104, nºs.1 e 4, e 107, nº.1, do C.I.R.C.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.218 e seg.; Rui Marques, Código do IRC anotado e comentado, Almedina, 2019, pág.878 e seg.).
Os pagamentos por conta revestem natureza provisória, apenas se podendo tornar definitivos quando o montante de imposto a pagar estiver efectivamente determinado, pelo que se verifica apenas um adiantamento do pagamento do imposto devido a final. Deste modo, o pagamento antecipado produzirá os seus efeitos se couber dentro da dívida de imposto, a qual apenas ficará determinada no momento da liquidação, sendo que a estruturação desta, em regra, implica a existência de uma obrigação acessória declarativa do sujeito passivo (cfr.v.g.artºs.89, al.a), e 90, nº.1, al.a), do C.I.R.C.; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.291).
Tendo presente o quadro normativo de referência acabado de transcrever e a factualidade considerada assente nos presentes autos, julgamos, contrariamente ao decidido pelo Tribunal "a quo", que a conduta da sociedade recorrida não preenche os pressupostos do ilícito contra-ordenacional tipificado no citado artº.114, nºs.1, 2 e 5, al.f), do R.G.I.T. (existência de lucro tributável/imposto que seja devido no final do período fiscal em causa - cfr.nºs.1 a 3 do probatório supra).
É que o "pagamento por conta" é, nos próprios termos da lei, uma entrega pecuniária antecipada, realizada por conta do imposto devido a final, no período de formação do facto tributário (cfr.artº.33, da L.G.T.). O que significa, ainda, que o "pagamento por conta" tem de ser aferido face à situação contabilística da empresa no fim do período fiscal a que se refere o mesmo. Ora, se nenhuma quantia pecuniária houver de ser (antecipadamente) entregue por conta do imposto devido a final, no concernente ao período de formação do facto tributário (a que se refere o "pagamento por conta") - mormente por inexistência/insuficiência de lucro tributável revelado pela contabilidade, a esse tempo - aquele "pagamento por conta" não tem fundamento substantivo. Em conclusão, nestas condições, a inexistência/insuficiência de lucro tributável no período fiscal a que se reporta o pagamento por conta em falta, encontra-se excluída a ilicitude da sua conduta no tocante à omissão do contribuinte, raciocínio que se deve aplicar, também, no caso de não ocorrer a liquidação da segunda prestação de pagamento por conta, prevista para o mês de Setembro, situação que se verifica nos presentes autos (cfr.nºs.1 a 3 do probatório supra; artº.31, do C.Penal; artº.2, nº.1, do R.G.I.T.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/10/2019, rec.329/18.1BELLE; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/01/2020, rec.461/18.1BELLE).
Arrematando, concede-se provimento ao presente esteio do recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A SENTENÇA RECORRIDA e, por consequência, a decisão administrativa de aplicação de coima, mais absolvendo a sociedade arguida da prática da contra-ordenação de que se encontrava acusada.
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Sem custas (inexistência de norma legal que preveja a condenação da entidade recorrida em custas).
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 8 de Setembro de 2021

Joaquim Manuel Charneca Condesso (Relator)

O Relator atesta, nos termos do artº.15-A, do Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de Março, o voto de conformidade dos Exº.mos Senhores Conselheiros Adjuntos: Gustavo André Simões Lopes Courinha e Anabela Ferreira Alves e Russo.
Joaquim Manuel Charneca Condesso