Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0488/14.2BEVIS 0412/18
Data do Acordão:02/17/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ILEGITIMIDADE
REVERSÃO
OPOSIÇÃO
Sumário:I - Na sua petição inicial, se é certo que o Oponente começa por aludir à falta de fundamentação, alude depois à falta de verificação dos requisitos legais que permitem a reversão da dívida, referindo que nunca exerceu qualquer efectivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto, pois que exercia apenas as funções de vendedor e distribuidor da sociedade devedora originária e, quanto à alegada remuneração, não existe qualquer remuneração dado que os valores se encontram em dívida, além de que assinava os documentos que lhe punham à frente (arts. 31º a 34º da petição inicial).
II - Neste domínio, quer o Oponente quer depois a AT na sua contestação (arts. 7º e 8º da contestação) não estão a discutir a concretização, em sede de despacho de reversão, da afirmação da gerência de facto, mas da verificação desse elemento como pressuposto da reversão, sendo essa a posição assumida pelo Tribunal recorrido quando definiu a necessidade de apreciar os pressupostos da reversão, que constituem matéria da (i) legitimidade do oponente, fundamento de oposição previsto no artigo 204º nº 1 alínea b) do CPPT, procedendo à análise acima descrita, a qual, bem ou mal para o caso agora não interessa, redundou na afirmação de que, competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve, no caso concreto, ser valorada contra si a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência, sendo que, em sede de análise de fundamento formal do despacho de reversão, não existe qualquer questão de ónus da prova mas apenas averiguar da alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (além de que, como se disse, não se impõe que dele constem os factos concretos nos quais a AT assenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções de gerente por parte do revertido).
III - Deste modo, temos por adquirido que o Tribunal a quo pretendeu dirimir algo mais do que a simples fundamentação formal do despacho de reversão que, aliás acaba por admitir, dado que, é onde vai colher os elementos que servem de base à análise da legitimidade do Oponente, enquanto fundamento de oposição previsto no artigo 204º nº 1 alínea b) do CPPT, para depois concluir que a realidade apreciada não é bastante para a afirmação da gestão de facto do Oponente.
IV - Tal equivale a dizer que esta abordagem do Tribunal a quo contende já com a real verificação do enunciado pressuposto de facto invocado e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico para concluir depois pela procedência da oposição em função da falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência, ou seja, o fundamento da procedência da oposição não se limita ao vício de forma de insuficiente fundamentação do despacho de reversão, tal como defende a Recorrente, contendendo antes com a verificação de um pressuposto substantivo da reversão apontada nos autos - exercício da gerência de facto.
Nº Convencional:JSTA000P27199
Nº do Documento:SA2202102170488/14
Data de Entrada:04/26/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 03-01-2018, que julgou procedente a pretensão deduzida por A………… no presente processo de OPOSIÇÃO relacionado com o processo de execução fiscal 2720201201071700 e apensos, que o Serviço de Finanças de Viseu moveu contra a sociedade comercial B…………, Lda., e contra ele revertido, por dívidas referente a IRS do ano de 2012, no montante de 2.312,00 €.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
A. Incide o presente recurso sobre a douta sentença que julgou procedente a presente oposição e, em consequência, determinou a extinção do processo de execução fiscal relativamente ao oponente.
B. Para assim decidir, entendeu o Tribunal a quo que: “dos elementos referidos [elementos documentais que, no procedimento de reversão, o órgão da execução fiscal entendeu como concretizadores do exercício efetivo da gerência de facto por parte do oponente] não lobrigamos fundamentação suficiente para a conclusão constante do despacho de reversão, a da gestão de fato do opoente. Os fatos/indícios que o Órgão de execução fiscal recolheu ou são atinentes à gestão de direito ou respeitam a outros sócios. Assim, competindo à Fazenda Pública o ónus dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, deve, no caso concreto, ser valorada contra si a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência”.
