Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03133/19.6BEBJA
Data do Acordão:10/07/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CLÁUDIO RAMOS MONTEIRO
Descritores:CONTRATAÇÃO PÚBLICA
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
AGRUPAMENTO DE EMPRESAS
HABILITAÇÃO DOS CONCORRENTES
Sumário:Nos termos do número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, todos os membros de um agrupamento concorrente a um concurso público de prestação de serviços de segurança e vigilância estão individualmente obrigados à apresentação de todos os documentos de habilitação exigidos pelo número 1 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), e pela referida portaria, não sendo suficiente que aqueles documentos sejam detidos, no seu conjunto, pelas empresas que constituem o agrupamento.
Nº Convencional:JSTA00071267
Nº do Documento:SA12021100703133/19
Data de Entrada:06/18/2021
Recorrente:A…………….., LDA (E OUTROS)
Recorrido 1:B……………, SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAS
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM CONT
Área Temática 2:CONTRATO
Legislação Nacional:PORT 372/2017, de 14/12 ART 2.º, 1
PORT 372/2017, de 14/12 ART. 6.º, 1
PORT 273/2013, de 20/08 ART 2,º, 2
PORT 273/2013, de 20/08 ART 57.º
CCP ART 81.º, 1
L 32/2013, de 16/05 ART 1.º, 1
L 32/2013, de 16/05 ART 14.º
L 41/2015, de 03/06 ART 19.º, 3
Jurisprudência Nacional:AC STA 26/06/2008 PROC 313/08; AC STA 05/01/2012 PROC 939/11
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO


I. Relatório

1. A…………….., Lda. - identificada nos autos – recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 150.º do CPTA, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), de 18 de março de 2021, que negou provimento ao recurso interposto da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, de 8 de junho de 2020, que julgou procedente a ação proposta por B……………, SA contra um agrupamento de entidades adjudicantes liderado pela UNIVERSIDADE DE LISBOA – identificado nos autos –, anulando a decisão de adjudicação do concurso público para “Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana para a Universidade de Lisboa” à proposta do agrupamento liderado pela Recorrente, e condenando as RR. a adjudicar o concurso à Autora.

2. Nas suas alegações, a Recorrente formulou as seguintes conclusões:

«A. Entendem as Recorrentes que a interposição do presente recurso de REVISTA EXCECIONAL se manifesta necessária, porquanto a questão a apreciar, pela sua relevância jurídica ou social, reveste-se de importância fundamental, assim como a admissão do presente recurso de REVISTA é fulcral para uma melhor aplicação do Direito.

B. A questão controvertida no presente processo consiste em saber qual a interpretação a dar ao artigo 6.º, n.º 1, da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, matéria que não tem sido debatida devidamente na jurisprudência portuguesa, no que tange aos contratos para aquisição de serviços, nomeadamente de serviços de segurança privada, como é o caso em apreço.

C. Os Arestos invocados no Acórdão ora recorrido reportam-se, na sua maioria, a procedimentos concursais para a celebração de contratos de empreitada, cuja interpretação está claramente assente e uniformizada, mas que tem enquadramento no n.º 2 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017, e não no n.º 1.

D. O Acórdão do STA de 06.11.2002 (proc. nº 1394/02), também disponível em www.dgsi.pt, e também citado no Aresto recorrido, sufraga o entendimento das recorrentes, de que “(…) IV - A constituição de um consórcio destinado à apresentação de uma proposta num concurso público visa potenciar as capacidades e as mais valias de cada um dos seus componentes, de forma a que a proposta a apresentar seja mais completa e competitiva e, assim, se multipliquem as possibilidades de êxito. V - Nesta conformidade basta que um dos associados satisfaça os requisitos exigidos para se poder concluir que o consócio os satisfaz. (…)” (nosso negrito).

E. Os Acórdãos a que é feita referência reportam-se a legislação anterior à publicação da Portaria sobre que incide a questão controvertida, inexistindo, ainda, jurisprudência firme e concreta sobre esta questão, proferida ao abrigo da vigência da referida Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro.

F. A doutrina portuguesa, nomeadamente os Autores de maior renome na área da contratação pública, tem-se manifestado favorável ao entendimento pugnado pelas Recorrentes nos presentes autos, considerando que os concorrentes podem fazer o aproveitamento de habilitações de terceiros para efeitos de execução do contrato objeto do procedimento pré-contratual: “(...) quando os contratos públicos a adjudicar envolvam, na sua execução, o exercício de profissões ou de atividades regulamentadas, a participação no procedimento depende da titularidade das habilitações legais para desenvolver as atividades contratadas.” (Pedro Costa Gonçalves, Direito dos Contratos Públicos, 3.ª Edição, Vol. 1, pág. 741, Almedina (novembro de 2018)).

