Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01502/17
Data do Acordão:01/24/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:BENS PENHORÁVEIS
SINDICATO
Sumário:O artigo 453º do Código do Trabalho estabelece a impenhorabilidade dos bens móveis e imóveis de associação sindical cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento. É, por isso, impenhorável o saldo da conta bancária penhorado, respeitante a quotizações dos associados, imprescindíveis ao pagamento das despesas de funcionamento, quando o executado não disponha de outros bens móveis ou imóveis.
Nº Convencional:JSTA00070506
Nº do Documento:SA22018012401502
Data de Entrada:12/27/2017
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:SIND NAC DE FERROVIÁRIOS E AFINS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECL ORGÃO EXEC FISC
Objecto:SENT TTLISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC FISC
Legislação Nacional:LGT ART3.
CT ART453 N1 ART476 A - D.
CONST ART56 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC097/12 DE 2012/02/23.
Referência a Doutrina:PEDRO ROMANO MARTINEZ - DIREITO DO TRABALHO ALMEDINA 2006 PÁG1059.
GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA - CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA COIMBRA EDITORA 2007 PÁG741.
JORGE MIRANDA E RUI MEDEIROS - CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA 2010 PÁG1103.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. Sindicato Nacional dos Ferroviários e Afins reclamou, no Tribunal Tributário de Lisboa, do ato do Chefe de Serviço de Finanças Lisboa 3 que, no âmbito do processo de execução fiscal n.º3085200801108514, determinou a penhora do saldo da conta bancária de que é titular, peticionando o levantamento da mesma.
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1.2. Aquele Tribunal, por sentença de 06/11/2017 (fls. 115/123), julgou procedente a presente reclamação.
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1.3. É dessa decisão que a recorrente, Fazenda Pública, vem interpor recurso terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a reclamação apresentada nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT e anulou o acto de penhora de valores depositados na conta n.º …………, titulada pela reclamante, na instituição bancária Millennium BCP, acto coercivo praticado no âmbito do processo de execução fiscal à margem referenciado pelo órgão de execução fiscal competente, o Serviço de Finanças de Lisboa 3.
B. A decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice.
C. Com o devido respeito e salvo melhor entendimento, desde logo discordamos da solução perfilhada pelo douto Tribunal de primeira instância ao considerar que a norma do n.º 1 do artigo 453.º do Código do Trabalho se aplica ao processo de execução fiscal.
D. De facto, a Lei Geral Tributária atribui expressamente ao processo de execução fiscal natureza judicial, de acordo com o disposto no n.º 1 do seu art. 103°.
E. Não obstante, não poderemos olvidar que o processo de execução fiscal é instaurado e tramitado pelo serviço local de finanças competente para o efeito, praticando, portanto, este órgão actos de natureza administrativa, o que confere a este processo especificidades relativamente aos processos executivos que correm termos no Tribunal Judicial, situação que o próprio legislador espelhou na redacção do n.º 1 do art. 103.º da LGT e que motivou diversa discussão jurisprudencial acerca da natureza do processo de execução fiscal.
F. De facto, não se pode olvidar que o processo de execução fiscal tem origem não em responsabilidade contratual que limita a relação entre particulares (no sentido de entidades de direito privado), mas sim na relação jurídico-tributária que se estabelece entre a Administração Fiscal e o sujeito passivo,
G. relação esta que se encontra expressamente regulada na LGT, diploma legal que estabelece as obrigações principais e acessórias do sujeito passivo, bem como as consequências, quer para a sujeito passivo, quer para a Administração Fiscal, do incumprimento dos deveres que lhes incumbem.
H. Em respeito pelos princípios constitucionalmente consagrados, na LGT o legislador consagrou diversas normas que mais não são do que corolários desses mesmos princípios, aplicados em concreto à regulação da relação jurídico-tributária, bem como ao procedimento e ao processo tributário (vide n.º 1 e 2 do art. 1.º da LGT).
I. De facto, e como é consabido, este diploma, não obstante não ter natureza de lei de valor reforçado, pois não se enquadra nas situações previstas no n.º 3 do art. 112.º da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP),
J. atendendo à redacção do art. 1.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), tem natureza orientadora relativamente à interpretação das normas contidas neste último diploma legal,
K. tendo o legislador pretendido acautelar que a interpretação das normas do CPPT se deve fazer de harmonia e conformidade com as disposições da LGT.
