Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0105/20.1BALSB
Data do Acordão:05/26/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
DECISÃO ARBITRAL
MESMA QUESTÃO FUNDAMENTAL DE DIREITO
Sumário:O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, no caso entre as decisões arbitral recorrida e a decisão arbitral invocada como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cf. o n.º 2 do art. 25.º RJAT) e, inexistindo essa oposição, não deve tomar-se conhecimento do mérito do recurso.
Nº Convencional:JSTA000P27765
Nº do Documento:SAP202105260105/20
Data de Entrada:09/29/2020
Recorrente:AA……………., S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 661/2019-T
Recorrente: “AA…………………, S.A.”
Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida no processo 661/2019-T ( Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=48&id=4887.) pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por oposição com a decisão proferida no processo 695/2015-T do mesmo CAAD ( Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=18&id=1885.), transitada em julgado, tendo apresentado alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1.º O presente Recurso vem deduzido contra a Decisão Arbitral proferida no processo n.º 212/2019-T [( Permitimo-nos corrigir a indicação do número do processo, de acordo com o despacho a fls. 231 do processo electrónico.)] que manteve os actos tributários e em matéria tributária objecto do mesmo em confronto com a douta Decisão proferida no processo 695/2015-T.

2.º A tese preconizada, a final, pelo Tribunal Recorrido, e no qual fundamentou a improcedência do Pedido Arbitral, assenta na (errónea e) ultrapassada ideia – quer (há muito) a nível doutrinal quer também Jurisprudencial – de que os empréstimos efectuados por uma sociedade a sociedades suas participadas são-no no interesse e exercício da actividade destas.

3.º Tal como admite o próprio Tribunal Recorrido, a necessidade ou indispensabilidade de gastos tem de ser aferida caso a caso, e no seu sentido jurídico-económico, a ponto de se aferir se, no âmbito da actividade (económica) do sujeito passivo em causa aqueles gastos são realizados ou incorridos no interesse do próprio – entendido como gastos incorridos dentro do seu escopo societário, tendo em vista o lucro.

4.º No caso em apreço, não obstante o Tribunal Recorrido admitir – expressamente – que tal é o caso sub judice, veio a final, a adoptar uma posição restritiva (e inaceitável) relativa a esse já fixado (doutrinal e jurisprudencialmente) conceito de indispensabilidade de gastos, de actividade e de fonte produtora.

5.º Nesta sede, importa relembrar que não é apenas da Decisão Fundamento que decorre a correcta interpretação do artigo 23.º do Código do IRC, mas que a mesma já se encontrava plasmada no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 1236/05, onde se deixou lapidarmente escrito que “deve entender-se que a actividade empresarial que gere custos dedutíveis há de ser aquela que se traduza em operações que tenham um propósito (e não um obrigatório nexo de causalidade imediata) de obtenção de rendimento ou a finalidade de manter o potencial de uma fonte produtora de rendimento. Nesse sentido, a actividade produtiva não deverá ser entendida em sentido restritivo, mas sim em sentido amplo, significando actividade relacionada com uma fonte produtora de rendimento da entidade que suporta os gastos. Ao buscar-se o sentido do conceito de actividade das empresas, ele não pode circunscrever-se a meras ou simples operações de produção de bens ou serviços, mas pressupõe uma relação com as operações económicas globais de exploração ou com as operações ou actos de gestão que se insiram no interesse próprio da entidade que assume os custos”.

6.º Ora, considerando que no caso em presença (i) os gastos suportados pela Recorrente com financiamentos não se relacionam exclusivamente com os empréstimos efectuados às suas participadas; (ii) que, não obstante isso, em qualquer caso os empréstimos concedidos às suas participadas foram efectuados com o claro objectivo de potenciar a geração de um activo do qual se esperavam (e resultaram) lucros e outros benefícios que se materializaram em rendimento na esfera da Recorrente,

7.º apenas se poderá concluir que andou mal o Tribunal Recorrido, e contra a doutrina e Jurisprudência citada (e muita outra que se poderia citar), aplicando mal o Direito, devendo a Decisão Recorrida, por isso, ser anulada e substituída por outra que determine a anulação dos actos em causa nos presentes autos.

Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser julgado procedente o presente recurso, por provado, anulando-se a decisão recorrida, substituindo-se por outra que determine a anulação dos actos de liquidação e em matéria tributária em causa, com as devidas consequências legais».