G. Não fica, pois, invalidada, a possibilidade de participação no procedimento por parte de entidades que não são titulares das habilitações legais exigidas ou de todas essas habilitações. Neste sentido: “O facto de a execução das prestações contratuais exigir uma habilitação não implica que a participação no procedimento seja reservada a titulares dessa habilitação. Poderá ser suficiente a exigência de que as prestações em causa sejam asseguradas por pessoal do contratante devidamente habilitado. Não parece sequer de excluir a possibilidade de recurso a terceiros titulares da habilitação (v.g. subcontratados), desde que sejam estes terceiros a assegurar a execução do contrato na parte em que este exige a titularidade da habilitação” (Pedro Costa Gonçalves, Direito dos Contratos Públicos, 3.ª Edição, Vol. 1, pág. 741, Almedina (novembro de 2018)).

H. Também Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, sufragam que, “Nessa circunstâncias (se, repetimos, o contrário não resultar de disposição do programa do procedimento ou da natureza do requisito), permite-se pois que o agrupamento se reclame de qualidades ou de capacidade que nem todas as entidades agrupadas possuem ou, mesmo, que nenhuma delas possui – além de, naturalmente, ser dado aos agrupamentos, nas mesmas condições que valem, para um candidato isolado, o recurso à capacidade de terceiros (...).”

I. Defendem estes Autores que, dos artigos 54.º e 81.º do CCP, e do n.º 1, do artigo 6.º, da Portaria n.º 372/2017, não resulta que as empresas que concorrem em agrupamento para a prestação de serviços de vigilância e segurança tenham de dispor, individualmente, de todas as habilitações para a execução das atividades que serão objeto do contrato a celebrar.

J. A interpretação que se deve extrair dos citados comandos legais é a de que as empresas que compõem o Agrupamento devem, entre si, e cumulativamente, cumprir os requisitos legais e habilitações exigidos no programa de procedimento, caderno de encargos e execução dos serviços objeto do concurso.

K. A tudo isto, e a justificar a necessidade urgente da presente REVISTA, acresce ainda o facto de esta matéria estar na ordem do dia, nomeadamente no que concerne aos procedimentos concursais para aquisição de serviços de segurança privada, em que vem sendo prática corrente as empresas de segurança privada concorrem em agrupamento, detendo cada uma delas alvarás distintos. E tanto assim é, que as Recorrentes já concorreram anteriormente em agrupamento em variadíssimos concursos, tendo sido aceites.

L. Está claramente patente, pois, a relevância jurídica e social da matéria em apreço nos presentes autos, atentos os procedimentos concursais em que têm vindo a ser admitidos os Agrupamentos em que as duas empresas detêm, entre si, e cumulativamente, os alvarás necessários para a execução do contrato.

M. O recurso ora apresentado versa, pois, sobre matéria de direito, e tem como fundamento a violação de lei substantiva, em concreto, da já citada norma artigo 6.º, n.º 1, da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro.

N. Entendem, pois, fundada e legitimamente as Recorrentes, que é urgente e necessária a presente Revista, porquanto estamos perante a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica, se reveste de importância fundamental, na medida em que os Tribunais portugueses ainda não a apreciaram devidamente, e o Acórdão ora recorrido não pode nem deve ser o único a apreciar esta questão, ainda para mais quando o faz com erro de julgamento de Direito;

O. Revelando-se, consequentemente, a presente revista, extremamente necessária para uma melhor aplicação do Direito ao caso concreto, e a casos futuros que tenham que vir a ser julgados, sobre esta mesma questão/matéria, o que se perspetiva vir a acontecer, pelos fundamentos já expostos.

P. É urgente, pois, que o Venerando Supremo Tribunal Administrativo se possa e deva pronunciar sobre esta questão, com o mérito que se lhe reconhece, para que, em casos futuros não haja dúvidas quanto à orientação da Administração Pública em geral, e jurisprudencial, do nosso ordenamento jurídico, quanto à matéria em apreço.

Q. Admitido o presente recurso de REVISTA, deve o artigo 6.º, n.º 1, da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, ser interpretada e aplicada no sentido de admitir que, no caso em apreço, de aquisição de serviços de segurança privada, concorrendo as Recorrentes em agrupamento, devem demonstrar, enquanto tal, serem titulares dos alvarás A e C, mas não se podendo exigir que cada uma por si, individualmente, tenha que ser titular dos dois alvarás.»

3. Os Recorridos não contra-alegaram.

4. O recurso de revista foi admitido por Acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, em formação de apreciação preliminar, de 27 de maio de 2021, por se entender que a «questão jurídica respeitante à especificidade do regime do exercício da actividade da segurança privada, estabelecida no art. 6°da Portaria n°372/2017 em articulação com o disposto no art. 81°do CCP, assume relevo jurídico, já que ultrapassa o interesse do caso concreto, tendo potencialidade para abranger muitos outros casos, na matéria complexa da contratação pública, não se conhecendo jurisprudência deste STA sobre a mesma ».

5. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, por entender que «o douto acórdão recorrido não incorreu em qualquer violação de lei substantiva, nomeadamente do disposto no artº 6º nº 1 da Portaria nº 372/2017».

6. Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, nos termos da alínea c) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 36.º do CPTA.


