Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01213/17
Data do Acordão:02/22/2018
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
JURISPRUDENCIA CONSOLIDADA
Sumário:I - Para que um recurso destinado a uniformização de jurisprudência possa ser admitido é indispensável, além do mais, que a orientação perfilhada no acórdão recorrido «não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada no STA»;
II - Não é o caso de um acórdão do STA que, proferido em 01.06.2017, manteve jurisprudência perfilhada em 2 acórdãos do STA, tirados em formação alargada, em 04.05.2017, e em mais 7 acórdãos da respectiva Secção.
Nº Convencional:JSTA000P22943
Nº do Documento:SAP2018022201213
Data de Entrada:11/08/2017
Recorrente:MUNICÍPIO DE SANTIAGO DO CACÉM
Recorrido 1:ÁGUAS DE SANTO ANDRÉ, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: I. Relatório
1. MUNICÍPIO DE SANTIAGO DO CACÉM [MSC] interpõe «recurso para uniformização de jurisprudência» do acórdão datado de 01.06.2017, e proferido nestes autos pela Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, porquanto entende que ele está em oposição com o decidido no acórdão de 07.12.2016, da mesma Secção, e proferido no processo nº0964/16 [acórdão fundamento].

Conclui assim as suas alegações:

A) O presente recurso para uniformização de jurisprudência é interposto do Acórdão desse STA de 01.06.2017 proferido na revista excepcional à margem referenciada interposta de Acórdão do TCAS que, revogando sentença do TAF de Beja, condenou o Município de Santiago ora recorrente a pagar à sociedade anónima Águas de Santo André, valor por esta peticionado a título de efluentes domésticos da Cidade de Vila Nova de Santo André, concelho de Santiago do Cacém, com fundamento em contradição sobre mesma fundamental questão de direito com douto Acórdão do STA, transitado em julgado, proferido em 07.12.2016 - Rº964/16;

B) O recorrente tem legitimidade para interpor o presente recurso porque a decisão recorrida, muito embora conceda provimento à revista, é muito desfavorável aos interesses do Município, porque reduz o núcleo essencial da controvérsia dos autos a mera questão de facto, para apreciação da qual diz ser irrelevante o direito aplicável e o contrato de concessão, e ordenando a baixa do processo para novo julgamento da causa, define à partida o direito a aplicar, limitando inquinando irremediavelmente esse julgamento;

C) Conforme se diz no texto: Recurso para Uniformização de Jurisprudência – Breves Notas e Jurisprudência -, Gabinete dos Juízes Assessores- Assessoria Cível, pagina 47, in Web, deve a parte «...ter-se por vencida quando a decisão obtida não seja a mais favorável aos seus interesses»;

D) O recurso é tempestivo e verificam-se requisitos previstos na lei processual;

E) Não existe jurisprudência recentemente consolidada do STA sobre a questão de direito aplicável à factualidade provada nas instâncias sobre o caso do Município de Santiago do Cacém;

F) E certo é que nunca poderá invocar-se que - sob pena de grave violação de preceitos constitucionais -, a existir, jurisprudência consolidada sobre o caso do Município de Sines, pois não há qualquer identidade entre matéria de facto subjacente aos processos do Município de Sines e à factualidade subjacente aos processos do Município de Santiago do Cacém, ora recorrente, como se demonstrará;

G) Existe contradição sobre questão fundamental de direito entre o Acórdão recorrido e o douto Acórdão do STA, transitado em julgado, proferido em 07.12.2016 - Rº964/16 - em que era recorrente o aqui recorrente e recorrida a aqui recorrida, no qual se discutiu exactamente a mesma questão, e cuja factualidade provada é igual à dos presentes autos;

H) O douto Acórdão Fundamento concedeu provimento à revista excepcional interposta pelo Município ora recorrente do Acórdão do TCAS de 14.01.2016 [igual ao do que é objecto do Acórdão recorrido], e revogou-o, bem como julgou improcedente a acção de Águas de Santo André, SA;

I) Os fundamentos do Acórdão Fundamento são os seguintes:

• Os serviços de saneamento básico compreendem a prestação do serviço de abastecimento público de água às populações e o saneamento das águas residuais urbanas, ambos através de redes fixas...;

• São serviços públicos essenciais, de titularidade e responsabilidade estatal ou municipal, podendo, no entanto, a sua gestão e exploração caber a outras entidades, nalgumas condições até entidades privadas;

• À data da propositura da acção a lei já distinguia entre sistemas multimunicipais e sistemas municipais; os primeiros eram criados pelo Estado precedidos de pareceres dos municípios territorialmente envolvidos [nºs 1 e 2 do DL 379/93] e por decreto-lei;

• O contrato de concessão entre Estado e a AdSA celebrou-se em Dezembro de 2001, sendo concedente o Estado e concessionária a AdSA, não tendo o Município intervenção do processo de concessão em apreço;

• Não há, pois, no caso, sistema multimunicipal, porque não existe Decreto-lei que o tenha criado;

• O caso dos autos é sui generis, porquanto o sistema serve dois municípios que não estão associados num sistema multimunicipal, apenas serve parcialmente os dois municípios, sendo que o Município de Santiago do Cacém não é o concedente;

• A sociedade AdSA presta directamente aos habitantes de VNSA serviços de abastecimento de água potável pelos quais cobra a tarifa respectiva, o que condiz com a titularidade estatal do sistema de saneamento básico de VNSA;

• Nem o Contrato de concessão, nem o DL 171/2001, permitem concluir que a ADSA, fazendo o abastecimento de água em baixa, não faça também a recolha e tratamento de efluentes na mesma cidade;

• Acresce que, não assegurando a exploração e gestão do sistema em baixa no âmbito de um sistema multimunicipal, o Município não pode ser considerado um utilizador do sistema em alta;

• A discussão nas instâncias sobre se há ou não contrato entre a AdSA e o Município, se o contrato é ou não nulo, se aplica ou não o regime de nulidade do artigo 289º assentava no pressuposto errado de que o MSC era utilizador do sistema em alta, dele beneficiando;

• Não existindo sistema multimunicipal perde sentido toda a discussão sobre contrato ou sobre se o município era beneficiário de um serviço da AdSA;

• No caso dos autos, tendo em consideração os contornos fácticos e jurídicos, não é réu devedor da AdSA;

J) O Acórdão recorrido concedeu a revista, MAS ordenou a baixa dos autos ao TCA-Sul «...para que os mesmos juízes resolvam as contradições presentes na decisão sobre a matéria de facto e julguem novamente a causa» sendo «…esse regresso dos autos ao TCA...vai já acompanhado da definição do regime jurídico aplicável, a qual será vinculante na decisão que, após se corrigir a matéria de facto, a instância venha a proferir [artigo 683º do CPC]» - folha 16;

L) O «regime jurídico aplicável que é vinculante» para o TCAS e que é indicado pelo acórdão recorrido, é o do Acórdão de 10.11.2016 – Rº391/16 proferido em processo do Município de Sines cuja factualidade provada é totalmente distinta da matéria de facto provada nos presentes autos;

M) Persiste o Acórdão recorrido no erro de ignorar a ESPECIFICIDADE da matéria de facto provada no caso em apreço, E SÓ NESTE, e que levou o TCAS BRUTAL ERRO DE JULGAMENTO;

N) O Acórdão recorrido diz:

• «A circunstância da autora ser concessionária do Estado é irrelevante- já que a respectiva «lex contractus» relativa às partes negociais, não obriga o réu município, enquanto terceiro»;

• «...também é indiferente o que o município porventura devesse «ex lege» fazer. O que importa não é aquilo que ele devia ter feito - folha 10;

• Este Tribunal de revista …confronta-se com uma dúvida insuperável: a factualidade recolhida pelas instâncias não esclarece se o réu município interveio, ou não, no processo de recolha domiciliária e de condução dos efluentes, já que os factos apurados afirmam isso e o seu contrário - folha 12;

• O que inviabiliza «... a imediata resolução jurídica do pleito»- folha 12;

• «Acompanhamos o acórdão recorrido referindo-se ao Acórdão do TCAS- “…quando ele disse que as partes se uniram num vínculo negocial relativo à recepção dos efluentes domésticos...» - fls. 18;

O) Perante tão paradoxal entendimento de um Tribunal Superior, cabe perguntar:

P) Estando em causa o fornecimento de bens essenciais às populações distribuição de água para uso doméstico, efluentes domésticos, são irrelevantes as obrigações a que se vinculou [no contrato de concessão] a concessionária da gestão e exploração de SISTEMA DE SANEAMENTO BÁSICO?

Q) São irrelevantes as normas legais que definem as atribuições e competências dos órgãos do Estado [Central ou Local] para o abastecimento de água e para recolha dos efluentes domésticos?

R) Afirmando o Acórdão recorrido que «...as partes se uniram num vínculo negocial relativo à recepção dos efluentes domésticos...», mas estando provado - alínea AA) e

T) dos factos assentes, transcritos a folhas 8 e 9 da decisão recorrida - que nunca houve contrato entre as partes e que o Município sempre devolveu as facturas, com a menção de que não era delas devedor - QUAIS OS FACTOS MATERIAIS PROVADOS que sustentam a afirmação supra referida?

S) Mandando baixar os autos ao TCAS, como já se referiu, o Acórdão recorrido define, então, o vinculante regime jurídico a aplicar pelo TCAS:

«...Na primeira hipótese, o réu município seria alheio ao processo de recolha e condução dos efluentes, já que a sua intervenção nele se limitara a passivamente tolerar que a autora usasse o seu sistema de esgotos» - folha 11 - devendo a acção improceder «in toto» [folha 13];

• Na segunda hipótese «...o réu activamente conduzira os efluentes domésticos para o ponto de recolha da autora...», pelo que «esta prestara um serviço ao réu…» [folha 11], havendo, deste modo, «...entre si alguma relação, visto que a autora prestou ao réu o serviço alegado in initio litis»;

• Pelo que se deverá nesta hipótese de aplicar a jurisprudência constante do acórdão do STA proferido no recurso nº391/16, transcrevendo, como já se referiu o citado Acórdão proferido sobre o CASO DE SINES;

T) Sendo a factualidade subjacente aos arestos em confronto [Acórdão Recorrido e Acórdão Fundamento] exactamente a mesma, a solução sobre a fundamental questão de direito é totalmente divergente;

U) Do que resulta a evidência de contradição sobre fundamental questão de direito entre o Acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento;

V) Como se referiu, existe radical diferença entre a matéria de facto provada nos presentes autos e nos autos de processos em que foi réu o Município de Sines;

T) Essa radical diferença revela-se do confronto da factualidade provada nos autos em que foi proferido o Acórdão de 10.11.2016 - Rº391/16 - relativo a processo relativo ao MUNICÍPIO DE SINES, que o Acórdão recorrido transcreve e cujo regime jurídico manda o Acórdão recorrido aplicar aos presentes autos;

U) Com efeito, do tal Acórdão relativo ao Município de Sines [Rº391/16] mostra-se que:

• É o Município de Sines que abastece de água e recolhe os efluentes domésticos de toda a população do Concelho;

• O Município de Sines celebrou em 2005, acordo com Águas de Santo André, SA, com vista a esta receber, tratar e dar destino aos efluentes domésticos da cidade de Sines;

• O Município de Sines celebrou contratos com a aqui recorrida, comprando-lhe água a Águas de Santo André, SA que depois o Município abastece aldeias do concelho e pontualmente a cidade de Sines;

• O Município de Sines nunca devolveu a Águas de Santo André, SA as facturas emitidas e que lhe foram entregues por esta;

• A razão invocada para o não pagamento das facturas pelo Município de Sines é a divergência sobre os tarifários aplicados por Águas de Santo André.

