Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0941/17.6BELRA
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26493
Nº do Documento:SA2202010140941/17
Data de Entrada:12/04/2018
Recorrente:MASSA INSOLVENTE DE A………. – UNIPESSOAL, LDA
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


MASSA INSOLVENTE DE A……….. – UNIPESSOAL, LDA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAF de Leiria) datada de 25 de Maio de 2018, que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal nº 3603201501106171, instaurada pelo Serviço de Finanças de Leiria 2, para cobrança de IVA respeitante ao ano de 2010, no valor de € 37.866,78.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
A. A douta sentença enferma de manifesta nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º do CPPT, por não se ter pronunciado sobre a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade consagrado no artigo 45.º, n.º 1 da LGT, questão de direito invocada pela Recorrente em sede de oposição que deveria ter apreciado.
B. Ademais a caducidade constitui exceção perentória e nos termos do artigo 576.º, n.º 3 do CPC importaria a absolvição total do pedido, neste pendor pronunciou-se Supremo Tribunal Administrativo, Acórdão de 16/12/2015, Processo 0773/14, in dgsi.pt.
C. A caducidade reconhece o direito a uma definição em prazo razoável da situação jurídico-tributária dos contribuintes justificada por razões de certeza e segurança jurídicas.
D. Para o efeito definiu-se um prazo para a prática do ato tributário e que este seja notificado de modo válido.
E. Porquanto, o facto impeditivo da caducidade é a notificação da liquidação dentro do prazo de quatro anos e não tendo sido notificada a liquidação ora em crise (IVA/2010) conclui-se pela sua caducidade nos termos do artigo 45.º, n.º 1 do CPPT.
F. Ademais a falta de notificação da liquidação viola o Princípio da legalidade tributária consagrado no artigo 8.º, n.º 2, alínea a) da LGT que dispõe expressamente que a liquidação está sujeita a este princípio, incluindo o prazo de caducidade.
G. A falta de notificação da liquidação também viola do disposto no artigo 36.º, n.º 1 do CPPT e artigo 94.º, n.º 1 do CIVA que renete para o artigo 45.º e 46.º da LGT.
H. Acresce que o ónus da prova sobre a notificação da liquidação recai sobre a administração tributária e a Fazenda Pública não demonstrou ter existido notificação da liquidação e nem sequer contra-alegou quanto a esta matéria, pelo que deveria ter sido julgada procedente a oposição execução e consequentemente declarada inexigibilidade da dívida exequenda.
I. Neste sentido sufragou o Supremo Tribunal de Justiça no seu douto Acórdão n.º 078/14, de 27 de maio de 2015 e o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 130/02, de 14 de março de 2002, entre outros.
J. No que concerne à retificação da douta sentença nos termos do artigo 614.º do CPC constata-se que na motivação de direito por lapso menciona “IMT” de “2011”, porém, deverá constar na motivação de direito da mesma que a dívida exequenda reporta-se a IVA de 2010, imposto e período em crise nos presentes autos.
Termos em que, admitido nos termos do artigo 280.º do CPPT, ao recurso deve ser dado provimento, com as legais consequências.

Não houve contra-alegações.