C. Com base nestas premissas, extraiu o decisor a conclusão de que se verifica a ilegitimidade do oponente, pelo que, com base nos supra citados fundamentos, se julgou procedente a oposição e, em consequência, se determinou a extinção, quanto ao oponente, do processo de execução fiscal que contra si havia sido revertido.
D. É apenas contra esta consequência jurídica que a sentença sob recurso extrai - a da extinção da execução fiscal quanto ao oponente - que discorda a Fazenda Pública, por considerar que a decisão em crítica se deveria ter quedado pela anulação do despacho de reversão e consequente absolvição do oponente da instância executiva.
E. Isto porque, depois de compulsar o material probatório que integra o processado, o decisor chega à conclusão de que o despacho de reversão não tem - no que tange à gerência de facto do oponente - fundamentação suficiente.
F. Ora, se o ato - que, no plano da sua qualificação, julgamos ser de considerar como materialmente administrativo - não tem fundamentação suficiente, é porque a apreciação jurídica que dele foi feita lhe imputa vício formal de falta ou insuficiente fundamentação.
G. Segundo o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 16-10-2013, proc. N.º 0458/13: “A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (nº 4 do art. 23º da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido”.
H. Porém, conforme o expendido no Acórdão do STA de 15-02-2012, proc. 0872/11: “Uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa.”.
I. “Para decidir se um acto administrativo está ou não fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, isto é, que se autonomize a questão de saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, (validade formal do acto) da questão de saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (validade substancial do acto)”. (Acórdão do TCAN de 29-06-2017, proc. 07633/14), sublinhado nosso.
J. Ora, no caso em apreço, entende a Fazenda Pública (aliás, em total sintonia com a decisão em crítica) que efetivamente o despacho de reversão se encontra ferido de insuficiência de fundamentação (o acto não se encontra substancialmente fundamentado), não cumprindo assim um dos requisitos do dever de fundamentação, o que, no plano da correspondente consequência jurídica, é equivalente à respetiva falta de fundamentação, à luz do art.º 153.º, n.º 2 do CPA.
K. Assim, imputando a sentença ao despacho de reversão o vício formal de insuficiente fundamentação – que, como se demonstrou, efetivamente ocorre - deveria a oposição ser julgada procedente, sendo que, o juízo decisório não deveria determinar a extinção da execução fiscal quanto ao oponente.
L. Pois que, estando em causa um mero vício de forma - falta de fundamentação - a consequência a retirar seria a da absolvição da instância executiva, tal como se decidiu no Acórdão do STA, tirado no Processo n.º 0361/14, em 16-12-2015.
M. Residindo o fundamento da procedência da oposição no vício de forma de insuficiente fundamentação do despacho de reversão, tal subsume-se num conteúdo decisório estritamente formal, não envolvendo qualquer apreciação jurídica ao mérito da oposição.
N. A douta decisão sob recurso, julgando a oposição procedente com sobredita motivação deveria determinar a anulação da decisão que operou a reversão contra o oponente e, consequentemente, culminar com a absolvição do oponente da instância executiva.
O. O douto Tribunal a quo não respeitou o estabelecido no art.º 608.º, n.º 1 do CPC, ex vi alinea e) do art.2º do CPPT que prescreve o seguinte “Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 278.º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica.”.
P. Em suma, ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do Direito, violando os art.º 124.º do CPPT, 153.º do CPA e 608.º, n.º 1 do CPC, pelo que não poderá manter-se.
Nestes termos e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que, se anule o despacho de reversão por vício formal de falta/insuficiência de fundamentação e consequentemente se absolva o oponente da instância executiva, com as legais consequências, designadamente a possibilidade de o órgão da execução fiscal proferir novo despacho de reversão, sanado do vício que determinou a anulação do primeiro.