V) De toda a factualidade provada nos presentes autos e em todas as restantes acções intentadas contra o Município de Santiago do Cacém, sumariam-se alguns dos factos provados relevantes:

• Não há nem nunca houve contrato ou acordos entre os aqui recorrente e recorrida, relativos a abastecimento de água ou saneamento de Vila Nova de Santo André, nem foram provados factos materiais de que se extraia vínculo negocial entre as partes;

• É Águas de Santo André, SA que abastece directamente a água para consumo humano aos residentes na cidade de VNSA;

• O Município de Santiago do Cacém SEMPRE DEVOLVEU as facturas à aqui recorrida com a menção de NÃO SER DEVEDOR;

• ÁGUAS DE SANTO ANDRÉ, SA não presta ao Município de Santiago do Cacém serviços de recolha, tratamento e destino final de efluentes domésticos na Cidade de Vila Nova de Santo ao Município de Santiago do Cacém, antes os presta directamente aos habitantes da cidade de VNSA aos quais abastece a água;

• Por força do contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e a aqui recorrida NÃO É O MUNICÍPIO DE SANTIAGO DO CACÉM que exerce as atribuições de abastecimento de água e saneamento à população de VNSA;

• Os utilizadores do sistema de abastecimento de água, recolha, tratamento e destino final de efluentes domésticos são os residentes em Vila Nova de Santo André.

X) A factualidades tão distintas COMO PODE APLICAR-SE O MESMO REGIME JURÍDICO?

Y- O direito a aplicar ao presente caso, tem, pois, necessariamente de ser distinto do definido pelo Acórdão recorrido QUE SE APLICA à factualidade do Município de Sines;

Z) O Acórdão recorrido proferido por órgão superior da hierarquia dos tribunais administrativos e fiscais

• Sustenta-se em argumentos [expressos ou implícitos] que não têm correspondência na realidade dos factos;

• Reduziu o cerne da controvérsia uma mera questão de um facto [saber quem recolhe os efluentes domésticos na Cidade de Vila Nova de Santo André, se a autora ou o réu], quando efectivamente do que se trata é de uma questão de direito - saber quem, segundo a lei e o contrato de concessão, tem o dever de recolher os efluentes domésticos da Cidade de Vila Nova de Santo André, situada no concelho de Santiago do Cacém - que, deste modo, só pode ser esclarecida, no quadro dos factos assentes, pela lei e pelo contrato de concessão;

• Tomou como pressuposto a matéria provada em processo relativo ao Município de Sines, cuja factualidade é radicalmente distinta da matéria assente no caso do Município de Santiago do Cacém, como se mostra inequívoco de todo o Acórdão e, particularmente da transcrição do Acórdão do STA de 10/11/16 - recurso 391/16 relativo ao caso de Sines em que é indicado o regime jurídico que o TCAS fica vinculado a aplicar;

• Afirma factos sem qualquer sustentação na matéria provada;

• Ignorou que é absolutamente impossível apurar, de facto, quem recolhe os efluentes de VNSA, mesmo sendo NOTÓRIO que, quando alguém acciona a descarga de água numa sanita, não há uma mão humana invisível que intervenha no curso natural e accione o escoamento/ RECOLHA da água descarregada na rede pública [efluente];

Ignorou o ciclo natural da água - aliás provado sob a alínea H) da matéria assente que o Acórdão recorrido transcreveu a folha 7 -: «A água é captada, tratada, distribuída, utilizada e uma vez utilizada é recolhida, tratada e rejeitada numa parte que constitui o efluente doméstico, COMPETINDO à A. PROCEDER AOS DIVERSOS ACTOS DESSE CICLO DA ÁGUA...»;

• Mandou baixar o processo ao TCAS para esclarecer se é a AdSA ou o Município que recolhe os efluentes domésticos em VNSA - como se tal fosse possível;

• Define o regime jurídico aplicar em cada uma das alternativas que vier a ser provado [como se tal não fosse absolutamente impossível], limitando a amplitude do julgamento do TCAS;

• E «mata» para sempre qualquer outra solução a dar ao caso, violando, em nosso entender, a garantia de duplo grau de jurisdição;

AA) O acórdão recorrido violou:

• O dever de «administrar a justiça» e «…assegurar a defesa dos direitos e interesse legalmente protegidos do Município de Santiago do Cacém, infringindo os nºs 1 e 2 do artigo 202° da CRP, bem como violou o nº1 do artigo 20º da Lei Fundamental»;

• Restringindo ainda o princípio da autonomia do poder local previsto nos artigos 235º e seguintes da CRP, infringiu desse modo o artigo 6º da Lei Fundamental e Carta Europeia da Autonomia Local;

• O DL 115/89 de 14.04 e o DL 171/2001 de 25.05;

• O Contrato de Concessão celebrado em Dezembro de 2001 entre o Estado e Águas de Santo André, SA que atribui a esta última a concessão em exclusivo da exploração e gestão do sistema de abastecimento de água e efluentes domésticos de Vila Nova de Santo André designadamente as cláusulas 1ª nºs 1 e 3, 2º nº1, 6ª nº1, 10ª nº1;

• Os artigos 217º, nº2 do 257º, 289º e nº 1 do 405º do CC;

• Os artigos 5º, 260º, 412º nº1, 608º nº2, 682º nº1, 2º e 3º do CPC;

• E, ainda, o artigo 140º e os nºs 2, 3 e 4 do artigo 150º do CPTA;

BB) O acórdão recorrido comete ERRO BRUTAL DE JULGAMENTO, COMO MELHOR É EVIDENCIADO NAS DECLARAÇÕES DE VOTO VENCIDO anexas ao Acórdão proferido no processo 483/16 que se dão aqui por integralmente reproduzidas e que acompanhamos na íntegra».

Termina, pedindo que este Pleno reconheça a «contradição entre os julgados», «revogue o acórdão recorrido», e «fixe jurisprudência» no sentido adoptado no acórdão fundamento, sendo, em conformidade, o MUNICÍPIO DE SANTIAGO DO CACÉM absolvido do pedido formulado pelas ÁGUAS DE SANTO ANDRÉ.

2. A recorrida ÀGUAS DE SANTO ANDRÉ contra-alegou concluindo assim:

A) A AdSA apresentou recurso de uniformização de jurisprudência contra o Acórdão Fundamento, de 07.12.2016, de que é Relatora a Senhora Conselheira Maria Benedita Urbano [tirado no Rº964/16, nesse STA], tendo então evidenciado os vícios inequívocos em que o mesmo incorre ao concluir que o sistema gerido pela AdSA abrange a prestação dos serviços de saneamento em baixa;

B) Trata-se, como então se evidenciou, e agora se reitera, de uma decisão clamorosamente errada - por ora, de resto, isolada no panorama geral das decisões desse Supremo Tribunal que, até à data, têm sido prolatadas em litígios semelhantes - e que tem de ser afastada em sede de uniformização de jurisprudência;

C) A jurisprudência desse Supremo Tribunal Administrativo até então emitida, vinha decidindo acertadamente no sentido de condenar os Municípios envolvidos, de Sines e Santiago do Cacém, ao pagamento à AdSA das quantias por esta facturadas e relativas aos serviços prestados de tratamento de efluentes em alta - assumindo, portanto, que a AdSA prestou tais serviços ao Município -, à luz do enquadramento jurídico e da solução de direito definida [e bem] também nos presentes autos pelo Acórdão Recorrido, isto é, enquadrando contratualmente a relação entre a AdSA e os Municípios, declarando a respectiva nulidade por falta de redução a escrito e determinando, à luz do artigo 289º do CC, o pagamento à AdSA dos serviços prestados;

D) O Acórdão Recorrido patenteia, porém, uma nuance relativamente à anterior jurisprudência firme do Supremo Tribunal Administrativo, que se consubstancia em saber se foi a AdSA quem, nos anos de 2010 e 2011, recolheu os efluentes domésticos juntos dos munícipes e VN de Santo André, encaminhando-os - mesmo que através da rede de esgotos pertencentes ao réu - para o seu sistema em alta a fim de serem tratados e rejeitados [como consta do facto GG], ou, nesse período, foi o réu quem procedeu à recolha domiciliária e ao encaminhamento dos efluentes, levando-os na sua rede até ao ponto onde se iniciava o sistema em alta [como consta do facto Z];

E) O Tribunal considera que se trata de uma «pura questão de facto», «porque o cerne da controvérsia, localizando-se na existência, ou não, dos elementos constitutivos de uma prestação de serviços, está desligado da problemática jurídica que acidentalmente o rodeia [...] e redunda na averiguação do facto que assinalámos, isto é, em determinar-se se a autora prestou, ou não, ao réu os serviços relacionados com aqueles efluentes domésticos, «inviabilizadora da imediata resolução jurídica do pleito [artigo 682º, nº3, do CPC] [...] e que obriga à baixa dos autos ao TCA-Sul a fim de que, em primeira linha, se rectifique a matéria de facto»;

F) Para além desse entendimento sobre a necessidade de eliminação da contradição na matéria de facto, o Acórdão recorrido define o direito aplicável aos factos, imputando à Autora o ónus de provar que a captação domiciliária dos efluentes e a sua condução até ao ponto de recolha foi efectuada pelo município, em termos que: (i) não sendo tal facto provado, a acção deverá improceder; e (ii), sendo tal facto provado, a acção será procedente, devendo o réu pagar à AdSA as quantias facturadas ao abrigo do regime previsto no artigo 289º do Código Civil;

G) Perante este quadro, a AdSA, encontrando-se em total desacordo com o Acórdão Fundamento, partilha, em traços gerais, da solução constante do Acórdão Recorrido, que não enferma do clamoroso equívoco em que assenta o Acórdão Fundamento;

H) No entanto, a AdSA diverge do Acórdão Recorrido em dois pontos que, no entender, devem ser corrigidos, associados (i) ao entendimento do Acórdão Recorrido da necessidade de eliminação da contradição entre a matéria de facto, entendendo a AdSA que esse Supremo Tribunal dispõe de elementos para decidir o litígio de imediato e (ii) à distribuição do ónus da prova evidenciado no Acórdão Recorrido, o qual, no entender da AdSA, não obedece ao disposto no artigo 342º do Código Civil e, deve, por isso, ser corrigido, para que o TCA Sul não venha a ficar vinculado por uma distribuição do ónus da prova que contraria a regra legal;

