Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01437/07.0BEPRT
Data do Acordão:01/23/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:OPOSIÇÃO
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
RESTITUIÇÃO
Sumário:1-Tendo o oponente sido declarado parte ilegítima para a execução fiscal por falta de exercício da gerência da empresa originária devedora, e, nessa medida não podendo ser responsabilizado, a título subsidiário pelo pagamento das dívidas fiscais daquela, ficou prejudicado o conhecimento de toda e qualquer questão jurídica que pudesse decorrer da análise do mérito das pretensões formuladas.
2-Todavia, nesta particular circunstância em que o oponente é chamado ao processo executivo na qualidade de responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, chamamento que o tribunal declara sem fundamento legal, terá que tomar-se conhecimento do pedido de condenação da Administração Tributária à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 100.º da Lei Geral Tributária.
Nº Convencional:JSTA000P24116
Nº do Documento:SA22019012301437/07
Data de Entrada:11/05/2018
Recorrente:A.........
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto
. de 31 de Outubro de 2017

Julgou procedente a oposição e, em consequência, extinta a execução.

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………. veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no processo de oposição à execução fiscal n.º 1783200001023284 que corre termos no Serviço de Finanças de Gondomar para cobrança coerciva de dívidas de IVA de 1998 e 1999, no valor de 5 736,18€, que instaurou, na qualidade de revertido, e em que é devedora originária a empresa B……… – ………….., Ld.ª, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

1. Circunscreve-se o presente recurso ao segmento da sentença que não apreciou o pedido de restituição da quantia paga (voluntariamente e através de compensação), acrescida de juros indemnizatórios, por considerar não ter o mesmo cabimento em sede de oposição à execução fiscal;

2. Tendo presente que uma das finalidades da oposição à execução fiscal pode ser a extinção, total ou parcial da execução fiscal, estando já paga a quantia exequenda, o objectivo do seu prosseguimento foi o de apurar se estavam verificados os pressupostos da responsabilidade subsidiária imputada ao oponente, dado que o n.º 1 do art. 151º do CPPT determina que todas as questões com aquela relacionados deverão ser apreciados em processo de oposição à execução;

3. A procedência da oposição levará à extinção da execução, no que ao oponente respeita, com todas as consequências daí resultantes, desde logo, a imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, como impõe o art. 100° da LGT;

4. Os art. 100° e art. 43° da LGT, à semelhança do art. 53° do mesmo diploma, corporizam um direito indemnizatório de matriz constitucional - fundado no art°. 22° da CRP - implicando a reconstituição da situação subjacente ao acto anulado com a restituição do imposto pago, bem como o pagamento de juros indemnizatórios e/ou da indemnização resultante da prestação de garantia;

5. Ê certo que n.° 1 do art. 43° da LGT não se refere expressamente ao processo de oposição à execução, mas é claro que o art. 171º do CPPT, a propósito da indemnização por garantia prestada, se refere, de modo mais abrangente, ao "processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda";

6. Tem, por isso, de considerar-se como abrangido no processo de oposição à execução o direito a juros indemnizatórios em caso de pagamento indevido, sob pena de a procedência da oposição fundada em circunstâncias diversas da ilegalidade da liquidação da dívida exequenda - a apreciar em reclamação graciosa ou impugnação judicial - como por exemplo a ilegalidade do acto administrativo de reversão da execução não conferir ao executado e revertido direito a ser restituído da quantia paga acrescido de juros indemnizatórios, o que nem o art. 100º da LGT, nem o art. 22º da CRP consentem;

7. No caso sub judice é patente ter existido pagamento indevido do imposto, face à ilegalidade do acto de reversão, conforme decidido pela Mmª. Juiz a quo;

8. Como se decidiu no Ac. do STA de 02-11-2001 - Proc. 0208/11, "não tendo a administração tributária feito prova dos pressupostos legais de que depende a reversão, verifica-se erro imputável aos serviços na medida em que a reversão da divida contra o oponente é ilegal, sendo essa ilegalidade Imputável à administração tributária";

9. Tendo o pagamento efectuado pelo recorrente sido indevido, resultando de erro imputável à administração tributária, com a procedência da oposição, deverá ser ordenada a restituição ao recorrente do Imposto pago acrescido de juros indemnizatórios;

10. Foi efectuada uma incorrecta aplicação do disposto nos art. 43°, 53° e 100º da LGT, 151º e 171 do CPPT e 22° da CRP.

Não foram apresentadas contra-alegações.
Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso com fundamento em não se encontrar previsto que em oposição seja determinada judicialmente a restituição do imposto pago.

