Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02176/15.3BEPRT 0915/17
Data do Acordão:01/30/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24155
Nº do Documento:SA22019013002176/15
Data de Entrada:07/17/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1. A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, no âmbito de impugnação judicial instaurada pela sociedade A…………, S.A. (doravante A…………) anulou parcialmente os actos de liquidação adicional de IRC referentes aos exercícios de 2010 e 2011, com fundamento em violação do artigo 23º do Código do IRC, em virtude de a Administração Tributária ter desconsiderado encargos financeiros que esta suportou, contabilizou e relevou fiscalmente nos aludidos exercícios por força de operação de fusão inversa ocorrida no ano de 2009, indeferindo, ainda, o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça formulada na contestação.

1.1. Apresentou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo:

a) O presente recurso tem por questão central saber se os encargos financeiros suportados pela A…………, nos exercícios de 2010 e 2011, na sequência de uma operação de fusão inversa poderiam ou não ser considerados fiscalmente na determinação do lucro tributável daquele exercício.

b) De facto, entende a Fazenda Pública, salvo o devido respeito por posição contrária, que, nesta matéria, a douta sentença enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, na medida em que efetuou um errado enquadramento da matéria em questão ao julgar a impugnação procedente.

c) Por outro lado, versa ainda o presente recurso sobre o segmento decisório que determinou o indeferimento do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, a que alude o artigo 6º, nº 7 do RCP, formulado pela Fazenda Pública, com o qual discordamos, por afrontar os princípios constitucionais da proporcionalidade e da igualdade.

d) Com efeito, e quanto ao primeiro ponto da matéria aqui controvertida, o Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto concluiu, por um lado, na sua douta sentença, que "o momento temporal para aferir da admissibilidade dos custos para efeitos tributários deve ser determinado pelo instante em que estes são gerados e não pelo momento em são suportados no sentido de que se vencem ou são pagos" (cf. pág. 61 da referida sentença), e que, por outro lado,

e) "tendo a sociedade incorporada o direito a revelar tributariamente os gastos na sua matéria tributável, em sede de IRC, esse direito persiste, pela fusão, ope legis, na esfera jurídica da incorporante" (cf pág. 61).

f) E "Entendimento diverso redundaria na violação do princípio comunitário da neutralidade fiscal das fusões". (cf. pág. 61).

g) Assim, determinou o Tribunal ad quo que as correções efetuadas pela AT são ilegais, por violarem o disposto no artigo 23º do CIRC, julgando, em conformidade, a impugnação procedente, com a consequente anulação parcial das liquidações adicionais de IRC relativas aos anos de 2010 e 2011 e, bem assim, as liquidações de juros compensatórios.

h) Ora, entende a Fazenda Pública que tal decisão enferma de erro de julgamento, por errada consideração ou análise da matéria em questão.

i) Pese embora o acerto da argumentação, em termos abstratos, o facto é que a mesma falha o alvo no que concerne ao presente processo de impugnação.

j) Com efeito, não estamos, nos presentes autos, perante uma fusão comum ou direta, como entende a Mmo. Juiz na douta apreciação que fez, mas ante uma fusão inversa o que acarreta uma alteração dos pressupostos e dos efeitos.

k) Na realidade, no âmbito da presente impugnação, estão em causa os encargos de financiamento contraídos para a aquisição das ações representativas do capital social duma sociedade que incorporou, por fusão, aqueloutra que a detinha e que entretanto se extinguiu, passando os seus acionistas a ser os novos acionistas da sociedade incorporante (beneficiária).

I) Este tipo específico de fusão, denominada de fusão inversa, é uma operação financeira através da qual os acionistas transferem os encargos incorridos e suportados com a aquisição duma sociedade para ela própria, em vez de serem eles, enquanto titulares das ações representativas do capital social dessa sociedade, e portanto, seus proprietários, a assumir tais encargos.

m) No entendimento da Impugnante, após a fusão inversa, estes mencionados encargos devem ser considerados para efeitos do apuramento do lucro tributável na esfera da sociedade incorporante (beneficiária); ao invés, a AT advoga, e bem, que tais encargos não podem figurar como componentes negativas do lucro tributável da sociedade beneficiária da fusão, em virtude de não serem indispensáveis para a obtenção de rendimentos tributáveis na esfera desta, nem tão-pouco para a manutenção da sua fonte produtora, que é condição necessária e essencial para efeitos da sua aceitação em sede fiscal, nos termos do artigo 23º do CIRC.

n) Na verdade, ao abrigo do artigo 23º do CIRC, as despesas e encargos suportados pela sociedade somente são aceites como custos fiscais na medida em que se mostrem necessários e indispensáveis para a obtenção dos rendimentos sujeitos a tributação na sua esfera.

o) E demonstrando-se que, por inerência, apenas os elementos patrimoniais que reúnem as condições para se qualificarem como elementos do Ativo na contabilidade e se encontrem afetos à exploração, são aptos de gerarem rendimentos suscetíveis de tributação na sua esfera,

p) Resultará, inevitavelmente, da conjugação das duas condições anteriormente descritas, que as despesas e encargos suportados pela sociedade só poderão aceitar-se para efeitos fiscais quando se comprove a sua ligação a algum desses elementos qualificados como Ativo na contabilidade e afetos à exploração, uma vez que, conforme referido, apenas esses elementos são suscetíveis de gerar proveitos tributados na sua esfera jurídico-tributária.

q) Ora, no caso em presença, verificamos que os encargos financeiros que antes da realização da fusão inversa eram suportados pela sociedade fundida para aquisição de elementos do seu Ativo (as ações representativas do capital social da sociedade beneficiária), não apresentam, após a realização dessa operação, agora na esfera da sociedade beneficiária, a ligação a quaisquer elementos afetos à exploração com a natureza de Ativo.

r) Conclui-se, assim, que tais encargos financeiros não podem ter contribuído - é manifestamente impossível poderem ter contribuído! - para a obtenção de quaisquer proveitos tributáveis na sociedade beneficiária da fusão, não sendo, por isso, elegíveis como componentes negativas do lucro tributável apurado na sua esfera.

s) De facto, enquanto o interesse da sociedade se concentra no desempenho dos elementos patrimoniais do Ativo de que esta é titular, geradores de proveitos e custos na sua esfera económica e fiscal, já o interesse dos sócios/acionistas reside na Situação Líquida (Capital Próprio) da própria sociedade, após cada "performance", que lhes trará, a eles sócios/acionistas, a remuneração (lucros distribuídos) pelo capital investido (Capital Social), sendo esse interesse tanto maior quanto maior for o valor desse capital de que cada um é titular.

t) Em face do exposto, não se nos afigura que o interesse da sociedade se confunda com o interesse dos seus sócios/acionistas, porquanto, se a esfera da sociedade é jurídica, económica e fiscalmente autónoma da esfera dos seus sócios/acionistas, os respetivos interesses subjacentes também se hão-de autonomizar, diferenciando-se claramente dos interesses daqueloutros.

u) Ora, a correção impugnada, concretiza-se na esfera da sociedade, pelo que importa aferir, na perspetiva fiscal, quais os elementos suscetíveis de gerarem rendimentos económicos (proveitos/ganhos/réditos) sujeitos a tributação na esfera da sociedade uma vez que apenas os gastos associados a esses rendimentos poderão ser admitidos fiscalmente, nos termos do artigo 23º do CIRC.

v) Assim, sobrevindo uma operação de fusão de duas sociedades, uma delas extingue-se (sociedade fundida) e é incorporada na outra (sociedade beneficiária), pelo que, de acordo com os princípios conformadores da operação em presença, em resultado da mencionada incorporação, o Ativo e o Passivo da sociedade fundida passam para o respetivo Ativo e Passivo da sociedade beneficiária, porém, isso não acontece quanto às ações representativas do capital social da sociedade beneficiária que sejam detidas pela sociedade fundida/extinta.

w) Nesta situação particular, denominada de fusão inversa, essas ações não são coligidas no Ativo da sociedade beneficiária porque representam o Capital Social dela própria, devendo, pois, em conformidade com a sua natureza, figurar como elemento do Capital Próprio e não como elemento do Ativo.

x) Efetivamente, tais ações, que antes da fusão pertenciam à sociedade fundida/extinta, são "distribuídas" aos seus anteriores acionistas, os quais, por superveniência da fusão, passam agora a ser os novos acionistas da sociedade beneficiária.

y) Por via da fusão inversa, as ações que antes pertenciam à sociedade fundida (extinta) e que, por isso, integravam o seu Ativo, "deslocam-se" para a titularidade dos seus acionistas (porque os acionistas da sociedade fundida/extinta são agora os acionistas da sociedade beneficiária), e não para a titularidade da sociedade beneficiária (o que sucederia se fossem evidenciadas no seu Ativo).

z) Por conseguinte, e, desde logo porque não integram o património Ativo da sociedade beneficiária, a suscetibilidade das referidas ações gerarem rendimentos económicos sujeitos a tributação na esfera da sociedade é notoriamente inexequível.

aa) Pelo que, sustentado, como tem de ser, nos pressupostos jurídico-tributários subjacentes à determinação do lucro tributável, dúvidas parecem não subsistir de que, as despesas e/ou encargos suportados com a sua aquisição e/ou manutenção não são, também, suscetíveis de aceitação em sede fiscal na esfera dessa sociedade.

bb) Doutro modo, ficariam comprometidos os pressupostos erigidos pelo legislador no procedimento de determinação do lucro tributável, prejudicando designadamente o princípio do balanceamento entre os gastos e rendimentos, em afronta direta a um dos postulados fundamentais do sistema fiscal português que conforma obrigatoriamente, na mesma esfera tributária, os rendimentos obtidos e os gastos necessários e indispensáveis para a sua obtenção, conforme vem expressamente determinado no artigo 23º do CIRC.