1.2 A AT contra-alegou, resumindo a sua posição em conclusões do seguinte teor:

«a) O presente recurso por oposição não reúne os necessários pressupostos de admissibilidade pois não se verifica a oposição quanto à mesma questão fundamental de direito entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento,

b) Assim como também não existe a necessária identidade quanto à matéria de facto cujo tratamento jurídico é colocado em discussão.

c) Desde logo, não se verifica a oposição quanto à mesma questão fundamental de direito entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, atendendo à alteração legislativa operada no normativo em causa, a alínea c) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC,

d) Sendo a redacção em vigor para o exercício de 2011, objecto do acórdão fundamento, uma redacção distinta da que vigorava no exercício de 2015, objecto do acórdão sob recurso.

e) De igual modo não existe a necessária identidade quanto à questão de facto, uma vez que, e conforme se pode ler no acórdão ora recorrido, em sede de matéria de facto pertinente para a boa decisão da causa, que não se considera demonstrado o seguinte:
- qual o destino efectivo das sobreditas disponibilidades financeiras canalizadas para empresas terceiras, não demonstrando, por conseguinte, que as mesmas fossem indispensáveis no âmbito da actividade empresarial daquelas empresas ou da Requerente, ou que a repercussão na actividade da Requerente justificasse a sua indispensabilidade;
- que a Requerente tivesse tomado qualquer deliberação contendo as razões e critérios, contabilísticos e/ou financeiros, que pudessem justificar as decisões empresariais de concessão de financiamento gratuito às participadas, assim como uma qualquer justificação razoável para a ausência de documentação demonstrativa dos factos que alega.

f) Ainda quanto ao relevo daquela factualidade, que considerou não provada, refere o acórdão sob recurso o seguinte:
Saliente-se ainda que “(...) no que respeita à qualificação das verbas contabilizadas como custos dedutíveis, cabe ao contribuinte o ónus da prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da força produtora, se a AT questionar essa indispensabilidade. É que em tal desiderato, o encargo da prova deve recais sobre quem, alegando o facto correspondente, com mais facilidade, pode documentar e esclarecer as operações e a sua conexão com os proveitos (...)” (cfr. Ac. do TCA, de 26/6/2001, Rec. N.º 4736/01)” Por outro lado, não é crível que em matéria da relevância da presente, uma empresa com a dimensão da Requerente, não sustentasse a indispensabilidade ou mesmo inevitabilidade dos custos com deliberações formais e técnicas, sendo que nestas matérias a prova testemunhal não pode suprir a ausência total de elementos probatórios documentais. Por outro lado, considerações gerais e abstractas como muitas das que são feitas pela Requerente não constituem sequer objecto de prova, ficando por demonstrar, com base na alegação e prova de factos concretos, as razões que levaram a Requerente – que não é uma “holding” – a substituir-se às empresas onde detinha participação no recurso a financiamentos bancários e, no essencial, demonstrar a indispensabilidade desse seus gastos para a realização de proveitos ou como custo da sua própria actividade, sujeito a tributação em sede de IRC, como melhor se verá infra aquando da abordagem do enquadramento legal e jurídico.

g) Prossegue ainda o acórdão recorrido nos seguintes termos:
Ora, no caso sub judice, verifica-se, no entender deste Tribunal, que não estão reunidas as condições para dar provimento ao pedido de anulação do acto de liquidação adicional com fundamento na indispensabilidade dos custos para garantir os rendimentos. Desde logo, porque não se estando perante uma SGPS, o crivo de análise da indispensabilidade pode ser mais exigente, porquanto a concessão de empréstimos não faz parte da actividade normal da empresa. Além disso, porquanto não há prova desse nexo de causalidade essencial entre custos e proveitos. Desde logo, porque a Requerente, embora o afirme (artigo 18.º da petição) , não comprova que o retorno das participadas seria assegurado por via dos dividendos pagos à Requerente, o que, diga-se de passagem, por força do artigo 51.º do CIRC não ficaria, em princípio, sujeito a tributação na esfera da Requerente, por força do mecanismo designado de participation exemption. Curiosamente, o que a Requerente diz ter ocorrido (artigo 21.º da mesma petição) é que ela “realizou prestações de serviços às entidades relacionadas num valor global e directo de 16 milhões de euros em 2015”. Todavia, a ser verdade, o que se questiona é se os empréstimos concedidos foram relevantes para a realização dos serviços prestados, ou seja, dito por outras palavras, afigura-se-nos que não resulta provado dos autos o tal nexo de causalidade de que nos fala a lei e a doutrina como essenciais para a consideração como custo de determinada despesa no caso vertente. Do ponto de vista do Tribunal não resulta demonstrado que os empréstimos concedidos foram essenciais para que a Requerente incrementasse os seus lucros por via, por exemplo, das prestações de serviços efectuadas ou se estas se fariam independentemente dos referidos empréstimos. Termos em que se nega provimento ao recurso da Requerente com o fundamento de que os custos incorridos com os juros dos empréstimos se mostravam necessários para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.

