Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0954/13
Data do Acordão:04/09/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:REVERSÃO
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I – Um dos requisitos constitutivos do direito à reversão da execução fiscal é o exercício efectivo da gerência, o qual, se estiverem em causa situações susceptíveis de enquadramento na previsão das alíneas a) e b) do nº 1 do art. 24º da LGT, impõe a circunstanciada indicação do período do exercício do cargo: se na data da constituição das dívidas, se na data do pagamento ou entrega do respectivo tributo, se em ambos os períodos.
II – Tais pressupostos têm de ser alegados/incorporados no despacho de reversão, com a obrigatoriedade de indicação das concretas normas legais em que o órgão da execução faz apoiar a responsabilidade subsidiária imputada ao revertido, para lhe permitir conhecer e questionar, atacando se necessário, os concretos pressupostos determinantes da reversão da execução contra si, habilitando-o a reagir eficazmente, pelas vias legais, contra a lesividade do acto caso com ele não se conforme.
III – Limitando-se o despacho de reversão a reproduzir todo texto do art. 24º da LGT sem subsumir a situação do revertido numa das suas alíneas, assim fundamentando a reversão simultaneamente nas alíneas a) e b) do seu nº 1, pese embora elas tenham âmbitos de aplicação distintos, e não constando desse despacho a indicação do período de exercício do cargo pelo revertido, não merece censura a sentença recorrida quando decidiu pela falta de fundamentação do despacho de reversão por se desconhecer a que título é imputável a culpa ao revertido.
Nº Convencional:JSTA00068660
Nº do Documento:SA2201404090954
Data de Entrada:05/27/2013
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:LGT98 ART24 N1 A B ART77.
CPPTRIB99 ART153.
CPA91 ART124.
CONST76 ART268.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. O MINISTÉRIO PÚBLICO recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a oposição que A……………….. deduziu à execução fiscal nº 2070200901007106 e apensos, instaurada contra a sociedade B………………….., Ldª, por dívidas de coimas, IVA, IMI, IRS, IRC e juros de mora, no montante de € 114.428,39, e que contra ele reverteu.
1.1. Terminou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:

1. A sentença recorrida decidiu pela falta de fundamentação do despacho que determinou a reversão contra o oponente por se desconhecer “a que título lhe é imputável a culpa, porquanto o despacho de reversão reproduz todo o artigo 24º da LGT sem subsumir a situação do revertido numa das suas alíneas.”

2. É certo que as alíneas do n° 1 do art. 24º da LGT têm âmbito de aplicação diferentes, prevendo regimes diferentes um do outro, havendo, por isso, necessidade de as concretizar e indicar, com clareza, aquela em que assenta o despacho de reversão.

3. Mas se assim é, não é menos verdade que o mesmo acto de reversão pode assentar simultaneamente em ambas as alíneas, o que na vertente situação sucedeu, uma vez que a AT sustentou nelas o despacho que determinou aquele acto, fazendo coincidir a fundamentação, essencialmente, com a redacção legal de tais dispositivos legais, que reproduziu.

4. Tal despacho mostra-se apto a revelar a um destinatário normal ou razoável as razões de facto e de direito que determinaram a decisão, habilitando-o a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respectiva lesividade, caso com a mesma não se conforme.

5. O que está em causa não é falta de fundamentação mas uma análise diferente da mesma, o que se prende já com a validade substancial da fundamentação, em saber se os factos e as normas legais em que a AT assentou o despacho de reversão preenchem os pressupostos legais para a prática desse acto.

6. Neste particular, mesmo que pudesse assistir alguma dúvida sobre a legalidade do acto de reversão em relação à dita alínea a), o acerto em função da alínea b) é irrefutável, já que resulta expressa e claramente dele que a dívida reporta-se ao período do exercício de gerência do oponente, em cujo prazo legal de pagamento ou entrega deveria ter ocorrido, não se colocando em causa os restantes requisitos da reversão.

7. E na circunstância, a alegação da falta de culpa não se encontra a cargo da AT, por não ter o ónus dessa prova, mas do próprio revertido.