II. Matéria de facto

7. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

«1)-Em 01/08/2019, a Ré Universidade de Lisboa, como representante do agrupamento de Entidades Adjudicantes acima mencionadas, publicou no DR n° 146, II série, Parte L, o concurso público para ―Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana para a Universidade de Lisboa‖, através do Anúncio nº 8202/2019, -cfr o DOC 1 da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e do qual ora se destaca o seguinte:

“2 - OBJETO DO CONTRATO. Designação do contrato: Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana para a Universidade de Lisboa. (…) Tipo de Contrato: Aquisição de Serviços. Preço base do procedimento: Sim.

Valor do preço base do procedimento: 13060524.00 EUR.

(…) 7 - DOCUMENTOS DE HABILITAÇÃO

7.1 - Habilitação para o exercício da atividade profissional: Não

(…)15 - O PROCEDIMENTO A QUE ESTE ANÚNCIO DIZ RESPEITO TAMBÉM É PUBLICITADO NO JORNAL OFICIAL DA UNIÃO EUROPEIA: Sim. (…)”.

2)-Ao concurso em presença apresentaram propostas as seguintes oito empresas e agrupamento concorrentes:

-C…………., SA;

-A……………, Lda, e I………………, Lda; ora adjudicatárias, contra-interessadas;

-D……………., SA;

-B…………….., SA; ora Autora;

-E………………, Lda.;

-F………………, SA;

-G……………….., SA;

-H……………….., Lda.

3)-A contra-interessada [CI] adjudicatária, A……………., LDA, [A……], é uma sociedade comercial que tem por objeto social o ―Exercido da atividade de segurança privada; prestação de serviços de vigilância de bens móveis e imóveis e o controlo de entrada, presença e saída de pessoas, bem como a prevenção da entrada de armas, substâncias e artigos de uso e porte proibidos ou suscetíveis de provocar atos de violência no interior de edifícios ou locais de acesso vedado ou condicionado ao público, designadamente estabelecimentos, certames, espetáculos e convenções; fornecimento e instalação de sistemas eletrónicos de segurança, exploração e a gestão de centrais de receção e monitorização de alarmes de intrusão, roubo, incêndio e circuito interno de televisão; formação profissional interna e externa de pessoal de vigilância e segurança, administrativos, técnicos, comerciais, bem como as respetivas especialidades, cursos de atualizações e de reciclagem‖ -cfr. certidão permanente com o código de acesso 5743-1524-5526, junta no PA e com os articulados, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

4)-A referida A…….. é detentora de Alvará de tipo A, [nº 175 A, previsto na Lei 34/2013, de 16/05 -Lei de segurança privada—artigo 3º-1-a)-c)-g)], a A…….. que compreende ―A vigilância de bens móveis e imóveis e o controlo de entrada, presença e saída de pessoas, bem como a prevenção da entrada de armas, substâncias e artigos de uso e porte proibidos ou suscetíveis de provocar atos de violência no interior de edifícios ou locais de acesso vedado ou condicionado ao público, designadamente estabelecimentos, certames, espetáculos e convenções‖ --cfr DOC do PA a fls 571 (fls 166 no SITAF), cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

5)-A contra-interessada [CI] e adjudicatária I……………, LDA, [I…….], é uma sociedade comercial que tem por objeto social a ―Exploração e gestão de centrais de receção e monitorização de alarmes. Instalação e manutenção de sistemas de segurança. Comércio, comércio eletrónico, importação, exportação e distribuição de sistemas de segurança, sistemas de fecho mecânicos ou eletrónicos ou caixas fortes. Representação de marcas. Consultoria no âmbito de segurança‖ --cfr. certidão permanente com o código de acesso 8804-4780-4878, junta no PA e com os articulados, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

6)-A referida I…………. é detentora de Alvará de tipo C, [nº 144 C, previsto na Lei 34/2013, de 16/05—artigo 3º-1-e)-g)], que compreende o ―transporte, aguarda, o tratamento e a distribuição de valores‖ --cfr DOC do PA a fls 580 (fls 164 no SITAF), cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

7)-O Programa do Concurso [PC] em presença é o constante do DOC 112555 do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e do qual ora se destaca o seguinte:

“(…) ARTIGO 8º - Agrupamento de Concorrentes

1.As entidades que integrarem um agrupamento concorrente devem designar um representante comum para praticar todos os atos no âmbito do respetivo procedimento, incluindo a assinatura eletrónica dos documentos da proposta e a receção de notificações e comunicações, devendo, para o efeito, entregar instrumentos de mandato, emitidos por cada um dos membros.

2.Todos os membros do agrupamento são solidariamente responsáveis perante a entidade adjudicante e, em caso de adjudicação, todos os membros do agrupamento deverão associar-se na modalidade de consórcio externo de responsabilidade solidária, sob pena de caducidade da adjudicação.