Mostram-se provados, os seguintes factos com relevo para a decisão do presente recurso:
A. No Serviço de Finanças do Gondomar 1, foram instaurados os processos de execução fiscal n.° 1783 2000 0102 3284 e apensos contra a sociedade B…….. -……….., Ld.ª, para cobrança das dívidas relativas a IVA de 1998 e 1999, no valor de € 5.736,18 - cfr. fls. 18 e ss. do processo físico.

B. Em 17.01.2007, no âmbito do processo de execução fiscal em causa foi proferida ''Informação'' com o seguinte teor - cfr. fls. 28 do processo físico:
Conforme o vertido no auto de diligências de fls. 9, a devedora originária foi declarada falida por sentença datada de 20 de Junho de 1994.
As dívidas tributárias que originaram a instauração do processo executivo identificado em epígrafe constituíram-se após a declaração de falência, pelo que, por força do estatuído no nº 6 do art. 180º do CPPT seguirão os seus termos normais até à extinção da execução.
Tais dívidas reportam-se a liquidações oficiosas de IVA relativo aos anos de 1994, 1998 e 1999, cifrando-se tal divida em € 17.575,72.
Refira-se que poder-se-ia colocar a questão da eventual responsabilidade subsidiária da liquidatária judicial pelas dívidas em questão. Contudo, compulsado o art. 181º do CPPT em conjugação com o art. 145º do CPEREF, constata-se que neles se concretizam os deveres do liquidatário judicial relativamente aos créditos da Fazenda Nacional, neles se incluindo a citação pessoal do órgão periférico local para enviar certidão de dívidas do falido à Fazenda Pública e, sendo-lhe cumulativamente imposta a obrigação de requerer a avocação dos processos de execução fiscal pendentes no órgão de execução fiscal do domicilio do falido, com vista a serem apensados ao processo de falência, pelo que cumpridos tais deveres, dever-se-á exonera-lo de qualquer responsabilidade pelo pagamento de tais dívidas.
Em sentido contrário, incumpridos tais deveres, poderá o liquidatário incorrer em responsabilidade subsidiária, podendo tê-la também em caso de inobservância da ordem de pagamento das dívidas constante da sentença de graduação. Tal é o que resulta igualmente da anotação de A. Lima Guerreiro ao art. 26º da LGT.
In casu, dado estarmos perante dívidas ao Fisco reportadas aos anos de 1994, 1998 e 1999, posteriores à data da sentença que declarou a falência, é defensável a não responsabilização do liquidatário judicial por tais dívidas, as quais sendo posteriores àquela, não foram obviamente incluídas na sentença de graduação de créditos, logo inexistem, quanto a tais dívidas, quaisquer devedores do liquidatário.
No que toca à eventual responsabilidade subsidiária dos gerentes da sociedade executada, ressalte-se que no tocante às dívidas vencidas após declaração de falência, deverão os correspondentes processos executivos prosseguir, tal como já foi dito supra, os seus trâmites normais, desde que sejam penhorados bens não apreendidos naquele processo de falência, interpretação esta considerada razoável compaginável com a unidade do sistema jurídico pelo Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado.
Ora, este Serviço de Finanças foi informado pela liquidatária judicial em carta datada de 17/05/1999, que o processo de falência se encontrava findo, tendo sido enviados os cheques aos credores contemplados na sentença de graduação de créditos, não se tendo registado quaisquer sobras.
Da certificação da Conservatória do Registo Comercial consta como sócio gerente da devedora originária desde o ano de 1993, A……. com o NIF ……….
Face ao circunstancialismo acima descrito, considero dever ordenar-se a reversão contra o responsável subsidiário ora identificado.
(…)

C. Em 08.02.2007, pelo Chefe do Serviço de Finanças do Gondomar 1, foi proferido ''Despacho'' com o seguinte teor: "Vista a informação prestada, desenvolvam-se as diligências de reversão contra o responsável subsidiário ali identificado. " - cfr. fls. 28 (verso) do processo físico.