L. Posto isto, estabelece o legislador, no artigo 36.º da LGT, que a relação jurídico-tributária se constitui com o facto tributário, sendo que os seus elementos essenciais não podem ser alterados por vontade das partes, não podendo a Administração Fiscal conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei.
M. De facto, não se poderá olvidar que o princípio da legalidade fiscal, sendo este elemento de garantia dos contribuintes e habilitação da Administração Tributária.
N. Quanto a este princípio, entendemos que as doutas palavras de Vasco Branco Guimarães (In Lições de Fiscalidade, 2012, almedina, página 62.) elucidam perfeitamente o seu âmbito e a sua importância na construção do edifício legislativo fiscal e a regulamentação das relações entre a Administração e o contribuinte, pelo que adoptamos as duas vertentes deste princípio que são definidas pelo professor doutor como lei-fundamento e lei-garantia.
O. De facto, e ainda na senda do pensamento do professor doutor Vasco Branco Guimarães, podemos, de forma simplificada, afirmar que a lei determina as formas e processos de formação da vontade legal e da administração em matéria fiscal, bem como regula as formas de relacionamento entre a Administração e os contribuintes e o conteúdo da obrigação de imposto, seu nascimento evolução e extinção.
P. Por outro lado e neste seguimento, não se poderá olvidar que a tributação visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado, obviamente em respeito pelos princípios constitucionais (vide art. 5.º da LGT).
Q. Posto isto, a Administração Fiscal, quer ao nível do procedimento, quer ao nível do processo tributários, tem o dever de nortear a sua actuação, através dos seus órgãos, pela Lei, sendo esta precisamente habilitante e limitadora ao mesmo tempo da actuação daquela.
R. Por outro lado, estabelece o n.º 2 do art. 30.º da LGT que “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”.
S. Pelo exposto, a lei fiscal determina a indisponibilidade do crédito tributário, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributárias, prevalecendo esta disposição sobre qualquer legislação especial,
T. motivo por que a indisponibilidade dos créditos tributários impõe-se à própria AT e a todos os particulares e não pode ser afastada por vontade das partes ou de terceiros, sendo decorrência directa dos fundamentais princípios da legalidade e igualdade tributárias, os quais encontram guarida nos artigos 266.º, 13.º, 103.º e 104.º, todos da CRP.
U. A indisponibilidade dos créditos tributários - que significa que AT não pode discricionariamente alterar a relação jurídica tributária e, assim, dispor livre e autonomamente dos seus créditos - decorre, em última análise, do princípio da legalidade tributária.
V. O princípio da legalidade, consagrado no art. 266.º, n.º 2, da CRP, impõe aos órgãos da AT que actuem no sentido da obtenção das prestações devidas nos termos da lei fiscal, certificando-se que os cidadãos cumprem a obrigação decorrente, desde logo, do n.º 3 do art. 103.º, n.º 3, da CRP, de pagar os impostos que «tenham sido criados nos termos da lei e cuja liquidação e cobrança» se façam nas formas «prescritas pela lei».
W. Assim, impõe-se à AT que actue com vista à obtenção da prestação efectivamente devida nos termos da lei fiscal e do princípio da igualdade (vide arts. 13.º, 103.º, n.º 3, e 266.º, n.º 2, da CRP e art. 3.º, n.º 1 e 5.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo (doravante, CPA)).
X. A AT tem a obrigação de prosseguir o objectivo de tratar igual e uniformemente todos os contribuintes, maxime na exigência, modificação ou extinção das obrigações tributárias deles.
Y. Ambos os princípios estão também consagrados no art. 55.º da LGT, que enumera os princípios a observar pela AT na sua actividade.
Z. No campo das moratórias, estipula o n.º 3 do art. 36.º da LGT que: «A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei».
AA. Em sintonia com o n.º 3 do art. 36.º da LGT, o art.º 85.º, n.º 3, do CPPT prevê que possam ser responsabilizados subsidiariamente os que, dolosamente, concederem moratórias fora dos casos previstos na lei.
BB. Posto isto e reconduzindo-nos agora mais ao caso concreto, não poderemos olvidar que o processo de execução fiscal se encontra regulado especificamente no CPPT, sendo neste diploma legal que o legislador consagrou as especificidades do mesmo face à execução civil.
CC. Mais uma vez se reitere que as normas legais do CPPT devem ser interpretadas em harmonia com a LGT, conforme se depreende do art. 1.º daquele diploma legal.
DD. Assim sendo, dispõe o n.º 1 do art. 50.º da Lei Geral Tributária (doravante, LGT) que “O património do devedor constitui a garantia geral dos créditos tributários”.