ARTIGO 9°- Documentos de Habilitação

1.O adjudicatário obriga-se a apresentar no prazo de dez dias úteis, a contar da data de notificação da decisão de adjudicação, os documentos de habilitação referidos no artº 81 do CCP:

Declaração emitida conforme modelo constante do anexo II do CCP (…)

(…) Alvará A - A vigilância de bens móveis e imóveis e o controlo de entrada, presença e saída de pessoas, bem como a prevenção da entrada de armas, substâncias e artigos de uso e porte proibidos ou suscetíveis de provocar atos de violência no interior de edifícios ou locais de acesso vedado ou condicionado ao público, designadamente estabelecimentos, certames, espetáculos e convenções; Alvará C - A exploração e a gestão de centrais de receção e monitorização de alarmes; (…)

(…) ARTIGO 14° -Preço anormalmente baixo Não é definido nenhum preço anormalmente baixo.

(…) ARTIGO 17°- Critério de Adjudicação

1.A adjudicação é feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa, determinada pela modalidade:

a) Avaliação do preço ou custo enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar

2.O critério de adjudicação será aplicado ao valor global da proposta, isto é, para a totalidade das entidades adjudicantes. 3.Em caso de empate, (…)”.

8)-O Caderno de Encargos [CE] do procedimento concursal em presença é o constante do DOC 112554 do PA (fls 52-75) do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e do qual ora se destaca o seguinte:

“(…) ARTIGO 3 ° -Prazo contratual

1.O contrato inicia-se a 1 de janeiro de 2020, mantendo-se em vigor pelo prazo de 12 (doze) meses, podendo ser prorrogado por iguais períodos até um máximo de 2 (duas) prorrogações, sem prejuízo das obrigações acessórias, as quais perdurarão pera além da cessação do contrato.

2.O contrato considera-se prorrogado por 12 (doze) meses se nenhuma das partes o denunciar, mediante notificação à outra parte por carta registada com aviso de receção, com a antecedência mínima não inferior a 90 (noventa) dias em relação ao seu termo.

3.Ambas as partes se obrigam a cumprir fiel e imperativamente todos os prazos acordados. (….) ARTIGO 8° -Preço contratual

1.Pela prestação dos serviços objeto do contrato, bem como pelo cumprimento das demais obrigações constantes do presente caderno de encargos, o contraente público deve pagar ao prestador de serviços o preço constante da proposta adjudicada, pela globalidade da prestação de serviços em todos os locais previstos e por cada uma das entidades adjudicantes, o qual não pode, sob pena de exclusão, ser superior a 13.060.524,00 euros (treze milhões, sessenta mil, quinhentos e vinte e quatro euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, se este for legalmente devido.

2.Será excluída qualquer proposta que apresentar um valor superior ao preço base por entidade adjudicante e/ou superior ao preço base global do procedimento

3.O preço referido no número um do presente artigo inclui todos os custos, encargos e despesas cuja responsabilidade não esteja expressamente atribuída à entidade adjudicante.

4.O preço a que se refere o n.° 1 é dividido pelas diversas entidades adjudicantes, nos seguintes termos:

Serviços Centrais - Reitoria, (…); Serviços de Ação Social; (…) (…) Faculdade de Arquitetura; (…) (…).

(…) ARTIGO 11°- Modificação objetiva do contrato

1.Além dos fundamentos de modificação objetiva previstos no artigo 312.° do Código dos Contratos Públicos, o contrato pode ainda ser modificado nas seguintes condições:

i)a atualização dos preços contratuais por um valor equivalente à indexação do aumento salarial relativo ao contrato coletivo de trabalho para o setor da segurança, após o envio de um pedido formal, por parte do cocontratante, e também da verificação dos formalismos legais necessários e a aceitação por parte do contraente publico; ii)a inclusão de novos locais de prestação de serviços de vigilância e segurança, não previstos inicialmente; (…) ARTIGO 22 ° -Foro competente Para resolução de todos os litígios decorrentes do contrato fica estipulada a competência do tribunal administrativo e fiscal de Lisboa, com renúncia expressa a qualquer outro. (…)”.

9)-Em 27/09/2019, o júri do procedimento em questão elaborou o relatório preliminar, DOC 112558 (103-106) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, comunicado à ora A em 27/11/2019, no qual propôs a exclusão das concorrentes G……………, SA, D……………., SA, F……………, SA, E………….., Lda., pelos motivos devidamente referidos no processo administrativo; e ordenação das propostas admitidas pela seguinte ordem:

1º-A……………… Lda, e I………………., Lda, no valor de 12.113.917.65 Euros; 2º-B……………… SA, ora Autora, no valor de 12.637.488.00 Euros; 3º-C…….. - ………….. SA, no valor de 12.707.909.84 Euros

10)-Em 03/10/2019, a ora A exerceu o direito de audição prévia, pelo DOC 112558/559 (151-153) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no sentido da exclusão da proposta do agrupamento constituído pela empresa A……….. e pela empresa I…………., acima referidas.