8. Mostrando-se confirmados na sentença recorrida os restantes requisitos estabelecidos nos arts. 24º da LGT e 153º do CPPT, o despacho determinativo da reversão não padece da ilegalidade referida pela Mm Juiz na sentença recorrida.

9. Nessa medida, ao decidir como decidiu, a Mm Juiz “a quo” fez, a nosso ver, errada interpretação e aplicação dos artigos 24° e 77° da LGT, 153° do CPPT e 124° do CPA pelo que deve anular-se a sentença recorrida e ser substituída por outra que declare fundamentado o despacho que decretou a reversão.


1.2. O Recorrido A……………… apresentou contra-alegações para defender a manutenção do julgado.

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de que devia ser concedido parcial provimento ao recurso, com a seguinte argumentação:

«O despacho de reversão mostra-se fundado, quer no art. 24.º n.º 1 al. a) da LGT, quer na sua al. b).

Contudo, no despacho de preparação à reversão consta com base numa presunção de culpa extraída do exercício de funções que o património da primitiva devedora se tornou insuficiente por culpa do oponente.

Já se decidiu que pode ser de entender resultar aplicável a dita al. b), sendo de entender a reversão como admissível “quanto às dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo” - neste sentido ac. do STA de 14-2-13, proferido no rec. 0642/12, acessível em www.dgsi.pt.

Por outro lado, quanto às dívidas de coimas, é certo que em face da alteração que foi introduzida ao art. 148º nº 1 al. c) do CPPT pela Lei nº 3-b/2010, de 28/4, as mesmas ser imputadas a título de responsabilidade subsidiária.

Contudo, o despacho de reversão não só é totalmente omisso quanto à norma em que se funda a responsabilidade por coimas, como quanto ao fundamento em que se funda a responsabilidade pelo seu pagamento.

É certo que no dito anterior despacho de preparação à reversão se funda a mesma ainda no art. 8º do R.G.I.T.

No nº 1 deste dispositivo distingue-se quanto aos factos que tenham ocorrido no período do exercício do cargo ou anteriormente, dependendo os mesmos, segundo o previsto na sua al. a) de culpa na dita insuficiência de património, e segundo a al. b), quanto aos factos anteriores, ainda, das coimas lhe terem ainda sido notificadas no dito período, o que não se pode presumir) segundo o previsto no art. 342º n.º 1 do C. Civil.

Concluindo, o recurso é, em parte, de proceder, sendo de entender quanto à reversão por coimas que, embora poder também ter havido culpa na insuficiência do património, importava que tivesse sido demonstrado pela A.T. se as mesmas eram anteriores por factos cometidos no período da gerência ou anteriores e se, sendo este o caso, as mesmas lhe tinham sido notificadas no período em causa, o que não se pode, sem mais, presumir.».


1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir.

2. Na decisão recorrida constam como assentes os seguintes factos:

A) Contra a sociedade B…………….., Ldª, foi instaurada a execução fiscal nº 2070200901007106 e apensos, por reversão de dívidas de Coimas, IVA, IMI, IRS, IRC e juros de mora, nos termos constantes de fls. 23 a 82, dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

B) Em 14/12/2010, no âmbito do processo de execução referido em A), foi elaborada a informação de fls. 28vº dos autos, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e onde se refere designadamente o seguinte:

«(…)
O bem conhecido da executada encontra-se penhorado e marcada a venda no processo nº 2070200501031457 e Aps. cuja divida actual é de € 76.553,35€.
O valor actual em dívida nos presentes autos é de 114.428,39 (cento e catorze mil quatrocentos e vinte oito euros e trinta e nove cêntimos),
Assim e não havendo mais bens em nome da executada presume-se que os mesmos sejam insuficientes para o pagamento integral da dívida nos autos, com penhora e consequentemente, sem bens susceptíveis de garantirem qualquer pagamento nos presentes autos.
Como os actos praticados pelos gerentes em representação da sociedade produzem os seus efeitos na esfera jurídico desta e não na sua própria, e legislador fiscal atribui-lhes, através do art. 24º da LGT e art. 8º do RGIT uma responsabilidade ex lege de objecto tributário, baseado numa interpretação pessoal dos actos sociais e numa presunção funcional, sendo responsável(veis) à data da origem da dívida, salvo se se provar a sua inculpabilidade nessa insuficiência patrimonial, em fase de audição, o(s) sócio(s) gerente(s), à data dos factos constitutivos dos impostos:
A………………. NIF ………….
(…)