O Recorrido A………… não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em analisar a consequência jurídica que a decisão recorrida retirou da procedência da presente oposição, determinando a extinção do processo de execução fiscal n.º 2720201201071700 e apensos, relativamente ao Oponente.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
A) Em 28/10/1994, no Primeiro Cartório Notarial de Viseu, foi outorgada uma escritura de constituição de sociedade, da qual se extrai o seguinte:
CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE
[…]
Primeiro: C…………, […];
Segundo: D…………, […]
Terceiro: E………… […]
Quarto: A………… […]
Pelos primeiro, segundo, terceiro e quarto outorgantes foi dito, que constituem entre si, uma sociedade comercial por quotas, nos termos constantes dos artigos seguintes:
PRIMEIRO/----A sociedade adopta a firma “B…………, LDA.”, vai ter a sua sede no lugar de ………, freguesia de Rio de Loba, concelho de Viseu;
SEGUNDO/---- A gerência fica desde já, autorizada a mudar de rede social dentro do mesmo concelho ou para concelhos limítrofes;
TERCEIRO/----O seu objecto é o comércio por grosso e a retalho de produtos alimentares congelados e outros;
QUARTO/----O capital social, integralmente subscrito e realizado em dinheiro, é de SEIS MILHÕES DE ESCUDOS, e corresponde à soma de quatro quotas iguais de um milhão e quinhentos mil escudos, pertencente, cada qual, aos sócios C………… - D…………, - E………… e A…………;
QUINTO/----A gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme fora deliberado em Assembleia Geral, pertence a todos os sócios, que, desde já, ficam nomeados gerentes.-----Para obrigar a sociedade em todos os actos e contratos são necessárias as assinaturas de dois gerentes, sendo uma delas obrigatoriamente a do gerente C…………;
[…]”, cfr. fls. 23 verso a 25 do apenso constituído por cópias extraídas dos processos executivos;
B) Por sentença proferida em 06/02/2013, no âmbito do processo n.º 3475/12.1TBVIS, que correu termos pelo 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viseu, foi decretada a insolvência da sociedade B…………, Lda., vide fls.. 68 e segs. do já aludido apenso;
C) Foi nomeado Administrador de Insolvência F…………, com domicílio profissional na Av. ………, Edifício ……, ……, Aveiro, 3800-…… Aveiro, idem anterior;
D) Através do ofício com a referência n.º 7514917, datado de 06/03/2013 o Tribunal Judicial de Viseu comunicou ao Serviço de Finanças de Viseu a sentença de declaração de insolvência, a que se alude na alínea B), vide folha 67 do apenso;
E) Na insolvência a que se aludiu nas alíneas anteriores o ora Oponente reclamou e viu reconhecidos créditos laborais e outros, cfr. os dois documentos que instruíram a petição da Oposição;
F) Contra a sociedade B…………, Lda. foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Viseu, o processo de execução fiscal n.º 2720201201071700 e apensos para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRS relativas aos períodos de junho, julho, agosto e setembro de 2012, no montante global de 2 312,00€, vide informação prestada pelo Órgão de execução fiscal constante de fls. 41 do processo físico (PF), fls. 2, 59 verso a 65 do apenso;
G) Dívidas que tiveram como prazo de pagamento voluntário 20 de julho, agosto, setembro e outubro, todas de 2012, idem anterior;
H) O Órgão de execução fiscal elaborou projeto de reversão contra o ora Oponente tendo este exercido, em 14-05-2014, o direito de audição prévia onde, no essencial, foi apresentada argumentação similar à usada na PI que deu origem aos presentes autos, cfr. apenso, fls. 33 e segs.;
I) Em 07/07/2014 foi proferido o despacho de reversão contra o oponente, no qual consta, entre o mais, o seguinte:

2 - A sociedade cessou a actividade para efeitos fiscais em 2013-04-24;
3 …
4 - Em 2013-03-06 foi proferida sentença de insolvência em relação à executada originária nos autos, no processo 3475/12.1TBVIS.