11)-Em 24/10/2019, o Júri do procedimento elaborou o 1º relatório final pelo DOC 112559 (8-11) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual ora se destaca o seguinte:

“(…) Considerando as pronúncias dos concorrentes A…………. Lda e C…………, S.A o júri detetou que aquando a abertura de propostas, não procedeu à desclassificação dos documentos da proposta do concorrente H……………., Lda, não permitindo aos restantes concorrentes terem conhecimento do conteúdo da mesma, para poderem exercer o seu direito à audiência prévia. Nos termos do nº 3 do artigo 66º do CCP, considera-se não escrita ou não declarada a classificação de um documento que não tenha sido expressamente autorizada nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 66º do CCP. Desta forma, vem o júri disponibilizar os documentos da proposta do concorrente H…………….., Lda, concedendo novo prazo para efeitos de audiência prévia. (…)”

12)-Em 26/11/2019, o Júri do procedimento elaborou o 2º relatório final pelo DOC 112559 (112-115) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual ora se destaca o seguinte:

“(…) Considerando as pronuncias dos concorrentes A……….. Lda e C………….., S A. o júri detetou que aquando a abertura de propostas, não procedeu à desclassificação na plataforma adngov. dos documentos da proposta do concorrente H………….., Lda. não permitindo aos restantes concorrentes terem conhecimento do conteúdo da mesma, para poderem exercer o seu direito à audiência prévia. Mos termos do n* 3 do artigo 66° do CCP, considera-se não escrita ou não declarada ã classificação de um documento que não tenha sido expressamente autorizada nos termos dos n°s 1 e 2 do artigo 66° do CCP. Desta forma, o júri deliberou por unanimidade disponibilizar os documentas da proposta do concorrente H…………., Lda, concedendo novo prezo para efeitos de audiência prévia (…) No tocante à pronúncia apresentada pela B………….., vem esta concorrente reiterar o que alegou em sede de audiência prévia ao enunciado no Relatório Preliminar, aludindo ao facto de a concorrente A……… ter-se associado em agrupamento a outra empresa I…………, e que tal agrupamento "não cumpre com os custos mínimos legais a regulamentaras obrigatórios" e que "estamos perante uma venda com prejuízo‖.

Analisemos, então, esta questão:

A)Tal como refere a nº 1 do art 6º da Portaria nº 372/2019, de 14 de dezembro, "Quando a adjudicatório for um agrupamento de pessoas singulares ou coletivas, os documentes previstos no nº 1 do artº 81º do CCP e na presente portaria devem ser apresentados por todas os seus membros", isto é, Declaração do anexa ii do CCP e documentos comprovativos de que não se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e h) do nº 1 do artigo 55.° do CCP.

Já quanto à titularidade de alvarás, refere o CCP no nº 2 do seu art° 81º que a habilitação e a titularidade dos mesmos, obedecem às regras e termos definidos na supracitada Portaria.

Da interpretação a dar ao n° 1 e ao nº 2 do artigo 6° da Portaria em referência, parece notório que quis claramente o legislador diferenciar, no que toca à necessidade da titularidade de alvarás entre procedimento de formação de contrato do empreitada ou de concessão de obras públicas e procedimento de formação de contrato de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, como é o caso.

Nesse entendimento, para o contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas é notoriamente exigido que todos os membros do agrupamento concorrente sejam titulares simultâneos de alvarás. Exigência esta que não é deliberadamente solicitada aos demais contratos, em particular a contratos de aquisição de serviços, no caso que nos interessa, parecendo assim querer dizer que se fosse exigível a titularidade de alvarás nos contratos da prestação de serviços, o legislador sempre o teria dito, o que não fez - art. 9º CCv.

Deste modo, por ordem lógica, nada pareça obstar qua os membros do agrupamento, em casos em que contrato a celebrar não seja de empreitada ou de concessão de obra pública, possam, em conjunto, conter as habilitações adequadas e necessárias á execução, - no caso - o alvará da prestação de serviços a realizar.

Por outro lado, expressa o artº 54º do CCP que podem ser candidatos ou concorrentes agrupamentos de pessoas singulares ou coletivas, qualquer que seja a atividade por eles exercida, sem que entre as mesmas exista qualquer modalidade jurídica de associação e que os membros de um agrupamento concorrente são solidariamente responsáveis perante a entidade adjudicante, pela manutenção da proposta e pela exigibilidade do cumprimento da obrigação que ficará assim assegurada.

Posto isto, a concorrente A……………., Lda, nada parece obstar que possa concorrer agrupada à I………………, Lda. Por esta razão, não assiste razão à B………….., pelo que a concorrente A………../I………… não deve ser excluída.

(…)

D) Vem também a C………… solicitar a sua exclusão do procedimento do consorcia A……../I…........, alegando que "o preço apresentado não cobre os encargos sociais obrigatórios, conforme o define o CCT dos trabalhadores (…)‖.

Ora, nesta matéria, insurgem-se igualmente as concorrentes B………… (na 1ª audiência) o C…………. uma vez que segundo as mesmas, a proposta classificada em primeiro lugar não permite suportar os gastos ou despesas com a prestação de serviço, configurando o concorrente C………… ainda que as propostas selecionadas, entre as quais a sua, pode configurar um preço anormalmente baixo, nomeadamente porque os custos da prestação de serviço estão em desacordo com o Contrato Coletivo de Trabalho.