I) O Acórdão Fundamento começa por considerar que «é fundamental analisar o contrato de concessão para perceber quais os poderes que a ora recorrida pode exercer sobre o recorrente e, bem assim, quais os eventuais direitos e deveres recíprocos» [ver página II do Acórdão recorrido] e que é ainda «imprescindível ter em conta a legislação atinente ao caso dos autos, e com base na qual se desenrolou a situação jurídica controvertida, em particular o DL 379/93, de 05.11, e o DL 171/2001, de 25.05»;

J) Com base no DL nº171/2001, de 25.05, o Acórdão Fundamento aceita que a gestão e exploração do sistema de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha, tratamento e rejeição e destino final de resíduos sólidos, que serve parcialmente os Municípios de Santiago do Cacém e de Sines, foi atribuída, em exclusivo, à AdSA, mediante a outorga de contrato de concessão [ver primeiros parágrafos da página 13];

K) O argumento principal em que assenta o Acórdão Fundamento é o de que, no sistema, não existe propriamente uma repartição organizatória entre a alta e a baixa, «designadamente não tendo sido atribuído ao Município de Santiago do Cacém o sistema em baixa [sistema cujos utilizadores finais são os consumidores individuais], tudo cabendo à exploração e gestão da sociedade AdSA»;

L) É que este entendimento do Acórdão Fundamento, mais do que relevar como fundamento apresentado para a negação da natureza multimunicipal do Sistema releva, a título principal, e com carácter fundamental para a caracterização da oposição de julgados aqui em causa, como fundamento essencial para a concessão de provimento no Acórdão Fundamento ao recurso de revista interposto pelo Município;

M) A ratio decidendi subjacente ao Acórdão Fundamento é essencialmente a de que o Município «foi arredado pelo atado (...) da exploração e gestão do sistema em baixa», sendo antes a ADSA a responsável por este último. De acordo com o Acórdão Fundamento, o Município não é titular de qualquer serviço público, seja de abastecimento de água, seja de saneamento, seja de recolha de resíduos sólidos, tanto em alta como em baixa. Tudo é, segundo o Acórdão Fundamento, competência da AdSA;

N) Tal decisão de direito convive - ainda que em tensão e manifesta contradição, como a AdSA teve oportunidade de invocar naqueles autos -, com um acervo factual dado como provado [e não contraditório, como sucede nos presentes autos] do qual decorre justamente o contrário daquela decisão [isto é, que o Sistema gerido pela Autora não abrange a baixa do saneamento em VN SA, actividade que é desenvolvida pelo Município];

O) São particularmente relevantes, a este respeito, os seguintes factos provados:

i) «Foram transferidos para a autora (...) a propriedade dos imóveis, infra-estruturas e equipamentos que constituem o sistema de saneamento básico de Santo André (...) com excepção das redes de drenagem de águas residuais domésticas e de águas pluviais do centro urbano da cidade de VNSA» [ver factos F) e G)];

ii) «As águas residuais urbanas, isto é, os efluentes domésticos de VNSA (...), são recolhidas pela rede municipal do Réu» [ver facto J];

iii) «O réu encaminha os efluentes domésticos provenientes da cidade de VNSA recebidos em Baixa na rede municipal de recolha para o sistema concessionado à autora» [ver facto Y];

iv) «Nos locais de recepção, os efluentes domésticos provenientes da recolha em “Baixa” pelos municípios e entregues nos locais de recepção, são sujeitos a um método de controlo e medição do caudal, por meio de caudalímetros» [ver facto II];

P) O argumento em que assenta a decisão constante do Acórdão Fundamento, incorre em erros de julgamento, violando as normas legais aplicáveis: o Acórdão Fundamento e, particularmente, a decisão principal em que o mesmo assenta viola o enquadramento legal e regulamentar a que a AdSA está vinculada;

Q) Ao contrário do que supõe o Acórdão Fundamento, o sistema da AdSA não abrange as infra-estruturas da baixa do saneamento. E esta conclusão emerge da própria lei, não dependendo de qualquer prova ou confirmação fáctica;

R) A AdSA é, como é inquestionável, uma concessionária de serviço público: o artigo 6.° do Decreto-Lei nº171/2001, de 25.05, atribui-lhe o exclusivo da exploração e gestão do sistema, em regime de concessão;

S) O concedente é, como também não é posto em causa, o Estado;

T) Tal sistema é o «sistema para captação, tratamento e distribuição de água, para recolha, tratamento e rejeição de efluentes e para recolha, tratamento e destino final de resíduos sólidos, constituído por imóveis, infra-estruturas e equipamentos cuja propriedade foi transmitida para o Estado pelo DL nº115/89, de 14.04, e cuja administração foi cometida à delegação da DGRN em Santo André, que transitou para o Instituto da Água (INAG) por força do disposto no artigo (8º-A do DL nº191/93, de 24.05, acrescentado a este último diploma pelo DL nº110/97, de 08.05, e que serve, parcialmente, os municípios de Santiago do Cacém e Sines, passa a ter a designação de sistema de abastecimento de água, de saneamento e de resíduos sólidos de Santo André adiante designado por sistema» [ver artigo 1º do DL nº171/2001];

U) Esta delimitação do sistema catapulta necessariamente o intérprete para o âmago do DL nº115/89, de 14.04, a fim de perceber que imóveis, infra-estruturas e equipamentos foram transmitidos para o Estado e, por isso, integram o sistema de Santo André;

V) O DL nº115/89, de 14.04, procedeu à transmissão do património do GAS (antigo Gabinete da Área de Sines) - imóveis, infra-estruturas e equipamentos que constituem os sistemas de saneamento básico e o centro de Estudos de Geologia e Geotecnia de Santo André (CEGSA) - para o Estado, mas nem todo esse património foi transmitido para o Estado;

W) O artigo 2º deste mesmo diploma legal excepciona daquela transmissão para o Estado algum património que foi transmitido para os municípios de Sines e de Santiago do Cacém, claramente identificado: (i) partes das redes de saneamento básico já integradas na rede da vila de Sines e na povoação de Porto Covo, que foram transmitidas para a Câmara Municipal de Sines e (ii) redes de drenagem de águas residuais domésticas e de águas pluviais de Santo André, que se transmitem para a Câmara Municipal de Santiago do Cacém;

X) Note-se, aliás, que não é só a propriedade de tais infra-estruturas que é transmitida para os Municípios de Sines e Santiago do Cacém, mas também a respectiva administração: «(...) cuja propriedade e administração são transmitidas para a Câmara Municipal de (...)»;

Y) Logo, se a rede de drenagem de efluentes domésticos de Santo André não foi transmitida para o Estado nos termos do DL nº115/89 - mas antes para o Município de santiago do Cacém, como ninguém, excepto o Acórdão Fundamento - põe em causa nos autos, então, tal rede não integra o sistema de Santo André;

Z) Ora: só o sistema que, por força do DL nº115/89, foi transmitido nessa data para o Estado foi depois, pelo Decreto-Lei 171/2001, transferido para a gestão da AdSA. E só esse releva para efeitos da delimitação da actividade e responsabilidades da AdSA;

AA) A rede que tinha sido transferida para os municípios em 1989 não foi, em 2001, repescada pelo Estado; manteve-se nos municípios. É esta realidade histórica e legal que explica que o sistema gerido pela AdSA, que mais não é do que o sistema transferido para o Estado em 1989, não inclua a rede e a actividade em baixa do saneamento;

BB) Feito este percurso pelos diplomas legais citados, tem de concluir-se que o sistema de Santo André não é um sistema delimitado de facto; é um sistema cuja delimitação tem fonte legal: e não abrange a rede de saneamento em baixa de VNSA;

CC) Se o sistema de Santo André não abrange a rede de efluentes em baixa de VNSA, como inequivocamente decorre do DL 115/89, e se a actividade concedida à AdSA, nos termos do artigo 6º do DL 171/2001, é a exploração e gestão do sistema de Santo André, tem forçosamente de concluir-se, qual silogismo, que a actividade concessionada à AdSA não inclui a rede de efluentes domésticos de VNSA;

DD) Fica assim totalmente refutada a conclusão constante do Acórdão Fundamento segundo qual «tudo cabe à exploração e gestão da sociedade AdSA» (ver último parágrafo da página 13), entendendo-se, no contexto da frase, por «tudo» tanto a actividade de saneamento em alta como em baixa em VNSA;

EE) Revelando ignorar a delimitação do sistema realizada pelo DL 115/89 e que parte do antigo património do GAS foi transmitido para os Municípios e falhando na necessária conjugação entre aquele diploma legal e o DL 171/2001 - pecado original que inquina o Acórdão Fundamento -, o Acórdão Fundamento assume que o sistema de Santo André atribuído à exploração da AdSA abrange tudo, indo ao ponto de salientar como peculiaridade do sistema a «circunstância de não haver propriamente uma distinção (no sentido de repartição organizatória) entre sistema em alta e sistema em baixa, designadamente não tendo sido atribuído ao MSC o sistema em baixa (sistema cujos utilizadores finais são os consumidores individuais), tudo cabendo à exploração e gestão da AdSA» (ver último parágrafo da página 13 do Acórdão Fundamento);

FF) O Acórdão Fundamento parece pressupor que caberia ao DL nº171/2001 «atribuir» ao Município de Santiago do Cacém o sistema em baixa - suposição que é consequência, por um lado, da ignorância relativamente ao facto de tal sistema já estar no Município desde 1989, e, por outro lado, relativamente ao facto de em jogo, no DL nº171/2001, estar apenas em causa a gestão do sistema que pertence ao Estado e a opção do Estado em concessioná-lo a uma empresa totalmente pública, em regime de concessão, não cabendo, ali, evidentemente curar de matérias que estão atribuídas aos municípios;

GG) A posição sustentada no Acórdão Fundamento, a qual, como se viu e movida pelo mencionado pecado original, contraria o DL nº171/2001, necessariamente conjugado com o DL nº115/89, ignora que o Município, que não é de facto parte no contrato de concessão, não teria sequer que nele intervir, nem poderia alguma vez o contrato de concessão (outorgado pelo concedente Estado) ser a fonte da atribuição ao município de determinada atribuição legal (a qual, de resto, já lhe cabe, como se viu, desde 1989);

HH) Como não pode deixar de ser, não é o facto de a AdSA prestar aos munícipes o serviço de abastecimento de água em baixa que explica (ou sugere) que aquela assuma idêntica relação direta com os municípios no que respeita ao saneamento;

II) É a lei que define os serviços que a AdSA presta, como se viu. E quanto às redes de abastecimento de água em baixa, estas, porque propriedade do Estado, viram a sua gestão e exploração ser, por lei, transferida para a AdSA; o mesmo não sucedeu com as redes de saneamento, que são propriedade do Município e é sua a responsabilidade pela respectiva gestão e prestação do serviço público conexo;