EE. Por sua vez, na subsecção II da Secção VII do CPPT, designada “Da Penhora”, veio o legislador consagrar, consoante o tipo de bens em causa, as formalidades que devem nortear os actos coercivos de penhora em processo de execução fiscal.
FF. Mais concretamente, a penhora de quantias depositadas em conta bancária encontra-se regulada no art. 223.º do CPPT, com a epígrafe “Formalidade da penhora de dinheiro ou de valores depositados”, estipulando-se que a penhora se efectua por meio de carta registada, com aviso de recepção, dirigida à entidade depositária, devendo a notificação conter ainda a indicação de que as quantias depositadas nas contas referidas nos números anteriores ficam indisponíveis desde a data da penhora, salvo nos casos previstos na lei, mantendo-se válida por período não superior a um ano, sem prejuízo de renovação.
GG. Não obstante, no art. 2.º do CPPT, determina-se que se aplicam subsidiariamente ao processo tributário (como é o processo de execução fiscal, nos termos do disposto no art. 103.º da LGT) diversos diplomas legais, sendo que a aplicação supletiva será efectuada de acordo com a natureza do caso omisso.
HH. “Assim, a ordem por que tal legislação vem indicada [no art. 2.º do CPPT] não é relevante para determinação do regime aplicável, sendo as características do caso que hão-de levar à determinação da lei a aplicar (Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Volume I, 6.ª edição, 2011, página 69, em anotação ao art. 2.º do CPPT.)”.
II. Ora, no caso concreto do processo de execução fiscal, designadamente quanto aos actos de penhora, em tudo o que não se encontrar expressamente regulado no CPPT, aplicam-se subsidiariamente as disposições do Código de Processo Civil (CPC), porquanto é neste diploma legal que se encontra previsto e regulado o processo de execução (vide alínea e) do art. 2.º do CPPT).
JJ. Atentando assim às normas do CPC nesta matéria, como é consabido, o processo executivo visa a satisfação dos créditos do exequente, implicando, para tal, a realização de actos coercivos sobre o património do devedor.
KK. Deste modo, regra geral no processo executivo no âmbito do processo civil, à semelhança do que prevê o n.º 1 do art. 50.º da LGT, supra transcrito, é objecto de penhora todo o património do executado, consagrando o n.º 1 do art. 735.º do CPC, enquadrado na sua subsecção I – bens que podem ser penhorados – da secção III – Penhora –, com a epígrafe “objecto da execução”, que “estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda”.
LL. Não obstante, o legislador não deixou desprotegido o executado, acautelando expressamente e de forma taxativa, nos artigos seguintes do CPC, limites ao acto de penhora, através da consagração expressa de bens absoluta ou totalmente penhoráveis, de bens relativamente penhoráveis e de bens parcialmente penhoráveis.
MM. Assim, as excepções e limites aos actos de penhora em processo executivo encontram-se expressamente previstas nos artigos 736.º, 737.º, 738.º e 739.º do CPC, podendo-se, portanto, concluir que o legislador optou por proteger os bens aí referidos e estabelecer limites à sua penhora, optando, assim, a contrario, por não proteger os bens que não se encontrem mencionados expressamente naquelas disposições legais.
NN. De facto, não poderemos olvidar que quando falamos em normas de excepção a uma disposição geral, devem apenas e tão só considerar-se abrangidas por aquelas as situações que cabem na sua enumeração expressa e taxativa, sob pena de, fazendo uma interpretação extensiva das mesmas, considerando que a letra da lei diz menos que o seu espírito, se inverter a regra geral em excepção.
OO. Assim, na tarefa de interpretação das normas jurídicas, dever-se-á entender que o legislador “consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (vide n.º 3 do art. 9.º do Código Civil, aplicável subsidiariamente ao processo tributário por força do disposto na alínea d) do art. 2.º da LGT,
PP. Pelo que, se o legislador optou livremente por consagrar de forma tipificada e taxativa, determinadas situações de excepção a uma regra geral, então tal opção constitui a ratio legis da norma, a justificação social da lei (Oliveira Ascensão.) não cabendo ao intérprete substituir-se ao legislador.