cc) Aqui chegados, é forçoso concluir que, em virtude das ações em causa não se qualificarem como elementos do Ativo de exploração da A…………, não são suscetíveis de originar quaisquer rendimentos passíveis de tributação em sede de IRC na esfera desta sociedade, daí resultando que, ao abrigo do disposto no artigo 23º do CIRC, os encargos financeiros e demais encargos suportados com a aquisição das referidas ações também não possam ser considerados para efeitos do apuramento do seu lucro tributável.

dd) Sem colocar em crise a neutralidade da operação de fusão inversa, que não é, conforme bem se compreende, o cerne da questão decidenda, entendemos que inexiste qualquer fundamento para, após a realização da dita fusão inversa, se encontrar vedada a possibilidade de verificação dos pressupostos da indispensabilidade dos custos, nos termos e com os efeitos previstos no artigo 23º do CIRC.

ee) Com efeito, se a verificação dos pressupostos definidos no artigo 23º do CIRC se mostra, de facto, inócua e inútil no caso da operação de fusão tradicional, comum ou direta, porque nesse caso, todos os elementos patrimoniais são transferidos para a sociedade beneficiária com todos os efeitos, já o mesmo não sucede na situação da fusão inversa.

ff) E assim é, porquanto, no caso da fusão inversa ao contrário do que acontece na fusão tradicional, os elementos patrimoniais que originaram os encargos financeiros em apreço não são transferidos para a sociedade beneficiária, mas sim para os seus acionistas.

gg) É, portanto, na esfera destes acionistas, e não na esfera da sociedade beneficiária, que, contrariamente ao que sucede no outro tipo de fusão, os ditos elementos patrimoniais contribuirão para a obtenção de rendimentos.

hh) Pelo que, in casu, torna-se necessário aferir casuisticamente, em cada período económico, a pertinência dos gastos relevados fiscalmente na esfera da sociedade beneficiária, de modo a consentir apenas aqueles que cumpram os requisitos da indispensabilidade.

ii) Contudo, contrariando esta natural ilação, a A………… pretende deduzir fiscalmente as despesas e encargos suportados com um elemento patrimonial que não lhe pertence, não consta do seu Ativo e não é suscetível de produzir rendimentos de natureza económica que ela possa oferecer à tributação para efeitos de IRC - as ações representativas do seu próprio capital social.

jj) Com efeito, a neutralidade da operação de reestruturação no modo de fusão inversa não deve implicar, sem mais, a transmissibilidade de todos e quaisquer gastos fiscais, mas apenas daqueles que se relacionem com os elementos patrimoniais transmitidos.

kk) Em jeito de conclusão, diremos que na fusão inversa há elementos patrimoniais que não são transmitidos para a sociedade beneficiária mas sim para os seus acionistas, daí que os correspondentes gastos associados não devam ser relevados na esfera fiscal da sociedade, uma vez que os rendimentos a eles associados, porque se tratam de lucros distribuídos/a distribuir aos acionistas, também não vão manifestar-se na sua esfera económica e fiscal mas sim na esfera económica e fiscal daqueloutros.

ll) Ora, foi justamente esta diferença de enquadramento que, com a devida vénia, o Mmo. Juiz, na sua douta sentença, não esquadrinhou e que se impunha.

mm) No que respeita ao segmento decisório relativo à fixação do valor da ação para efeitos de custas, refere o Digníssimo Magistrado o seguinte: "[p]ois que este não se mostra desproporcionado em face do concreto serviço prestado, por a questão decidenda na impugnação não se afigurar de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes se ter limitado ao que lhes é exigível e legalmente devido".

nn) Com efeito, a norma do artigo 11º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), conjugada com a do nº 1 do artigo 6º, e correspondente Tabela, na medida em que não estabelecem qualquer limite máximo para o valor da taxa de justiça, fazendo depender o seu montante, apenas e cegamente, do valor da ação (numa progressão infinita), são manifestamente inconstitucionais, por violação do princípio do Estado de Direito, nessa sua específica dimensão, dos princípios da proporcionalidade (artigos 2º e 18º nº 2 da CRP) e da igualdade (artigo 13º da CRP), configurando um enriquecimento sem causa (artigo 473º do Código Civil (CC), na medida em que não existe contrapartida ou correspetividade entre o valor da taxa de justiça devida, nos termos daquelas normas, e o serviço prestado pelo tribunal.

oo) Dissecando o artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, verificamos, de acordo com o teor da norma do n° 1, conjugada com a norma do n° 7, que, são dois os requisitos essenciais para a dispensa do pagamento do remanescente, a saber:

i. a complexidade da causa e
ii. a conduta processual das partes.

pp) Ora, é nosso entendimento de que não se verifica, no caso em apreço, uma má conduta processual das partes justificativa de tal acréscimo, estando arredado, para aferição da possibilidade de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, o segundo ponto, a saber, a conduta processual das partes.

qq) Assim, o Mmo. Juiz funda a sua decisão na complexidade da causa, para indeferir o pedido de dispensa do remanescente.

rr) Ora, entende a Fazenda Pública que, efetivamente, a matéria em questão é complexa e envolve pesquisa e conhecimentos de vária ordem, porém, tal complexidade não justifica uma taxa de justiça na ordem dos €51.000,00 por cada uma das partes!

ss) Assim, tal decisão é, sem dúvida, violadora dos princípios da proporcionalidade, nas vertentes da justa medida e da proibição do excesso, (artigos 2º e 18º nº 2 da CRP) e da igualdade (artigo 13º da CRP), configurando um autêntico enriquecimento sem causa (artigo 473º do Código Civil (CC).

tt) De facto, de acordo com o nº 1 do aludido artigo 6º, "[a] taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento" (realces nossos), pelo que não vislumbramos em que medida os serviços prestados por este Douto Tribunal justificam, em abstrato, um valor de custas sem qualquer limite.

uu) Aliás, essa situação acaba por contrariar a lógica do próprio RCP.

vv) E se atendermos a que no dia-a-dia dos tribunais nos deparamos com ações substancialmente mais complexas que estão longe de atingir os montantes em causa no presente recurso, a conclusão não pode ser outra que não a de que existe uma flagrante desproporcionalidade entre o serviço prestado, os custos cobrados e os custos a cobrar.

ww) De facto, o valor exigível a título de taxa de justiça num processo deste montante é muito superior aos serviços prestados pelo Tribunal, pecando por excessivo, desajustado e desproporcionado, sendo, por isso, as normas aqui chamadas à colação, inconstitucionais por envolverem uma grave violação do princípio constitucional da proporcionalidade em sentido amplo, nas vertentes da adequação ou justa medida e da proibição do excesso.

xx) Assim, na senda do exposto, há que perguntar, num primeiro momento, se a medida legislativa em causa é apropriada à prossecução do fim a ela subjacente, só podendo a resposta a tal questão ser negativa.

yy) De facto, pretendeu o legislador, com tais normas, como resulta do preâmbulo do Decreto-Lei nº 34/2008, de 26/02, que o "custo efetivo" do processo opere à custa de quem deu causa (em sentido amplo) à ação e continuar o "plano de moralização e racionalização do recurso aos tribunais iniciado com a revisão de 2003".

zz) Assim, "a taxa de justiça é, agora com mais clareza, o valor que cada interveniente deve prestar, por cada processo, como contrapartida pela prestação de um serviço Ibidem (negrito e sublinhados nossos), tendo-se procurado também, de um modo geral, adequar-se o valor da taxa de justiça ao tipo de processo em causa e aos custos que, em concreto, cada processo acarreta para o sistema judicial, numa filosofia de justiça distributiva à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais, enquanto modelo de financiamento dos tribunais e de repercussão dos custos da justiça nos respectivos utilizadores".

aaa) Com efeito, o processo em análise, cuja taxa de justiça ascende a mais de € 51.000,00, por cada uma das partes, de modo algum poderá ser apropriado à prossecução dos fins visados pelo legislador, redundando numa injustiça e imoralidade excessivas, desproporcionadas e manifestamente inconstitucionais, porquanto violam os mais básicos e essenciais princípios do nosso Direito, mormente o princípio da proporcionalidade, em sentido amplo, nas suas três dimensões, pois que, e ademais, a instância não sofreu qualquer tipo de perturbação ou perplexidade, teve uma tramitação linear, apesar de complexa, ofendendo aquele montante, assim determinado, de igual modo, o princípio da igualdade.

bbb) Na realidade, as normas aqui visadas (norma do artigo 110, conjugada com a do nº 1 do artigo 6º do RCP e correspondente Tabela) são também inconstitucionais por violação do princípio da igualdade, um dos princípios estruturantes do regime geral dos direitos fundamentais,

ccc) De facto, num procedimento em que o volume da taxa de justiça se determina em função do valor da causa, sem qualquer limite máximo, na medida em que fica ao arbítrio do juiz a dispensa ou não do pagamento do remanescente, tendo o mesmo de fundamentar adequadamente tal dispensa, não deixam tais normas de ser materialmente inconstitucionais, motivo pelo qual deveria a norma comportar, como regra, um montante máximo e, como exceção, a possibilidade de tal montante ser agravado de acordo com a complexidade da causa e a conduta das partes, devendo, em consequência o juiz fundamentar adequadamente o motivo de tal agravamento.

ddd) Assim se entende, importando não olvidar que deve existir correspetividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, quer de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2° CRP, quer ainda do direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20° igualmente da Constituição da República Portuguesa, nos termos já apontados.

eee) Por fim, tudo visto e ponderado, na sequência do exposto, este recurso deve proceder devendo a conta de custas a elaborar ter em conta o máximo de 275.000,00 euros fixado na tabela I do RCP aplicável desconsiderando-se o remanescente, por violação também do princípio da igualdade.

fff) Ou, subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que apenas se admite por mera cautela de raciocínio, deverá o valor da causa para efeitos de custas ser ajustado para um montante considerado justo e equilibrado, adotando-se uma solução que não choque com o comum sentimento de justiça.