5 - Considerando a declaração de insolvência é possível concluir que o património da executada se afigura manifestamente insuficiente para satisfazer a totalidade do direito de crédito da Administração Fiscal;
…”
Depois apreciou-se a prova testemunhal apresentada pelo ora Oponente tendo, no final se concluído que a originária devedora foi gerida de fato e de direito pelos seus quatro sócios apesar de um ter renunciado à gerência, fato registado em 16-08-2007, após esta data continuou a exercer a gerência de fato “ como se comprova, sem qualquer dúvida, pelos documentos que se encontram juntam aos autos, como é o caso da escritura de Hipoteca lavrada a 10-04-2008…”, vide fls. 55 verso e seguintes do apenso.
II Factos não provados
Para além dos supra descritos, com relevo para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos.
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto teve por base a análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos, os quais não foram impugnados, tudo conforme se encontra especificamente indicado em cada um dos pontos do probatório.”
«»
3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de analisar a bondade da consequência jurídica que a decisão recorrida retirou da procedência da presente oposição, determinando a extinção do processo de execução fiscal n.º 2720201201071700 e apensos, relativamente ao Oponente.

Com efeito, nas suas alegações, a Recorrente sublinha que o presente recurso incide sobre a aludida consequência jurídica que a sentença sob recurso extrai - a da extinção da execução fiscal quanto ao oponente -, por considerar que a decisão em crítica se deveria ter quedado pela anulação do despacho de reversão e consequente absolvição do oponente da instância executiva, dado que, depois de compulsar o material probatório que integra o processado, o decisor chega à conclusão de que o despacho de reversão não tem - no que tange à gerência de facto do oponente - fundamentação suficiente e se o acto - que, no plano da sua qualificação, julgamos ser de considerar como materialmente administrativo - não tem fundamentação suficiente, é porque a apreciação jurídica que dele foi feita lhe imputa vício formal de falta ou insuficiente fundamentação.
Ora, no caso em apreço, entende a Fazenda Pública (aliás, em total sintonia com a decisão em crítica) que efectivamente o despacho de reversão se encontra ferido de insuficiência de fundamentação (o acto não se encontra substancialmente fundamentado), não cumprindo assim um dos requisitos do dever de fundamentação, o que, no plano da correspondente consequência jurídica, é equivalente à respectiva falta de fundamentação, à luz do art.º 153.º, n.º 2 do CPA, o que significa que, imputando a sentença ao despacho de reversão o vício formal de insuficiente fundamentação - que, como se demonstrou, efectivamente ocorre - deveria a oposição ser julgada procedente, sendo que, o juízo decisório não deveria determinar a extinção da execução fiscal quanto ao oponente, pois que, estando em causa um mero vício de forma - falta de fundamentação - a consequência a retirar seria a da absolvição da instância executiva, ou seja, residindo o fundamento da procedência da oposição no vício de forma de insuficiente fundamentação do despacho de reversão, tal subsume-se num conteúdo decisório estritamente formal, não envolvendo qualquer apreciação jurídica ao mérito da oposição, pelo que, a douta decisão sob recurso, julgando a oposição procedente com sobredita motivação deveria determinar a anulação da decisão que operou a reversão contra o oponente e, consequentemente, culminar com a absolvição do oponente da instância executiva.
Que dizer?
Num primeiro momento, podemos dizer que é pacífico que os vícios de forma, designadamente o vício de falta ou insuficiência de fundamentação da reversão, apenas determinam a anulação do acto, não obstando à sua renovação, desde que observado o formalismo em falta, ou seja, desde que expurgado do vício que o afectava, sendo que uma decisão de extinção da execução fiscal, pressupondo a avaliação de mérito da matéria controvertida (da pretensão executiva), obsta a que seja renovada a instância.
Assim, o vício de falta de fundamentação do despacho de reversão não terá como consequência a extinção da execução fiscal, ainda que restrita ao Oponente, porque, como ficou dito, a anulação do acto de reversão com fundamento em vício de forma por falta de fundamentação não impede que este seja renovado, para tal bastando que o órgão de execução fiscal pratique novo acto em que enuncie explícita e suficientemente as razões que levaram o seu autor a praticar o acto, a proferir a decisão de fazer prosseguir a execução fiscal contra a ora Recorrida.