QQ. “Todavia, nesse esforço [tarefa interpretativa], e na senda de atingir uma verdadeira justiça substancial, não deve ser descurado o ponto de partida, isto é, a norma jurídica, e, ao interpretar esta, nunca se pode ter em vista criar uma outra. O objectivo é sempre, em face de eventuais conceitos obscuros ou polissémicos, discernir aquele significado que mais se adequará ao que o legislador quis dizer. Dai, evidentemente, não pode resultara produção legiferante. O intérprete não cria (Joaquim Freitas da Rocha, In Lições de Procedimento e Processo Tributário, 5.ª edição, página 72.)”.
RR. Pelo supra exposto, com o devido respeito e salvo melhor entendimento, contrariamente ao que entende o douto Tribunal “a quo”, não se encontrando consagrada expressamente nos artigos 736.º, 737.º, 738.º e 739.º do CPC a impenhorabilidade, absoluta ou relativa, das quotizações sindicais, não pode o órgão de execução fiscal, sob pena de violação do principio da legalidade fiscal e norma que determina a proibição de concessão de moratórias, a que supra aludimos, abster-se de penhorar os referidos bens móveis,
SS. colocando em causa a prossecução dos fins visados com a tributação, mormente a satisfação das necessidades financeiras do Estado,
TT. e, desse modo, colocando também em crise o princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado no art. 13.º da CRP e previsto no n.º 2 do art. 5.º da LGT.
UU. De facto, encontram-se expressamente previstos no art. 2.º do CPPT as normas legais que se aplicam subsidiariamente ao procedimento e processos tributários, não se encontrando prevista a norma legal do art. 453.º do Código do Trabalho, motivo pelo qual discordamos da douta sentença proferida em primeira instância.
VV. Ora, atento o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários e com base nas disposições legais do CPPT e do CPC supra invocadas, bem como nos argumentos supra enunciados, conclui-se que o órgão de execução fiscal actuou de acordo com o principio da legalidade (cfr. art. 8.º n.º 2, alínea e) da Lei Geral Tributária),
WW. estando-lhe vedada a aplicação do n.º 1 do art. 453.º do Código do Trabalho, norma que, por um lado, não é de aplicação subsidiária ao processo tributário e que, por outro, não se poderá aplicar ao caso concreto atentos os princípios da hermenêutica jurídica supra enunciados.
Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada justiça.».
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1.4. O recorrido contra-alegou concluindo do seguinte modo:
«1. A dívida exequenda não é de natureza tributária pois tem como fonte o financiamento concedido através do Fundo Social Europeu para a realização de acções de formação profissional;
2. O CPPT prevê a remissão, nos casos omissos, tal como a lei Geral Tributária, para a disciplina constante do Código do Processo Civil;
3. O Código Processo Civil quando elenca os bens absoluta ou totalmente impenhoráveis inclui não só os expressamente identificados nas suas várias alíneas, como também, todos os bens que por disposições especial estejam isento de penhora;
4. O Código do Trabalho é, para efeitos de aplicação do disposto no art.º 736.º do CPC, lei especial, sendo ainda que o próprio Código do Processo de Trabalho, igualmente, remete para aplicação, no omisso, no Código do Processo Civil.
5. Ficou provado que o saldo da conta bancária penhorada preenche todos os pressupostos e requisitos constantes do art.º 453.º do Código do Trabalho – essenciais ao funcionamento do Sindicato Nacional dos Ferroviários e Afins, pelo que a sua penhora afeta os direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente previstos.
6. Em caso idêntico já o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 23.02.2012, proferido no processo n. 097/12, considerou aplicável à situação o disposto no Código do Trabalho, art.º 453.º, n.º 1.
7. De acordo com a matéria de facto dada como provada, a penhora da qual se reclamou impossibilita o funcionamento da associação Sindical aqui executada – Sindicato Nacional dos Ferroviários e Afins;
8. Como tal e por força da remissão constante do CPPT, da LGT e do CPC, tais saldos são, nos termos do disposto no art.º 453.º do CT, totalmente impenhoráveis;
9. Consequentemente é correta a decisão de anular o acto de penhora reclamado e, bem assim, a consequente ordem de levantamento da penhora, tal como declarou a douta sentença recorrida.
Termos em que e sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.ª, deve julgar-se improcedente o recurso a que aqui se responde, mantendo-se a sentença proferido pelo Tribunal Tributário de Lisboa, nos seus precisos termos, com o que se fará JUSTIÇA.».
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1.5. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia:
«I. INTRODUÇÃO
Inconformada, veio a Reclamada Fazenda Pública interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 06/11/2017, pelo M.mo Juiz de Direito do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a reclamação deduzida pelo Reclamante Sindicato Nacional de Ferroviários e Afins e, consequentemente, anulou o ato de penhora de saldo da conta bancária de que é titular, efetuado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3085200801108514.
