Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:096/18
Data do Acordão:06/27/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
Sumário:Não prevendo o ETAF de 2002 a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a divergências jurisprudenciais ocorridas em áreas diferentes do contencioso da jurisdição administrativa e fiscal, não é de admitir, por não se enquadrar no recurso previsto no art. 284.º do CPPT, uma invocada oposição entre acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo e da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA000P23447
Nº do Documento:SA220180627096
Data de Entrada:01/30/2018
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – A…………, SA, vem reclamar para a Conferência do despacho do relator de fls. 253/254 que não lhe admitiu recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do Acórdão deste Tribunal proferido em 22.03.2018, a fls. 183/196 e segs., recurso esse em que invocava oposição entre aquele aresto e o acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 12/5/2016 no âmbito do processo 1669/15, que expressamente indicou como acórdão fundamento e de que juntou cópia a fls. 208-224.

2. É o seguinte o teor despacho reclamado:
«Vem a A............, SA recorrer para o Pleno da secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 22.03.2018 (fls. 183/196) invocando oposição do decidido com acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste STA, proferido em 12/5/2016 no âmbito do processo 1669/15.
Importa antes de mais proceder à verificação dos pressupostos processuais de admissibilidade, prosseguimento e decisão do recurso.
Como é sabido, no que concerne aos recursos jurisdicionais de Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, vigoram os seguintes regimes:

À face do ETAF de 2002, pode recorrer-se de acórdãos proferidos, em primeiro grau de jurisdição pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo para o respectivo Pleno (art. 27º, n.º 1, alínea a), daquele diploma), com excepção dos proferidos em processos de conflitos.
De acordo com o mesmo diploma, nos termos da alínea b) do nº 1 do mesmo art. 27º pode ainda recorrer-se de acórdãos da Secção de Contencioso Tributário para o respectivo Pleno, para uniformização de jurisprudência, com fundamento em oposição entre o acórdão de que se recorre e outro acórdão da mesma Secção ou do respectivo Pleno (art. 152 º, nº 1, alínea b), do CPTA).
Ora, como é bom de ver, no caso presente não se verifica nenhuma daquelas situações, já que nem o Acórdão de fls. 183 e segs. foi proferido em primeiro grau de jurisdição, nem a recorrente invoca oposição de julgados com qualquer acórdão desta Secção de Contencioso Tributário ou do Pleno a demandar uniformização de jurisprudência, invocando, sim, oposição com o decidido em acórdão da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo.
Sucede, porém, que o ETAF de 2002 não prevê qualquer competência para conhecer de recursos por oposição entre acórdãos das secções do contencioso tributário e administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.
Neste sentido, cf. o Ac. do Pleno de 04/06/2014, rec. n.º 142/14 e o Acórdão desta Secção de Contencioso Tributário de 11.04.2018, recurso 9/17, bem como a demais jurisprudência e doutrina aí citadas.
Neste contexto, não pode o recurso prosseguir, pois que falham os acima apontados requisitos de que depende a sua admissibilidade.
Termos em que, se decide não admitir o presente recurso.»

3. Não conformada com o supracitado despacho vem agora a recorrente reclamar para a conferência, requerendo que sobre a matéria seja proferido acórdão e alegando, em síntese, que embora não desconheça a jurisprudência já produzida sobre a questão em análise e que constitui fundamento para a decisão ora reclamada, não pode concordar com a mesma, porquanto esta assenta numa clara interpretação restritiva das normas contidas nos citados artigos 27.º/1, alínea b) do ETAF e 152.º/1 alínea b) do CPTA, «o que constitui uma restrição, sem fundamento válido, ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental» e que «a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efectiva» (cf. fls. 265 e 266).
A recorrida, notificada de tal reclamação, nada disse.

Com dispensa a de vistos, vêm os autos à conferência.

4 – Tal como vem alegada, a questão o objecto da reclamação consiste em saber se é admissível recurso por oposição de julgados, para uniformização de jurisprudência, de acórdãos da Secção do Contencioso Tributário e do Contencioso Administrativo do STA.