Antes de avançar, importa voltar a ter presente o que ficou consignado na sentença recorrida sobre a realidade que conduziu ao dispositivo acima assinalado:
“…
Nos termos do artigo 124.º do CPPT, aplicável ex vi artigo 211.º, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que importem a declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios que conduzam à sua anulação. Neste último grupo, a apreciação dos vícios deve ser feita pela ordem indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público, ou nos demais casos, os vícios, cuja procedência determina, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Atento o exposto, nos presentes autos, cumpre apreciar e decidir as seguintes questões:
i) ilegitimidade do oponente para os processos de execuções fiscais;
ii) falta de fundamentação do despacho de reversão.
O oponente alega que é parte ilegítima da execução, por nunca ter exercido, de facto, a gerência da sociedade devedora originária.
Cumpre, assim, apreciar os pressupostos da reversão, que constituem matéria da (i) legitimidade do oponente, fundamento de oposição previsto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT.
De acordo com o disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT e 153.º do CPPT, constituem pressupostos da responsabilidade subsidiária a fundada insuficiência patrimonial da devedora principal e devedores solidários, o exercício de facto das funções de administração/gerência e a culpa na insuficiência do património da executada para satisfação dos créditos fiscais ou na falta de pagamento dos mesmos.
Dispõe o citado artigo 24.º da LGT o seguinte:
“1 – Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”
Assim, considerou o legislador que, relativamente às dívidas da sociedade originariamente devedora vencidas no período de exercício do cargo do gerente ou administrador, se justificava a presunção de culpa dos órgãos sociais na falta de pagamento, cabendo a estes demonstrar, para a sua responsabilidade, que o não pagamento não se ficou a dever a culpa sua.
Esta diferença de regime no ónus da prova compreende-se porque o gerente não pode ser responsabilizado pela falta de pagamento, dado que enquanto exerceu o cargo a dívida não fora posta a pagamento; assim, só poderá ser responsabilizado caso a exequente prove que ele teve culpa na insuficiência do património societário [alínea a) do n.º 1 do art.º 24 da LGT]. Já no caso da alínea b) da mesma norma legal, porque o pagamento da prestação tributária constitui uma obrigação do gerente, tem de ser este a provar que não lhe é imputável a falta de pagamento das dívidas vencidas durante o período do exercício do caro, designadamente pela demonstração de que não tem culpa pela insuficiência do património do património da originária devedora para pagamento dessas dívidas. [vide, entre outros, o acórdão do STA de 08/04/2015, proferido no processo n.º 345/14].
Deste modo, apenas relativamente às dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo [cfr. alínea b), n.º 1 do artigo 24.º da LGT] se faz incidir sobre o gerente ou administrador o ónus da prova que a falta de pagamento das dívidas da sociedade não lhe é imputável.
O prazo legal de pagamento ou entrega a que se refere o artigo 24.º, n.º 1, alínea b) é a data a partir da qual são devidos juros de mora a que alude o artigo 163.º do CPPT, mencionada na certidão de dívida.
Revertendo ao caso em apreço, conforme resulta do probatório, as liquidações de IRS de 2012, cuja cobrança coerciva é efetuada nos autos de execução fiscal a que se reportam os presentes autos de oposição, tiveram como prazo de pagamento voluntário 20 de julho, agosto, setembro e outubro, todas de 2012, vide al. G) dos fatos assentes.
A questão que se deve colocar, ainda antes de saber se à data de vencimento das dívidas exequendas o Oponente era ou não gerente de fato, é se o Oponente foi gerente de fato em algum período. Na versão que ele apresentou a resposta é negativa. Resposta positiva é dada no despacho de reversão. Analisando este e os elementos probatórios que nele foram considerados verifica-se que:
- se atendeu ao depoimento das testemunhas arroladas pelo Oponente no exercício do direito de audição: Uma não respondeu; duas, a esposa e a filha, indicaram que não tiveram qualquer relação com a executada originária e o que desta sabem lhe foi transmitido pelo Oponente; G…………, trabalhador da executada diz que era C………… quem a geria; que o Oponente coordenava as tarefas dos prestadores de serviços; mas era um simples trabalhador. Sobre a alegada coordenação analisando o inquérito preenchido pela testemunha em causa, vide fls. 45 e 46 do apenso, não vislumbramos donde resulte a referida coordenação. Mas, mesmo por mera hipótese, ela resultasse, o demais do depoimento é claro no sentido de ela não ser entendida como ato de gestão. Ela não resulta e a alusão realizada no despacho de reversão deve entender-se como mero lapso.