A ora Recorrente veio insurgir-se contra a supra aludida decisão judicial, discordando da interpretação, aí efetuada, do regime legal aplicável, com o que, alegadamente, se mostraria violado o disposto nos artigos 13.º, 103.º,104.º, e 266.º, todos da Constituição da República Portuguesa, bem como nos artigos 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, 5.º, n.ºs 1 e 2, 8.º, n.º 1, 30.º, n.º 2, 36.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 50.º, n.º 1, todos da Lei Geral Tributária, 32.º, n.º 1 e 5.º, n.º 1, ambos do Código de Procedimento Administrativo, e, ainda, os artigos 735.º, 736.º, 737.º, 738.º e 739.º, estes últimos do Código de Processo Civil.
II. DOS ERROS DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE DIREITO
Neste âmbito, a questão a equacionar e, subsequentemente, a decidir por este Colendo Supremo Tribunal ad quem, consiste em apurar se ocorrem in casu os invocados erros de julgamento quanto à matéria de direito, designadamente, sobre se se verifica a imputada violação dos preceitos constitucionais e legais acima enunciados.
Sucede que, na perspetiva do Ministério Público, a interpretação defendida pelo tribunal a quo, para além de perfeitamente adequada à letra das disposições convocadas para a decisão, respeita a ratio dos mesmos preceitos legais e daí que nos não mereça censura.
Assim, como observou, certeiramente, o Recorrido, nas suas contra-alegações, pese embora o hábil labor doutrinal plasmado nas alegações do recurso em análise, é inegável que a dívida exequenda não constitui uma dívida de natureza tributária, porquanto não respeita a qualquer tributo, na aceção consagrada no artigo 3.º da LGT.
Efetivamente, conforme resulta do facto levado à alínea A) do probatório, “Em 16.08.2008, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3, contra o ora Reclamante, o processo de execução fiscal n.º 3085200801108514, para cobrança coerciva de dívidas ao Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, IP., a título de verbas indevidamente recebidas do Fundo Social Europeu e do Estado Português, no âmbito de um pedido de financiamento no montante de 28.406.67 EUR (o sublinhado não consta do original).
Ora, como resulta do douto Acórdão deste Colendo STA, de 23/02/2012, tirado no Processo n.º 097/12, que versa sobre um caso similar ao dos presentes autos, “As dívidas emergentes de comparticipações pagas e utilizadas ou indevidamente aplicadas, por ações de formação realizadas ao abrigo dos programas do Fundo Social Europeu, pelo facto de serem cobradas coercivamente não se transformam em dívidas tributárias (...)” (disponível in www.dgsi.pt).
Acresce que o citado douto aresto pronunciou-se e decidiu, com sapiência e sagacidade, a vexata quaestio que constitui o cerne do presente recurso jurisdicional, a saber, a aplicação subsidiária ao processo tributário da norma do n.º 1 do artigo 453.º do Código do Trabalho.
A título de fundamentação jurídica, o mencionado douto aresto veiculou a seguinte argumentação, que o Ministério Público perfilha e corrobora e que, com a devida vénia, passará a citar: “O art. 453.º do Código do Trabalho dispõe que “São impenhoráveis os bens móveis e imóveis de associação sindical ou associação de empregadores cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento”.
O art. 56.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa confere às associações sindicais (Segundo PEDRO ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, 3 ed., Almedina, 2006, Coimbra, p. 1059, “A expressão associações sindicais engloba: os sindicatos (propriamente ditos); as federações; as uniões; e as confederações (art. 476.º alíneas a) a d) do CT)”.) a defesa e promoção dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem. Constituem direitos das associações sindicais, nos termos do disposto no nº 2, do mesmo preceito: participar na elaboração da legislação do trabalho; participar na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses dos trabalhadores; pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução; fazer-se representar nos organismos de concertação social, nos termos da lei; participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a ações de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho”. Segundo o nº 3 compete ainda às associações sindicais exercer o direito de contratação coletiva.
Sem prejuízo de alguns direitos reconhecidos neste preceito não poderem ser exercidos universalmente por todas e cada uma das associações sindicais (Cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 741.), a verdade é que se retira do mesmo o papel relevante que a Constituição atribui às associações sindicais (Cfr. JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.ª ed., Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2.ª ed., 2010, p. 1103.) nos vários domínios apontados.