JJ) Não é, pois, verdade que «o MSC foi arredado pelo Estado (...) da exploração e gestão do sistema em baixa» [ver página 17 do Acórdão Fundamento], pelo menos no que toca ao saneamento em baixa em Vila Nova de Santo André;

KK) Imbuída também no pecado original, assumindo que a AdSA gere também o saneamento em baixa, o Acórdão Fundamento percorre nas páginas 15 e 16 algumas cláusulas do contrato de concessão das quais parece retirar a confirmação da sua posição de que a ADSA gere o saneamento em baixa de VNSA;

LL) Trata-se, porém, por um lado, de cláusulas que não se apresentam minimamente decisivas para essa conclusão, referindo-se aos utilizadores e aos efluentes canalizados para o sistema da AdSA pelos utilizadores (o que o acórdão Recorrido parece entender, mal, como utilizadores finais), o que é perfeitamente compatível com a definição contratual e legal (artigo 11.0 do DL nº171/2001);

MM) Na verdade, o título que a AdSA detém para a gestão do sistema de Santo André - a concessão atribuída por lei - está limitado ao sistema legalmente definido (nos termos do artigo 6º do DL nº171/2001, «o exclusivo da exploração e gestão do sistema é adjudicado, em regime de concessão, à Águas de Santo André, SA (...)». E nem tem qualquer sentido ou fundamento tentar encontrar no contrato de concessão - cujo fundamento é a lei e cujo âmbito e objecto está delimitado na lei (DL nº171/2001) - a base para ali ler, como faz o Acórdão Fundamento uma atribuição à AdSA da responsabilidade pelo saneamento em baixa em VNSA - numa leitura que é claramente impedida pelo próprio DL nº107/2001 e pelo DL nº115/89;

NN) O Estado não é o proprietário daquelas redes de efluentes em baixa em VNSA nem a mesmas integram o sistema de Santo André cuja gestão lhe compete e que o legislador determinou fosse concessionado, o contrato de concessão celebrado ao abrigo do DL nº107/2001 não poderia - sob pena de violação do princípio da legalidade, entre outros - ser o título para a atribuição à AdSA do direito/obrigação de realizar a actividade de saneamento em baixa em VNSA (simplesmente porque essas redes estão fora do sistema que, por determinação da lei, lhe foi concessionado);

OO) A propriedade e a administração da rede de efluentes domésticos de Santo André foi transmitida ao Município de Santiago do Cacém, como decorre do DL nº115/89;

PP) Logo, é o Município, e não o Estado ou a AdSA, que é o titular do serviço e que está, por conseguinte, incumbido da sua gestão e obrigado a prestar o serviço público a que tal rede está afecta;

QQ) É, aliás, o que decorre das regras gerais da delimitação das competências e atribuições dos municípios, constante da Lei nº159/99, de 14.09 (Lei das Autarquias Locais), actualmente, a Lei nº75/2013, de 12.09, mantém a mesma lógica (alínea k) do n° 2 do artigo 23º);

RR) Ora, se é certo que o Estado intervém neste domínio nos municípios de Sines e Santiago do Cacém, houve uma parte das atribuições municipais que foram preservadas na esfera municipal, pelo menos, desde 1989, justamente as que, pelo DL nº115/89 foram transferidas para aqueles municípios, onde se inclui a rede de efluentes em baixa de VNSA;

SS) Ora, coerentemente com a respectiva propriedade, administração e com as atribuições gerais municipais em matéria de ambiente e do saneamento básico, é ao município que cabe gerir aquelas infra-estruturas e o serviço público nas mesmas assente;

TT) Este entendimento está, de resto, em consonância com a definição jurídica avançada no próprio Acórdão Fundamento para a hipótese de ser o município, e não o Estado, o titular do serviço (hipótese que o Tribunal afastou mercê do seu pecado original);

UU) É, aliás, esse o quadro geral que se encontra, desde 2009, densificado no DL nº194/2009, de 20.08;

VV) É certo que o Município tem assumido a gestão desse serviço: faz a recolha dos efluentes em baixa, usando para tanto as redes e infra-estruturas sua propriedade e cuja gestão é da sua responsabilidade e encaminha-os para o sistema gerido pela AdSA (que não abrange, como decorre da lei, as redes em baixa);

WW) Mas, poderia, também, ter optado por outro dos quatro modelos de gestão de sistemas municipais de água e saneamento previstos no DL nº194/2009, de 20.08 (para além da gestão directa, ali se prevê a gestão delegada em parceria pública, a gestão delegada em empresa local ou a gestão concessionada a empresa privada), mas a verdade, que se saiba, é que não optou; e nem veio nos autos dizer que atribuiu a outra entidade a gestão do serviço;

XX) Simplesmente diz que é a AdSA, escudando-se no contrato de concessão, o qual, como se viu, não abrange, nem podia abranger o segmento do saneamento em baixa em VNSA;

YY) Nem o DL nº171/2001 o permite, nem o contrato de concessão coerentemente o prevê, nem o Município de Santiago do Cacém sequer alegou, ou demonstrou, ter celebrado com a AdSA um qualquer contrato de parceria pública - seria este o único modelo pelo qual a lei permitiria ao município de Santiago do Cacém atribuir à AdSA a gestão daquele serviço público, ao abrigo do DL nº194/2009, de 20.08, conjugado com o DL nº90/2009, de 09.04 -, para que esta fosse a entidade gestora do sistema municipal em causa (isto é, do sistema municipal de saneamento em baixa de VNSA);

ZZ) Se a rede em baixa está fora do sistema gerido pela AdSA, é evidente, portanto, que é o município o titular desse serviço e, segundo emerge dos autos, de quanto é alegado pelo Município, não atribuiu ele a gestão desse serviço a outra entidade (limitando-se a dizer que é a AdSA quem tem essa responsabilidade), pelo que tem de concluir-se, em face dos autos, que ocorre uma gestão directa do serviço pelo Município;

AAA) É, pois, inevitável concluir-se que é o Município que injecta na rede que integra o sistema gerido pela AdSA os efluentes por si recolhidos juntos dos munícipes. E, ao injectá-los, o Município transfere para terceiro uma responsabilidade que, não fora a existência do sistema (em alta) titulado pelo Estado e gerido pela AdSA, seria sua (ao abrigo justamente das suas atribuições em matéria de ambiente e saneamento básico);

BBB) A ADSA intervém a jusante desse serviço de recolha que é prestado pelo Município. Isto é, após essa recolha e estando já as águas residuais na rede municipal, a ADSA, através de um ponto de recolha seu que existe em VNSA recebe as águas residuais que provêm da rede municipal e transporta-as para tratamento na sua ETAR, a ETAR de Ribeira de Moinhos;

CCC. É precisamente esta realidade, indesmentível, que não é assumida no Acórdão Fundamento, antes nele se alterando a realidade dos factos, os quais, aliás, ficaram processualmente firmados desde a 1ª instância;

DDD) É o Município quem recolhe as águas residuais juntos dos seus munícipes, e de que é a rede municipal de saneamento que injecta na rede da AdSA, no designado ponto de recolha, tais águas residuais após estas terem sido recolhidas pelo Município junto dos seus munícipes;

EEE) Neste quadro, a decisão de considerar que não está provado que o Réu fosse ou seja beneficiário ou utilizador dos serviços da autora está, pois, em manifesta oposição com os factos acabados de enunciar e com o DL nº115/89 e com o DL nº171/2001, diplomas legais em que assenta toda a arquitectura do sistema gerido pela AdSA e a delimitação da actividade que, nos termos da lei e do contrato de concessão, lhe foi cometida;

FFF) Se o Município encaminha os efluentes que recolhe dos seus munícipes, através da sua rede municipal, para a rede gerida pela Autora, através do ponto de recolha localizado em VNSA, não se vê como possa dizer-se que não há um acordo de vontades tácito e que não há sequer uma relação contratual sem forma escrita;

GGG) É claro que, ao mandar - ou, pelo menos, ao saber que eles para lá afluem, sem nada fazer para o impedir - os seus efluentes para tratamento e destino final pela AdSA, o município está a aceitar tacitamente que a AdSA lhe preste aqueles serviços (não desconhecendo igualmente o regime tarifário a que está sujeita a prestação de tais serviços);

HHH) Tendo em conta o descrito enquadramento, o facto de o município ter devolvido as facturas não pode ter outro significado que não o de patentear que o município não quer pagar as facturas e/ou entende não ser delas devedor, mas essa conduta não pode relevar para a aplicação do direito aos factos e para a determinação pelo Tribunal se assim é, ou não;

III) Se assim fosse, estaria, de resto, encontrada a fórmula mágica para os devedores se livrarem dos seus débitos;

JJJ) É que é isso mesmo que brocado latino protestatio facto contraria nihil relevat reconhece: a adopção de determinado sentido negocial expresso através de declarações de protesto ou recusa de aceitação de determinada realidade não pode surtir qualquer efeito se, no plano das actuações adoptadas, o agente revelar uma postura contraditória;

KKK) Neste estádio das presentes alegações, estão já reunidos os dados que permitem, com grande facilidade, compreender a irrelevância da qualificação jurídica do sistema de Santo André, à luz do binário sistema municipal/sistema multimunicipal;

LLL) Mas é ainda relevante notar - o que mais reforça o carácter decisivo do pecado original para o sentido decisório que ficou plasmado no Acórdão Fundamento - que o Acórdão Fundamento, ao teorizar sobre o regime jurídico dos sistemas multimunicipais, assinala (bem), na página 12, que os municípios são aí «(...) utilizadores do sistema ´em alta` tendo que pagar um preço pelos serviços que lhe são prestados (...)»;

MMM) Para além de não relevar, portanto, para a correta decisão do litígio, tal questão não releva igualmente para efeitos do presente recurso, isto é, no plano da oposição de julgados, uma vez que o Acórdão Recorrido não se pronuncia directamente sobre essa natureza do sistema gerido pela AdSA nem a decisão subjacente ao mesmo assenta, ou estaria sequer dela logicamente dependente, nessa qualificação;

NNN) De qualquer forma, tenha-se em mente que o conceito de sistema multimunicipal vertido na Lei de Delimitação de Sectores (Lei 46/77, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº372/93 exige que (i) o sistema sirva, pelo menos, dois municípios (justamente, os municípios de Sines e de Santiago do Cacém), a (ii) exija investimentos do Estado;

OOO) A esta luz, é o próprio DL de 2001, quando atribuiu a gestão e exploração do Sistema à AdSA (isto é, com o DL nº171/2001, de 25.05), quem, no preâmbulo, reconheceu a natureza multimunicipal do sistema, ao dizer que o mesmo «(...) serve parcialmente os municípios de Santiago do Cacém e Sines, resultou de um investimento efectuado pelo Estado em função de razões de interesse nacional e foi objecto de decreto-lei»;