1.2. A sociedade Impugnante, ora Recorrida, apresentou contra-alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

a) A douta sentença recorrida deve ser mantida na sua totalidade já que andou bem ao considerar que as correções efetuadas pela AT são ilegais por violarem o disposto no artigo 23º do CIRC, devendo em consequência ser mantida anulação das liquidações adicionais de IRC relativas aos exercícios de 2010 e 2011, bem como as respetivas liquidações de juros compensatórios.

b) Nos presentes autos apenas está em causa a verificação, ou não, do cumprimento das condições constantes do artigo 23º do CIRC para que os gastos financeiros incorridos pela Recorrida sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais.

c) Nos presentes autos não está em causa, ao contrário do que alega a Recorrente, os termos da operação fusão de que a Recorrida foi objeto, sendo totalmente irrelevante para efeitos de decisão da causa que a operação de fusão tenha sido uma operação de fusão inversa.

d) Com efeito, o facto de estar em causa uma operação de fusão inversa não acarreta, ao contrário que sustenta a Recorrente, uma alteração dos pressupostos e dos efeitos que ponha em causa a dedução dos gastos financeiros que passaram a ser refletidos na contabilidade da Recorrida.

e) O momento temporal para aferir da admissibilidade dos custos para efeitos fiscais deve, como considerou, e bem, a douta sentença recorrida, ser determinado pelo instante em que estes são gerados e não pelo momento em que são suportados no sentido de que se vencem ou são pagos, dando assim cumprimento ao disposto no artigo 23º do CIRC.

f) A Recorrida, tendo incorporado o direito de relevar tributariamente os gastos na sua matéria coletável em sede de IRC, mantém, ope legis, esse direito após fusão.

g) A invocação de uma alegada violação do disposto no artigo 23º do CIRC apenas permite à Recorrente sindicar as condições de aplicação deste artigo, sendo-lhe vedado questionar os propósitos da fusão, a menos que pretenda pôr em causa a fusão, seja nos termos cláusula geral anti-abuso constante do 38º, nº 2, da LGT, seja nos termos cláusula anti-abuso específica do regime da neutralidade fiscal constante do artigo 73º, nº 10 do CIRC, o que expressamente optou por não fazer.

h) Com efeito, no nosso ordenamento jurídico o único instituto que permite à Recorrente pôr em causa os efeitos tributários da fusão, como parece agora pretender Recorrente, é através das normas anti acima referidas, e não pela verificação das condições de aplicação do artigo 23º do CIRC.

i) A Recorrente ao distinguir entre fusões tradicionais e fusões não tradicionais, para daí extrair a conclusão que relativamente a estas últimas é de concluir que os gastos da incorporada podem ser deduzidos ao nível da incorporante, está claramente a violar quer o regime do artigo 23º do CIRC, quer regime da neutralidade fiscal.

j) Ficou igualmente demonstrada tanto a indispensabilidade do custo como a (desnecessária) aplicação dos fundos - capitais alheios - na exploração, uma vez que em momento anterior à fusão os fundos (empréstimo bancário e suprimentos) remunerados pelos juros foram contraídos e utilizados na íntegra pela B………… para a aquisição do capital de outra sociedade (Recorrida) com atividade consolidada no mercado, detentora de ativos, know-how, clientela e cash-flow, estando assim cumprido o disposto no artigo 23º do CIRC.

k) A fusão não acarreta o desaparecimento da realidade económica e empresarial, nem extingue o complexo de direitos e obrigações constituídos na entidade fundida, implicando, isso sim, que essa realidade e esse conjunto de direitos e obrigações transitem como um todo para a esfera jurídica da sociedade beneficiária, de onde decorre que os ativos e os passivos passam a estar inseridos no contexto empresarial próprio da incorporante/beneficiária.

l) A extinção das ações da Recorrida detidas pela sua então acionista única (B…………) e a atribuição à acionista desta (C…………) de novas ações da Recorrida consubstancia um efeito legal da fusão.

m) Finalmente, a douta sentença ora recorrida, acompanha a jurisprudência mais recente quer dos tribunais administrativos e fiscais, quer do CAAD, sendo de destacar os acórdãos já referidos do CAAD em que a factualidade é exatamente a mesma objeto do presente recurso.

1.3. Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso quanto à decisão de anulação parcial das liquidações e concedido provimento quanto à decisão de indeferimento do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, esgrimindo com a seguinte argumentação:

«1. Primeira questão decidenda.
I. A solução da questão exige a convocação das premissas argumentativas seguintes:
- na operação de fusão inversa uma sociedade é dissolvida e incorporada numa sua subsidiária, da qual era detentora da totalidade do capital social;
- com a inscrição da fusão no registo comercial extinguem-se as sociedades incorporadas, transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante (art.º 112º al. a) CSC);
- a relevância fiscal como gasto do encargo financeiro resultante dos empréstimos contraídos deve ser aferida pela sua adequação à estrutura produtiva e à obtenção de lucros pela sociedade mutuária, ainda que aplicados no financiamento de operação económica não reprodutiva ou ruinosa;
- o momento temporal relevante para essa aferição é o da contracção dos empréstimos e não o momento em que o encargo deve ser suportado, por via do pagamento dos juros ou da amortização do capital;
- a observância do princípio da neutralidade fiscal no âmbito da fusão de sociedades (com actual expressão no art.º 74º nº 1 CIRC) não permite a desconsideração como gastos fiscais da sociedade incorporante de gastos fiscais anteriormente considerados na esfera jurídica da sociedade incorporada, sob pena de introdução de obstáculo fiscal distorcivo do mercado, restringindo ou impedindo operações de reorganização empresarial.
II. Características relevantes do caso concreto:
- a sociedade B…………, SA adquiriu a totalidade do capital social da impugnante A…………, SA, financiando a aquisição com empréstimos de entidades financeiras e com um suprimento da sua accionista única C…………, SA;
- no ano 2009, mediante operação de fusão, a sociedade impugnante incorporou a sua accionista única B…………, SA e a sociedade D…………, SA (fusão inversa);
- em consequência da fusão foi transferida para a sua esfera jurídica a globalidade do património das sociedades incorporadas, passando a suportar os encargos financeiros decorrentes dos empréstimos contraídos pela sua acionista única B…………, SA;
- a operação de fusão inversa não foi realizada com recurso a meios artificiosos ou fraudulentos, nem com o objectivo primordial de obtenção de vantagem fiscal; antes determinada por razões económicas válidas: gestão centralizada em uma única sociedade de sociedades com objectos sociais idênticos, permitindo a geração de sinergias consideráveis, através da flexibilidade de gestão e planeamento (factos provados nº 8 motivos da fusão fls. 208);
III. A conjugação das premissas argumentativas enunciadas e a sua subsunção às características relevantes do caso sob análise fundam a conclusão de que os encargos financeiros incorridos pelo sujeito passivo A…………, SA, transferidos para a sua esfera jurídica na sequência de operação de fusão inversa, (por extinção e incorporação da sua antiga accionista única B…………, SA), assumem a natureza de gasto fiscal, concorrendo para a formação do lucro tributável dos respectivos exercícios (arts. 17º nº 1 e 23º nº 1 al. c) CIRC redacção vigente em 2010 e 2011).

Segunda questão decidenda.
A jurisprudência do STA-SCT tem consolidado o entendimento de que se justifica a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça se a causa se revelar de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes não merecer censura (designadamente, acórdãos STA - Pleno SCT 5.07.2017 processo nº 586/15 5.07.2017; 19.10.2016 processo nº 274/16; 18.05.2016 processo nº 346/14).
Em consonância com a doutrina enunciada a jurisprudência do STA-SCT tem igualmente emitido pronúncia reiterada no sentido de que se pode considerar de menor complexidade (justificativa da dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça) decisão proferida por remissão para a fundamentação de arestos anteriores, na medida em que a questão objecto do recurso já foi apreciada em diversas decisões do mesmo tribunal (designadamente, acórdãos STA-SCT 18.03.2015 processo nº 890/13; 23.09.2015 processo nº 763/14; 22.02.2017 processo nº 1185/16).
Na apreciação da questão é imperativa a relevância da estrutura sinalagmática da taxa de justiça (expressa no binómio prestação pecuniária da partes-prestação e serviço prestado pelo tribunal), impeditiva da fixação de um montante da taxa de justiça devida por aplicação estrita da tabela legal manifestamente desproporcionada ao concreto serviço prestado (acórdão STA-SCT 23.11.2016 processo nº 923/16).
Da aplicação destas considerações ao caso concreto emergem como factores relevantes que justificam a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça:
- a adesão da fundamentação jurídica da sentença à fundamentação de sentenças sobre idêntica questão proferidas no TAF Porto, explicitamente assumida pelo juiz, indiciando uma menor complexidade da operação intelectual subjacente à apreciação e decisão da causa (fls. 234);
- o valor manifestamente desproporcionado da taxa de justiça devida, em face do concreto serviço prestado pelo tribunal, resultante da aplicação estrita da tabela legal (Tabela I anexa ao RCP € 48 958 266,00 - cf. alegações de recurso nº 189).».

1.4. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir em conferência.