Assim sendo, há de considerar-se decorrer deste mesmo preceito constitucional a garantia de um acervo mínimo de bens móveis e imóveis que garantam às associações sindicais o desempenho desse papel, garantia essa que o art. 453.º do Código do Trabalho visa concretizar.
(…) Assim sendo, considerando que (…) o saldo da conta bancária penhorado respeita a quotizações dos associados e de que se trata de verbas imprescindíveis ao pagamento das despesa de funcionamento do recorrente, que não dispõe de quaisquer outros bens móveis ou imóveis de sua titularidade, há de concluir-se que a manutenção da penhora viola o referido art. 453.º do Código do Trabalho. (…)”.
Assim, perante este acervo de fundamentos jurídicos, que a Recorrente não logrou derrubar, no âmbito da motivação do recurso em apreço, o Ministério Público vem pugnar pela aplicabilidade do artigo 453.º do Código do Trabalho e, consequentemente, pela bondade da interpretação das normas legais convocadas para a solução do caso vertente.
Destarte, forçoso se torna concluir no sentido de que deverá ser confirmada in totum a sentença sob recurso.
III. CONCLUSÃO
Nos termos e com os fundamentos acima sucintamente expostos, deverá ser negado provimento ao recurso jurisdicional, mantendo-se, pois, inteiramente, a sentença recorrida.»
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1.6. Sem vistos, dada a urgência do processo, cabe decidir.
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2. A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«A) Em 16.08.2008, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3, contra o ora Reclamante, o processo de execução fiscal n.º 3085200801108514, para cobrança coerciva de dívidas ao Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, I.P., a título de verbas indevidamente recebidas do Fundo Social Europeu e do Estado Português, no âmbito de um pedido de financiamento, no montante de 28.406,67 EUR (cfr. autuação e certidão de dívida, respectivamente, a fls. 1 e 2 do processo de execução fiscal apenso);
B) Por despacho da Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, de 15.07.2016, foi efectuado, no âmbito do processo de execução fiscal identificado na alínea anterior, um pedido de penhora, no valor de 125.589,60 EUR, incidente sobre os valores depositados na conta bancária n.º ………., de que o Reclamante é titular, junto do Banco Comercial Português, S.A., e que se encontra activa desde 30.12.2016 (cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial, a fls. 7, e informação a fls. 29 e 30 dos autos);
C) Por força da penhora identificada em B), ficaram cativas as importâncias depositadas na conta bancária titulada pelo Reclamante, que, à data de 11.05.2017, totalizavam a quantia de 5.674,74 EUR (cfr. informação de fls. 29 e 30 dos autos);
D) O saldo bancário existente na conta objecto da penhora é constituído exclusivamente por quantias provenientes das quotizações pagas pelos associados do Reclamante (cfr. depoimentos das testemunhas A……… e B………);
E) A receita proveniente das referidas quotizações encontra-se distribuída em duas contas bancárias, uma destinada à gestão corrente do Reclamante, identificada em B), e outra com verbas afectas ao apoio social dos associados e ao Fundo de Greve, também penhorada (cfr. depoimentos das testemunhas A……….. e B………..);
F) A gestão corrente do Reclamante depende exclusivamente das quantias penhoradas (cfr. depoimentos das testemunhas A………. e B……….);
G) O Reclamante não dispõe de quaisquer outros bens móveis ou imóveis, constituindo o montante proveniente das quotizações sindicais pagas pelos associados a sua única fonte de receita (cfr. depoimentos das testemunhas A………. e B………….);
H) A petição inicial da presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 3 em 23.01.2017 (cfr. registo a fls. 4 dos autos).»
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3.1. A sentença recorrida do Tribunal Tributário de Lisboa julgou procedente a reclamação deduzida pelo reclamante Sindicato Nacional de Ferroviários e Afins e anulou o ato de penhora de saldo da conta bancária de que este é titular, efetuado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3085200801108514.
Desta sentença recorre a Fazenda Pública discordando da interpretação a que a mesma sentença chegou sustentando, em síntese, que foram violados os artigos 13.º, 103.º, 104.º, e 266.º, todos da Constituição da República Portuguesa, bem como nos artigos 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, 5.º, n.ºs 1 e 2, 8.º, n.º 1, 30.º, n.º 2, 36.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 50.º, n.º 1, todos da Lei Geral Tributária, 32.º, n.º 1 e 5.º, n.º 1, ambos do Código de Procedimento Administrativo, e, ainda, os artigos 735.º, 736.º, 737.º, 738.º e 739.º, estes últimos do Código de Processo Civil.