PPP) Em segundo lugar, o argumento do Acórdão Fundamento segundo o qual não há uma separação entre sistema em alta e sistema em baixa é, como já se viu, erróneo. Se é certo que o sistema abrange a alta e a baixa no que toca ao abastecimento de água, o mesmo não sucede a respeito do saneamento (emerge aqui o pecado original);

QQQ) Mas é conveniente registar, em qualquer caso, que o âmbito de actividades cobertas pelo sistema municipal (se a alta, se a baixa) não integra os requisitos legalmente estabelecidos para a definição de um sistema multimunicipal. De facto, à luz da Lei de Delimitação de Sectores, nada impede que um sistema multimunicipal abranja a actividade em baixa;

RRR) O erro sobre os respectivos pressupostos em que assenta o Acórdão Fundamento - o pecado original - está igualmente presente nos dois votos de vencido dos Senhores Conselheiros António Bento São Pedro e Maria Benedita Urbano (Relatora do Acórdão Fundamento) apostos no Acórdão Recorrido (ambos por remissão);

SSS) Também nestes dois votos de vencido se entende que o sistema gerido pela AdSA integra o sistema em baixa de Vila Nova de Santo André - e este é o pressuposto errado que inquina todo o raciocínio subsequente - concluindo-se, nessa base, que é a AdSA quem tem a obrigação de recolher os efluentes domésticos dessa localidade;

TTT) Pese embora exista uma evolução entre o Acórdão Fundamento e os votos de vencido de 4 de maio de 2017, acima referidos, consubstanciado no voto de vencido da Senhora Conselheira Maria Benedita Urbano lê-se, na página 2 da declaração de voto, que “o MSC é desde 2001 o proprietário das redes de drenagem de águas residuais” [leia-se domésticas], o que patenteia, portanto, a sua mudança de posição quanto à propriedade das infra-estruturas relativamente ao Acórdão Recorrido de que foi relatora;

UUU) No entanto, não é desde 2001 que o Município de Santiago do Cacém é proprietário dessas infra-estruturas, mas sim desde a publicação do DL nº115/89. Isto é, aquando da atribuição da concessão do sistema à AdSA (em 2001), já o sistema de Santo André tinha existência e à data dessa atribuição da concessão, já o sistema de Santo André estava delimitado, não incluindo as redes de saneamento em baixa de Santo André, que pertenciam e eram geridas pelo município;

VVV) Apesar desse reconhecimento sobre a propriedade das infra-estruturas, o voto de vencido persiste num raciocínio errado, posição esta que, com aquele pressuposto, se torna ainda mais incompreensível;

WWW) Continua a asseverar-se que é a AdSA quem presta todos os serviços de saneamento em baixa em Vila Nova de Santo André, ignorando que o título habilitante da AdSA para a exercer essa actividade - o DL nº177/2001 e o contrato de concessão - restringe o objecto da concessão ao Sistema de Santo André, que é, como se explicita no artigo 1.º deste diploma legal, o sistema transferido para o Estado pelo DL nº115/89 (e que não abrange, como se viu, as redes de saneamento em baixa de Santo André);

XXX) E este é, como se sabe já, o ponto nevrálgico do equívoco do Acórdão Fundamento e destes votos de vencido (e em que não incorre o Acórdão Recorrido);

YYY) Por outro lado, o raciocínio em causa no voto de vencido labora numa nítida inversão lógica, partindo de circunstâncias laterais e acessórias para a definição do principal;

ZZZ) Ao contrário de toda a arquitectura do Acórdão Fundamento Recorrido e do voto de vencido, o conceito de sistema multimunicipal (e a lógica associada a este) não está no centro (ou na base) dos presentes autos, como já se disse nestas alegações; não releva, com efeito, a classificação e o nomen iuris que se dê ao sistema gerido pela AdSA;

AAAA) Não é decisivo saber o Sistema gerido pela AdSA é um sistema multimunicipal; essencial é saber que direitos e obrigações se inscrevem na esfera jurídica da AdSA e, paralelamente, se, no outro pólo da relação jurídica estabelecida, existe um sistema municipal (isto é, atribuições municipais para a prestação do serviço público de efluentes);

BBBB) E se este sistema municipal existe, ainda que apenas limitado à baixa do saneamento; e, existindo [logo, desde o DL nº115/89], com as responsabilidades municipais inerentes, o que importa é que a AdSA (operando, por força da lei, apenas no saneamento em alta) presta um serviço ao Município, que esse serviço tem um preço que o município insiste em não pagar;

CCCC) É verdade que a responsabilidade pelo serviço em baixa poderia, em teoria, ser da AdSA e esta não ser proprietária das infra-estruturas afectas a esse serviço, que poderiam ser do Município;

DDDD) Mas essa é uma tese que, no caso em apreço não tem, como demonstrado, aderência à realidade, é negada pela lei, não é isso que ocorre, pelo que ponderá-la conduz a um trajeto errático e infrutífero;

EEEE) Sendo o serviço municipal, para que a AdSA fosse por ele responsável, teria tal responsabilidade que ter-lhe sido atribuída pelo Município;

FFFF) Não consta provado nos autos, nem sequer alegado, que ato do Município de Santiago do Cacém atribuiu à AdSA a responsabilidade pelo serviço do saneamento em baixa em V. N. de Santo André - o contrato de concessão e o DL 171/2001 não foram seguramente, porque, como ficou demonstrado, o objecto destes limita-se ao sistema de Santo André, o qual não inclui aquelas redes de saneamento em baixa;

GGGG) Por outro lado, o Município devolve as facturas à AdSA porque não quer pagar um serviço que, antes da opção pelo Estado pelo modelo concessório (à AdSA), o município não pagava, pretendendo, portanto, prolongar uma situação a que confortavelmente se habitou, mas que não tem, no modelo actual, respaldo jurídico;

HHHH) Não é, nem pode ser, o facto de o município devolver as facturas que vai determinar se as mesmas são ou não devidas;

IIII) As diferenças entre a situação do Municípios de Sines e de Santiago do Cacém em face da AdSA e à luz do quadro jurídico aplicável são perfeitamente irrelevantes para a resolução dos litígios;

JJJJ) O enquadramento jurídico aplicável e a actividade a que se referem os serviços em dívida são exactamente os mesmos;

KKKK) O Município de Sines, à semelhança do Município de Santiago de Cacém, é servido pelo sistema gerido pela ADSA [ver artigo 1º do DL nº171/2001, de 25 de maio];

LLLL) O enquadramento jurídico relevante é o mesmo, com destaque quer para o DL nº171/2001, de 25.05, quer para o Contrato de Concessão celebrado entre o Estado e a ADSA, assinado em 27.12.2011;

MMMM) A diferença reside no facto de, no município de Santiago do Cacém, a AdSA faz o abastecimento de água em alta e em baixa a V. N. de Santo André e presta também os serviços de saneamento em alta a VNSA, ao passo que...

NNNN) No município de Sines, a AdSA abastece água em alta apenas a pedido do Município (que tem captações próprias) e opera ainda o saneamento em alta;

OOOO) Mas, o que importa para os litígios em jogo é que, em ambas os municípios, em parte do respectivo território, a AdSA opera o saneamento em alta e, em causa, nos vários processos, num e noutro Município, está o pagamento das facturas relativas aos serviços de saneamento em alta;

PPPP) O facto de o Município de Sines assegurar o abastecimento de água em baixa - e tal não suceder com o município de Santiago do Cacém - é irrelevante para a questão jurídica em causa;

QQQQ) O facto de o Município de Sines ter, em tempos, formalizado um contrato com a AdSA - e o mesmo não ter sucedido com o Município de Santiago do Cacém - também não altera a substância do enquadramento jurídico aplicável à AdSA e à sua relação com as entidades beneficiárias dos seus serviços;

RRRR) E o mesmo se diga acerca da não devolução das faturas, no caso do Município de Sines. Vale, aqui, quanto, a respeito da relevância da devolução as faturas pelo Município de Santiago do Cacém, acima se escreveu;

SSSS) Não é, nem poderia ser, tal actuação, que altera a substância das coisas: a configuração do Sistema, a prestação dos serviços pela AdSA e o direito aplicável;

TTTT) Não fora o pecado original - o desacerto de considerar que o sistema gerido pela AdSA inclui a gestão do saneamento em baixa -, a decisão contida no Acórdão Fundamento não podia deixar de ser outra, pois estaria aquele Tribunal adstrito a considerar, atento o prisma que anuncia - isto é, o de que a qualificação de utilizador do sistema depende de quem é responsável pelo sistema ‘em baixa’ - que o Município é o beneficiário directo dos serviços de recolha, tratamento e rejeição de efluentes domésticos prestados pela ADSA, sendo devedor dos montantes peticionados na Petição Inicial, ainda que o seja tão-só nos termos do nº1 do artigo 289º do CC;

UUUU) Independentemente de se considerar que o sistema é, ou não, multimunicipal, o que importa é que a AdSA presta um serviço ao Município, que esta reconhece e continuadamente mantém e que esse serviço tem um preço que o município insiste em não pagar;

VVVV) As alegações antecedentes deixam bem patente a adesão da AdSA, no essencial, ao entendimento subjacente ao Acórdão Recorrido, contudo, existem dois aspectos em que, tal como anunciado logo a abrir as presentes alegações, a AdSA discorda do decidido no Acórdão Recorrido;

WWWVW) Como decorre de quanto alegado a propósito do desacerto do Acórdão Fundamento, há uma posição de princípio relativamente à qual a AdSA adere ao Acórdão Fundamento e, paralelamente, aos votos de vencido dos conselheiros António Bento São Pedro e Maria Benedita Urbano no Acórdão Recorrido;

XXXX) A AdSA discorda da necessidade de baixa dos autos ao TCA Sul para eliminação da contradição entre a matéria de facto, porquanto, no seu entender, não há qualquer questão de facto que tenha ainda que ser resolvida para que o litígio possa ser decidido por este Supremo Tribunal - concordando, aliás, com a solução de direito definida no Acórdão Recorrido (enquadramento contratual da relação entre a AdsA e o Município, declaração da nulidade do contrato e pagamento das quantias peticionadas ao abrigo do dever de restituição previsto no artigo 289º do Código Civil);

YYYY) O que está em causa é essencialmente matéria de direito, que consiste em saber quem é que tem o dever de recolher os efluentes dos munícipes, que o Supremo Tribunal Administrativo pode e deve conhecer;

ZZZZ) Pois se a AdSA prestou o serviço em alta - como está assente nos autos - e o Município é o titular das infra estruturas e do serviço em baixa, como decorre da lei; e este não demonstrou ou sequer alegou ter transferido para outra entidade, à luz dos modelos de gestão previstos no Decreto-Lei nº194/2009, a responsabilidade pela gestão do serviço de saneamento em baixa; logo, é evidente que o serviço que a AdSA prestou foi prestado ao Município, não havendo que ver se foi a AdSA quem realizou um serviço (saneamento em baixa) para o qual não está sequer habilitada, nem legal nem contratualmente;