2. Na sentença recorrida julgou-se como provada a seguinte matéria de facto:

1. A Impugnante "A…………, S.A." exerce a actividade de "valorização de resíduos metálicos" (CAE 38321) desde 04/02/1977 - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22- vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

2. Em 24/07/2008 a "B…………, S.A." adquiriu 100% do capital social da "A…………, S.A." - (admitido por acordo);

3. Para financiamento da aquisição referida no ponto anterior a "B…………, S.A." contraiu um empréstimo bancário de EUR 61.200.000,00, junto de instituições financeiras, como o BCP, o BES e o Caixa BI - Banco de Investimento, contrato este acompanhado por um contrato de cobertura de taxa de juro [swap de taxa de juro] e recebeu suprimentos no valor de EUR 36.000.000,00 da sua accionista única, "C…………, S.A." - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22-vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

4. Para o montante de suprimentos referido no ponto anterior contribuiu um financiamento de EUR 12.000.000,00 concedido pela "A…………, S.A." à "C…………, S.A." - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22-vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

5. Em resultado de um processo de reestruturação, a sociedade "C…………, S.A." detinha, em 2008, 100% do capital da sociedade "B…………, S.A." que, por sua vez, detinha a totalidade do capital da "A…………, S.A." e da "D…………, Lda" - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22-vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

6. No ano de 2009 a "A…………, S.A." foi objecto de fusão com as sociedades "B…………, S.A." e "D…………, Lda.", subsistindo como sociedade incorporante destas, com efeitos reportados a 01/01/2009 - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22-vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

7. A Impugnante foi objecto de acção inspectiva de âmbito geral efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto a coberto da ordem de serviço OI201206961, com referência aos exercícios fiscais de 2010 e 2011 - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 7 a 22-vº do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

8. No âmbito da acção inspectiva referida no ponto anterior foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária que ora se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai, além do mais, o seguinte:

(...)
II.C1 CARACTERIZAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO
1) A empresa A…………, S.A. (NIPC ………), tem a sua sede na Travessa ………, ……, em Pedroso e encontra-se colectada para o exercício, a título principal da actividade de "Valorização de resíduos metálicos" - CAE 38321 - desde 04/02/1977.
(...)
3) Trata-se de uma sociedade anónima. Nos anos alvo da presente acção de inspecção, o conselho de administração era constituído por ………… (NIF ………), como presidente, e ………… (NIF ………) e ………… (NIF ………) como vogais. (...)
4) Em termos declarativos a situação relativa aos anos de 2010 e 2011 é a seguinte: - Na esfera do Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas (IRC), as obrigações de entrega das declarações periódicas de rendimentos, a que se refere o art. 117 n.º 1 alínea b) e 120º do CIRC, e da declaração anual de informação contabilística e fiscal, a que se refere o art. 117 n.º 1 alínea c) e 121º do CIRC, foram cumpridas dentro dos prazos legais.
(...)
I - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

A) JUROS SUPORTADOS COM FINANCIAMENTO BANCÁRIO E COM SUPRIMENTOS
A situação que se passa a descrever foi já analisada e alvo de correcção referente ao ano de 2009, pelo que os factos que lhe deram origem foram descritos no relatório de inspecção tributária relativo à Ordem de serviço OI2012030234 e que se passa a transcrever:
Início de Transcrição
«No ano de 2009, verificou-se um processo de fusão por incorporação das sociedades B…………, SA e D…………, LDA na A…………, SA.
Decorrente deste processo, as demonstrações financeira da A………… passaram a espelhar os activos, passivos e resultados obtidos pelas diversas empresas ao longo de 2009, foi que a fusão produziu efeitos a 01/01/2009, como mais à frente veremos.
Assim, importa efectuar uma breve análise das empresas envolvidas no processo de fusão e das consequências do mesmo ao nível dos resultados obtidos pela sociedade incorporante (A…………).
1) CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS INTERVENIENTES NO PROCESSO DE FUSÃO
1.1) A…………, SA (NIPC ………)


Em 2008, esta empresa foi alvo de um processo de reestruturação sendo de destacar os seguintes factos:
- Antes do processo de reestruturação, os administradores e detentores das participações sociais eram os seguintes.
A………… (NIF ………)
………… (NIF ………)
………… (NIF ………)
………… (NIF ………)
………… (NIF ………)
- Esta reestruturação resultou de uma operação realizada com a empresa E…………, SA (NIPC ………), com a intervenção de um fundo de investimento designado por F………… (NIPC ………).
- Segundo informação prestada pela A………… no âmbito do despacho interno D1200904262, a partir de 24/07/2008, as empresas envolvidas no processo de reestruturação da A………… são as seguintes:
o a A………… passou a ser detida a 100% pela sociedade «B…………, SA»;
o a empresa «B…………, SA», em 24/07/2008, era detida a 100% pela sociedade denominada «C………… SA» a qual, por sua vez era detida também a 100% pelo Fundo de Capital de Risco «F…………» (NIPC ………).


- As participações sociais da empresa A…………, representativas de 100% das ações, foram então adquiridas pela empresa B…………, SA., pelo preço total de 100.000.000 €, distribuídos do seguinte modo pelos anteriores detentores das participações:
A………… - 60.000.000 €
………… -10.000,000 €
………… -10.000.000 €
………… - 10.000.000 €
………… - 10.000.000 €

Desta operação de venda de acções resultaram mais-valias não tributadas nos termos do CIRS, tendo os montantes sido declarados pelos beneficiários, em sede de IRS - Anexo G1 das declarações Modelo 3 relativas ao ano de 2008.
No ano seguinte a esta reestruturação dos detentores do capital da empresa a A………… participou, como entidade incorporante num processo de fusão incorporando as sociedades B…………, SA e D…………, LDA, com efeitos a 01/01/2009.
Apresentam-se, neste ponto, as demonstrações financeiras da empresa A…………, reportadas a 31/12/2008, ou seja, em data anterior à fusão:
(...)
A empresa «B…………, SA» é detida a 100% pela sociedade C…………, SA, e conforme indicado no ponto anterior, a mesma adquiriu em 2008, 100% das participações sociais da empresa pelo valor de 100.000.000€.
Para tal a empresa financiou-se junto da banca (dívidas a instituições de crédito, no valor de 61.200.000 €) junto da sua accionista C…………, SA (Dívidas a terceiros - accionistas, no valor de 36.000.000 €), conforme se verifica nas demonstrações financeiras da empresa B…………, reportadas a 31/12/2008, que passamos a apresentar:


Neste Balanço destaca-se que o activo é constituído essencialmente por «investimentos financeiros», correspondente ao valor de aquisição de 100% das acções da empresa A…………, por 100.000.000 € e das quotas da empresa D………… por 200.000 €.
No capital próprio destaca-se o valor de 6.000.000 de prestações suplementares. Já no Passivo e para fazer face aos investimentos ocorridos, destaca-se o valor do financiamento bancário, no valor total de 61.200.000€ contraído junto do BCP, BES e Caixa BI - Banco de Investimento, contrato este acompanhado por um contrato de cobertura de taxa de juro (Swap de taxa de juro) e um contrato de suprimentos concedidos pela sua accionista C…………, no valor de 36.000.000€
1.3) D………… LDA (NIPC ………).


Apresentam-se, neste ponto, as demonstrações financeiras da empresa D………… reportadas a 31/12/2008, ou seja, em data anterior à fusão:


2) PROJETO DE FUSÃO
Em 06/11/2009, foi depositado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o Projecto de Fusão na modalidade de transferência global do património das sociedades incorporadas para a sociedade incorporante.
As sociedades envolvidas são as seguintes
Ø Sociedade Incorporante: A…………, SA
Ø Sociedades Incorporadas/fundidas: D………… SA e B………… SA
Em 10/08/2012, em deslocação à Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia, foram recolhidos os seguintes elementos relativos a esta operação:
ü Projecto de fusão, elaborado nos termos do Art.º 98º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais;
ü Atas das Assembleias Gerais das empresas acima identificadas para efeitos de aprovação dos balanços das respectivas sociedades e deliberar sobre a dispensa do exame do projecto de fusão por um Revisor Oficial de Contas;
ü Pareceres do Fiscal Único das empresas envolvidas, acerca do projecto de fusão.
Conforme se retira do próprio texto do Projecto de Fusão, no seu ponto 2.1:
«As sociedades requerentes têm o seguinte objecto social:
o A A………… tem por objecto social a reciclagem de sucata e de desperdícios metálicos, comércio de ferro em geral.
o A D………… tem por objecto social a valorização, armazenagem e triagem de resíduos.
o A B………… tem por objecto social a recolha, arma reciclagem e tratamento de todo o tipo de sucata e de desperdícios incluído, designadamente metálico, comércio de ferro em geral»
Já quanto aos motivos da fusão, contempla o ponto 2.2, o seguinte: «Considerando que,
Todas as sociedades envolvidas neste projecto de fusão dispõem de objectos sociais idênticos, desenvolvendo todas a sua actividade no domínio da transformação e preparação de sucata para reciclagem.
A presente existência das empresas distintas está a implicar um conjunto de esforços (custos administrativos e de serviços), com despesas acrescidas
(...)
A gestão de sociedades com a mesma actividade centralizada numa única sociedade gerará sinergias consideráveis, através da flexibilidade de gestão e planeamento.
(...)
Acresce que as sociedades intervenientes no processo de fusão são, directa e indirectamente dependentes da sociedade denominada C…………, SA, com sede na Avenida ………, ……, ……, em Lisboa (...)
A sociedade INCORPORANTE é assim, detida a 100% pela B…………, que por sua vez detém 100% do capital social da sociedade INCORPORADA D………… (...)»!
No que respeita à data a partir da qual as operações da sociedade incorporada são consideradas, do ponto de vista contabilístico, como efectuadas por conta da sociedade incorporante foi considerado o dia 01/01/2009.
3) SITUAÇÃO DA EMPRESA APÓS FUSÃO (31/12/2009)
Apresenta-se de seguida as demonstrações financeiras da empresa A…………, em 31/12/2009, ou seja, contemplando os efeitos da fusão das três empresas em questão.