h) Já o acórdão fundamento considera que não existem factos com interesse para a boa decisão da causa que não tenham sido provados,

i) Elencando, entre estes, e contrariamente ao que sucedeu no acórdão sob recurso, na alínea h) do probatório, que resultou demonstrado nos autos que os financiamentos intra-grupo se revelam essenciais para o exercício da actividade económica do Grupo, referindo, a propósito, a existência de um consórcio em cujo contexto se justifica esse financiamento.

j) Assim, relativamente à matéria de facto em causa nos dois acórdãos, a qual não se encontra minimamente em crise, não existe a necessária identidade para efeitos de admissibilidade do presente recurso.

k) Consequentemente, deve o presente recurso ser rejeitado por não estarem preenchidos os pressupostos para a sua admissibilidade.

Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso ser rejeitado por não estarem reunidos os pressupostos de admissibilidade do mesmo».

1.4 Dada vista ao Ministério Público, a Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que não se conheça do recurso por falta de verificação dos pertinentes pressupostos. Em síntese, após enunciar os requisitos de admissibilidade e prosseguimento do recurso e sobre o seu entendimento doutrinal e jurisprudencial, bem como após resumir os termos das decisões em confronto, com a seguinte fundamentação: «[…]

Afigura-se-nos, com o respeito devido que, no caso, a situação de facto não é substancialmente idêntica em ambos os processos.
Com efeito, como resulta da factualidade dada como provada, desde logo se verifica que a estrutura societária das Requerentes e a sua correlação com as empresas participadas não se mostra substancialmente idêntica.
Aliás, uma das requerentes é uma “holding” e a outra é um grupo de sociedades sem a estrutura societária de uma “holding” ou “SGPS”.
Da factualidade assente na Decisão Arbitral fundamento, resulta, nomeadamente:
(…)
b) A estrutura de capital da Requerente foi alterada em meados de 2011, passando a pertencer em 100% ao “Grupo D...”, pois sendo então já detida em 50% pela “C... España,SL”, esta última adquiriu os 50% que pertenciam ao anterior accionista, a “E...” (cf. PA).
c) A Requerente passou, desde então, a integrar plenamente o universo “C...”, grupo económico líder à escala global no sector da produção de electricidade pela utilização de recursos renováveis (cf. PA).
d) O que se referiu teve um impacto na sua estrutura de financiamento da requerente, pois deixou de ser financiada por terceiros e passou a ser financiada por empréstimos intra-grupo, tendo terminado em 2011 o financiamento externo que tinha obtido através de programas de papel comercial (cf. PA).
e) A Requerente é uma holding intermédia do “Grupo C...” que, além de participações sociais em diversas sociedades do sector da energia, dispõe de recursos e estruturas técnicas e humanas que permitem criar sinergias e potenciar o desenvolvimento da actividade operacional por parte das respectivas subsidiárias. …”
(…)
h) O desenvolvimento da actividade da Requerente – o qual tanto é realizado directamente, como indirectamente, através das suas subsidiárias ou associadas e outras participadas – pressupõe necessariamente a concessão de empréstimos intra-grupo, na medida em que os referidos financiamentos se mostram essenciais à prossecução da actividade desenvolvida pelas suas participadas e, consequentemente, à actividade exercida pela própria Requerente, permitindo que aquelas obtenham lucros que, posteriormente, serão distribuídos à Requerente e que valorizarão as suas participações sociais.
i) Os serviços prestados pela Requerente decompõem-se em (cf. PA):
(1) Um fee de gestão, na medida em que as sociedades que desenvolvem os projectos energéticos recorrem aos recursos existentes na esfera da Requerente, com vista à exploração dos mesmos, designadamente, nas áreas administrativa, técnica, financeira e comercial.
(2) Um fee de manutenção, uma vez que os ACE’s “S...” e “T...”, no âmbito da sua actividade de produção de energia nas suas centrais de cogeração, recorrem aos recursos disponíveis na esfera da Requerente, tendo em vista a exploração de projectos, nomeadamente, na área da manutenção de equipamento.
Ora, não resulta da factualidade dada como provada na Decisão Arbitral Recorrida que a Recorrente tenha a mesma natureza societária e que seja idêntica a sua relação com as empresas participadas.
É certo que as decisões em confronto versam sobre a interpretação do art. 23.º, n.º 1 do CIRC mas, salvo melhor opinião, não se reportam à mesma situação de facto.
Se assim for entendido, no caso em apreço, será aplicável o que se escreveu no Acórdão deste Supremo Tribunal de 05-06-2012, 0433/12: “… os Acórdãos em confronto, partindo de realidades com alguma similitude, deram-lhes um tratamento jurídico inteiramente diferente de tal forma que se deve afirmar que ambos conheceram de questões diferentes. E, se assim é, não se poderá falar em contradição de julgamentos.
Em consequência, falta um dos pressupostos para o conhecimento do recurso para uniformização de jurisprudência – a identidade da questão fundamental de direito de que é pressuposta a identidade dos respectivos pressupostos de facto.
Do exposto, resulta o nosso entendimento no sentido de não deve conhecer-se do recurso por falta dos pressupostos de que depende o respectivo conhecimento».