AAAAA) Segundo o Acórdão Recorrido, é essencial para a boa decisão da causa apurar se foi a AdSA, ou não, quem, de facto, realizou os serviços de saneamento em baixa em VNSA;

BBBBB) A manter-se a decisão do Acórdão Recorrido, o mesmo enferma de uma incorreção que não pode deixar de ser corrigida;

CCCCC) É que, na definição de direito aplicável, o Acórdão Recorrido incorre num erro quanto à distribuição do ónus da prova;

DDDDD) Se a AdSA nada tem a apontar quanto à solução de direito encontrada, em si mesma, e constante aliás de abundante jurisprudência desse STA que o próprio Acórdão Recorrido cita - enquadramento contratual da relação entre as partes, declaração da nulidade do contrato e dever de restituição ao abrigo do artigo 289º do Código Civil - já o mesmo não pode dizer-se quanto ao modo como esse Supremo Tribunal distribui o ónus da prova, vinculando nessa medida o TCA SUL;

EEEEE) O Acórdão Recorrido atribui à AdSA (Autora) o ónus de provar que foi o município quem realizou a captação domiciliária dos efluentes e os encaminhou até à rede em alta gerida pela AdSA;

FFFFF) É a AdSA quem tem de o provar e, caso não consiga fazer essa prova (isto é, se não se provar aquela realidade, não se provando igualmente o seu contrário (“non liquet” probatório), é sobre a AdSA que recaem as consequências desfavoráveis da frustração da prova (isto é, a acção é declarada improcedente);

GGGGG) Uma tal distribuição do ónus da prova viola, porém, o disposto no artigo 342.° do Código Civil e deve, por isso, ser alterada;

HHHHH) A regra basilar da distribuição do ónus da prova subjectivo é a de que “àquele que invoca um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado” (nº1 do artigo 342º do CC);

IIII) Já “a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita”, isto é, o réu, assim se estabelecendo no número seguinte do mesmo artigo do Código Civil;

JJJJJ) Assim sendo, os factos constitutivos do direito da Autora, aqui a AdSA, são os factos que se traduzem na prestação do serviço em alta, que a AdSA logrou provar e não é sequer discutido nos autos;

KKKKK) E ao Réu, o Município, cabe provar os factos impeditivos do direito da Autora, como é o caso de não ser ele, Município, quem opera o serviço em baixa, mas sim uma terceira entidade;

LLLLL) Portanto, postas as coisas no seu devido lugar, à Autora nada mais cabe provar, sendo ao Réu que cabe fazer a prova de que não é ele quem opera o serviço, não sendo, por isso, o devedor do serviço prestado pela AdSA;

MMMMM) Se o provar, a acção improcede. Se não fizer essa prova - seja por se gerar apenas a dúvida a tal respeito (“non liquet”), seja por se ter provado o contrário (isto é, que foi ele quem que realizou o serviço em baixa - então, a acção procede e é o Município quem sofre as consequências negativas de não ter logrado provar o facto impeditivo do direito da Autora;

NNNNN) Esta aplicação do regime do ónus da prova previsto no artigo 342.° do Código Civil revela cruamente a inversão que cometeu o Acórdão Recorrido pondo a nu que o resultado dessa inversão é fazer recair erradamente, na Autora o ónus de provar, além dos factos constitutivos do seu direito (que provou), ainda a não verificação dos factos impeditivos do direito do Réu;

OOOO) Em última análise, este erro tem como efeito deixar o Réu afinal livre de qualquer ónus probatório e concentrado, em contra exercício, na tarefa de combater a produção da prova que compete à Autora;

PPPPP) A realização do serviço em baixa por outra entidade que não o Réu é um facto impeditivo do direito da Autora - e não um facto constitutivo do direito da Autora AdSA;

QQQQQ) É o que decorre do designado critério da normalidade de que nos falam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, no Código Civil Anotado (volume 1, 4.ª edição, página306, em anotação ao artigo 342.° do Código Civil), o qual tem de ser perspectivado em função do direito e pretensão em causa;

RRRRR) A adopção do aludido critério da normalidade conduz, precisamente, no caso concreto em apreço, a considerar a prova de que não é o município quem faz a recolha e o encaminhamento dos resíduos da rede em baixa constitui um facto impeditivo do direito da Autora;

SSSSS) É que, bem vistas as coisas, essa realidade - não ser o município a fazer o serviço em jogo - é que é anormal. Pois se (i) as redes de saneamento em baixa são sua propriedade, como decorre do já mencionado Decreto-Lei nº115/89, e se (ii) o município é também, nos termos da legislado já supra sobejamente explicitada, o titular do serviço público de saneamento em baixa, o normal é que seja ele a prestá-lo, tendo, portanto, de caber-lhe a demonstração de que a responsabilidade pela gestão do serviço de que é titular foi transferida (a gestão) para outra entidade e qual (sendo esta a realidade anormal);

TTTTT) A idêntica conclusão se chega se se pensar que quanto aos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, pois como defende MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, As Partes, O Objecto e a Prova na Acção Declarativa, Lex, 1995, página 221) «(...) é que não seria aceitável que recaísse sobre a parte que invoca uma situação jurídica o ónus de provar não só que estão preenchidos todos os seus elementos constitutivos, mas também que não se verificam nenhuns factos impeditivos, modificativos ou extintivos»;

UUUUU) Ora, como se viu, é justamente a esse resultado, reputado inaceitável pelo citado Ilustre processualista, que o erro constante do Acórdão Recorrido conduz - o que determina, portanto, a necessidade da sua correcção.»

Termina pedindo que deverá (i) reconhecer-se o erro de julgamento do acórdão fundamento; (ii) confirmar-se o entendimento vertido no acórdão recorrido; (iii) fixar-se jurisprudência neste sentido - salvo no que diz respeito à necessidade de eliminação de contradição entre matéria de facto, pois entende-se que a matéria constante dos autos permite dirimir o litígio de imediato - condenando o Município de Santiago do Cacém no pedido.

3. O Ministério Público não se pronunciou [artigo 146º, nº1, do CPTA].

4. Colhidos os «vistos» legais, cumpre apreciar e decidir sobre a admissibilidade do recurso, e, caso afirmativo, sobre o seu mérito.

II. De Facto

I) O acórdão recorrido deu como assente a seguinte factualidade:

A) Em 25.05.2001, foi constituída a sociedade ÁGUAS DE SANTO ANDRÉ S.A. - AdSA, ora A., sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e concessionária, em regime de exclusivo, da concessão da exploração e gestão do sistema de abastecimento de água, de saneamento e de resíduos sólidos de Santo André - Sistema - ver DL nº171/200 de 25 de Maio;

B) O referido sistema serve parcialmente os Municípios de SANTIAGO DO CACÉM e de SINES: por acordo;

C) Esta exploração e gestão compreendem a concepção, a construção das obras e equipamentos, bem como a sua exploração, reparação, renovação e manutenção do Sistema concessionado: por acordo;

D) Em 27.12.2001, o Estado Português, na qualidade de primeiro outorgante e a AdSA, na qualidade de segundo outorgante, outorgaram o contrato de concessão, no qual acordaram os termos e as condições da exploração e gestão do Sistema acima referido: ver contrato de concessão junto por CD de fls. 133 e 134 dos autos;

E) O Estado Português concessionou à A. todo o sistema em funcionamento nos moldes em que o próprio Estado o vinha exercendo, através do INSTITUTO DA ÁGUA - INAG: por acordo;

F) Transferindo para o património da A. todos os bens e direitos que integrou na Concessão, nomeadamente, a propriedade dos imóveis, infra-estruturas e equipamentos que constituem os sistemas de saneamento básico da cidade de V.N.S.A., com excepção das redes de esgotos que foram transmitidos para a Câmara Municipal de Santiago do Cacém - CMSC: ver Doc. 1 junto com a pi; DL n° 115/89 de 14/4 e DL n° 171/2001, 2001, de 25/05;

G) Até então o Estado, através da Direcção Geral de Recursos Naturais INAG, geriu esse sistema, fornecendo água e recolhendo e tratando os efluentes domésticos aos residentes na cidade de V.N.S.A., nunca tendo facturado com o município aqui R., não tendo a autarquia pago fosse o que fosse, a qualquer título por aquela gestão, e mais concretamente pela recolha e tratamento de efluentes domésticos de VNSA: por acordo;

H) A água é captada, tratada, distribuída, utilizada e uma vez utilizada é recolhida, tratada, e rejeitada numa parte, que constitui o efluente doméstico, competindo à A. proceder aos diversos actos desse ciclo da água que, posteriormente, cobra as respectivas contrapartidas aos utentes: por acordo;

I) Este sistema tem o seu início no Concelho de Santiago do Cacém, na cidade de VNSA onde existe um Ponto de Recolha: por acordo;

J) No Ponto de Recolha de VNSA procede-se à recolha da rede de esgotos de Vila Nova de Santo André, de Brescos, de Foros da Quinta e de Giz: por acordo;

K) O Ponto de Recolha de Brescos recebe os efluentes domésticos gerados por cerca de 1200 habitantes: por acordo;

L) O Ponto de Recolha de Giz recebe os efluentes domésticos gerados por cerca de 500 habitantes: por acordo;

M) Os efluentes domésticos provenientes do Ponto de Recolha de VNSA são recepcionados numa Estação Elevatória e, posteriormente, reenviados para tratamento na ETAR de Ribeira de Moinhos: por acordo;

N) Estes efluentes recepcionados nos dois locais referidos - a totalidade do ponto de recepção de VNSA - são tratados na mencionada ETAR Ribeira de Moinhos: por acordo;

O) Estes efluentes domésticos, após tratamento adequado, são rejeitados no meio hídrico receptor - o mar - por meio de um emissário submarino, com cerca de 2500 metros de extensão, destino final este adequado e devidamente autorizado e licenciado: por acordo;

P) Caudalímetros são instrumentos de medida volumétrica e destinam se, essencialmente, a registar com precisão as quantidades de efluentes canalizados por cada um dos pontos de entrega para o sistema de recolha, quantidades sobre que, após medição mensal, incidem as tarifas aprovadas: por acordo;

Q) Estas infra-estruturas de recolha e posterior tratamento e rejeição de efluentes domésticos no meio hídrico são propriedade e da responsabilidade da A. desde a recepção até ao adequado destino final: por acordo;

R) Para o ano de 2009, as tarifas foram aprovadas por despacho do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território - MAOP: ver folhas 133 e 134;

S) As facturas infra melhor identificas foram emitidas pela A.: por acordo;

T) O R. devolveu as referidas facturas sem liquidar o respectivo valor e com a menção «...consideramos não sermos devedores...» - ver Doc. N°3 e n°8 juntos com a PI;