4) PEDIDO DE ESCLARECIMENTOS
A empresa A………… foi notificada através do ofício nº 055120/0506, de 04/09/2012, remetido por correio registado com aviso de recepção (recebido pelo destinatário em 05/09/2012) para prestar os seguintes esclarecimentos e apresentar os elementos a seguir indicados:
1) Demonstrações Financeiras das três empresas fundidas, reportadas a 31 de Dezembro de 2008, dado que conforme consta do projecto de fusão, depositado na Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia, as operações das sociedades incorporadas serão consideradas como efectuadas pela sociedade incorporante a partir do dia 01 de Janeiro de 2009;
2) Extracto contabilístico das contas 68 - Custos Financeiros, e documentos de suporte aos registos mais significativos efectuados na rubrica 681 - Juros suportados, no ano de 2009;
3) Enquadramento / justificação para o facto relatado na IES/2009 (página 20): «Principais efeitos derivados da fusão: (...). Aumento dos custos financeiros pela incorporação da B…………, no montante de 9.659.367 euros, dado que, conforme demonstrações financeiras reportadas a 30 de Junho de 2009 da sociedade B…………, SA, os custos financeiros suportados até essa data ascendiam a 2.369.214 €.
Em resposta a empresa A………… enviou, em 28/09/2012, os seguintes elementos e esclarecimentos:
ü Demonstrações financeiras das três sociedades participantes na operação de fusão, com referência a 31/12/2008.
ü Extracto contabilístico da conta 68 - Custos financeiros e documentos de suporte aos registos mais significativos.
ü Indica ainda que,
«o incremento dos seus custos financeiros resultou da operação de fusão realizada no exercício de 2009 (com efeitos a 1 de Janeiro desse mesmo ano), na sequência da qual a Exponente (A…………) incorporou activos e passivos da B…………, SA.
Com efeito, um incremento de € 2.396.214 corresponde aos juros suportados pela B…………, SA no primeiro semestre de 2009 associados aos empréstimos contraídos pela mesma junto de instituições financeiras - no montante global de € 61.200.000, conforme se pode comprovar pelo respectivo balanço a 30 de Janeiro de 2009.
No decurso do segundo semestre de 2009 [já após a fusão] o empréstimo acima referido originou juros no montante de € 1.863.153.
Assim, os encargos financeiros incorridos pela Exponente em resultado dos empréstimos contraídos originalmente pela B…………, SA ascenderam, no exercício de 2009, ao montante total de € 4.259.367 conforme decorre dos extractos contabilísticos em anexo.
Adicionalmente em resultado de suprimentos concedidos pela sua accionista C…………, SA., no montante global de € 36.000.000, a B…………, SA (entretanto incorporada pela Exponente,) suportou juros no montante de € 5.400.000.
Em face do exposto, e por força da referida operação de fusão, o total de encargos financeiros registados nas demonstrações financeiras da Exponente (A…………) por referência a 31 de Dezembro de 2009, ascendeu ao montante de € 10.285 639».
5) ANÁLISE DOS FACTOS DESCRITOS NOS PONTOS 1 A 4 ANTERIORES Do exposto nos pontos anteriores salientamos os seguintes aspectos:
- As empresas C…………, SA e B…………, SA, foram constituídas em Maio e Julho do ano de 2008, respectivamente, para efeitos do processo de reestruturação que ocorreu na empresa A…………, precisamente no mesmo ano. Em consequência deste processo:
- a empresa A………… passou a ser detida a 100% pela sociedade B………….
- a empresa B…………, é detida a 100% pela sociedade denominada C………… a qual, por sua vez, é detida também a 100% pelo Fundo de Capital de Risco F………… (NIPC ………)
- A empresa D…………, LDA., já existia desde 2006. No entanto, ainda em 2008 e inserido no modelo de reestruturação acima referido, as suas participações sociais foram adquiridas pela B………… e consequentemente procedeu-se à alteração dos seus órgãos de gestão.
- Após os processos acima descritos, os administradores e gerentes são comuns às várias empresas que participaram no processo de/lesão aqui em análise.
- No que respeita em concreto à empresa A………… verifica-se que:
- A empresa sempre teve uma actividade operacional considerável no sector da valorização de resíduos metálicos.
- As demonstrações financeiras, quer as reportadas a 31/12/2008, quer mesmo as referentes a exercícios anteriores, são reflexo dessa realidade, já que apresentam resultados líquidos significativos. O passivo de médio e longo prazo e as dívidas a instituições de crédito apresentam um valor contrabalançado com activos correntes.
- A empresa teve ainda capacidade financeira para, em 2008, conceder um empréstimo à C………… para cobertura de défice de tesouraria, no valor de 12.000.000 €, ou seja, a sociedade que emprestou arte desse montante a B………… para que esta, por sua vez o utilizasse na compra das participações justamente da empresa A………….
- Já no que se refere à empresa B…………, salienta-se o seguinte:
- A empresa foi constituída para o exercício da actividade de valorização de resíduos metálicos, no entanto na sua estrutura de resultados apenas apresenta operações relevantes ao nível das prestações de serviços e ao nível financeiro, o que se mostra contrário a natureza da mesma. Aliás, estas prestações de serviços correspondem mas sua maioria a uma factura emitida por esta entidade para a empresa A…………, no valor de 1 338 000 € correspondente a serviços de gestão.
- Não foi apresentada a declaração Modelo 10, nem se encontram evidenciados custos com o pessoal, pelo que se depreende que esta empresa não terá funcionários ao seu serviço.
- Deste modo, a empresa B………… mostra-se sem actividade operacional e sem estrutura para o objecto social declarado.
- Nas demonstrações financeiras preparadas com referência a 31/12/2009, o activo é constituído essencialmente por investimentos financeiros, correspondentes ao valor de aquisição de 100% das acções da empresa A…………, por 100.000.000 € e das quotas da empresa D………… por 200,000 €.
- No capital próprio destaca-se o valor de 6.000.000 de prestações suplementares.
Já no Passivo, e para fazer face aos investimentos ocorridos, destaca-se o valor do financiamento bancário, no valor total de 61.200.000€, contraído junto do BCP, BES e Caixa BI - Banco de Investimento e um contrato de suprimentos concedidos pela sua acionista C………… no valor de 36.000.000€.
- No que respeita a D…………, destaca-se o seguinte:
- A entidade D…………, Lda tinha sido constituída em 2006, mas não apresentou actividade expressiva quer nesse ano, quer em 2007. A partir de 2008, ano em que passou também a ser detida pela B………… inserida no processo de reestruturação do grupo, passou a apresentar uma actividade operacional, e quase em exclusivo para a A………….
- Por outro lado face ao volume de negócio declarado correspondente a uma actividade operacional expressiva (vendas de cerca de 1.000.000 €, em 2008) a empresa não evidencia uma estrutura de funcionários compatível com a mesma, porquanto não se encontram evidenciados custos com o pessoal.
- Em 2009, ocorre a Fusão entre as empresas A…………, B………… e D…………, operação cujo projecto é registado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, em 06/11/2009, com efeitos, ao ponto de vista contabilístico reportado a 01/01/2009. Conforme se retira do próprio texto do «Projecto de fusão», as sociedades intervenientes têm como objecto social actividades relacionadas com a valorização de resíduos e recolha, armazenagem e tratamento de sucatas,
No entanto, conforme já referido a empresa D………… encontrava-se praticamente inactiva até 2008, ano em que foi adquirida pela B…………, passando a exercer a sua actividade operacional maioritariamente para a empresa A…………. Já quanto à empresa B…………, a actividade declarada não tem enquadramento em sectores comerciais ou industriais, logo afastada do sector da sucata e valorização de resíduos, daí que seja apenas detentora de participações sociais.
Ainda relativamente ao texto do «Projecto de fusão», são apontados como motivos para a operação realizada os seguintes:
Todas as sociedades envolvidas neste projecto de fusão dispõem de objectos sociais idênticos, desenvolvendo todas a sua actividade no domínio da transformação e preparação de sucata para reciclagem.
A presente existência das empresas distintas está a implicar um conjunto de esforços (custos administrativos e de serviços), com despesas acrescidas.
(...)
A gestão de sociedades com a mesma actividade centralizada numa única sociedade gerará sinergias consideráveis, através da flexibilidade de gestão e planeamento.
(...)
A que as sociedades intervenientes no processo de fusão são, directa e indirectamente dependentes da sociedade denominada C…………, SA, com sede na Avenida ………, ……, ……, em Lisboa (...)
A sociedade INCORPORANTE é assim, detida a 100% pela B…………, que por sua vez detém 100% do capital social da sociedade INCORPORADA D………… (...).»
Ora, de facto as sociedades são directa ou indirectamente dependentes da sociedade C…………, passam a dispor de única gestão centralizada, no entanto no que se refere a uma concentração de actividades, tal está longe de ser a realidade já que a B………… não apresenta uma actividade operacional, mas apenas Investimentos financeiros com recurso a empréstimos bancários e junto de terceiros (a sua detentora) para os financiar.
Face à contabilização da operação de fusão por incorporação, o balanço da empresa A…………, em 31/12/2009, passa a evidenciar a soma dos activos e dos passivos, destacando-se:
- no Activo a conta de imobilizações incorpóreas, no valor de 79.320.837 € que inclui o valor de 79.276.322 € correspondente a «trespasse», representando a diferença de consolidação apurada pela B…………, em 2008, na aquisição das empresas A………… e D…………, nos seguintes termos:

- No Passivo destaca-se a rubrica de dívidas de médio e longo prazo - dívidas a instituições de crédito, no montante de 58.700.000 €, correspondente ao empréstimo bancário antes contraído pela B…………, no valor total de 61.200.000 € e amortizado no ano de 2009, no valor de 2.500.000€, bem como a dívida à accionista C…………, no valor de 36.000.000 €, relativa a suprimentos prestados. Realce-se que quer o empréstimo bancário, quer os suprimentos recebidos tiveram como finalidade a aquisição das partes sociais da empresa A………… pela B…………, em 2008.
- A demonstração de resultados por seu lado, passa a evidenciar, para além da actividade operacional, que se reduz face ao ano anterior em cerca de 50% face ao ano anterior (Vendas do ano de 2009 = 64.659.941 € e Vendas de 2008 = 124.736.372 €), evidencia uma importante componente de custos financeiros que ascende a 10.285.639 € (cerca de 15% do total dos custos), resultante da contabilização pela empresa A…………, dos encargos financeiros decorrentes quer do empréstimo bancário quer do contrato de suprimentos celebrados pela sociedade incorporada (B…………), em 2008.
- Ora, através da fusão o que se verifica é que a A………… passou a deter um passivo, correspondente à assunção da responsabilidade face a um financiamento bancário e respectivo contrato de cobertura de taxa de juro, e financiamento junto de terceiros, antes contraídos pela B…………, justamente para aquisição de um activo que se consubstancia nas suas próprias participações sociais.
- Deste modo e com base na análise dos elementos relacionados com a matéria em causa fornecidos pelo SP em resposta à notificação efectuada, verifica-se que a empresa A………… é, desde a fusão, responsável pelo referido empréstimo bancário e respectivo contrato de cobertura de taxa de juro, e contrato de suprimentos disponibilizados pela C………… e consequentemente pelo pagamento dos juros devidos, empréstimos estes que foram contraídos pela B…………, em 2008, para aquisição de 100% das participações sociais da A…………, por 100.000.000€.
- Destaca-se ainda que como resultado desta operação de fusão ocorrida em 2009, o valor de lucro tributável para o ano de 2009, da A………… ascende apenas a 234.135,10 € valor este que se afasta significativamente do histórico apresentado pela empresa, nos últimos exercícios:

Fim de Transcrição.