- o Oponente e demais sócios outorgaram em escritura de hipoteca lavrada no dia 10-04-2008, vide o doc. de fls. 26 a 29 do apenso. Deste documento resulta a efetiva participação, mas na qualidade de únicos sócios, visto que o bem hipotecado era propriedade da originária devedora;
- os demais elementos documentais para que remete, para além dos formais ou seja os alicerçadores da gestão de direito, não indiciam a gestão de fato do ora Oponente. Estamos a falar de fls. 9 a 11, 13 verso, 14 a 16, 18, 20 verso e 21, todas do apenso.
Dos elementos referidos não lobrigamos fundamentação suficiente para a conclusão constante do despacho de reversão, a da gestão de fato do Oponente. Os fatos/indícios que o Órgão de execução fiscal recolheu ou são atinentes à gestão de direito ou respeitam a outros sócios
Assim, competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve, no caso concreto, ser valorada contra si a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência.
Verificando-se a ilegitimidade do Oponente, procede a presente oposição, com este fundamento, ficando prejudicada a apreciação das demais questões invocadas [cfr. artigo 608.º, n.º 2 do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT]. …”
Perante o que fica exposto, e sem mais, começa a adivinhar-se o naufrágio do presente recurso.
Na verdade, é sabido que o direito à fundamentação, relativamente aos actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos tem hoje consagração constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, tendo o respectivo princípio constitucional sido densificado nos arts. 124º e 125º do CPA e, posteriormente, nos arts. 77º nºs. 1 e 2 da LGT (acto administrativo tributário), sendo que este dever legal de fundamentação do acto administrativo cumpre uma dupla função: endógena, ao exigir ao decisor a expressão dos motivos e critérios determinantes da decisão, assim contribuindo para a sua ponderação e transparência; exógena, ao permitir ao destinatário do acto uma opção esclarecida entre a conformação e a impugnação graciosa ou contenciosa, o que significa que a fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
No entanto, a fundamentação formal do acto tributário é distinta da chamada fundamentação substancial, devendo esta exprimir a real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico.
Ou seja, à fundamentação formal interessa a enunciação dos motivos que determinaram o autor ao proferimento da decisão com um concreto conteúdo; à fundamentação material interessa a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto.
Sobre este aspecto em particular, crê-se pertinente ter ainda presente o enquadramento jurisprudencial desta matéria, tal como decorre do exposto no Ac. do S.T.A. (Pleno) de 16-10-2013, Proc. nº 0458/13, www.dgsi.pt, onde se ponderou que: “… De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.
E sendo um acto administrativo tributário, aquele despacho está sujeito a fundamentação, dado até o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (nº 3 do art. 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT. Daí que, enquanto acto administrativo tributário, o despacho de reversão deva incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» - cfr. nº 4 do art. 23º da LGT. (De acordo com o disposto neste nº 4 do art. 23º da LGT «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».) Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT).
Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT).
Não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.
É que, como se exara no acórdão de 31/10/2012, da Secção do Contencioso Tributário deste STA, processo nº 0580/12, «não … parece, porém, … que seja necessário que do despacho de reversão constem os factos concretamente identificados nos quais a Administração tributária fundamenta a sua convicção relativa ao efectivo exercício de funções, pois que em causa não está uma acusação em matéria sancionatória e persistindo dúvida acerca do efectivo exercício de funções o “non liquet” não poderá deixar de ser valorado contra a Administração fiscal, que invoca o direito a responsabilizar o gerente, pois que inexiste presunção legal no sentido de que o gerente de direito exerça de facto as suas funções, daí que não possa seriamente defender-se que a não invocação no despacho de reversão de tais factos possa comprometer a defesa do responsável subsidiário» (No mesmo sentido ver também o acórdão de 23/1/2013, processo nº 0953/12.) sendo que, em caso de discordância, o revertido sempre poderá exercer o direito de defesa mediante dedução de oposição onde, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações das previsões legais (i) incumbe à AT comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do nº 1 do art. 24º da LGT); (ii) incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT). …”.