U) Factura nº4130384805, com data de emissão em 30.11.2010 e vencimento em 29.01.2010, no valor de 22.269,20€ (vinte e dois mil, duzentos e sessenta e nove euros e vinte cêntimos), com a quantidade e 50.226m3: ver Doc. 3 junto com a PI;

V) Factura nº4130384872, com data de emissão em 31.12.2010 e vencimento em 01.03./2010, no valor de 20.317,45€ (vinte mil, trezentos e dezassete euros e quarenta e cinco cêntimos), com a quantidade e 45.824m3: ver Doc. 4 junto com a P1;

W) A factura nº4130384939, com data de emissão em 29.01.2010 e vencimento em 30.03.2010, no valor de 24.440,30€ (vinte e quatro mil, quatrocentos e quarenta euros e trinta cêntimos), com a quantidade de 55.122,700m3: ver Doc. 5 junto com a P1;

X) Em 26.02.2010 foi emitida a nota de crédito nº4130510154, no valor de 840,91€ (oitocentos e quarenta euros e noventa cêntimos), correspondente ao acerto da Taxa de Recursos Hidrícos - TRH durante o ano de 2009: ver Doc. n° 6 junto com a PI;

Y) A factura nº4130385001, com data de emissão em 26.02.2010 e vencimento em 27.04.2010, no valor de 23.687,38€ (vinte e três mil, seiscentos e oitenta e sete euros e trinta e oito cêntimos), com a quantidade de 53.256,400m3: ver Doc. 7 junto com a PI;

Z) A factura n° 4130385072, com data de emissão em 31/03/2010 e vencimento em 30/05/2010, no valor de €35.418,63 (trinta e cinco mil, quatrocentos e dezoito euros e sessenta e três cêntimos), com a quantidade de 79.631,800m3: cfr. Doc. 8 junto com a PI;

AA) Além disso, apesar de várias insistências para a celebração de um contrato de recolha e tratamento de efluentes domésticos da cidade de Vila Nova de Santo André com o Município R., e de inúmeras reuniões nesse sentido, até hoje este nunca aceitou outorgar qualquer acordo ou contrato de recolha e tratamento de efluentes domésticos: por acordo;

BB) O R. não cobra aos seus munícipes o saneamento básico da cidade de Vila Nova de Santo André: por acordo;

CC) No plano dos factos, “utilizadores”, ou clientes, são os “residentes”, individuais ou colectivos - e, no caso, também os serviços do Município - que utilizem os serviços de recolha, tratamento e destino final de efluentes domésticos, a quem a A. fornece a água e recolhe os efluentes, que trata e aos quais dá destino: cfr. resulta dos depoimentos das Testemunhas …………; …………; ………..; ……….; ……….. e ……………; art. 1° BI;

DD) A A. não tem contrato com os Munícipes quanto ao saneamento, tendo, contudo, contrato com cerca de 5600 clientes na cidade de V.N.S.A., quanto à água para consumo humano que fornece - resulta do depoimento da Testemunha ………….. e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 2° BI;

EE) A A. despende quantias com a recolha, tratamento e rejeição dos efluentes domésticos provenientes os Munícipes de VNSA.: cfr. resulta do depoimento da Testemunha …………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 3° BI;

FF) As tarifas devidas, além dos custos directos visam assegurar de forma regular, contínua e eficiente a recolha a todos os utilizadores bem como o bom estado de funcionamento, a conservação, a segurança de todos os bens afectos à concessão: cfr. resulta do depoimento da Testemunha …………. e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 4° BI;

GG) A falta de pagamento das tarifas referentes às recolhas atempadamente efectuadas onera a A.: cfr. resulta do depoimento da Testemunha ………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 5° BI;

HH) O R. não foi chamado a intervir, nem por qualquer meio, interveio nas negociações que tiveram por conclusão o contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e a A.: cfr. depoimentos das testemunhas …………. e …………; art° 6° BI;

II) Nem nunca esse contrato foi normalmente comunicado ao R., cujo teor integral só chegou ao seu conhecimento, por mero acaso: cfr. depoimento da Testemunha …………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 7° BI;

JJ) A A. usa, sem acordo ou autorização expressa do Município R., e sem lhe pagar qualquer contrapartida, a rede de esgotos que é propriedade da autarquia, para a condução dos efluentes que recolhe e trata e dá destino: cfr. prova testemunhal no seu conjunto e seu confronto com a prova documental; art. 8.º BI;

KK) É o Município R. que procede à reparação e conservação da rede de esgotos (suportando, assim, os correspondentes custos): cfr. Depoimentos das Testemunhas …………., …………., ……………; art. 9° BI;

LL) A A. factura os serviços de recolha em alta e tratamento de efluentes domésticos que presta aos utentes/clientes de VNSA - cfr. resulta do depoimento da Testemunha ………….. e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 10º BI;

MM) A A. não presta quaisquer serviços de recolha e tratamento de efluentes em baixa ao Município R., a cidade de VMSA: cfr. depoimentos da Testemunha ………….. e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 11º BI;

NN) A recepção nas condutas, o tratamento e a rejeição de efluentes domésticos tem como utilizadores do Sistema os Municípios de Santiago do Cacém e de Sines: cfr. depoimentos da Testemunha ………… e ………….; art. 13º BI;

OO) Relativamente aos lugares de Brescos e Giz é o R. Município que explora e gere o abastecimento de água aos ali residentes: cfr. resulta do depoimento da Testemunha …………. e da Testemunha …………..; art. 14° BI;

PP) O Ponto de Recolha de Foros da Quinta recebe os efluentes gerados por cerca de 600 habitantes: depoimentos das Testemunhas …………, ………… e …………..; art. 14° BI;

QQ) Nos locais de recepção, os efluentes domésticos provenientes da recolha em “Baixa” pelo Município e entregues nos locais de recepção, são sujeitos a um método de controlo e medição do caudal, por meio de caudalímetros: cfr. resulta dos depoimentos das Testemunhas …………. e …………..; art. 16° BI;

RR) No exercício da referida concessão, o A. prestou ao Município R., serviços que respeitam à recepção, tratamento e rejeição de efluentes domésticos em alta aos munícipes (individuais e colectivos, serviços municipais incluídos) de VNSA - cfr. prova testemunhal e documental produzida; art. 17° BI;

SS) O R. Município utiliza o sistema de saneamento básico da A., na cidade de V.N.S.A., sendo que um sistema (rede em baixa do R.) não funciona sem o outro (rede em alta do A.): cfr. prova testemunhal e documental produzida; art. 18º BI;

TT) Os efluentes domésticos, também denominados por águas residuais urbanas, são canalizados pela rede em “Baixa”, na rede municipal de recolha e o seu encaminhamento para o sistema concessionado à A., para tratamento na E.T.A.R. de Ribeira de Moinhos: ver prova testemunhal e documental produzida; art. 20º BI;

UU) O R. suporta todos os custos inerentes à reparação, manutenção e conservação da rede de esgotos de VNSA que a A. utiliza, sem qualquer contrapartida: ver prova testemunhal e documental produzida; art. 21° BI;

VV) E sem que, expressamente, tenha sido, para tal, autorizada – ver depoimento da Testemunha ……………; art. 22° BI.

II) O acórdão fundamento deu como assente a seguinte factualidade:

A) Em 25.05.2001, foi constituída a sociedade Águas de Santo André S.A. - AdSA, ora A, sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e concessionária, em regime de exclusivo, da concessão da exploração e gestão do sistema de abastecimento de água, de saneamento e de resíduos sólidos de Santo André - Sistema: cfr. DL. N.º 171/2001, de 25 de Maio;

B) O referido sistema serve parcialmente os Municípios de SANTIAGO DO CACÉM e de SINES: por acordo;

C) Esta exploração e gestão compreendem a concepção, a construção das obras e equipamentos, bem como a sua exploração, reparação, renovação e manutenção do Sistema concessionado: por acordo;

D) Em 2001-12-27, o Estado Português, na qualidade de primeiro outorgante e a AdSA, na qualidade de segundo outorgante, outorgaram o contrato de concessão, no qual acordaram os termos e as condições da exploração e gestão do Sistema acima referido: ver Doc. 1 junto com a Petição Inicial - P.I.;

E) O Estado Português concessionou à A. todo o sistema em funcionamento nos moldes em que o próprio Estado o vinha exercendo, através do INSTITUTO DA ÁGUA - INAG: por acordo;

F) Foram transferidos para a A. o património mobiliário e Imobiliário afecto ao sistema, assim como todos os direitos: por acordo, vide DL. n.º 171/2001, de 25 de Maio, Art.º 12 Nº 2 e cláusula 7ª do Contrato de Concessão;

G) No património acima mencionado incluem-se: a propriedade dos imóveis infraestruturas e equipamentos que constituem o sistema de saneamento básico de Santo André, criado pelo extinto GABINETE DA ÁREA DE SINES - GAS, e posteriormente transferidas para o INAG, com excepção das redes de drenagem de águas residuais domésticas e de águas pluviais do centro urbano da cidade de VNSA: por acordo; vide DL. N.º 171/2001, de 25 de Maio e D.L. N.º 115/1989, de 14 de Abril artº 1 nº 2 al. a) e b);

H) Para o ano de 2012, as tarifas foram aprovadas por despacho da Senhora Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território - MAOT: cfr. Doc. 2 junto com a PI;

I) A água é captada, tratada, distribuída, utilizada e uma vez utilizada é recolhida, tratada e rejeitada numa parte, que constitui o efluente doméstico: por acordo;

J) As águas residuais urbanas, isto é, os efluentes domésticos de VNSA, e outras pequenas localidades do Concelho de Santiago do Cacém, são recolhidas pela rede municipal do Réu MUNICÍPIO DE SANTIAGO DO CACÉM e tratadas na ETAR (Estação de tratamento de águas residuais) de Ribeira de Moinhos, propriedade da AdSA: por acordo;

K) No ponto de recolha de VNSA, procede-se à recolha de rede dos esgotos seguintes: Vila Nova de Santo André (efluentes gerados por cerca de 10.000 habitantes), Brescos, e de Giz: por acordo;

L) Todas as infra-estruturas de transporte, a partir do ponto de recolha, tratamento e rejeição dos efluentes domésticos são propriedade e da responsabilidade da AdSA, a partir da recepção até ao destino final: por acordo;

M) a) A factura nº413 03 87157, com a data de emissão de 31.10.2012 e vencimento em 30.12.2012, no valor de 6.680,81€ (seis mil, seiscentos e oitenta euros e oitenta e um cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 14.282 m3, DOC. Nº3;

N) b) A factura nº41303 87223, com a data de emissão de 30.11.2012 e vencimento em 29.01.2013, no valor de 20.548,38€ (vinte mil, quinhentos e quarenta e oito euros e trinta e oito cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 48.270 m3. DOC. Nº4;

O) c) A factura nº4130387254, com a data de emissão de 01.12.2012 e vencimento em 30.01.2013, no valor de 2.031,26€ (dois mil, trinta e um euros e vinte seis cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 48.269 m3, DOC. Nº5;