C) Em 14/12/2010, foi proferido despacho de preparação da reversão, nos termos constantes de fls. 29, dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e onde se refere designadamente o seguinte:

“(...)
DESPACHO



(…)».

D) Em 24/01/2011 foi proferido Despacho de Reversão contra o oponente, nos termos constantes de fls. 15 dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e onde se refere designadamente o seguinte:

«FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Dos administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da dívida se verificou no período de exercício do cargo [art. 24°/nº 1/a) LGT];
Ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo [art. 24º/nº 1/a) LGT);
Não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício da carga [art. 24º/nº 1/ b) LGT].».

E) Em 6/9/2011, foi o oponente citado de que é executado por reversão, como responsável subsidiário, não contendo a citação os fundamentos da reversão nos termos constantes de fls. 14 dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

F) Com o despacho de citação, referido em E), foi entregue ao revertido um documento denominado “INFORMAÇÃO”, referente à reversão nº 2070.2010.46 datado de 6/09/2011, nos termos constantes de fls. 16 dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido onde se refere designadamente o seguinte:

«De acordo com o legalmente exigido (…) e de forma a indicar todos os elementos relevantes que serviram de base à decisão da efectivação da reversão, por parte deste OEF, anexam-se os seguintes documentos à citação:
1. Cópia dos Títulos Executivos;
2. Despacho da Chefe de Finanças que determinou a reversão;
3. Cópia da Certidão de Diligências efectuadas por este Serviço de Finanças, ande se conclui a inexistência de bens penhoráveis na esfera jurídica da devedora originária;
(…)».

G) A cópia da certidão de diligências, referida em F), é datada de 16/06/2011 e refere-se ao processo de execução fiscal nº 2070201001027956 e apensos, nos termos constantes de fls. 17 dos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido onde se refere designadamente o seguinte:

«(...) Em face dos elementos constantes no sistema informático, e após diversas diligências, verifica-se que a empresa em causa não possui quaisquer bens penhoráveis que possam dar cumprimento ao presente processo, estando assim reunidos os fundamentos para a reversão (…)».

3. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a oposição que A……………….. deduziu à execução fiscal nº 2070200901007106 e apensos, instaurada contra a sociedade B…………………, Ld.ª, por dívidas de coimas, IVA, IMI, IRS, IRC e juros de mora, e que contra aquele reverteu.

A oposição teve por fundamento a falta de fundamentação do despacho de reversão quer quanto à situação patrimonial da sociedade devedora originária quer quanto à culpa do revertido pela insuficiência patrimonial da mesma.

A sentença recorrida, depois de discorrer sobre o dever de fundamentação dos actos em matéria tributária e de haver considerado que o vício de falta de fundamentação no que se refere à insuficiência de bens da sociedade devedora se reconduzia, afinal, a vício da própria citação - por falta de junção dos devidos documentos - que devia ser invocado em reclamação dirigida ao órgão de execução e não em sede de oposição, julgou procedente a oposição por vício de falta de fundamentação do despacho de reversão no que se refere à culpa do revertido e no que se refere à sua obrigação de pagamento das dívidas de coimas aplicadas à sociedade, sufragando o seguinte entendimento:

«Relativamente à fundamentação no que se refere à culpa do responsável subsidiário pela insuficiência do património da sociedade executada, desconhece-se a que título lhe é imputável a culpa, porquanto o despacho de reversão reproduz todo o artigo 24º da LGT sem subsumir a situação do revertido numa das suas alíneas, pelo que é manifestamente insuficiente.
Acresce que tratando se também de dívidas resultantes de coimas, a norma aplicável para a reversão de dívidas é o artigo 8º do RGIT.
Decorre da matéria de facto provada que, em momento algum, seja no despacho de reversão, seja na citação, é feita referência a este normativo, pelo que a fundamentação de direito é manifestamente insuficiente.
Suficientes têm de ser os fundamentos no sentido de aptos a dar a perceber o processo lógico que levou à decisão consubstanciada no acto concretamente praticado.
Perante o que se conclui que a decisão motivada nos termos descritos não indica, com clareza os elementos de facto e de direito que determinaram a reversão.
Nesta medida procede o vício de falta de fundamentação.».

O Ministério Público, ora Recorrente, manifesta o seu desacordo quanto ao sentido que o tribunal a quo extraiu da abrangente referência que o acto de reversão faz à norma contida no art. 24º da LGT, porquanto, na sua perspectiva, tal significa apenas que esse acto se fundamentou tanto na alínea a) como na alínea b) desse preceito legal, acto que, na sua óptica, é perfeitamente apreensível por um destinatário normal. Sustenta, por isso, que o despacho de reversão se encontra devida e suficientemente fundamentado. E porque à luz do que dispõe a alínea b) do art. 24º da LGT, o ónus da alegação e prova da falta de culpa impendia sobre o revertido, conclui que a sentença enferma de erro de julgamento quanto à interpretação dos arts. 24º e 77º da LGT, 153º do CPPT e 124º do CPA, razão por que sustenta que «deve anular-se a sentença recorrida e ser substituída por outra que declare fundamentado o despacho que decretou a reversão.».

Deve desde já dizer-se que o tribunal ad quem nunca poderia proferir decisão com a amplitude pedida pelo Recorrente, já que nas conclusões das alegações – que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso - o Recorrente apenas questiona a vertente da sentença que incidiu sobre a questão da fundamentação formal do despacho de reversão nos termos do art. 24º da LGT, julgando-o infundamentado, mas deixando intocada a parte da decisão que se refere às coimas.

Com efeito, não tendo o Recorrente ensaiado demonstrar o desacerto da fundamentação factual e/ou jurídica da sentença quanto à reversão das coimas, não pondo sequer em crise os concretos motivos que levaram a o tribunal a quo a decidir essa questão nos termos em que o fez, deixando-os incólumes, o presente recurso sempre teria, nessa parte, de improceder.

Nesta circunstância, a única questão que resta apreciar é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito ao ter julgado que o despacho que determinou a reversão da execução contra o Oponente, ora Recorrido, não se encontra suficientemente fundamentado, tendo em conta que nesse despacho não consta a concreta alínea do artigo 24º da LGT que sustenta a reversão.

Vejamos.

É inquestionável que a Administração tem o dever de fundamentar os actos que afectem os direitos ou legítimos interesses dos administrados, em harmonia com o princípio plasmado no art. 268º da CRP e acolhido nos arts. 124º do CPA e 77º da LGT. E como a doutrina e a jurisprudência têm vindo exaustivamente a repetir, a fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação.

Assim, a fundamentação deve ser entendida como a obrigação de enunciar expressamente (de modo directo ou por remissão) os motivos de facto e de direito que determinaram o agente ou órgão decisor, esclarecendo o seu destinatário das razões que o motivaram e do porquê do sentido decisório, visando proporcionar ao administrado o conhecimento do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto.

Deste modo, o acto só estará fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o artigo 487º, nº 2, do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação.

No caso presente, emerge clara e expressamente do teor do despacho de reversão [transcrito na alínea D) do probatório] que o oponente é responsabilizado pelo pagamento da dívida exequenda face à qualidade de «administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas …» e por

(i) «Ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da dívida se verificou no período de exercício do cargo»,

(ii) «Ter sida feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo»;

(iii) «Não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo».