Avançando, diga-se que é ponto assente que a decisão recorrida começou por nomear as questões a decidir, apontando primeiro para a matéria da i) ilegitimidade do oponente para os processos de execuções fiscais, referindo depois a situação da ii) falta de fundamentação do despacho de reversão.
De acordo com o exposto, a decisão identifica, em seguida, que o oponente alega que é parte ilegítima da execução, por nunca ter exercido, de facto, a gerência da sociedade devedora originária, definindo a necessidade de apreciar os pressupostos da reversão, que constituem matéria da (i) legitimidade do oponente, fundamento de oposição previsto no artigo 204º nº 1 alínea b) do CPPT.
Quando se refere que a fundamentação substancial deve exprimir a real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico, facilmente se intui que foi este o caminho trilhado pela decisão recorrida.
Nesta sequência, o Tribunal recorrido analisa a matéria relacionada com a questão de saber se à data de vencimento das dívidas exequendas o Oponente era ou não gerente de facto ou mesmo se o Oponente foi gerente de facto em algum período.
Perante a divergência identificada nos autos, o Sr. Juiz a quo prosseguiu o seu labor, procedendo ao seu tratamento em função do exposto no despacho de reversão e dos elementos probatórios que nele foram considerados, ponderando que:
“- se atendeu ao depoimento das testemunhas arroladas pelo Oponente no exercício do direito de audição: Uma não respondeu; duas, a esposa e a filha, indicaram que não tiveram qualquer relação com a executada originária e o que desta sabem lhe foi transmitido pelo Oponente; G…………, trabalhador da executada diz que era C………… quem a geria; que o Oponente coordenava as tarefas dos prestadores de serviços; mas era um simples trabalhador. Sobre a alegada coordenação analisando o inquérito preenchido pela testemunha em causa, vide fls. 45 e 46 do apenso, não vislumbramos donde resulte a referida coordenação. Mas, mesmo por mera hipótese, ela resultasse, o demais do depoimento é claro no sentido de ela não ser entendida como ato de gestão. Ela não resulta e a alusão realizada no despacho de reversão deve entender-se como mero lapso.
- o Oponente e demais sócios outorgaram em escritura de hipoteca lavrada no dia 10-04-2008, vide o doc. de fls. 26 a 29 do apenso. Deste documento resulta a efetiva participação, mas na qualidade de únicos sócios, visto que o bem hipotecado era propriedade da originária devedora;
- os demais elementos documentais para que remete, para além dos formais ou seja os alicerçadores da gestão de direito, não indiciam a gestão de fato do ora Oponente. Estamos a falar de fls. 9 a 11, 13 verso, 14 a 16, 18, 20 verso e 21, todas do apenso.”

A partir daqui, em sede de conclusão, o Tribunal recorrido refere que “dos elementos referidos não lobrigamos fundamentação suficiente para a conclusão constante do despacho de reversão, a da gestão de fato do Oponente. Os fatos/indícios que o Órgão de execução fiscal recolheu ou são atinentes à gestão de direito ou respeitam a outros sócios”, acabando por rematar a questão, afirmando que “competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve, no caso concreto, ser valorada contra si a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência.”.

Pois bem, aparentemente, a Recorrente terá ficado impressionada com a referência constante da decisão recorrida no sentido de que não existia fundamento suficiente para a conclusão vertida no despacho de reversão com referência à gerência de facto por parte do Oponente, reduzindo a questão à falta de fundamentação do tal despacho de reversão.
