Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:055/11
Data do Acordão:05/11/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
TEMPESTIVIDADE DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
FÉRIAS JUDICIAIS
Sumário:Os prazos de interposição de recursos ou impugnações judiciais de decisões administrativas que terminam em férias judiciais transferem-se para o primeiro dia útil seguinte ao termo destas, não obstando a tal transferência - fundada no disposto na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil – o facto de a apresentação da petição ser efectuada junto da administração tributária, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 103.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Nº Convencional:JSTA00066957
Nº do Documento:SA220110511055
Data de Entrada:01/21/2011
Recorrente:A... E OUTRA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LEIRIA DE 2001/11/13 PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART102 ART103 N1.
LOFTJ99 ART12.
CCIV66 ART279.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO VOLI 5ED PAG730.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A… e B…, com os sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal do despacho liminar, de fls. 116 dos autos, pelo qual em 13 de Novembro de 2001 o então Tribunal Tributário de 1.ª instância de Leiria indeferiu liminarmente, por extemporaneidade, a impugnação judicial deduzida pelos ora recorrentes contra as liquidações de IRS constantes de fls. 38 e 39 dos autos e relativas aos anos de 1998 e 1999, recebendo a impugnação quanto às restantes.
O recurso foi interposto para este Supremo Tribunal e a ele juntas as respectivas alegações (fls. 120 a 123 dos autos), nas quais se conclui nos seguintes termos:
1 – O prazo de 90 dias para deduzir a presente impugnação judicial ocorreu em 17 de Julho de 2001, data esta incluída no período de férias judiciais.
2 – Férias judiciais que terminaram a 14 de Setembro, sendo que os dias 15 e 16 corresponderam a um sábado e domingo.
3 – Daí que o último dia de que a impugnante dispunha para deduzir a presente impugnação ocorreu em 17 de Setembro, primeiro dia útil após as férias e o fim-de-semana.
4 – Daí que a impugnação deduzida em 30 de Julho de 2001 seja tempestiva.
5 – Dispõe a alínea e) do artigo 279.º que para efeitos de contagem do termo do prazo, às férias judiciais aplica-se o regime dos sábados e domingos.
6 – A douta decisão recorrida fez errada aplicação da alínea a) do nº 1 do artigo 102.º do CPPT e da alínea e) do artigo 279.º do Código Civil.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e em consequência ser revogada a douta decisão recorrida, ordenando-se o prosseguimento dos autos em primeira instância.
2 - Não foram apresentadas contra-alegações.
3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
Objecto do recurso: decisão de indeferimento liminar de petição de impugnação judicial deduzida contra liquidações adicionais de IRS e juros compensatórios (anos 1998 e 1999)
FUNDAMENTAÇÃO
1. Apreciação do recurso
A decisão impugnada de indeferimento liminar tem por objecto a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios – anos de 1998 e 1999 (fls. 116)
A decisão proferida, com trânsito em julgado, tem diferente objecto: liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios (fls. 354/369)
Esta diferença tem as seguintes consequências:
- desconsideração da decisão impugnada como uma decisão interlocutória, passível de recurso cuja apreciação fique dependente da interposição do recurso da decisão final (art. 285º nº 1 CPPT)
- utilidade autónoma da apreciação do recurso
2. Mérito do recurso
O termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias liquidadas verificou-se em 18.04.2001 (fls. 38/39)
O termo do prazo legal de 90 dias para dedução de impugnação judicial ocorreu em 17.07.2001, data incluída no período de férias judiciais de verão, pelo que se transferiu para 17.09.2001, primeiro dia útil após férias (art. 279º al. e) CCivil; art. 102º nº1 al. a) CPPT);
Neste contexto é tempestiva a petição de impugnação apresentada em 30.07.2001 (tendo por objecto as liquidações de IRS e juros compensatórios)
Porém, o prosseguimento da tramitação de impugnação judicial com aquele objecto, na sequência do provimento do recurso, traduzir-se-ia numa violação de imperativo legal, na medida em que os recorrentes formularam na petição uma cumulação ilegal de pedidos de anulação de actos tributários respeitantes a tributos de natureza diferente (IVA/IRS) (art. 104º CPPT)
Esta ilegal cumulação tem como consequência a rejeição da impugnação judicial, por ilegalidade da sua dedução, sem prejuízo da faculdade de apresentação pelos autores de nova petição no prazo de um mês a contar do trânsito em julgado da decisão do recurso, com data retroagida à data de apresentação da primeira petição (art. 57º parágrafo 4º RSTA; art. 38º nº4 LPTA, aplicáveis a processos iniciados antes de 1.01.2004, início de vigência do CPTA)
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A decisão impugnada deve ser confirmada (com a fundamentação supra enunciada).
Notificadas as partes do parecer do Ministério Público (fls. 385 a 387 dos autos), nada vieram dizer.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se, como decidido, é intempestiva a impugnação apresentada tendo por objecto as liquidações de IRS relativas aos anos de 1998 e 1999.
Não se toma conhecimento da questão suscitada pelo Ministério Público da ilegal cumulação de impugnações, dado que a impugnação que não foi objecto de indeferimento liminar encontra já julgada, com trânsito em julgado da decisão, pelo que o conhecimento das liquidações de IRS não concretizam qualquer cumulação.
