Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0579/20.0BEALM
Data do Acordão:11/18/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
DIREITO A DECISÃO JUDICIAL EM PRAZO RAZOAVEL
DANO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão de TCA que confirmou a decisão do TAF se não se coloca questão de relevância social e jurídica fundamental, nem nos deparamos com uma apreciação pelo tribunal a quo quanto o quantum arbitrado que, claramente, reclame a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição para melhor aplicação do direito, já que em linha e consonância com a jurisprudência produzida sobre a questão em causa.
Nº Convencional:JSTA000P28546
Nº do Documento:SA1202111180579/20
Data de Entrada:11/10/2021
Recorrente:A……………..
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


1. A………… [doravante A.], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 07.07.2021 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 1309/1377 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso de apelação por si interposto dado inconformado com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria [doravante TAF/LRA], proferida na ação administrativa deduzida contra ESTADO PORTUGUÊS [doravante R.], que havia julgado «parcialmente procedente a presente ação» e que, em consequência, condenou o R. no pagamento de indemnização ao A. no montante de «2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos em virtude da duração excessiva do processo n.º 140/13.6TBPNI, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a prolação da presente decisão até efetivo e integral pagamento».

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 1384/1447] na relevância social e jurídica da questão objeto de discussão [respeitante à fixação do cômputo/valor dos danos a arbitrar por danos não patrimoniais emergentes da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso/demora na administração da justiça] e, bem assim, para uma «melhor aplicação do direito», fundada não só nas nulidades acometidas ao acórdão recorrido [cfr. art. 615.º, n.º 1, als. b), c) e d), do Código de Processo Civil (CPC/2013)], mas, também, na errada interpretação e aplicação, mormente dos arts. 06.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos [CEDH], 20.º, n.ºs 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa [CRP], 496.º e 562.º e seguintes do Código Civil [CC], bem como enfermando de inconstitucionalidade.

3. O R. veio produzir contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 1450/1509], nas quais pugna, desde logo, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/LRA julgou «parcialmente procedente a presente ação», tendo condenado o R. no pagamento ao A. de uma indemnização a título de danos não patrimoniais no montante de 2.500,00 €, acrescido de juros moratórios, decorrente da duração excessiva do processo n.º 140/13.6TBPNI [cfr. fls. 1150/1219], juízo esse integralmente mantido pelo TCA/S no acórdão recorrido.

7. O A., aqui ora recorrente, para além da relevância social e jurídica da questão, sustenta a necessidade de melhor aplicação do direito, insurgindo-se, neste segmento, para além das arguidas nulidades de decisão, no que entende ser a errada interpretação e aplicação feita no acórdão recorrido do quadro normativo supra enunciado, sustentando pela a indemnização pelo atraso na duração do processo devem corresponder, pelo menos, a um valor de 12.000,00 € [doze mil euros].

8. A alegação expendida pelo ora recorrente, centrada, no essencial, no tempo de duração e no valor a arbitrar a título de indemnização, não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes os contornos do caso sub specie, no sentido de que o TCA/S terá decidido com pleno acerto, tanto mais que a fundamentação jurídica na qual se mostra assente o juízo firmado não aparenta padecer de erros lógicos ou jurídicos manifestos.

9. Com efeito, o quantum arbitrado pelo TCA/S é razoável e plausível, até porque ele não parece ostensivamente discrepante relativamente à jurisprudência nacional e internacional na matéria, pelo que nada insta à transferência do assunto para este Supremo, visto um tal reenvio só se imporia se o cômputo indemnizatório, feito pelo tribunal a quo, suscitasse dúvidas claramente ostensivas, o que vale por dizer que a admissão do recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito, cientes de que não obstante a relevância reconhecida à questão o certo é que, face aos atuais contornos da jurisprudência e deste caso concreto, ela não se posiciona como de especial relevância jurídica, nem social ou indício de interesse comunitário fundamental.

10. Refira-se, por outro lado, que as questões envolvendo alegadas inconstitucionalidades dizem respeito a problemática sobre a qual a intervenção do Supremo não pode assegurar as finalidades inerentes à razão de ser do recurso excecional de revista, isto é, de, em termos finais, decidir litígios e/ou orientar e definir interpretações para futuras decisões de casos semelhantes no âmbito daquilo que constituem as matérias da sua competência especializada, tanto mais que em sede do controlo da constitucionalidade das normas e das interpretações normativas feitas a última palavra caberá ou mostra-se acometida ao Tribunal Constitucional [TC].

11. De notar que para se lograr aceder ao TC e obter tutela em sede do controlo de questão de conformidade constitucional de normas não resulta como exigida, ou sequer como imposta, a necessidade de emissão de uma pronúncia sobre a questão por parte deste Supremo Tribunal no quadro do recurso de revista excecional tal como se mostra delimitado e gizado no art. 150.º do CPTA, tanto mais que um tal entendimento redundaria ou implicaria que, uma vez suscitada uma questão de constitucionalidade, houvesse lugar à necessária e imediata admissão do recurso de revista, ao arrepio daquilo que constituem as finalidades e âmbito do mesmo e dos critérios definidos [cfr., entre outros, os Acs. de 09.09.2015 - Proc. n.º 0881/15, de 03.12.2015 - 01544/15, de 08.03.2017 - Proc. n.º 0185/17, de 05.04.2017 - Proc. n.º 0352/17, de 11.01.2018 - Proc. n.º 01419/17, de 10.05.2019 - Proc. n.º 0445/15.1BEBRG, e nos mais recentes, os Acs. de 04.02.2021 - Procs. n.ºs 0549/13.5BEAVR, 0822/09.7BECBR e 02605/14.3BESNT, de 18.02.2021 - Procs. n.ºs 01382/20.3BELSB, 0804/17.5BEPRT, de 11.03.2021 - Proc. n.º 1240/19.4BEPNF-S1, de 25.03.2021 - Proc. n.º 0213/20.9BEALM-S1].

12. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo do A./recorrente.
D.N..

Lisboa, 18 de novembro de 2021. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.