No entanto, cremos ser claro que a exposição antes descrita não se limita a uma apreciação da enunciação dos motivos que determinaram o autor ao proferimento da decisão com um concreto conteúdo no que diz respeito à situação que agora interessa aos autos.
Com efeito, na sua petição inicial, se é certo que o Oponente começa por aludir à falta de fundamentação, alude depois à falta de verificação dos requisitos legais que permitem a reversão da dívida, referindo que nunca exerceu qualquer efectivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto, pois que exercia apenas as funções de vendedor e distribuidor da sociedade devedora originária e, quanto à alegada remuneração, não existe qualquer remuneração dado que os valores se encontram em dívida, além de que assinava os documentos que lhe punham à frente (arts. 31º a 34º da petição inicial).
Por seu lado, na contestação, a AT aponta que a gerência de facto da sociedade anteriormente identificada, na data do nascimento e vencimento da dívida tributária em execução no processo n.º 2720201201071700 e apensos, era exercida pelo aqui oponente, factualidade que resulta da certidão permanente da sociedade que se encontra junta aos autos, bem como, dos documentos referidos no ponto 7 do despacho de reversão (cfr. fls. 93 a 96 do processo executivo junto aos autos), mais tendo sido apurado que o oponente foi trabalhador da devedora originária ao tempo da dívida em reversão nos presentes autos, e na qualidade de sócio daquela sociedade assinava os documentos em nome daquela que segundo o oponente "… que lhe punham à frente", pelo que, não pode deixar de se concluir que, o aqui oponente, durante o período a que se refere a dívida em execução participou na gestão da devedora originária tendo o devido conhecimento e participação na gestão daquela (fls. 82 a 101 do processo executivo junto aos autos), sendo que a factualidade vinda de referir é admitida pelo próprio oponente nos quesitos 31.° a 34 da douta p.i. (arts. 7º e 8º da contestação).
Neste domínio, quer o Oponente quer a AT não estão a discutir a concretização, em sede de despacho de reversão, da afirmação da gerência de facto, mas da verificação desse elemento como pressuposto da reversão.
Aliás, foi essa a posição assumida pelo Tribunal recorrido quando, como já ficou dito, definiu a necessidade de apreciar os pressupostos da reversão, que constituem matéria da (i) legitimidade do oponente, fundamento de oposição previsto no artigo 204º nº 1 alínea b) do CPPT, procedendo à análise acima descrita, a qual, bem ou mal para o caso agora não interessa, redundou na afirmação de que, competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve, no caso concreto, ser valorada contra si a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência, sendo que, em sede de análise de fundamento formal do despacho de reversão, não existe qualquer questão de ónus da prova mas apenas averiguar da alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (além de que, como se disse, não se impõe que dele constem os factos concretos nos quais a AT assenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções de gerente por parte do revertido).
Deste modo, temos por adquirido que o Tribunal a quo pretendeu dirimir algo mais do que a simples fundamentação formal do despacho de reversão que, aliás acaba por admitir, dado que, é onde vai colher os elementos que servem de base à análise da legitimidade do Oponente, enquanto fundamento de oposição previsto no artigo 204º nº 1 alínea b) do CPPT, para depois concluir que a realidade apreciada não é bastante para a afirmação da gestão de facto do Oponente.
Tal equivale a dizer que esta abordagem do Tribunal a quo contende já com a real verificação do enunciado pressuposto de facto invocado e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico para concluir depois pela procedência da oposição em função da falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência.
Sem assim, como é, perante o enquadramento e alcance do que ficou exposto na decisão recorrida, cremos que ficou demonstrado que o fundamento da procedência da oposição não se limita ao vício de forma de insuficiente fundamentação do despacho de reversão, tal como defende a Recorrente, contendendo antes com a verificação de um pressuposto substantivo da reversão apontada nos autos - exercício da gerência de facto -, o que significa que a decisão recorrida não merece qualquer censura, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 17 de Fevereiro de 2021. – Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.