Importa, por isso, determinar se ocorrem os invocados erros de julgamento sobre matéria de direito por existir a violação dos preceitos constitucionais e legais indicados.
Torna-se, por isso, necessário determinar se o artigo 453.º do Código do Trabalho que estabelece que “são impenhoráveis os bens móveis e imóveis de associação sindical ou associação de empregadores cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento” é aplicável à situação dos autos.
Assim o entendeu a sentença em apreciação, com a concordância do sindicato recorrido, contrariamente ao defendido pela FP nas conclusões das suas alegações.
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3.2. Segundo a sentença recorrida no referido artigo 453.º, n.º 1, do CT prevê-se a impenhorabilidade dos bens das associações sindicais, onde se podem incluir os seus saldos bancários (compostos pelas quotizações dos associados), contanto que se verifique o pressuposto previsto na parte final do artigo — a estrita indispensabilidade do bem que se pretende penhorar para assegurar o funcionamento da associação.
Acompanhou a sentença recorrida o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 23.02.2012, processo n.º 097/12, que tem o sumário seguinte:
“V - Conferindo o art. 56.º da Constituição da República Portuguesa às associações sindicais papel relevante na defesa e promoção dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem, há-de considerar-se decorrer do mesmo preceito a garantia de um acervo mínimo de bens móveis e imóveis que garantam às associações sindicais o desempenho desse papel, garantia essa que o art. 453.º do Código do Trabalho visa concretizar ao consagrar a impenhorabilidade dos bens móveis e imóveis de associação sindical cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento;
VI - Resultando da matéria dada como provada que o saldo da conta bancária penhorado respeita a quotizações dos associados e de que se trata de verbas imprescindíveis ao pagamento das despesas de funcionamento do recorrente, que não dispõe de quaisquer outros bens móveis ou imóveis de sua titularidade, há-de concluir-se que a manutenção da penhora viola do art. 453.º do Código do Trabalho;”.
Ainda segundo a sentença recorrida o artigo 736º do CPC, subsidiariamente aplicável, a propósito da impenhorabilidade de bens, salvaguarda a aplicação de isenções de penhora previstas em lei especial como é o caso da regra de impenhorabilidade prevista no artigo 453.º do CT.
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3.3. A questão controvertida consiste em determinar se à penhora a que se referem os presentes autos é ou não aplicável o artigo 453º do CT.
Inexistem motivos para não acompanhar o mencionado acórdão do STA de 23/02/2012, processo n.º 097/12, pois que a recorrente não acrescentou qualquer novo argumento, com relevância, para divergir da orientação que o mesmo acórdão trilhou.
Em tal acórdão escreveu-se o seguinte:

“O art. 453º do Código do Trabalho dispõe que “São impenhoráveis os bens móveis e imóveis de associação sindical ou associação de empregadores cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento”.
O art. 56º, nº1, da Constituição da República Portuguesa confere às associações sindicais (Segundo PEDRO ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, 3ª ed., Almedina, 2006, Coimbra, p. 1059, “A expressão associações sindicais engloba: os sindicatos (propriamente ditos); as federações; as uniões; e as confederações (art. 476º alíneas a) a d) do CT)”.) a defesa e promoção dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem. Constituem direitos das associações sindicais, nos termos do disposto no nº2, do mesmo preceito: participar na elaboração da legislação do trabalho; participar na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses dos trabalhadores; pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução; fazer-se representar nos organismos de concertação social, nos termos da lei; participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho”. Segundo o nº 3 compete ainda às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva.
Sem prejuízo de alguns direitos reconhecidos neste preceito não poderem ser exercidos universalmente por todas e cada uma das associações sindicais (Cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 741.), a verdade é que se retira do mesmo o papel relevante que a Constituição atribui às associações sindicais (Cfr. JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª ed., Wolters Kluer/Coimbra Editora, 2ª ed., 2010, p. 1103.) nos vários domínios apontados.
Assim sendo, há-de considerar-se decorrer deste mesmo preceito constitucional a garantia de um acervo mínimo de bens móveis e imóveis que garantam às associações sindicais o desempenho desse papel, garantia essa que o art. 453º do Código do Trabalho visa concretizar.
Por outro lado, o Mmo. Juiz “a quo” apenas rejeitou a questão da impenhorabilidade porque, embora tratando-se de um sindicado, não vinha demonstrada a utilidade pública da associação sindical imposta pelo art. 823º do CPC, exigência que o art. 453º do Código do Trabalho não estabelece.