CORRECÇÕES PROPOSTAS
Para além do antes descrito, verifica-se que, no ano de 2010 e 2011, a A………… amortiza parte do empréstimo antes referido, contraído inicialmente pela B…………, de acordo com o respectivo plano de reembolso, em duas tranches de 2.500.000 €, em 2010. Já em 2011, as duas tranches são de 2.500.000 € e 3.125.000 €. Deste modo o saldo final da dívida em 31/12/2011 é de 48.075.000 €.
Assiste-se ainda, em 2010, a uma extinção recíproca de créditos, segundo acordo assinado entre a A………… e a C………… uma vez que, em virtude da fusão a empresa passa a evidenciar um crédito sobre a C………… de 12.000.000 € (valor mutuado em 21/07/2008) e uma dívida à mesma entidade no valor de 36.000.000 € (suprimentos que a C………… prestou à B…………). Desta forma a sociedade passa apenas a evidenciar uma dívida perante a C………… de 24.000.000 €.
Em 2011 o saldo aumenta em 2.000.000 € face à transferência do saldo evidenciado na conta 26614 - Outros empréstimos de curto prazo para a rubrica de suprimentos. Do exposto, afigura-se que os custos suportados pela empresa A…………, nos anos de 2010 e 2011, a título de custos financeiros - juros suportados pelo referido empréstimo bancário constituído junto da banca, no valor total de 61.200.000 € (saldo em 31/12/2011 é de 48.075.000 €), do respectivo contrato de cobertura de taxa de juro e do contrato de suprimentos celebrado com a C…………, no valor de 24.000.000 € (após a extinção recíproca de créditos), não se mostram comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, uma vez que tais custos decorreram da aquisição de um activo relevado como incorpóreo (trespasse) que em nada contribui para a exploração do sector de actividade.
Acrescente-se que no ano em causa não foram identificados outros investimentos ou carências de tesouraria que justificassem a necessidade de recurso ao crédito nos montantes em causa.
De acordo com o disposto no Art.º 23º do CIRC:
«1. Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes.
(...)
c) Encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de câmbio, gastos com operações de crédito, reembolso,"
Conclusão:
Do expendido, verifica-se que a operação de fusão enquadra-se numa decisão de gestão empresarial que, independentemente dos méritos que se lhe possam atribuir, não traduziu para a empresa incorporante (A…………) a obtenção de condições mais favoráveis ou benefícios inequívocos, antes pelo contrário, veio acarretar-lhe, pela via do empréstimo bancário e do contrato de cobertura de taxa de juro contraídos pela sociedade incorporada (B…………) e dos suprimentos concedidos pela empresa detentora (C…………), pagamento de juros financeiros significativos e desnecessários em contrapartida de um activo incorpóreo (trespasse) que se confina justamente à diferença de consolidação apurada pela B………… na aquisição, em 24 de Julho de 2008, das sociedades A………… e D………… conforme antes já descrito.
Sendo assim, os referidos custos financeiros não têm enquadramento na definição de custos e perdas (gastos) para efeitos de determinação do lucro tributável, uma vez que a assunção dos encargos em causa foi determinada por motivações empresariais no âmbito de uma política de interesses particulares ditada pelos responsáveis das sociedades interligadas e que só a eles diz respeito, e, nessa conformidade, tais custos não devem ser havidos por indispensáveis, em harmonia com o estatuído no art. 23º do CIRC, pelo que se propõe o seu acréscimo à matéria colectável dos exercícios de 2010 e 2011, nos montantes de 6.690.933,87€ e 7.118.225,18€ respectivamente, conforme detalhe seguinte:

A.1) Juros do empréstimo bancário contraído pela B………… (Tranches A e B - 61.200.000 €)




A.2) Juros líquidos resultantes do contrato de cobertura de taxa de juro (Swap taxa de juro)




A.3) Juros derivados do contrato de suprimentos da C………… à B…………
(...)
E) RESUMO DAS CORRECÇÕES PROPOSTAS EM SEDE DE IRC
Apresenta-se de seguida um quadro resumo, para efeitos de determinação da matéria tributável em 2010 e 2011 bem como da colecta e derrama, respectivas:
VIII- DIREITO DE AUDIÇÃO
O sujeito passivo foi notificado através do ofício nº 75083/0506, de 21/11/2012 (data de registo nos CTT- 22/11/2013), remetido para a morada que consta no cadastro como sede da empresa para, no prazo de 15 dias exercer o direito de audição nos termos dos artigos 60º da Lei Geral Tributaria (LGT) e 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT).
Em 11/12/2012 deu entrada nesta Direcção de Finanças o Direito de Audição do sujeito passivo A…………, em resposta à notificação efectuada (...) Do mesmo destaca-se o seguinte: «Como é do conhecimento destes Serviços de Inspecção Tributária, em 2009 - embora os efeitos da operação se reportem a 01/01/2009 - a B…………, S.A. foi incorporada por fusão na A…………, daí decorrendo, por força da lei, que os encargos financeiros referidos no artigo 2º transitaram para a esfera jurídica da sociedade incorporante (A…………), sendo registados nas demonstrações financeiras desta última por referência a 31/12/2009. (...) Com efeito, tais encargos financeiros foram efectivamente suportados - o que a Autoridade Tributária não questiona e cumprem todos os requisitos legais para a aceitação como gasto fiscal dos exercícios de 2010 e 2011, em particular os constantes do artigo 23º, nº1 do CIRC.
(…)»
Ora, conforme consta do presente relatório, e à semelhança do exposto com referência a 2009, não está em causa o facto de os encargos financeiros referidos terem sido efectivamente suportados mas sim a indispensabilidade dos mesmos para a actividade produtora da A………….
Dos factos relatados, verificou-se que os empréstimos em causa contraídos pela B…………, tiveram como finalidade a aquisição das acções representativos do capital social da A…………, e que por via da fusão entretanto operada, passa a ser ela própria, A………… a suportar os encargos financeiros incorridos com os referidos empréstimos, que em nada contribuem para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Sendo assim os referidos custos financeiros não têm enquadramento na definição de custos e perdas (gastos) para efeitos de determinação do lucro tributável, uma vez que a assunção dos encargos em causa foi determinada por motivações empresariais no âmbito de uma política de interesses particulares ditada pelos responsáveis das sociedades interligadas e que só a eles diz respeito, e, nessa conformidade, tais custos não devem ser havidos por indispensáveis, em harmonia com o estatuído no art. 23º do CIRC.
Quanto às restantes correcções propostas, as mesmas são mencionadas mas não são apresentados argumentos para as contestar.
Desta forma não será de atender ao expresso no Direito de Audição apresentado, pelo que serão de manter as conclusões antes apresentadas no projecto de relatório. (...)"- (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 07 a 22-v.º do processo administrativo apenso aos presentes autos);

9. No âmbito do procedimento inspectivo referido no ponto anterior foram propostas correcções à matéria tributável de IRC de EUR 6.761.073,26 para o exercício de 2010, e de EUR 7.118.225,18 para o exercício de 2011- (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 07 a 22-v.º do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

10. Com fundamento naquelas correcções propostas, a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à emissão das seguintes liquidações, ínsitas na nota de cobrança nº 2014 151251, de 02/01/2014, no valor de EUR 2.159.179,95, e na nota de cobrança nº 2014 165779, de 30/01/2014, no valor de EUR 2.193.916,76:




- (cf. notas de cobrança e demonstrações das liquidações constantes de fls. 34 a 37 do processo administrativo apenso aos autos);

11. Durante os anos de 2010 e 2011 e em resultado da fusão operada, a Impugnante suportou os encargos financeiros decorrentes dos empréstimos obtidos pela "B…………, S.A." para aquisição do seu capital, quer relativamente aos mútuos bancários quer relativamente aos suprimentos da "C…………, S.A.", no total de EUR 6.690.933,87 e de EUR 7.118.225,18, respectivamente - (cf. relatório de inspecção tributária que consta de fls. 07 a 22-v.º do processo administrativo apenso aos presentes autos e admitido por acordo);

12. Em 30/06/2014 a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra os actos de liquidação referidos no ponto 10., dando origem ao procedimento de reclamação graciosa nº 3964201404003039 - (cf. documentos de fls. 03 a 34 do processo de reclamação graciosa nº 3964201404003039 apenso aos presentes autos);

13. Por despacho promanado em 28/08/2014 foi indeferida a reclamação graciosa deduzida pela Impugnante e referida no ponto anterior - (cf. documento de fls. 69 e 70 do processo de reclamação graciosa nº 3964201404003039 apenso aos presentes autos);

14. Em 03/10/2014 deu entrada na Direcção de Finanças do Porto requerimento de interposição de recurso hierárquico contra a decisão referida no ponto anterior, que deu origem ao procedimento de recurso hierárquico nº 3964201410001233 - (cf. documento de fls. 01 a 60 do processo de recurso hierárquico n.º 3964201410001233 apenso aos presentes autos);

15. Por despacho promanado em 30/04/2015 foi indeferido o recurso hierárquico interposto pela Impugnante e referido no ponto anterior - (cf. documento de fls. 64 a 69 do processo de recurso hierárquico nº 3964201410001233 apenso aos presentes autos).