Importa realçar que o programa do procedimento não determinou a fixação de qualquer critério definidor de preço anormalmente baixo, e que o caderno de encargos, no seu artigo 11º, nº 1 alínea i), prevê a modificação do contrato no que respeita à atualização dos preços contratuais por um valor aqui valente à indexação do aumento salarial relativo ao contrato coletivo de trabalho para o setor da segurança, após o envio de um pedido Formal, por parte do cocontratante e também da verificação dos formalismos legais necessários e a aceitação por parte do contraente público. Para além disso, não foram fornecidos elementos que evidenciem o alegado ou quaisquer outros elementos objetivos que compravam que os salários subjacentes a tais propostas não cumpram o CCT ou qualquer legislação laboral, dado nomeadamente não se conhecerem as caraterísticas laborais do pessoal afeto às referidas sociedades, nem a forma como são geridos os seus recursos humanas, nem é legalmente exigível que os concorrentes revelem todos os itens de composição dos seus preços, se existe mitigação de custos laborais com vários contratos, nem a estratégia comercial que empenhou.

Igualmente não é conhecida a estrutura de custos associados á prestação de serviço, nem a sua solidez financeira, não existindo qualquer evidência que suscite uma qualquer incapacidade para executar o contrato nas condições oferecidas, ou risco de incumprimento.

Deste modo, como aliás tem sido referido pela jurisprudência, atento o Caderno de Encargos e o Programa do Procedimento, as entidades prestadoras de serviços, de acordo com a sua livre iniciativa económica, são livres de afetar os trabalhadores que entenderem e formar o seu preço, sem que tal justifique, por si só, a violação de qualquer (i) disposição legal e regulamentar, de (ii) risco de incumprimento do contrato para com a entidade adjudicante ou (iii) risco de existência de indícios da ações violadoras da concorrência.

Face ao exposto, propõe o júri manter a ordenação dos concorrentes apresentada no relatório (…)”.

13)-Em 02/12/2019, foi elaborada a propostas de adjudicação do contrato ao agrupamento constituído pela empresa A………. e pela empresa I………., acima referidas -cfr o DOC 2 da PI, e DOC fls 560-565 (80) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

14)-Em 09/12/2019, empresa A……… e a empresa I………. celebraram o contrato de consórcio externo de DOC 112559 (118-122) do PA do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, nos termos artigo 5º-2, do DL 231/81, de 28/06 [cláusula 4ª] com vista a concorrerem como agrupamento ao presente concurso [cláusula 3ª], sendo chefe do consórcio a sociedade A………… [Cláusula 6ª].

15)-Em 19/12/2019, a A deu entrada à presente ação, no TAF de Beja —cfr o SITAF.»


III. Matéria de direito

8. A questão de direito que se discute neste recurso é a de saber se, à luz do número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, todos os membros de um agrupamento concorrente a um concurso público de prestação de serviços de segurança e vigilância estão individualmente obrigados à apresentação de todos os documentos de habilitação exigidos pelo número 1 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), e pela referida portaria, ou se é suficiente que aqueles documentos sejam detidos, no seu conjunto, pelas empresas que constituem o agrupamento.
Em causa, concretamente, está a exigência feita no número 1 do artigo 9.º do Programa do Concurso (PC) sub judice, de que os concorrentes sejam titulares de dois alvarás legalmente exigíveis para o exercício das atividades que integram as prestações de serviços que constituem o seu objeto, a saber: o Alvará A, para o exercício das atividades de «vigilância de bens móveis e imóveis e o controlo de entrada, presença e saída de pessoas, bem como a prevenção da entrada de armas, substâncias e artigos de uso e porte proibidos ou suscetíveis de provocar atos de violência no interior de edifícios ou locais de acesso vedado ou condicionado ao público, designadamente estabelecimentos, certames, espetáculos e convenções»; e o Alvará C, para o exercício «exploração e a gestão de centrais de receção e monitorização de alarmes».
A questão foi suscitada na presente ação porque, no agrupamento que deu origem ao consórcio adjudicatário, constituído pela A………, ora Recorrente, e pela I………….., apenas aquela primeira empresa é titular do Alvará A, e apenas a segunda é titular do Álvara C.
As instâncias consideraram unanimemente que era legalmente exigível que ambas as empresas fossem titulares dos dois alvarás, e consequentemente anularam a adjudicação que lhes havia sido feita pela UNIVERSIDADE DE LISBOA e pelas demais entidades adjudicantes.
A Recorrente, que lidera o consórcio adjudicatário, não se conforma com a interpretação feita pelas instâncias da citada disposição da Portaria n.º 372/2017, e pede que a mesma seja revista no sentido de considerar que o consórcio, no seu conjunto, se encontra devidamente habilitado para a prestação dos serviços que constituem o objeto do concurso.

9. A interpretação literal do número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017 não favorece a posição da Recorrente, porque o seu enunciado é claro, nele se dispondo expressamente que «quando o adjudicatário for um agrupamento de pessoas singulares ou coletivas, os documentos previstos no n.º 1 do artigo 81.º do CCP e na presente portaria devem ser apresentados por todos os seus membros».
À partida, parece evidente do teor do preceito citado que todos os membros do agrupamento consorciado devem apresentar todos os documentos exigidos, incluindo, portanto, os dois alvarás atrás identificados.