Acontece que o alcance das duas normas é muito diferente, pois enquanto o art. 823º do CPC consagra de plano a isenção de penhora em relação aos bens das pessoas colectivas de utilidade pública, bastando-se, por conseguinte, com a prova dessa condição. O mesmo já não se passa com o art. 453º do Código do Trabalho que apenas garante a impenhorabilidade dos bens móveis e imóveis de associação sindical “estritamente indispensáveis” ao seu funcionamento.
Assim sendo, considerando que a Constituição da República Portuguesa, no seu art. 56º, nº1, não estabelece qualquer distinção entre as associações sindicais consoante lhes seja atribuída utilidade pública ou não e resultando da matéria dada como provada (cfr. pontos 11 a 13 da matéria de facto assente) que o saldo da conta bancária penhorado respeita a quotizações dos associados e de que se trata de verbas imprescindíveis ao pagamento das despesa de funcionamento do recorrente, que não dispõe de quaisquer outros bens móveis ou imóveis de sua titularidade, há-de concluir-se que a manutenção da penhora viola o referido art. 453º do Código do Trabalho.
Procede, desta forma, a ilegalidade invocada pelo recorrente, devendo ser revogada a sentença recorrida, julgando-se procedente a reclamação e anulando-se o acto reclamado que ordenou a penhora do saldo da conta bancária do recorrente.”.

É de realçar que o artigo 453º do Código do Trabalho apenas garante a impenhorabilidade dos bens móveis e imóveis de associação sindical “estritamente indispensáveis” ao seu funcionamento.
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3.4. Resulta da matéria de facto provada (alíneas B) e D) ) que está em causa a penhora de quantias depositadas em conta bancária, quantias estas que são exclusivamente provenientes da receita obtida com as quotizações pagas pelos associados do reclamante, que as verbas depositadas na conta bancária têm como destino a gestão corrente do reclamante, na medida em que é com recurso a essas quantias que este efectua o pagamento de todas as despesas inerentes ao seu funcionamento (alínea E)), que (alíneas F) e G)) o reclamante não é titular de quaisquer outros bens móveis ou imóveis, constituindo o montante proveniente das quotizações sindicais pagas pelos associados a sua única fonte de receita, a qual se encontra depositada em duas contas bancárias, uma afecta à gestão corrente do reclamante, e que está em causa nos presentes autos, e outra ao apoio social e fundo de greve, ambas objecto de penhora.
Como se escreveu na sentença em apreciação dependendo a gestão corrente do reclamante exclusivamente das quantias penhoradas, é possível concluir que, em resultado da penhora, o reclamante ficou privado da única fonte de receita de que dispunha, tomando-se incapaz de cumprir com as suas obrigações de gestão correntes.
Acompanha-se, ainda, a sentença recorrida quando afirma que não está em causa a falta de demonstração do nexo de causalidade entre a penhora da quantia bancária de 552,04 EUR e a impossibilidade de funcionamento da associação sindical, pois que, por força do acto de penhora objecto de reclamação não fica, nem ficou, apenas cativo esse montante, mas, antes, as quantias que entretanto vieram a ser depositadas na conta penhorada, tal como resulta, de resto, do teor da informação prestada nestes autos pelo órgão de execução fiscal (alínea C) do probatório).
É também de acompanhar quando afirma que tendo o reclamante ficado privado da totalidade da receita proveniente do pagamento das quotas pelos associados, e não dispondo de qualquer outra, verifica-se que a penhora posta em crise incide sobre bem estritamente indispensável ao funcionamento da associação sindical reclamante, uma vez que, sem a possibilidade de utilização dos valores em causa, não consegue assegurar a sua atividade.
Daí que se conclua que a penhora em apreciação viola o artigo 453.º do CT, por incidir sobre bem impenhorável, porque estritamente indispensável ao seu funcionamento.
Não merece, por isso, provimento o presente recurso.
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O artigo 453º do Código do Trabalho estabelece a impenhorabilidade dos bens móveis e imóveis de associação sindical cuja utilização seja estritamente indispensável ao seu funcionamento. É, por isso, impenhorável o saldo da conta bancária penhorado, respeitante a quotizações dos associados, imprescindíveis ao pagamento das despesas de funcionamento, quando o executado não disponha de outros bens móveis ou imóveis.
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4. Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente FP.

Lisboa, 24 de janeiro de 2018. – António Pimpão (relator) - Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.