Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01488/17
Data do Acordão:01/25/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
INEXISTÊNCIA JURÍDICA
SENTENÇA
Sumário:Deve admitir-se revista de acórdão do TCA que perante um excesso de pronúncia não alegado entende que a sentença é inexistente.
Nº Convencional:JSTA000P22850
Nº do Documento:SA12018012501488
Data de Entrada:12/22/2017
Recorrente:B......, SA E A......., SA
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE TORRES NOVAS E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………………. S.A. recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Sul, proferido em 19-10-2017, que julgou inexistente a sentença proferida pelo TAF de Leiria, que por seu turno anulou o acto que lhe adjudicou da prestação de serviços e condenou a entidade adjudicante (Município de Torres Novas) a retomar o procedimento pré – contratual, densificando os conceitos ali usados e a excluir a proposta por si (A………….) apresentada.

1.2. B…………….. S.A. (autora na presente acção de contencioso pré-contratual) recorreu do mesmo acórdão.

1.3. Ambos os recorrentes justificam a admissão da revista por ser necessária uma melhor interpretação e aplicação do direito, dado que a sentença declarada inexistente está devidamente assinada, consta dos autos e é totalmente recognoscível e identificável como uma verdadeira sentença judicial.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A sentença proferida no TAF de Leiria anulou o acto de adjudicação da prestação de serviços à A…………. e condenou a entidade adjudicante a retomar o procedimento pré – contratual, densificando no Programa do Procedimento os subfactores procurando objectivar os conceitos indeterminados ali usados, e condenou a entidade adjudicante a excluir a proposta apresentada pela concorrente A……….., por violação do art. 70º, 2, b) segunda parte do CCP.

3.3. Desta sentença foram interpostos recursos pela A………….., SA, pela B…………….. S.A.

3.4. O TCA Sul começou por apreciar o recurso apresentado pela B…………….

Neste âmbito começou por destacar as questões colocadas no recurso: (i) saber se, como consta do enquadramento feito na sentença, a proposta apresentada pela A………. deveria ser excluída, por incumprimento dos parâmetros do Caderno de Encargos; (ii) saber se ocorreu erro na avaliação da proposta da A……….., relativamente aos sub - factores LU, LDMC e RH; (iii) saber se o relatório preliminar e final padecem de vício de falta de fundamentação pela utilização de conceitos indeterminados não densificados na justificação da pontuação atribuída ao facto P2; (iv) valor do processo.

De seguida resumiu o entendimento da sentença, dando especial destaque à questão relativa ao “vício de falta de fundamentação dos Relatórios Preliminar e Final, pela utilização de conceitos indeterminados não densificados na justificação da pontuação atribuída ao subfactor P2 e demais subfactores”. Nesta análise, depois de transcrever a argumentação da sentença recorrida, entendeu que a procedência da acção funda-se “numa questão – causa de pedir – que não foi suscitada pela recorrida-Autora, mas tão-somente pela CI C.......... e, na sua contestação”, e deve ser reconduzida a um pedido reconvencional, por visar a impugnação dos documentos conformadores do procedimento. Acontece que o Tribunal “a quo” – continua a argumentar o acórdão recorrido – ordenou o desentranhamento da reconvenção da CI C.......... por despacho de 10-1-2017, já transitado em julgado. Daí que, continua o acórdão, não podia o julgador pronunciar-se sobre tal questão: “É, pois, ostensivo que a sentença padece de excesso de pronúncia, por falta de identidade entre a causa de pedir e a causa de julgar” (fls. 785).

Contudo, não foi imputado à sentença o referido vício de excesso de pronúncia, o que levou o TCA Sul a ponderar o seguinte:

Porque não pode ser conhecida por falta de arguição, em face das vicissitudes processuais já analisadas coloca-se a questão de saber se é juridicamente inexistente a sentença” .

O acórdão termina a sua análise concluindo que efectivamente estamos perante um caso de inexistência da sentença.

3.5. A nosso ver é evidente que a revista deve ser admitida.

Desde logo e tanto basta, porque o vício de inexistência jurídica de uma sentença é (como diz o acórdão, citando Marcello Caetano) um vício demasiado grave que ocorre quando “grosseiramente” se quer fazer passar por sentença “um acto praticado no processo onde não se encontra nada que corresponda ao conceito respectivo”. No presente caso, estamos perante (i) uma decisão judicial proferida e assinada pelo juiz competente, (i) no tribunal competente e (ii) na forma processualmente adequada.

Por outro lado, o vício da sentença foi – pelo TCA Sul - juridicamente qualificado como de “excesso de pronúncia”, e só não foi conhecido, enquanto tal, por não ser de conhecimento oficioso e não ter sido arguido. Ora, esta transformação do excesso de pronúncia em inexistência da respectiva decisão, também justifica claramente a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do Direito.

4. Decisão

Face ao exposto admite-se a revista.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2018. – São Pedro (relator) – Costa Reis – Madeira dos Santos.