5 – Apreciando
5.1 Da tempestividade da impugnação
O despacho recorrido, que subiu a este Supremo Tribunal depois de em 6 de Outubro de 2010 ter sido proferida sentença que julgou procedente a impugnação deduzida quanto às liquidações de IVA e juros compensatórios impugnadas (cfr. sentença de fls. 354 a 369 dos autos) e de os recorrentes terem manifestado interesse na manutenção do recurso que haviam interposto do despacho liminar de indeferimento quanto às liquidações de IRS (cfr. fls. 375 a 377 dos autos), é do seguinte teor:
«Compulsados os documentos de cobrança juntos pela impugnante, que consubstanciam as liquidações impugnadas, verifica-se que as de folhas 38 e 39 têm como data limite de pagamento voluntário 18 de Abril de 2001.
A douta petição inicial deu entrada no serviço periférico local de finanças em 30 de Julho de 2001, portanto para além dos 90 dias a que alude a alínea a) do n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/99, de 26 de Outubro, alterado e republicado em anexo à Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, com início de vigência em 5 de Julho de 2001 e aplicação a todos os processos pendentes.
Assim sendo, relativamente a estas prestações tributárias, indefiro liminarmente a douta petição inicial.
Não havendo motivos para indeferimento liminar, quanto às restantes, RECEBO A IMPUGNAÇÃO.
Notifique, sendo o Exmo. Representante da Fazenda Pública para contestar, querendo, “no prazo de 90 dias” e solicitar a produção de prova adicional, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.» (fim de citação).
Alega a recorrente que, ao contrário do decidido, a impugnação é tempestiva quanto às liquidações de IRS objecto de indeferimento liminar, pois que embora o prazo de 90 dias de que dispunha para deduzir impugnação judicial tivesse ocorrido em 17 de Julho de 2001, porque esta data estava já incluída no período de férias judiciais, que terminaram a 14 de Setembro (sendo que os dias 15 e 16 corresponderam a um sábado e domingo), o último dia de que a impugnante dispunha para deduzir a presente impugnação era o dia 17 de Setembro, primeiro dia útil após as férias e o fim-de-semana, daí que a impugnação deduzida em 30 de Julho de 2001 seja tempestiva, pois que dispõe a alínea e) do artigo 279.º (do Código Civil) que para efeitos de contagem do termo do prazo, às férias judiciais aplica-se o regime dos sábados e domingos (cfr. as conclusões das suas alegações de recurso supra transcritas).
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito apoia a alegação dos recorrentes quanto à tempestividade da petição de impugnação apresentada tendo por objecto as liquidações de IRS e juros compensatórios.
Vejamos.
O fundamento para o indeferimento liminar (parcial) da petição de impugnação relativamente às liquidações de IRS respeitantes aos anos de 1998 e 1999 foi a sua extemporaneidade, pois que se julgou que delas constando como data limite de pagamento o dia 18 de Abril de 2001 (cfr. fls. 38 e 39 dos autos) e tendo a petição de impugnação dado entrada no serviço periférico local de finanças em 30 de Julho de 2001, teria dado entrada para além dos 90 dias a que alude a alínea a) do n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Não atendeu, contudo, o tribunal “a quo” a que as férias judiciais de verão decorriam então de 16 de Julho a 14 de Setembro (cfr. o artigo 12.º da Lei de organização e funcionamento dos tribunais judiciais – Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro -, então vigente) e que a jurisprudência do STA tem vindo a ser uniforme no sentido de que os prazos de interposição de recursos ou impugnações judiciais de decisões administrativas que terminam em férias judiciais se transferem para o primeiro dia útil seguinte ao termo destas, não obstando a tal transferência - fundada no disposto na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil – o facto de a apresentação da petição ser efectuada junto da administração tributária, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 103.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário – CPPT (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e comentado, Vol. I, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2006, pp. 730 – nota 2 ao art. 102.ºdo CPPT - e p. 270 – nota 10 ao art. 20.º do CPPT, bem como jurisprudência aí citada nas notas de rodapé números 1 e 2).
Desta forma, como o termo do prazo de 90 dias (artigo 102.º n.º 1, alínea a) do CPPT) de que o recorrente dispunha para deduzir impugnação terminava em férias judiciais este transferiu-se, ex vi do disposto na alínea e) do artigo do artigo 279.º do Código de Processo Civil, para o primeiro dia útil após férias, ou seja, no ano de 2001, para o dia 17 de Setembro de 2001, pois o último dia de férias judiciais de verão coincidiu com uma sexta-feira. E assim sendo, a petição de impugnação apresentada no dia 30 de Julho de 2001 foi apresentada tempestivamente, pois que o prazo de que os então impugnantes dispunham para a apresentar apenas terminava no dia 17 de Setembro desse ano.
Haverá, pois, que revogar a recorrida decisão de indeferimento liminar, por extemporaneidade, da petição de impugnação, pois que esta foi tempestivamente apresentada.
O recurso merece, pois, provimento.
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conceder provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido e julgando tempestiva a impugnação apresentada, baixando os autos à primeira instância para que prossigam se a tal nada mais obstar.
Sem custas.
Lisboa, 11 de Maio de 2011. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Dulce Neto - Valente Torrão.