3. O presente recurso tem por objecto a sentença que, no âmbito de processo de impugnação judicial instaurado pela sociedade A…………, S.A. (A…………) contra actos de liquidação adicional de IRC relativos aos exercícios de 2010 e 2011, anulou tais actos na parte correspondente às correcções que a Autoridade Tributária (AT) efectuou à matéria colectável desses exercícios (a nível de dedução de custos fiscais) e donde resultou um acréscimo de € 6.690.933,87 à matéria colectável do exercício/2010 e um acréscimo de € 7.118.225,18 à matéria colectável do exercício/2011 [montantes que dizem respeito a encargos financeiros que a impugnante suportou nesses exercícios com "juros empréstimo", com "swaps-taxa de juro" e com "juros suprimentos"].

O motivo determinante dessa anulação foi a julgada verificação de vício de violação de lei, mais precisamente a violação do art.º 23º do CIRC, na medida em que a AT desconsiderou esses encargos financeiros que a impugnante, enquanto sociedade incorporante, suportou e relevou fiscalmente na sequência de operação de fusão inversa (operação através da qual, como se sabe, uma sociedade subsidiária incorpora a sociedade que detém o seu controlo em 100%, isto é, em que a sociedade "filha" incorpora a sociedade "mãe").

É contra essa decisão que se insurge a Fazenda Pública, que contesta, ainda, o indeferimento do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça que formulara e que se encontra contido na decisão recorrida.

Pelo que, as questões que cumpre apreciar e decidir neste recurso reconduzem-se a saber se a sentença padece de erro de julgamento em matéria de direito (i) ao julgar que os aludidos encargos financeiros - inicialmente assumidos pela sociedade incorporada e transmitidos para a sociedade incorporante na sequência de operação de fusão - podem relevar como custo fiscal desta sociedade à luz do disposto no art.º 23º do CIRC, e (ii) ao julgar que não se verificam os requisitos para a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça face aos requisitos contidos no nº 7 do art.º 6º do Regulamento das Custas Processuais.

3.1. Do erro de julgamento no que toca à relevância como custo fiscal da sociedade incorporante de encargos financeiros assumidos pela sociedade incorporada e transmitidos para aquela na sequência de operação de fusão inversa.
Para cabal compreensão da questão importa ter em conta o quadro factual e circunstancial relevante, traduzido no seguinte:

- a sociedade B………… adquiriu a totalidade do capital social da sociedade impugnante (A…………), financiando essa aquisição com empréstimos de entidades financeiras e com um suprimento da sua accionista C…………;

- em 2009 a A………… incorporou aquela sua única accionista (B…………) e uma outra sociedade (D…………) e, em consequência desta operação de fusão inversa, foi transferida para a esfera jurídica da A…………, com efeitos reportados a 1/01/2009, a globalidade do património das sociedades incorporadas e os respectivos activos e passivos, designadamente os encargos financeiros que a B………… assumira por força dos aludidos empréstimos e suprimentos, passando a A………… a suportar esses encargos durante os anos de 2010 e 2011 e amortizado parte do empréstimo de acordo com o respectivo plano de reembolso;

- nesse contexto, e como se deixou referido no relatório da inspecção que serve de suporte fundamentador às correcções efectuadas pela AT, «através da fusão o que se verifica é que a A………… passou a deter um passivo, correspondente à assunção da responsabilidade face a um financiamento bancário e respectivo contrato de cobertura de taxa de juro, e financiamento junto de terceiros, antes contraídos pela B…………, justamente para aquisição de um activo que se consubstancia nas suas próprias participações sociais. // Deste modo (...), verifica-se que a empresa A………… é, desde a fusão, responsável pelo referido empréstimo bancário e respectivo contrato de cobertura de taxa de juro, e contrato de suprimentos disponibilizados pela C………… e consequentemente pelo pagamento dos juros devidos, empréstimos estes que foram contraídos pela B…………»;

- apesar de se ter constatado, nessa inspecção, que a operação de fusão levou a uma diminuição do lucro tributável da A…………, o certo é que a AT nunca invocou que ela tivesse sido realizada com recurso a meios artificiosos ou fraudulentos ou com o objectivo primordial de obtenção de vantagem fiscal, tendo sido aceite que a fusão foi determinada por razões económicas válidas, isto é, por razões de gestão centralizada em uma única sociedade de sociedades com objectos sociais idênticos, permitindo a geração de sinergias consideráveis através da flexibilidade de gestão e planeamento;

- as correcções efectuadas alicerçaram-se na consideração, tecida pela AT, de que esses encargos suportados pela A………… não eram "indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora", com a seguinte fundamentação vertida no relatório da inspecção: «os custos suportados pela empresa A…………, nos anos de 2010 e 2011, a título de custos financeiros - juros suportados pelo referido empréstimo bancário constituído junto da banca, no valor (...), do respectivo contrato de cobertura de taxa de juro e do contrato de suprimentos celebrado com a C…………, no valor (...) - não se mostram comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, uma vez que tais custos decorreram da aquisição de um activo relevado como incorpóreo (trespasse) que em nada contribui para a exploração do sector de actividade» e «Do expendido, verifica-se que a operação de fusão enquadra-se numa decisão de gestão empresarial que, independentemente dos méritos que se lhe possam atribuir, não traduziu para a empresa incorporante (A…………) a obtenção de condições mais favoráveis ou benefícios inequívocos, antes pelo contrário, veio acarretar-lhe, pela via do empréstimo bancário e do contrato de cobertura de taxa de juro contraídos pela sociedade incorporada (B…………) e dos suprimentos concedidos pela empresa detentora (C…………), pagamento de juros financeiros significativos e desnecessários em contrapartida de um activo incorpóreo (trespasse) que se confina justamente à diferença de consolidação apurada pela B………… na aquisição, em 24 de Julho de 2008, das sociedades A………… e D………… conforme antes já descrito. // Sendo assim, os referidos custos financeiros não têm enquadramento na definição de custos e perdas (gastos) para efeitos de determinação do lucro tributável, uma vez que a assunção dos encargos em causa foi determinada por motivações empresariais no âmbito de uma política de interesses particulares ditada pelos responsáveis das sociedades interligadas e que só a eles diz respeito, e, nessa conformidade, tais custos não devem ser havidos por indispensáveis, em harmonia com o estatuído no art.º 23º do CIRC, pelo que se propõe o seu acréscimo à matéria colectável dos exercícios de 2010 e 2011, nos montantes de 6.690.933,87 € e 7.118.225,18 € respectivamente (...)».

Dado que a impugnante suscitou, neste processo de impugnação, a ilegalidade das correcções face à fundamentação contida no relatório que lhe serve de suporte formal fundamentador, o Mmº Juiz debruçou-se sobre a questão e, depois de tecer extensas e sábias considerações sobre o tratamento fiscal das fusões de sociedades, designadamente à luz do princípio da neutralidade fiscal, e sobre o regime de dedutibilidade dos custos à luz do art.º 23º do CIRC, julgou que esses encargos não podiam deixar de ter relevância como custo fiscal tendo em conta, essencialmente, o seguinte:

[...] a Fazenda Pública está a aferir da admissibilidade fiscal dos custos tendo por referência a conexão que estes devem ter, no momento em que são suportados, com os proveitos realizados ou a manutenção da fonte produtora dos rendimentos.
Contudo, caso fizesse com referência ao momento em que ocorre a sua génese (leia-se quando nasce a obrigação que a eles dá lugar) o resultado seria o oposto.
Com efeito, a aferição da conexão dos gastos com os proveitos deve ser feita com referência ao seu facto gerador, em especial tratando-se de gastos que dependem da verificação de condições temporais.
Destarte, para aferir da admissibilidade da consideração da relevância fiscal do pagamento de juros é mister analisar a operação subjacente que a eles deu origem, ou seja, esta vai depender, não do momento em que estes se vencem ou são pagos, mas da eventual conexão com os proveitos existente no momento em que a obrigação destes nasce - a contracção do mútuo oneroso que a eles dá lugar.
Afigura-se pacífico que uma empresa que obtenha um financiamento para desenvolver um novo ramo de actividade, díspar do até aí seguido, se o vier a abandonar posteriormente por concluir que não é rentável, continua a ter o direito de considerar fiscalmente os juros relativos a esse financiamento, mesmo após esse abandono.
No entanto, se formos aferir a conexão entre os juros pagos e a actividade da empresa, no momento em que estes se venceram ou foram pagos, estes não mostram, no preciso momento em que são suportados, qualquer conexão com os proveitos gerados pela sociedade na medida em que não respeitam ao ramo de actividade da empresa naquele instante temporal, na medida em que o outro foi anteriormente abandonado.
Assim, seguindo o raciocínio expendido pela Fazenda Pública, tal determinaria a inadmissibilidade da sua consideração, o que não se concebe.
Donde assoma a conclusão que essa conexão entre a fonte geradora dos gastos e a potencial formação de proveitos tributáveis em sede de IRC/manutenção da fonte produtora, deve ser aferida tendo como referência o momento em que são contraídos os empréstimos e não no momento de vencimento dos juros.
ln casu, essa conexão existe e não é questionada pela Autoridade Tributária. Emergindo, assim, a evidência que os gastos devem ser considerados.
Acresce que é incontroverso nos autos que a "B…………, S.A." antes da incorporação podia deduzir os encargos/gastos dos financiamentos obtidos, porquanto a aquisição do capital social da Impugnante era susceptível de gerar proveitos na sua esfera tributável, quer sob a forma de dividendos quer sob a forma de eventuais mais de uma eventual alienação da sua participação.
Com a operação de fusão esse direito à consideração fiscal dos gastos não se extingue, por efeito da fusão, pelo contrário, ope legis, mantém-se e surge, desta feita, na esfera jurídica da Impugnante.
Há ainda uma terceira ordem de razões que determinam a consideração de tais gastos na definição da matéria tributável: a neutralidade do regime da fusão.
A este propósito J. L. SALDANHA SANCHES [in "Fiscalidade", nº 34], em artigo dedicado à fusão inversa, afirmava:
″A questão jurídica em análise no presente artigo é muito simples e é facilmente identificável: saber se há alguma norma ou princípio, de Direito nacional comunitário ou internacional que leve a excluir do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 67º do Código do IRC uma operação através da qual uma sociedade é incorporada e dissolvida numa sua subsidiária que detém a 100% (operação vulgarmente conhecida por fusão inversa). Pode adiantar-se a resposta à questão: a fusão por incorporação de uma sociedade participante na sociedade participada é abrangida pelo regime da neutralidade fiscal, uma vez que se trata da operação descrita no artigo 67º, nº 1, al. a), do Código do IRC, ou seja, da «transferência global do património de uma (...) sociedade (sociedade fundida)» - sociedade A - "para outra sociedade já existente (sociedade beneficiária)" - sociedade B - «e a atribuição aos sócios daquela» - sociedade S - «de partes representativas do capital social da beneficiária» - partes da sociedade B. Ora, não havendo no nosso ordenamento jurídico, ou no ordenamento comunitário, qualquer norma que excepcione o efeito de neutralidade da fusão, este efeito não pode ser negado na operação descrita, sob pena de ilegalidade da liquidação que daí resultar.
(...)
Argumenta a Fazenda Pública que o que está aqui em causa é a mera desconsideração dos custos nos termos do art.º 23º do CIRC e não a neutralidade da fusão.
Até certo ponto tem razão, contudo, se os gastos que anteriormente eram considerados para efeitos da determinação da matéria colectável de cada uma das sociedades incorporadas deixam de o ser na esfera jurídica da sociedade incorporante, em resultado da operação de fusão, então é manifesto que a fusão é tudo menos neutral.
Mesmo que possa ter havido "neutralidade fiscal" no que concerne aos "movimentos patrimoniais″, o certo é que ao deixar de se permitir a consideração fiscal de gastos anteriormente admissíveis, chega-se a um resultado que se afigura contrário ao espírito da Directiva, isto é, de impedir que questões fiscais distorçam o mercado no sentido de favorecer, restringir (ou mesmo impedir) operações de reorganização empresarial, com as inerentes consequências ao nível da concorrência no mercado único.
Pode, assim, em jeito de súmula do expendido, afirmar-se que:
i) o momento temporal para aferir da admissibilidade dos custos para efeitos tributários deve ser determinado pelo instante em que estes são gerados e não pelo momento em que são suportados no sentido de que se vencem ou são pagos;
ii) tendo a sociedade incorporada o direito a relevar fiscalmente os gastos na sua matéria tributável, em sede de IRC, esse direito persiste, pela fusão, ope legis, na esfera jurídica da incorporante;
iii) Entendimento diverso redundaria na violação Direito Europeu, mormente do princípio da neutralidade fiscal das fusões.».

Em suma, a sentença analisou a questão da dedutibilidade dos referidos custos à luz da fundamentação que alicerçava as impugnadas correcções, tendo julgado que os encargos assumidos pela sociedade incorporada e que por força da fusão passaram a ser suportados pela sociedade incorporante podiam relevar como custo fiscal para a determinação da matéria colectável desta, porquanto o momento temporal para aferir da sua admissibilidade é determinado pelo instante em que são gerados e não pelo momento em que são suportados; e visto que a incorporada tinha o direito de os relevar na sua matéria tributável, esse direito persistia, ope leqis, na esfera jurídica da incorporante, sendo que entendimento diverso redundaria na violação do princípio comunitário da neutralidade fiscal das fusões.

Neste recurso, a Fazenda Pública não rebate esta consistente motivação, antes esgrime com diverso discurso fundamentador em defesa da tese da falta de verificação do requisito da indispensabilidade contido no art.º 23º do CIRC, vindo advogar que esses encargos financeiros não devem considerar-se "indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora" na medida em que na fusão inversa os elementos patrimoniais que os originaram não são transferidos para a sociedade incorporante, mas sim para os acionistas, sendo, por conseguinte, na esfera destes que esses elementos patrimoniais contribuirão para a obtenção de rendimentos. Ou, como resumidamente deixou expresso nas conclusões KK) e LL) deste recurso, «Em jeito de conclusão, diremos que na fusão inversa há elementos patrimoniais que não são transmitidos para a sociedade beneficiária mas sim para os seus acionistas, daí que os correspondentes gastos associados não devam ser relevados na esfera fiscal da sociedade, uma vez que os rendimentos a eles associados, porque se tratam de lucros distribuídos/a distribuir aos acionistas, também não vão manifestar-se na sua esfera económica e fiscal mas sim na esfera económica e fiscal daqueloutros» «Ora, foi justamente esta diferença de enquadramento que, com a devida vénia, o Mmo. Juiz, na sua douta sentença, não esquadrinhou e que se impunha.»

O que significa que advoga razões que a AT não levou ao relatório que constitui a declaração formal fundamentadora das correcções e das subsequentes liquidações, o que constitui uma fundamentação a posteriori, claramente inadmissível tendo em conta que o tribunal tem de quedar-se pela formulação de um juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, apreciando a sua legalidade em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto, não podendo substituir-se à Administração e ir ponderar se o acto pode ser sancionado com distinta fundamentação e argumentação jurídica.

Sabido que o direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários reclama que o particular apenas tenha de defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos, não será de admitir qualquer fundamentação a posteriori nem o aproveitamento do acto quando isso implique a valoração de razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, pois se assim não fosse o particular ver-se-ia surpreendido em juízo com a invocação de uma outra realidade e isso representaria uma contracção do seu direito de impugnação contenciosa face à impossibilidade de utilizar os meios conferidos por lei para sindicar tais actos e que são mais favoráveis que os meios conferidos por lei para impugnar decisões judiciais.

Em sentido idêntico, o acórdão de 22/03/2018, no proc. nº 0208/17, prolatado pelo STA no recurso interposto pela Fazenda Pública de análoga sentença proferida em processo de impugnação judicial instaurado pela mesma sociedade para contestar as mesmas correcções efectuadas para o exercício de 2009, e onde aquela formulara idênticas alegações e conclusões de recurso.

«Ou seja, o acervo dos fundamentos e argumentos agora esgrimidos em sede de recurso não constam expressamente do relatório da inspecção, indo mais além do que ali ficou dito. Sabendo nós que a fundamentação dos actos administrativos e tributários a posteriori não é legalmente consentida, cfr. os acórdãos do STA, de 26/3/2014, proc. nº 01674/13 e de 23/4/2014, proc. nº 01690/13, sendo que a validade do acto terá necessariamente que ser apreciada em função dos fundamentos de facto e de direito que presidiram à sua prática, irrelevando os que posteriormente lhe possam ser "aditados", podemos concluir sem margem para dúvida que, ainda que fosse reconhecida razão à recorrente com base nos fundamentos agora esgrimidos tal não poderia ser determinante para a manutenção do acto anulado pelo tribunal a quo e, logicamente, também não poderia conduzir à revogação da sentença recorrida.
Efectivamente, no relatório da inspecção apenas se colocou a questão da indispensabilidade dos custos de forma singela, por não terem relação com a actividade operacional da impugnante (o que impressionou mais fortemente a recorrente foi o facto de a impugnante assumir os custos de aquisição do seu próprio capital social), nunca se colocou a questão tal como agora vem colocada e, nessa medida, conhecer-se agora de tais fundamentos constituiria uma verdadeira decisão inovatória que se afasta do próprio acto tributário em apreciação.
Pelo exposto, não restam dúvidas que a questão trazida agora para apreciação deste Supremo Tribunal não pode determinar a manutenção ou anulação do acto tributário impugnado.».
Termos em que o recurso não pode obter provimento quanto a esta questão.

3.2. Do erro de julgamento quanto à decidida falta de verificação dos requisitos para a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Segundo o disposto no nº 7 do art.º 6º do RCP, nas causas de valor superior 275.000,00 € o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.

Trata-se, por conseguinte, de uma dispensa excepcional, que depende de uma concreta e casuística avaliação a efectuar pelo juiz e sujeita a uma real ponderação sobre o peso da complexidade da causa e da conduta processual das partes. Razão por que a jurisprudência desta Secção se consolidou no sentido de que se justifica a dispensa se a causa revelar uma complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes não merecer censura, devendo, para o efeito, considerar-se de menor complexidade a decisão proferida por remissão para a motivação jurídica de anterior sentença/acórdão.

Neste contexto, somos levados a acompanhar a posição sustentada pelo Ministério Público no parecer supra transcrito, porquanto a questão de legalidade das liquidações impugnadas analisada na sentença já anteriormente fora analisada e decidida pelo mesmo tribunal (em sentença que veio a ser confirmada pelo aludido acórdão do STA no proc. nº 0208/17), limitando-se o julgador a aderir à motivação jurídica ali vertida e que transcreveu, o que indicia uma menor complexidade da operação intelectual subjacente à apreciação e decisão desta causa. E, por outro lado, as partes limitaram-se a sustentar as suas posições nos articulados permitidos por lei, sem criar entraves anormais ao desenrolar do processo, pelo que não podemos deixar de concluir que tiveram uma atitude positiva de cooperação.

Face ao exposto, julgamos que, neste concreto caso, se justifica a pretendida dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça devida - tanto em 1ª instância como neste Supremo Tribunal.

4. Termos em que se acorda em conceder parcial provimento ao recurso, revogar a sentença no que toca ao indeferimento do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, que se substitui por decisão de deferimento total desse pedido, confirmando-se, quanto a tudo o mais, o ali decidido.

Custas pela Recorrente, com dispensa para ambas as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso.

Lisboa, 30 de Janeiro de 2019. – Dulce Neto (relatora) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.