P) d) A factura nº4130387290, com a data de emissão de 31.12.2012 e vencimento em 01.03.2013, no valor de 25.512,14€ (vinte e cinco mil, quinhentos e doze euros e catorze cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 54.539 m3, DOC. Nº6;

Q) e) A factura nº4130387363, com a data de emissão de 31.01.2013 e vencimento em 01.04.2013, no valor de 26.526,76€ (vinte seis mil, quinhentos e vinte seis euros e setenta e seis cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 56.708 m3, DOC. Nº7;

R) f) A factura nº4130387431, com a data de emissão de 28.02.2013 e vencimento em 29.04.2013, no valor de 21.639,55€ (vinte e um mil, seiscentos e trinta e nove euros e cinquenta e cinco cêntimos), referente a efluentes domésticos recepcionados no Sistema e provenientes daquele Município com o volume de 46.769 m3, DOC. Nº8;

S) Até à presente data o R. não pagou o valor das facturas acima melhor identificadas, devolvendo-as sistematicamente ao A: por acordo;

T) O R. não cobra aos seus munícipes o saneamento básico da cidade VNSA: por acordo;

U) Os «utilizadores» dos serviços de recolha, tratamento e destino final de efluentes domésticos, são os munícipes da Cidade de VNSA: por acordo;

V) A A. recebe, trata e dá destino final aos efluentes domésticos provenientes dos residentes na cidade de V.N.S.A: cfr. resulta do confronto entre toda a prova testemunhal e documental produzida; art. 3º da Base Instrutória - BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

W) A A. não tem contrato com os Munícipes quanto ao saneamento, tendo, contudo, contrato com cerca de 5600 clientes na cidade de VNSA quanto à água para consumo humano: cfr. resulta do depoimento da Testemunha ………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 4º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o nº 215/09BEBJA;

X) O sistema de efluentes domésticos de VNSA inicia-se no Concelho de Santiago do Cacém, na cidade de VNSA, existindo para o efeito aí um ponto de recolha da A: confronto entre toda a prova testemunhal e documental produzida; artigo 5º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

Y) O R. encaminha os efluentes domésticos provenientes da cidade de VNSA recebidos em "Baixa" na rede municipal de recolha para o sistema concessionado à A.: cfr. confronto entre toda a prova testemunhal e documental produzida; art. 6º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

Z) A A. sempre recebeu e tratou na ETAR de Ribeira de Moinhos os efluentes domésticos, procedendo à sua adequada rejeição: cfr. confronto entre toda a prova testemunhal e documental produzida; art. 7º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

AA) O R. não foi chamado a intervir, nem, por qualquer meio, interveio nas negociações que tiveram por conclusão o contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e a A.: cfr. resulta do depoimento das Testemunhas ……….. e ……. ………… e confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 8º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

BB) Nem nunca esse contrato foi formalmente comunicado ao R., cujo teor integral só chegou ao seu conhecimento, por mero acaso: cfr. resulta do depoimento da Testemunha ………… e confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 9º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

CC) A A., fornece, em exclusivo, água aos residentes na cidade de V.N.SA: cfr. resulta do depoimento das Testemunhas ………….. e ………….; art. 10º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

DD) Até à criação da A., o Estado Português, através da Direcção Geral de Recursos Naturais e depois INAG (Instituto Nacional da Água), geriu esse sistema, fornecendo água e recolhendo e tratando os efluentes domésticos aos residentes na cidade de V.N.S.A.: cfr. depoimento das Testemunhas …………. e ………… e ainda do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 11º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

EE) E nunca cobrou ou facturou ao Município R, e nunca a autarquia pagou fosse o que fosse, a qualquer título, por aquela gestão, e mais concretamente pela recolha e tratamento de efluentes domésticos de V.N.S.A.: cfr. depoimento das Testemunhas …………… e ………….. e ainda do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; art. 12º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

FF) A A. usa, sem acordo ou autorização expressa do Município R., e sem lhe pagar qualquer contrapartida, a rede de esgotos que é propriedade da autarquia, para a condução dos efluentes que recolhe e trata e dá destino: cfr. prova testemunhal e documental produzida; art. 13º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

GG) É o Município R. que procede à reparação e conservação da rede de esgotos (suportando, assim, os correspondentes custos): resulta do depoimento das Testemunhas …………., …………, …………. e …………….; artigo 14º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o n.º 215/09BEBJA;

HH) A autora factura os serviços de recolha em alta e tratamento de efluentes domésticos que presta aos utentes/clientes de V.N.S.A.: resulta do depoimento da Testemunha …………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; artigo 15º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o nº215/09BEBJA;

II) Nos locais de recepção, os efluentes domésticos provenientes da recolha em "Baixa" pelos municípios e entregues nos locais de recepção, são sujeitos a um método de controlo e medição do caudal, por meio de caudalímetros: resulta dos depoimentos das Testemunhas …………. e …………; artigo 17º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o nº215/09BEBJA;

JJ) A tarifa devida pela recolha, tratamento e destino final de efluentes domésticos é sempre calculada de acordo com a água individualmente fornecida a cada utilizador: resulta do depoimento da Testemunha ………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; artigo 18º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o nº215/09BEBJA;

KK) A água é fornecida pela A. que a cobra, directamente, a cada utilizador o respectivo consumo: ver testemunho de ………… e do confronto com a demais prova testemunhal e documental produzida; artigo 19º da BI do processo que neste Tribunal correu termos sob o nº215/09BEBJA.

E é tudo quanto a matéria de facto provada nos acórdãos em confronto.

III. De Direito

1. Os recursos para uniformização de jurisprudência destinam-se a obter uma orientação jurisprudencial em casos nos quais se verifiquem os «pressupostos» seguintes: a) Existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA, ou deste e do TCA, ou entre acórdãos do TCA; b) Que a contraditoriedade decisória se verifique sobre a mesma questão fundamental de direito; c) Que os arestos em causa - acórdão recorrido e acórdão fundamento - tenham transitado em julgado, e o respectivo recurso tenha sido interposto, no prazo de trinta dias, após o trânsito do acórdão recorrido; d) Que a orientação perfilhada no acórdão recorrido não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada no STA [ver artigo 152º, nº1, nº2, e nº3, do CPTA, na redacção anterior à introduzida pelo DL nº214-G/2015, de 02.10, sendo que é a esta redacção que nos referimos caso nada mais seja dito].

Estes pressupostos são de verificação cumulativa, pelo que a não verificação de um deles conduz à «não admissão do recurso».

2. E, desde logo, há um indispensável requisito para conhecimento do presente recurso para «uniformização de jurisprudência» que não se verifica: - é o supra elencado sob a alínea d).

Efectivamente, a questão tratada nos dois acórdãos postos em confronto, e que o ora recorrente, face à discrepância entre o sentido das respectivas decisões, pretende ver com solução «uniformizada» por este «Pleno», foi já apreciada e decidida por vários acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo.

Na verdade, após a prolação de um primeiro acórdão sobre o tema, e referente às mesmas partes, que foi o acórdão ora invocado como «fundamento» [AC STA de 07.12.2016, Rº0964/16], foram proferidos dois acórdãos, em formação alargada [artigo 148º, nº1, do CPTA], ambos em 04.05.2017 [Rº483/16 e Rº397/16], e num sentido diferente do daquele primeiro, sendo que, em conformidade com esta uniformização, já foram proferidos mais sete acórdãos pela Secção de Contencioso Administrativo [AC STA de 01.06.2017, Rº0444/16; AC STA de 29.06.2017, Rº01205/16; AC STA de 29.06.2017, Rº01148/16; AC STA de 29.06.2017, Rº0963/16; AC STA de 29.06.2017, Rº0717/16; AC STA de 26.10.2017, Rº0964/16; AC STA de 07.12.2017, Rº0717/17].

O julgamento de 04.05.2017, realizado em «formação alargada», foi efectuado, e como dissemos, ao abrigo do nº1 do artigo 148º do CPTA, segundo o qual «o Presidente do Supremo Tribunal Administrativo ou do Tribunal Central Administrativo podem determinar que no julgamento de um recurso intervenham todos os juízes da secção quando tal se revele necessário ou conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência, sendo o quórum de dois terços».

E foi-o na sequência de despacho para o efeito proferido pelo Presidente deste Supremo Tribunal, segundo o qual «[…] atendendo a que, apesar da possível diversidade de pormenores de cada processo que poderão avultar na discussão, está em apreciação a mesma situação da vida jurídico-administrativa, no mesmo quadro jurídico, entre as mesmas partes e com litigiosidade persistente, determino que se proceda ao julgamento ampliado do recurso nos referidos processos, nos termos do artigo 148º, nº1 do CPTA».

Como já foi escrito, a diferença entre haver uma jurisprudência tout court e uma jurisprudência consolidada há-de necessariamente advir de um plus desta última, que cause ou revele uma estabilidade de julgamento; e esse acréscimo detecta-se, sobretudo, por um critério quantitativo, significador de constância decisória, ou seja, do «facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido e obtidas por unanimidade ou por maiorias inquebráveis» [AC STA/Pleno, 18.09.2008, Rº0212/08; e sobre o tema da «jurisprudência consolidada ver, ainda, e entre outros, AC STA/Pleno de 22.01.2009, Rº01212/06; AC STA/Pleno de 14.01.2010, Rº0610/09; AC STA/Pleno de 15.11.2010, Rº0542/12; AC STA/Pleno de 18.11.2010, Rº0355/10; AC STA/Pleno de 18.04.2013, Rº098/13; AC STA/Pleno de 30.10.2013, Rº01183/13; AC STA/Pleno de 11.12.2013, Rº01507/13; AC STA/Pleno de 22.01.2014, Rº01480/13; AC STA/Pleno de 27.03.2014, Rº062/14; AC STA/Pleno de 15.10.2014, Rº0240/14].

Ora, quanto ao tema em apreciação, constatamos que a «jurisprudência» deste STA, mais precisamente da sua Secção Administrativa, se uniformizou a partir dos ditos julgamentos em formação alargada, passando a ser unânime o sentido de decisão dos respectivos litígios, sendo certo que os Juízes Conselheiros que então votaram nesse sentido são os mesmos que permanecem em funções, e que o vêm desde aí observando.

Estamos, assim, perante «jurisprudência consolidada» que, manifestando-se no sentido da solução encontrada pelo acórdão recorrido, obsta, à «admissão do recurso».

IV. Decisão

Nestes termos, decidimos não admitir o presente recurso para uniformização de jurisprudência.

Custas pelo recorrente.

Não carece de publicação.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2018. – José Augusto Araújo Veloso (relator) – Alberto Acácio de Sá Costa Reis – Jorge Artur Madeira dos Santos – António Bento São Pedro – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa – Carlos Luís Medeiros de Carvalho – José Francisco Fonseca da Paz – Ana Paula Soares Leite Martins Portela – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.