Corresponde tal fundamentação, no essencial, ao próprio teor normativo das alíneas a) e b) do nº 1 do art. 24º da LGT que versam sobre a responsabilidade subsidiária

É, assim, inequívoco que o despacho de reversão se fundamenta simultaneamente nas duas normas contidas no enunciado preceito legal, pese embora cada uma delas tenha um âmbito de aplicação próprio e específico: enquanto a norma da alínea a) se aplica aos casos em que as dívidas se constituíram no período de exercício do cargo de gerente mas foram postas à cobrança depois da cessão dessas funções ou quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois desse exercício, já a norma da alínea aplica-se aos casos em que o prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tenha terminado no período de exercício do cargo.

E as implicações da imputação da responsabilidade por cada uma dessas normas são legalmente relevantes, tendo em conta a bipartição de regimes quanto à repartição do ónus da prova: enquanto na alínea a) não se prevê qualquer presunção de culpa do gerente da sociedade, ficando, por isso, a cargo da Fazenda Pública o ónus de provar que foi por culpa daquele que o património social se tornou insuficiente para satisfação das dívidas, já na alínea b) se onera o responsável subsidiário com a prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento.

O que significa que, no caso, e face ao teor do despacho de reversão, não se sabe qual delas determinou a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, ora recorrido, isto é, não se sabe se recaía sobre este o ónus de prova de que não tinha tido culpa na insuficiência dos bens da executada originária para pagamento das dívidas tributárias ou se esse ónus de prova recaía sobre a administração tributária.

E essa imputação também não se extrai do restante contexto fundamentador do despacho de reversão, porque dele não consta, ainda que por mera remissão, o período em que o revertido exerceu a gerência da sociedade devedora originária – se no período da constituição das dívidas, se no período do pagamento ou entrega do tributo, se em ambos os períodos.

Ora, como se sabe, um dos requisitos constitutivos do direito à reversão é o exercício efectivo da gerência, o qual, se estiverem em causa situações susceptíveis de enquadramento na previsão do nº 1 do art. 24º da LGT, impõe a circunstanciada indicação do período do exercício do cargo: se na data da constituição das dívidas, se na data do pagamento ou entrega do respectivo tributo, se em ambos os períodos.

Tais pressupostos têm de ser alegados/incorporados no despacho de reversão, com a obrigatoriedade de indicação das concretas normas legais em que o órgão da execução faz apoiar a responsabilidade subsidiária imputada ao revertido, para lhe permitir conhecer e questionar, atacando se necessário, os concretos pressupostos determinantes da reversão da execução contra si, habilitando-o a reagir eficazmente, pelas vias legais, contra a lesividade do acto caso com a mesma não se conforme.

Neste contexto, e tendo em conta a ausência de indicação do período de exercício do cargo pelo revertido, indicação que não pode ser feita pelo Ministério Público nem pelo Tribunal (como parece pretender o ora Recorrente ao querer eleger agora a norma contida na alínea b) do art. 24º da LGT como fundamento da reversão), não merece censura a sentença recorrida quando decidiu pela falta de fundamentação do despacho que determinou a reversão contra o oponente por se desconhecer “a que título lhe é imputável a culpa, porquanto o despacho de reversão reproduz todo o artigo 24º da LGT sem subsumir a situação do revertido numa das suas alíneas.”.

Por fim, refira-se que não há que chamar à colação o acórdão proferido pelo STA em 14/02/2013, no proc. nº 0642/12, dado que na situação aí prevista constava de documento que instruíra o procedimento de reversão que os revertidos sempre tinham sido os únicos gerentes da sociedade desde a sua constituição, não subsistindo qualquer dúvida de que haviam exercido a gerência nos dois momentos a que se referem as alíneas a) e b) do nº 1 do art. 24º da LGT, o que, aliás, eles nunca negaram ou questionaram.

Situação que, no presente caso, não foi alegada nem aceite pelo oponente.

Termos em que não podem proceder as conclusões do recurso.

4. Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Sem custas.


Lisboa, 9 de Abril de 2014. – Dulce Neto (relatora) – Isabel Marques da SilvaPedro Delgado.