10. Não existem, também, quaisquer dúvidas de que aqueles dois alvarás fazem parte do rol de documentos de habilitação a apresentar pelos membros do agrupamento, por se tratar de documentos previstos naquela portaria.
Com efeito, dispõe o número 1 do artigo 2º da citada Portaria n.º 372/2017 que, «no caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, o adjudicatário deve ainda apresentar os documentos de habilitação que o convite ou o programa do procedimento exija, nomeadamente, no caso de se tratar de um contrato de aquisição de serviços, quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a prestação dos serviços em causa».
E os mesmos documentos foram, como vimos, expressamente exigidos pelo número 1 do artigo 9º do Programa do Concurso, como, aliás, é legalmente imposto pelo número 1 do artigo 1.º e pelo artigo 14.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, que regula exercício da atividade de segurança privada e da organização de serviços de autoproteção.

11. Contra esta interpretação literal, a Recorrente contrapõe, socorrendo-se principalmente de argumentos de natureza doutrinária, que o quadro normativo aplicável não apenas não exige, como expressamente permite, que um concorrente aproveite as habilitações de terceiros para assegurar a execução do contrato objeto do procedimento.
De acordo com o entendimento exposto, essa possibilidade existe, quer nos casos de concorrentes agrupados entre si, em que a habilitação de um aproveita a todos, quer nos casos em que um concorrente recorre a terceiros subcontratados para realizar uma parte ou a totalidade da prestação.

12. O aproveitamento conjunto das habilitações dos membros de um agrupamento está, de facto, expressamente previsto para os contratos de empreitada ou de concessão de obras públicas no número 3 do artigo 19.º da Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, que regula o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade de construção.
Dispõe o preceito legal citado que «os consórcios ou outros agrupamentos de empresas aproveitam conjuntamente da capacidade técnica dos respetivos membros, sempre que demonstrem dispor efetivamente dos profissionais qualificados nos termos do anexo i da presente lei para a execução das obras em causa», o que, inclusive, justifica a ressalva inicial feita no artigo 8.º do mesmo diploma, quando ali se dispõe que «nos procedimentos de formação de contratos de empreitadas de obras públicas, a empresa de construção responsável pela obra deve ser detentora de habilitação contendo subcategoria em classe que cubra o valor global daquela, respeitante aos trabalhos mais expressivos da mesma, sem prejuízo da exigência de habilitação noutras classes e subcategorias relativas às restantes obras e trabalhos a executar».
Foi, aliás, sobre um regime análogo ao regime atualmente em vigor para os contratos de empreitada ou de concessão de obras públicas que se pronunciou este Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente no seu Acórdão de 5 de janeiro de 2012, proferido no Processo n.º 939/11, quando afirmou que «o artigo 26.º, n.º 2, do DL n.º 12/2004, deve ser interpretado com o sentido de que os consórcios ou agrupamentos de empresas aproveitam das habilitações das empresas associadas, desde que uma das empresas de construção detenha a habilitação que cubra o valor total da obra e respeite ao tipo de trabalhos mais expressivo e cada uma das outras empresas de construção a habilitação que cubra o valor da parte da obra que se propõe executar» - v. também os Acórdãos de 14 de abril de 2002, proferido no Processo n.º 191/02, e de 6 de novembro de 2002, proferido no Processo n.º 1394/02.
A razão de ser deste regime está no peculiar sistema de ingresso na atividade de construção, que conjuga critérios de idoneidade comercial, e de capacitação técnica, económica e financeira, conferindo habilitações de diferentes medidas, em razão do valor e do tipo de obras.
E compreende-se que seja assim, dado que a execução de contratos daquela natureza está claramente segmentada em função das diferentes especialidades em que a obra se desdobra, permitindo assim diferenciar com maior clareza as responsabilidades dos diferentes membros do consórcio ou agrupamento em função da titularidade dos correspondentes alvarás.