Como se disse já no despacho reclamado, tal não é possível porque o ETAF de 2002 não prevê qualquer competência para conhecer de recursos por oposição entre acórdãos das secções do contencioso tributário e administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.
Neste sentido tem vindo a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo a sublinhar que o facto de no ETAF de 2002 não se ter incluído na competência do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo a apreciação de recursos para uniformização de jurisprudência deve ser interpretado como expressão de uma intenção legislativa de não admitir recursos para uniformização com fundamento em decisões proferidas por formações do Supremo Tribunal Administrativo especializadas em áreas diferentes.
Aliás, o ETAF de 2002, em outras disposições confirma esse desígnio legislativo ao prever apenas situações de uniformização de jurisprudência no âmbito de cada uma das áreas da jurisdição administrativa e fiscal, como pode ver-se pelos seus arts. 23.º, n.º 1, alínea f), 36.º, n.º 1, alínea g), 43.º, n.º 3, alínea d).
Assim, é de concluir que, no âmbito do ETAF de 2002, não se previu a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a divergências jurisprudenciais ocorridas em áreas diferentes da jurisdição administrativa e fiscal.
Consequentemente, devem interpretar-se restritivamente as referências que no n.º 1 do art. 152.º do CPTA se fazem a acórdãos em contradição com o recorrido como reportando-se apenas a decisões proferidas pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo e ou por uma das secções do contencioso administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos.
E, obviamente, na aplicação subsidiária deste regime ao contencioso tributário, com as necessárias adaptações, devem restringir-se os acórdãos invocáveis como fundamento do recurso a acórdãos proferidos pelas secções do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo ou de um dos tribunais centrais administrativos» (Cf., neste sentido, Acórdãos do Pleno desta Secção do Contencioso Tributário, de 25/3/2009, proc. nº 0595/08, de 5/6/2013, proc. nº 01184/11 e de 04.06.2014, proc. nº 142/14, Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA, de 7/7/2011, recurso para uniformização de jurisprudência nº 310/09, bem como os acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário, de 10/9/2008, recurso 0768/07 e de 11.04.2018, recurso 09/17).

Face a esta interpretação das normas contidas nos citados artigos 27.º/1, alínea b) do ETAF e 152.º/1 alínea b) do CPTA, o recorrente alega que a mesma constitui «uma restrição, sem fundamento válido, ao direito de acesso aos Tribunais da (...) reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental» e que «a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efectiva» (cf. fls. 265 e 266).

Entendemos, porém, que tal interpretação não constitui restrição, sem fundamento válido, do direito de acesso aos Tribunais.
É que, como já sublinhou o Tribunal Constitucional nos seus Acórdãos n.º 36/2009, de 20 de Janeiro de 2009 e nº 69/2009, de 11 de Fevereiro de 2009, após a pretensão do recorrente já ter sido apreciada por duas instâncias, a mera oposição de julgados relativamente à mesma questão de direito, não constitui motivo suficiente para que se considere que o direito ao acesso aos tribunais, nomeadamente o direito à impugnação jurisdicional dos actos da Administração, imponha ao legislador a previsão de um recurso extraordinário para a fixação de jurisprudência em todas as hipóteses possíveis, a nível de tribunais superiores, de oposição de decisões.
A possibilidade de previsão e conformação de um recurso deste tipo situa-se na ampla margem de manobra que assiste ao legislador nesta temática processual, pelo que a interpretação questionada não viola qualquer parâmetro constitucional (Neste sentido vide também o supracitado Acórdão da Secção de Contencioso Tributário no recurso 09/17.).

Pelo que fica dito improcede a reclamação deduzida, sendo de confirmar o despacho de não admissão do recurso.

5. Decisão:
Nestes termos acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em indeferir a presente reclamação.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC.


Lisboa, 27 de Junho de 2018. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes.