Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01437/18.4BEBRG
Data do Acordão:04/10/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:DÍVIDA À SEGURANÇA SOCIAL
PRESCRIÇÃO
CITAÇÃO
INTERRUPÇÃO
EFEITO DURADOURO
Sumário:I - Constitui facto interruptivo do prazo legal de prescrição de dívidas à Segurança Social a citação para a execução fiscal, o qual tem não só um efeito jurídico instantâneo (de inutilizar todo o prazo anteriormente decorrido) como, também, um efeito jurídico duradouro, isto é, um efeito interruptivo que permanece até ao termo do processo executivo, em conformidade com o disposto no art.º 327º nº 1 do Código Civil, norma cuja aplicação se deve ao facto de o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social e a actual Lei Geral Tributária nada disporem sobre a matéria.
II - Relativamente a dívidas tributárias, as regras que disciplinam o instituto geral da prescrição e que encontram previsão no Código Civil só podem ter aplicação quando não haja regulação especial (na LGT ou em diploma próprio) sobre a matéria.
Nº Convencional:JSTA000P24453
Nº do Documento:SA22019041001437/18
Data de Entrada:02/26/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL
SECÇÃO DE PROCESSOS DE BRAGA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A…………, melhor identificado nos autos, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 15/10/2018, que julgou improcedente a reclamação que apresentou contra o acto do órgão de execução fiscal que lhe indeferiu o pedido de declaração de prescrição da dívida em cobrança nas execuções fiscais nºs 0301200900093343, 0301200900093351, 0301201000194476, 0301201000194492, 0301201000194514, 0301201000194557, 0301201100584673, 0301201100584681 e 0301201100359220, proveniente de quotizações e contribuições em dívida à Segurança Social relativas a Agosto de 2007 e ao período de Novembro/2007 a Janeiro/2009 e coimas aplicadas.

1.1. Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:

A. Resulta provado que o pagamento de cotizações e contribuições é mensal e é efetuado do dia 10 até ao dia 20 do mês seguinte àquele a que as contribuições e as cotizações dizem respeito - tal resulta do art.º 43º da Lei nº 110/2009, de 16 de setembro, que procedeu à aprovação do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

B. Resulta provado que face ao alegado incumprimento no pagamento daquelas prestações pelo Recorrente, tinha a Recorrida o prazo de 5 (cinco) anos para cobrança coerciva das contribuições e das cotizações a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.

C. Resulta provado que o único facto com efeitos interruptivo corresponde às citações do Recorrente para os processos de execução.

D. Resulta provado que, com a citação, ocorre a interrupção do prazo prescricional, pelo que todo o prazo decorrido até à data da citação fica inutilizado, reiniciando-se novo prazo de prescrição de 5 (cinco) anos.

E. Resulta provado de que em matéria de relações jurídico-tributárias, e por força da hierarquia das normas prevista no art.º 2º da LGT, prevalecem as normas especiais em matéria tributária sob as normas gerais do Código Civil.

F. Resulta provado que, em matéria de interrupção, a fundamentação do Tribunal a quo com recurso ao disposto no art.º 327º do CC, viola o princípio da legalidade e do pensamento legislativo, ao não considerar a unidade do sistema jurídico-tributário, face à existência de regulamentação deste instituto em lei especial.

G. Resulta provado que a dependência de uma decisão que põe termo ao processo em matéria jurídico-tributária encontra-se regulado em matéria de suspensão, conforme resulta do exposto no art.º 49º, nº 4, al. b), da LGT.

H. Resulta provado de que os processos nºs 301200900093343 e 301200900093351, alegadamente instaurados em 13/06/2009, a ter existido a ocorrência de algum facto interruptivo, como a citação em 30/06/2009, iniciou-se um novo prazo de prescrição, de cinco anos, pelo que as cotizações e contribuições, juros ou outras quantias prescreveram, se não antes, em 30/06/2014.

I. Resulta provado de que os processos nºs 301201000194514 e 301201000194557, alegadamente instaurados em 16/03/2010, a ter existido a ocorrência de algum facto interruptivo, como a citação em 30/03/2010, iniciou-se um novo prazo de prescrição, de cinco anos, pelo que as cotizações, contribuições, juros ou outras quantias prescreveram, se não antes, em 30/05/2015.

J. Resulta provado de que os processos nºs 301201100584673 e 301201100584681, alegadamente instaurados em 02/09/2011, a ter existido a ocorrência de algum facto interruptivo, como a citação em 20/09/2011, ter-se-á iniciado um novo prazo de prescrição, de cinco anos, pelo que as cotizações, contribuições ou outras quantias prescreveram, se não antes, em 20/09/2016.

K. Resulta provado de que os processo nº 301201100359220, alegadamente instaurados em 25/05/2011, a ter existido a ocorrência de algum facto interruptivo, como a citação em 30/06/2011, ter-se-á iniciado um novo prazo de prescrição, de cinco anos, pelo que as cotizações, contribuições de trabalhador independente, juros ou outras quantias prescreveram, se não antes, em 30/06/2016.

Nestes termos,

E nos melhores de Direito que V/Exa. proficuamente suprirá, devem as presentes alegações de recurso ser julgadas procedentes, por provadas e, por via disso, alterar-se a decisão a quo nos exatos termos pedidos das Conclusões supra, só assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA!

1.2. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que devia ser negado provimento ao recurso por não assistir razão ao Recorrente.

1.4. Com dispensa de vistos legais, cumpre decidir em conferência.

2. Na decisão recorrida julgaram-se como provados os seguintes factos:

A. Na Secção de Processo Executivo de Braga do "Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP." foram instaurados os seguintes processos de execução contra o Reclamante:


B. Foram remetidas cartas com "Citação", por correio registado com aviso de recepção, para o Reclamante, para os seguintes processos de execução:



C. Em 23/05/2016, o Reclamante remeteu requerimento por carta à Reclamada, com o seguinte "Assunto: Declaração de Prescrição" - Fls. 36 verso a 39;

D. Sobre o requerimento foi elaborada "Informação/Proposta" com o seguinte teor:

I - Dos fundamentos:

1. Por requerimento aos autos de processo o Executado supra identificado vem alegar a prescrição da dívida exequenda;

2. Os processos executivos nºs 0301200900093343 e 0301200900093351 foram instaurados em 2009-06-13 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2008/03 a 2008/12 titulado pela certidão de dívida nº 10244/2009 e 10245/2009, respectivamente.

3. Os processos executivos nº 0301201000194476 e 0301201000194492 foram instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Coimas e Encargos - Coimas do período 2008/04 titulado pela certidão de dívida nº 7038/2010 e 7039/2010, respectivamente.

4. Os processos executivos nºs 0301201000194514 e 0301201000194557 foram instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2007/08; 2007/11 a 2008/02 e 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 7042/2010 e 7044/2010, respectivamente.

5. Os processos executivos nºs 0301201100584673 e 0301201100584621 foram instaurados em 2011-09-02, para cobrança coerciva de Contribuições e Cotizações do período de 2008/03 titulado pela certidão de dívida nº 66647/2011 e 66646/2011, respectivamente.

6. O processo executivo nº 0301201100359220 foi instaurado em 2011-05-25 para cobrança coerciva de Contribuições de Trabalhador Independente do período de 2007/10 a 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 40613/2011.

7. Uma vez que a Secção de Processo a tem competência para a cobrança coerciva da dívida, remeteu estes elementos para a unidade de Contribuições/Núcleo de Gestão de Contribuições do Centro Distrital de Braga, I.S.S, I.P, tendo este serviço informado o seguinte: "Não há registo de qualquer ato interruptivo e/ou suspensivo referente ao executado A………… - NIF: ………."

8. Sendo a prescrição de conhecimento oficioso nos termos do artigo 175º do CPPT, cabe a esta Secção de Processo Executivo pronunciar-se sobre a mesma.

9. No que refere às contribuições para a Segurança Social, a contagem dos prazos de prescrição é feita nos termos do disposto na Lei nº 17/2000 de 8 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei 4/2001 de 16 de Janeiro, segundo o qual as Contribuições para a Segurança Social prescrevem decorrido o prazo de 5 anos, contado desde a data em que a obrigação deveria ter sido cumprida, ou seja, a contar do dia 16 do mês seguinte aquele a que respeitam uma vez que as mesmas devem ser pagas até o dia 15 do mês seguinte a que respeitem (art.º 10, nº 2, do D.L. nº 199/99 de 8 de Setembro).

10. A referida Lei entrou em vigor 180 dias após a sua publicação, mais concretamente, em 04/02/2001, pelo que é partir desta data que se inicia o novo prazo de prescrição de cinco anos que é contado nos termos do art.º 279º do Código Civil, terminando em 06/02/2006 (tendo o prazo de cinco anos terminado em 04/02/2006 e correspondendo este dia a um sábado, o prazo transfere-se para o primeiro dia útil, ou seja, 06/02/2006, nos termos do art.º 279º, alínea e), do Código Civil.

11. Ora, nos termos do disposto no artigo 63º nº 3 da Lei 17/2000 de 8 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei 4/2007 de 16 de Janeiro, “a prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida”.

12. O art.º 49º, nº 1, da LGT define que a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo são causas de interrupção da prescrição.

13. Neste regime especial de prescrição consideram-se diligências administrativas todas as que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal, conducentes à liquidação e cobrança de dívida de que venha a ser dado conhecimento ao titular - cfr. Jorge Lopes de Sousa, in "Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas" fls. 119.

14. O artigo 187º, nº 2, da Lei 110/2009 de 16 de Setembro, é mais abrangente e estabelece que o prazo de prescrição interrompe-se pela ocorrência de qualquer diligência administrativa realizada da qual tenha sido dado conhecimento ao responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou à cobrança da dívida e pela apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação.

15. Ademais, na senda da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo a citação para o processo executivo tem efeito duradouro (impede que o novo prazo comece a correr enquanto não findar o processo executivo), ex vi do disposto no n.º 1 do artigo 327º do Código Civil) v.g. Ac. STA nº 01500/14 de 20-05-2015, disponível em www.dgsi.pt.

16. Compulsados os autos, constata-se os seguintes factos interruptivos/suspensivos:

17. Relativamente aos processos executivos nºs 0301200900093351 e 0301200900093351 instaurados em 2009-06-13 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2008/04 a 2008/12 titulado pela certidão de dívida nºs 10244/2009 e 10245/2009, respectivamente, verifica-se a ocorrência de facto interruptivo em data anterior ao decurso do prato prescricional previsto para os tributos em causa - 2009-06-30 - Confirmação de Citação Pessoal. Os tributos em causa não se encontram prescritos. No que concerne ao período de 2008/03 os mesmos não apresentam dívida pelo que inexiste obrigação de reconhecimento de prescrição.

18. Relativamente aos processos executivos nº 0301201000194476 e 030120100019492 em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Coimas e Encargos - Coimas do período 2008/04 titulado pela certidão de dívida nº 7038/2010 e 7039/2010, respectivamente, verifica-se a ocorrência de facto interruptivo em data anterior ao decurso do prazo prescricional previsto para os tributos em causa - 2010-03-30 - Confirmação de Citação Pessoal. Os tributos em causa não se encontram prescritos.

19. Relativamente aos processos executivos nº 0301201000194514 e 0301201000194557 instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2007/11 a 2008/02 e 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 7042/2010 e 7044/2010, respectivamente verifica-se a ocorrência de facto interruptivo em data anterior ao decurso do prazo prescricional previsto para os tributos em causa - 2010-03-30 - Confirmação de Citação Pessoal. Os tributos em causa não se encontram prescritos.

No que concerne ao período de 2007/08 os mesmos não apresentam dívida pelo que inexiste obrigação de reconhecimento de prescrição.

20. Os processos executivos nºs 0301201100584673 e 0301201100584681 instaurados em 2011-09-02, para cobrança coerciva de Contribuições e Cotizações do período de 2008/03 titulado pela certidão de dívida nº 66647/2011 e 66646/2011, respectivamente, verifica-se a ocorrência de facto interruptivo em data anterior ao decurso do prazo prescricional previsto para os tributos em causa - 2011-09-20 - Confirmação de Citação Pessoal. Os tributos em causa não se encontram prescritos.

21. O processo executivo nº 0301201100359220 instaurado em 2011-05-25 para cobrança coerciva de Contribuições de Trabalhador Independente do período de 2007/10 a 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 40613/2011 verifica-se a ocorrência de facto interruptivo em data anterior ao decurso do prazo prescricional previsto para os tributos em causa - 2011-06-30 - Confirmação de Citação Pessoal. Os tributos em causa não se encontram prescritos.

II - Conclusão e proposta

Ante o exposto, proponho o indeferimento da declaração de prescrição relativamente aos processos executivos nº 0301200900093343 e 0301200900093351 instaurados em 2009-06-13 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2008/03 a 2008/12 titulado pela certidão de dívida nº 10244/2009 e 10245/2009, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201000194476 e 0301201000194492 instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Coimas e Encargos - Coimas do período 2008/04 titulado pela certidão de dívida nº 7038/2010 e 7039/2010, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201000194514 e 0301201000194557 instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2007/08; 2007/11 a 2008/02 e 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 7042/2010 e 7044/2010, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201100584573 e 0301201100584681 instaurados em 2011-09-02, para cobrança coerciva de Contribuições e Cotizações do período de 2008/03 titulado pela certidão de dívida nº 66647/2011 e 66646/2011, respectivamente e quanto ao processo executivo nº 0301201100359220 foi instaurado em 2011-05-25 para cobrança coerciva de Contribuições de Trabalhador Independente do período de 2007/10 a 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 40613/2011, dos presentes autos, com consequente tramitação legal de cobrança coerciva - Fls. 43 e 44.

E. Em 09/09/2016 foi proferido "Despacho" pela Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Braga do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, com o seguinte teor:

Concordo com a proposta que antecede.

Ante o exposto indefiro a declaração de prescrição relativamente aos processos executivos nº 0301200900093343 e 0301200900093351 instaurados em 2009-06-13 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2008/03 a 2008/12 titulado pela certidão de dívida nº 10244/2009 e 10245/2009, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201000194476 e 0301201000194492 instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Coimas e Encargos - Coimas do período 2008/04 titulado pela certidão de dívida nº 7038/2010 e 7039/2010, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201000194514 e 0301201000194557 instaurados em 2010-03-16 para cobrança coerciva de Cotizações e Contribuições do período de 2007/08; 2007/11 a 2008/02 e 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 7042/2010 e 7044/2010, respectivamente; Os processos executivos nº 0301201100584673 e 0301201100584681 instaurados em 2011-09-02, para cobrança coerciva de Contribuições e Cotizações do período de 2008/03 titulado pela certidão de dívida nº 66647/2011 e 66646/2011, respectivamente e quanto ao processo executivo nº 0301201100359220 foi instaurado em 2011-05-25 para cobrança coerciva de Contribuições de Trabalhador Independente do período de 2007/10 a 2009/01 titulado pela certidão de dívida nº 40613/2011, dos presentes autos, com consequente tramitação legal de cobrança coerciva.

Notifique-se o Executado do teor conteúdo do presente despacho.

Oficie-se ao Núcleo de Gestão de Contribuições com cópia do despacho. - Fls. 42 verso.

3. A questão colocada no presente recurso consiste unicamente em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento em matéria de direito ao ter julgado que não ocorrera a extinção, por prescrição, das dívidas provenientes de quotizações e contribuições em dívida à Segurança Social relativas ao mês de Agosto/2007 e ao período de Novembro/2007 a Janeiro/2009.

Segundo a sentença, o Reclamante carece de razão ao defender a ilegalidade da decisão do órgão de execução fiscal, porquanto, ao contrário do que advoga, a sua citação para essas execuções, enquanto facto interruptivo do prazo de prescrição (5 anos), não determina que comece de imediato a correr novo prazo de prescrição, porquanto esse facto tem um efeito duradouro que se mantém até ao termo do processo de execução.

Como se pode ler na sentença, «com a citação ocorre a interrupção do prazo prescricional, pelo que todo o prazo decorrido até à data da citação fica inutilizado, ou seja, tudo se passa como se ainda não tivesse decorrido qualquer prazo (nº 1 do artigo 326º do CC) e o prazo permanece paralisado (não começa a correr enquanto não existir trânsito em julgado ou equivalente da decisão que puser termo ao processo de execução fiscal ou seja, enquanto o processo não findar (nº 2 do artigo 327º do C.C.). Acompanha-se, assim, a jurisprudência consolidada do STA (entre muitos outros: Acórdãos do STA de 10/01/2018 proferido no processo nº 01360/17, de 12/10/2016 proferido no processo nº 0984/16, e de 31/03/2016, proferido no processo nº 0184/16)».

Neste recurso não vem questionada a factualidade provada, designadamente a data em que ocorreram os actos de citação, nem questionado o prazo legal de prescrição tido por aplicável, nem a data do seu termo inicial ou, sequer, que os actos de citação constituem factos interruptivos do prazo de prescrição destas dívidas. O que o Recorrente discute é o efeito jurídico atribuída a esse facto interruptivo (tanto pelo órgão de execução como pelo Mmº Juiz), efeito que, na óptica do Recorrente, não pode ser duradouro, mas apenas instantâneo, porquanto o regime contido no art.º 327º, nº 1, do Código Civil não pode ter aplicação no processo tributário, por existirem normas na Lei Geral Tributária cuja aplicação se impõe em razão da relação de especialidade.

Vejamos.

Importa começar por salientar que pese embora não seja possível, no âmbito de obrigações tributárias, chamar à colação as normas do direito civil que regem o prazo de prescrição, a determinação do seu dies a quo, ou que definem os factos interruptivos e suspensivos - por se tratar de matéria taxativamente fixada na LGT relativamente a tributos e rigorosamente sujeita ao princípio da legalidade tributária de reserva da lei formal, integrando-se nas "garantias dos contribuintes" - pode e deve ir aí buscar-se o significado do conceito jurídico de "prescrição" e dos conceitos de "interrupção" e de "suspensão" do prazo de prescrição, e, bem assim, o alcance dos efeitos jurídicos da "interrupção" e da "suspensão", na medida em que nem o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social nem a actual LGT dispõem sobre a matéria, tornando-se, assim, necessário observar o disposto no art.º 11º da LGT, segundo o qual sempre que nas normas fiscais se empreguem termos próprios de outros ramos de direito devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm.

No que toca às dívidas à Segurança Social, o regime constante da Lei nº 4/2007, de 16.01, e no art.º 187º nºs 1 e 2 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social, apenas disciplina, de modo específico, o prazo de prescrição (de 5 anos) e os respectivos factos interruptivos, consagrando que «o prazo de prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança».

Deste modo, e sabido que só o que não encontre regulação neste regime especial pode ser regulado pelas regras contidas na LGT, é inquestionável que só podem constituir factos interruptivos do prazo de prescrição das dívidas à Segurança Social as diligências administrativas que ocorram no processo conducente à sua liquidação ou à sua cobrança, como é, de forma indiscutível, o acto de citação para a execução fiscal.

Todavia, quanto aos efeitos ou eficácia jurídica destes factos interruptivos, eles terão de ser os previstos no Código Civil, uma vez que, como se disse, nem o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social nem a actual LGT dispõem sobre a matéria.

Com efeito, ao contrário do que constava do Código de Processo Tributário e da própria LGT até à revogação do nº 2 do seu art.º 49º pela Lei nº 53-A/2006, esta Lei Geral nada dispõe actualmente sobre os efeitos jurídicos da interrupção do prazo de prescrição, isto é, se os factos interruptivos têm efeito instantâneo ou duradouro, havendo, portanto, que aplicar o regime que, para a generalidade das obrigações, o legislador consagrou no Código Civil nos artigos 326º e 327º.

Neste contexto, não há, em princípio, suporte para afirmar que as "diligências administrativas", enquanto factos interruptivos, têm efeito duradouro; tais diligências determinam, em princípio, o imediato início de novo prazo prescricional, por aplicação da regra geral contida no art.º 326º do C. Civil, segundo o qual «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte».

Esta é, pois, a regra geral, do efeito instantâneo da interrupção, que só admite como excepção (efeito duradouro) a situação prevista no art.º 327º do C.Civil. Efectivamente, por força da parte final do art.º 326º do C.Civil, o acto interruptivo passa a ter efeito duradouro quando esteja em causa um acto de citação, sabido que o nº 1 do art.º 327º dispõe que «Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo».

Como refere Ana Filipa Morais Antunes (in "Prescrição e Caducidade", Coimbra Editora, pág. 161), «Estão em causa hipóteses de interrupção fundadas no exercício judicial do direito pelo respectivo titular e que justificam, por isso, um regime especial. Uma vez que os actos interruptivos judiciais desencadeiam um processo durante o qual se pode admitir que o titular não está inactivo, deverá manter-se a eficácia da interrupção, só começando o prazo a correr a partir do momento em que transitar em julgado a sentença que puser termo ao processo».

Ou como esclarecia Vaz Serra (in "Prescrição Extintiva e Caducidade", BMJ, nº 106, p. 248), em termos de saber em que momento começa a correr o novo prazo prescricional: «Há, por conseguinte, que apurar quando cessa a eficácia da causa interruptiva, ou, o que é o mesmo, qual a duração dessa eficácia. A este respeito, pode a eficácia da causa interruptiva ser instantânea ou permanente, conforme essa eficácia se produz em dado momento, cessando logo e começando, portanto, logo também o novo período prescricional, ou dura por um lapso de tempo mais ou menos longo, findo o qual se inicia o novo período da prescrição. Eficácia instantânea tem o reconhecimento ou o acto da constituição em mora do devedor; deriva daí que do mesmo momento começa a correr um novo período prescricional. Eficácia permanente têm os actos interruptivos judiciais, dado que dão início a um processo, durante o qual pode admitir-se que o titular não está inactivo e deve, assim, manter-se a eficácia da interrupção. A prescrição só recomeçará a correr do momento em que transita em julgado a sentença que põe termo ao processo».

Por conseguinte, no caso de o prazo de prescrição ter sido interrompido pela citação para acção judicial (ainda que de natureza executiva), a cessação da eficácia do facto interruptivo é diferida para a data da decisão que ponha termo ao processo, embora, como se deixou já explicitado em acórdãos desta Secção, designadamente no proferido em 5/04/2017, no proc. nº 0304/17, deva equipar-se a essa decisão aquela que declare em falhas a execução fiscal.

Termos em que, mais uma vez, se reitera a jurisprudência desta Secção do STA, vertida, designadamente, nos acórdãos de 20/05/2015, no proc. nº 01500/14, de 29/01/2014, no proc. nº 01941/13, de 12/10/2016, no proc. nº 0984/16, de 31/03/2016, no proc. nº 0184/16, de 6/12/2017, no proc. nº 01300/17, e de 17/02/2018, no proc. nº 01463/17, no sentido de que não se descortina razão para, na ausência de disposição expressa do legislador fiscal, não atribuir ao acto de citação na execução fiscal a mesma eficácia duradoura que o acto de citação produz no processo executivo comum.

Pelo exposto, bem andou o Mmº Juiz do tribunal "a quo" ao reconhecer efeito duradouro ao acto interruptivo de citação e, por consequência, ao julgar que, por esse motivo, não ocorrera ainda a prescrição das dívidas em cobrança.

4. Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 10 de Abril de 2019. – Dulce Neto (relatora) – Francisco Rothes – Ana Paula Lobo, vencida segundo voto que anexo.


VOTO DE VENCIDA

Não acompanho a decisão adoptada, pelas razões constantes do voto de vencida que formulei no processo 0639/17 de 21/06/2017, acessível em dgsi.pt, que mantenho.

(Processado e revisto pela relatora com recurso a meios informáticos (art.º 131° nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).


Lisboa, 2019.04.10

Ana Paula Lobo