13. O que se dispõe para a habilitação do adjudicatário em contratos de empreitada ou de concessão de obras públicas não é, contudo, aplicável à habilitação do adjudicatário em contratos de aquisição de serviços de segurança e vigilância, não apenas porque a ratio do sistema de habilitação para o exercício da atividade não é a mesma, como, sobretudo, porque os respetivos quadros normativos são distintos.
A Portaria n.º 273/2017 claramente distingue os regimes de habilitação dos adjudicatários em contratos de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, e dos contratos de empreitada ou concessão de obras públicas, previstas, respetivamente, nos artigos 2.º e 3.º, diferenciando, em consequência, as correspondentes regras de apresentação dos documentos de habilitação de agrupamentos previstas no artigo 6.º. Nesse quadro, nomeadamente, não se aplica aos contratos de prestação de serviços de segurança e vigilância, abrangidos pelo regime geral previsto no número 1 daquele artigo, a exceção estabelecida no número 2 para os contratos de empreitada de obras públicas.
Por outro lado, no regime de exercício da atividade de segurança privada aprovado pela Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, não se dispõe nenhuma regra equivalente à do número 3 do artigo 19.º da Lei n.º 41/2015, não havendo, por isso, fundamento legal para afastar a exigência estabelecida no número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 273/2017, de que todos os membros do agrupamento consorciado devem apresentar todos os documentos exigidos.
É certo que naquele diploma legal também se diferenciam os alvarás por classes ou categorias de atividades, mas essa diferenciação, embora esteja pressuposta na exigência feita pelo PC de alvarás de duas classes ou categorias distintas, não é tão evidente na definição do objeto da prestação posta a concurso no caso dos autos, que se refere globalmente à aquisição de serviços continuados de vigilância e segurança humana para a Universidade de Lisboa e que não é, por isso, quanto à sua execução, suscetível de ser dividida com a mesma facilidade que uma empreitada de obras públicas.
Embora num quadro legal anterior, este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou no seu Acórdão de 26 de junho de 2008, proferido no Processo n.º 313/08, pela impossibilidade de fazer uma interpretação restritiva da exigência de que todos os membros do agrupamento disponham das habilitações necessárias à realização da totalidade da prestação de serviços, naqueles casos em que o contrato não contemple, de forma evidente, uma pluralidade de prestações de índole diversa.

14. O que ficou dito é evidenciado pelo regime aplicável à subcontratação de serviços.
Aquele regime não é diretamente aplicável ao caso dos autos, uma vez que nele não está em causa uma situação de subcontratação, mas a sua análise é justificada pelo facto de a Recorrente assentar nele uma boa parte da sua argumentação no sentido da possibilidade de um membro de um agrupamento aproveitar as habilitações dos demais para assegurar a execução do contrato objeto do procedimento.
E a possibilidade de uma prestação de serviços ser realizada, no todo ou em parte, por terceiros, está realmente prevista no número 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 273/2017, onde se estabelece que, «para efeitos de comprovação das habilitações referidas no número anterior, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes».
Sucede, porém, que, ao contrário do que alega a Recorrente, isso não é, por si só um indício seguro de que o legislador admite genericamente que um membro de um agrupamento possa aproveitar as habilitações dos demais para assegurar a execução do contrato.
Ao contrário do que acontece na relação entre dois ou mais membros de um consórcio ou agrupamento adjudicatário, que realizam a prestação conjunta e solidariamente, sem que seja claramente possível identificar as respetivas responsabilidades individuais, um subcontratado, por definição, executa uma parcela concreta da prestação, perfeitamente delimitada pelo respetivo contrato, e pela qual responde exclusivamente perante o adjudicatário.
Na verdade, na subcontratação o adjudicatário não aproveita verdadeira as habilitações do subcontratado, porque este último substitui-se integralmente a ele na execução da quota-parte da prestação que lhe cabe, nos termos do respetivo contrato. Dito por outras palavras, na subcontratação não existe o risco de que uma empresa exerça uma atividade para a qual não está habilitada.
Mas na execução de um contrato por um agrupamento esse risco não fica devidamente acautelado, se o âmbito das prestações de cada um dos seus membros não estiver perfeitamente delimitado, e as respetivas responsabilidades individualmente assumidas perante a entidade adjudicante, como parece ser o caso dos autos.

15. Acresce, por outro lado, que no domínio dos serviços de segurança e vigilância privada aquela subcontratação nem sequer é possível com carácter de generalidade, dado que o número 2 do artigo 57.º da Portaria n.º 273/2013, de 20 de agosto, veda «às entidades referidas no número anterior [as entidades de segurança privada habilitadas com Alvará ou Licença C], para o exercício da sua atividade, subcontratar outras entidades, ainda que titulares de Alvará ou Licença C, para a gestão de sinais de alarme, de videovigilância, ou tratamento de dados pessoais de clientes com os quais tenham contrato de prestação de serviços».
A restrição estabelecida na disposição citada revela que a prestação de serviços de segurança privada é particularmente condicionada pelo interesse público que lhe é inerente, «considerando a [sua] complementaridade com a função pública e estadual de segurança, de proteção das pessoas e bens e de prevenção da prática de atos ilícitos, bem como os riscos associados à prossecução privada desses fins» - cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/2018, de 4 de julho, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
O interesse público inerente à prestação objeto do contrato justifica, assim, ainda maior cautela na interpretação do número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017, reforçando a convicção deste Tribunal de que o seu alcance não deve ser restringido.

16. Assim, e sem necessidade de mais considerações, conclui-se que o acórdão recorrido julgou bem ao considerar que, nos termos do número 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, todos os membros do agrupamento concorrente estavam individualmente obrigados à apresentação dos dois alvarás exigidos pelo número 1 do artigo 9.º do Programa do Concurso.


IV. Decisão

Em face do exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, reunidos em conferência, em negar provimento ao recurso e, em consequência, em manter o acórdão recorrido.

Custas do processo pela Recorrente. Notifique-se


Lisboa, 7 de outubro de 2021. - Cláudio Ramos Monteiro (relator) - José Francisco Fonseca da Paz - Maria do Céu Dias Rosa das Neves.