D. Em 18.04.2007, pelo Chefe do Serviço de Finanças do Gondomar 1, foi proferido despacho com o seguinte teor - cfr. fls. 38 (verso) do processo físico:
Despacho
Na sequência da notificação para exercício do direito de audição previsto nos artigos 23º e 60º da Lei Geral Tributária (LGT), feita ao responsável subsidiário A………, veio este responder em exposição escrita.
Os argumentos invocados e a sua apreciação encontram-se amplamente explanados na informação e parecer antecedentes, cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido, concluindo-se:
Quanto à divida de IVA do ano de 1994, encontra-se já prescrita não sendo de proceder a responsabilidade subsidiária prevista no artigo 13º do Código de Processo Tributário (CPT);
• Relativamente às dívidas de IVA dos anos de 1998 e 1999, não foram apresentados factos ou prova documental que possa afastar a mesma responsabilidade, esta abrangida respectivamente pelas disposições do citado artigo 13º do CPT e 24º nº 1 alínea b) da Lei Geral Tributária;
Assim estando concretizada a audição e verificadas as condições previstas no nº 2 do artigo 239º do CPT e nº 2 do artigo 153º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A……., contribuinte nº ……., com domicílio fiscal na Rua ……. nº … – …… - ………. (……) na qualidade de responsável subsidiário pela divida a exigir nos presentes autos, proveniente de IVA dos anos de 1998 e 1999, no valor total de 5.736,18€.
Proceda-se à citação do agora executado por reversão, nos termos dos artigos nº 160º do CPPT, para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia exequenda, sem juros de mora nem custas (Nº 5, do artigo 23º da LGT).

E. Entre 01.09.1978 e 21.09.1994, o oponente figurou no registo da sociedade devedora originária como gerente da mesma, juntamente com C……. e D……… , obrigando-se a sociedade com a assinatura do gerente C…….. ou pela dos outros dois gerentes em conjunto - cfr. fls. 10 e ss. do processo físico.

F. Em 20.06.1994, foi proferida sentença a declarar falida a sociedade devedora originária - cfr. fls. 28 do processo físico.

G. Em 31.12.2000 e 27.04.2001, terminaram os prazos de pagamento voluntário das dívidas em causa - cfr. fls. 45 e 47 do processo físico.
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Questão objecto de recurso:
1 – Pode ser determinada a restituição do montante indevidamente pago em processo de oposição?

A sentença recorrida considerando que não foi efectuada a necessária prova de que o oponente exerceu a gerência da empresa originária devedora, e, nessa medida não podendo ser responsabilizado, a título subsidiário pelo pagamento das dívidas fiscais daquela, considerou o oponente parte ilegítima para a referida execução fiscal. Considerou que tal decisão prejudicava o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos, entre elas o pedido de restituição do montante pago acrescido de juros indemnizatórios.
Tendo-se quedado pela análise da inexistência do pressuposto processual de legitimidade do revertido, ficou prejudicado o conhecimento de toda e qualquer questão jurídica que pudesse decorrer da análise do mérito das pretensões formuladas.
Todavia, nesta particular circunstância em que o oponente é chamado ao processo executivo na qualidade de responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, chamamento que o tribunal declara sem fundamento legal, tanto mais que directamente formulado esse pedido, terá que tomar-se conhecimento do pedido de condenação da Administração Tributária à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 100.º da Lei Geral Tributária.
O processo não contém elementos sobre a alegada compensação e pagamento voluntário do montante exequendo, impondo-se a anulação da sentença recorrida, por insuficiência da matéria de facto, nos termos do disposto no artº 682.º, n.º 3 do artigo do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto nos art.º 2.º e 281.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, para que seja substituída por outra que, após a necessária ampliação da matéria de facto nos termos atrás apontados, reaprecie o pedido de devolução do montante pago e juros indemnizatórios.
Fez, pois, a sentença recorrida uma incorrecta interpretação da lei impondo-se a sua anulação para ampliação da matéria de facto.


Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para proceder à ampliação da matéria de facto e conhecer do pedido de restituição do montante pago e juros indemnizatórios.

Custas pela recorrida que não suporta taxa de justiça face à ausência de alegações.

(Processado e revisto pela relatora com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 23 de Janeiro de 2019. – Ana Paula Lobo (relatora) – Dulce Neto – Aragão Seia.