O Ministério notificado pronunciou-se no sentido da procedência do presente recurso devendo a decisão recorrida revogada, e ordenada a baixa dos autos à 1ª instância para que seja conhecida a invocada caducidade.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
1.1. Em 2014.11.06 no processo n.º 425/14.4T8LRA a correr termos pelo Tribunal da Comarca de Leiria – Instância Central – 1.ª Secção Comércio – J2 de Alvaiázere, foi proferida sentença a decretar a insolvência de A……… – Unipessoal, Lda.
1.2. A sentença referida em 1.1. fixou em 30 dias o prazo para reclamação de créditos.
1.3. Pelo Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Comércio, em Representação da Fazenda Nacional, foram naquele processo n.º 425/14.4T8LRA reclamados os créditos de IRC, IMI, IVA, Coimas e encargos de processos de contraordenação que constam da Reclamação de Créditos junta com a PI, onde não foi incluída a dívida exequenda nos presentes autos.
1.4. Em 2015.02.23 veio o DMMP, em representação da Fazenda Pública, propor ação declarativa para verificação ulterior de créditos, tendo por objeto apenas o IMT e Imposto de Selo devido em 2011 no montante global de € 15.558,60.
1.5. Em 2015.03.30 o Serviço de Finanças de Leiria 2 instaurou contra a ora oponente o processo de execução fiscal n.º 3603201501106171, para cobrança coerciva de dívida de IVA e juros compensatórios respeitantes ao exercício de 2010, no montante de € 33.514,87, perfazendo com os acrescidos o montante total de € 38.041,42.
1.6. Em 2017.04.10 o Administrador da Insolvência de A………. – Unipessoal, Lda., foi citado nessa qualidade para o processo de execução fiscal supra identificado.
1.7. Em 2017.05.17 foi remetida ao Serviço de Finanças de Leiria 2, por carta registada, a presente oposição à execução fiscal.
Nada mais se deu como provado.

Há, agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido.
A única questão que a recorrente coloca no presente recurso consiste em saber se na sentença recorrida se omitiu pronuncia sobre a questão suscitada na petição inicial, cfr. artigos 15.º a 21.º, respeitante à não notificação da liquidação dada à execução no respectivo prazo de caducidade e, em consequência, se ocorreu a caducidade do direito à liquidação.
Lida atentamente a sentença recorrida, surpreende-se que logo no relatório se identifica do seguinte modo a causa de pedir articulada pela recorrente, na sua petição inicial: Alega, para tanto, e em suma, a caducidade da dívida exequenda, e que a mesma não foi reclamada no âmbito do processo que decretou a sua insolvência (nem em sede de reclamação de créditos, nem em sede de verificação ulterior de créditos), encontra-se precludido o direito a exigir o pagamento do crédito, pelo que a Administração fiscal não pode instaurar o processo de execução fiscal aqui em causa, o que consubstancia uma atuação abusiva e ilegal.

Em seguida identifica-se na sentença recorrida a questão a decidir nos seguintes termos: A questão que nestes autos cumpre decidir consiste em saber se a dívida exequenda é exigível, em face da declaração de insolvência da executada.

Daqui se surpreende que a sentença recorrida apenas se pronunciou sobre uma das questões a decidir, faltando emitir pronúncia sobre a questão da caducidade do direito à liquidação, ainda que tal questão possa não ter razão de ser, ou possa vir a ser julgada manifestamente improcedente.
Na verdade, nos termos do disposto no artigo 125º do CPPT resulta que a sentença é nula quando falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.
Faltando no caso concreto a pronúncia sobre uma das questões colocadas pela recorrente -também não se consegue vislumbrar na matéria de facto levada ao probatório qualquer facto que respeite à questão da caducidade do direito à liquidação- e que no seu entendimento seria determinante para a extinção da execução que contra si foi movida pela AT, cfr. pedido formulado na petição inicial sob a alínea a), e não se vislumbrando da sentença recorrida, ou do posterior despacho que se pronunciou sobre a arguida nulidade, que a não pronuncia sobre tal questão tenha ficado prejudicada pela solução dada à questão apreciada, é indubitável que a sentença enferma da nulidade que lhe vem assacada, pelo que, o recurso obterá provimento.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem a Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em:
-conceder provimento ao recurso e, em consequência, julgar nula a sentença recorrida por não ter conhecido da questão da caducidade do direito à liquidação;
-ordenar a baixa dos autos ao Tribunal a quo para que aí se conheça de tal questão, quer de facto, quer de direito.
Custas pela recorrida, levando-se em conta que não contra-alegou.
D.n.

Lisboa, 14 de Outubro de 2020. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva – Paulo José Rodrigues Antunes.