1.5 Cumpre apreciar e decidir em conferência no Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo que, antes do mais, há que verificar se estão verificados os requisitos da admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência.
Se concluirmos pela verificação desses requisitos, passaremos a conhecer do mérito do recurso, ou seja, da infracção imputada à decisão arbitral recorrida [cfr. art. 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)].


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

2.1.1 A decisão arbitral recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«a) A Requerente é uma sociedade comercial anónima que tem como objecto social a “montagem de materiais refractários, isolante e anticorrosivos e construção e projecto de instalações industriais”, enquadrada no regime geral de IRC, sujeito passivo de IVA e não isento, enquadrada no regime normal de periocidade mensal.

b) Em data não apurada, mas que terá sido na década de noventa, a Requerente tomou a decisão de apostar no mercado internacional.

c) A internacionalização da Requerente foi assegurada através da constituição ou aquisição de participações maioritárias das sociedades de seguida anunciadas em cada jurisdição, como segue:

d) A Requerente dispunha de um conjunto de participações sociais em sociedades com sede fora de Portugal, cuja actividade se assemelha àquela prosseguida pela própria A...;

e) Em 2013 e 2014 foi levada a cabo a reorganização societária do grupo F... através da consolidação na holding G..., SGPS, SA, da maioria das participações sociais das empresas do grupo.

f) Esta reorganização ocorreu através de uma operação de cisão-fusão, registada em 7 de Janeiro de 2015.

g) Finda a restruturação, mantiveram-se apenas na titularidade do SP as participações que não requeriam a manutenção de uma estrutura própria, destinada à sua gestão ou que se encontrariam em risco de falência técnica – a H..., SA, em Portugal e a I..., Lda, em Portugal.

h) A Requerente tomou a decisão de financiar as suas participadas através de empréstimos não remunerados.

i) No período de 2015 o SP registou um aumento do volume de negócios de cerca de 30% face ao ano anterior (fls. 14, RIT).

j) A requerente foi objecto de uma inspecção conforme ordem de serviço n.º OI2018..., datada de 2 de Fevereiro de 2018, que incidiu sobre o período de 2015.

k) No período de 2015 o SP recorreu a financiamento bancário, contabilizado nas diversas subcontas das contas 2511 – Financiamentos obtidos – Contas caucionadas/Empréstimo bancários e 2512 – Descobertos bancários, tendo suportado encargos financeiros que considerou como gasto para efeitos contabilísticos e fiscais que, no período causa, ascenderam a € 240.126,45, já deduzidos do montante de juros provenientes de empréstimos bancários contraídos pela J..., de 16.323,10 € (fls. 17, RIT).

l) Parte dos citados financiamentos foi utilizada pela Requerente para conceder empréstimos não remunerados a empresas participadas, os quais se encontram contabilizados em subcontas da conta 411 — investimentos em subsidiárias, e 412 — investimentos em associadas, os quais representam os seguintes saldos mensais devedores (fls. 17, RIT):

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

m) A AT desconsiderou como gasto para efeitos de determinação do resultado tributável os encargos financeiros suportados pela Requerente, na parte correspondente à utilização do capital alheio para financiamento das empresas participadas, que calculou no montante de 97.657,27 €, deduzidos que foram os saldos oriundos da sociedade J..., no âmbito da fusão ocorrida em 2013, nomeadamente os saldos mensais constantes das contas 25 — Financiamentos obtidos no valor de 1.387.916,71 €, bem como a importância contabilizada na conta de gastos 691111114 — Empréstimos bancários (16.323,10 €).

n) Decorrente da sobredita desconsideração como gasto, foi emitida a nota de liquidação adicional de IRC n.º 2019..., de 05.06.2019, referente ao período de 2015, no montante de 63.518,36 €, já incluindo os juros compensatórios, no valor de 6.643,23 €.

o) O SP procedeu ao pagamento dessa liquidação em 17 de Julho de 2019.».

2.1.2 Na decisão arbitral apresentada como fundamento do presente recurso foi dada como provada a seguinte factualidade:

«A- A Requerente foi constituída em Julho de 1991, tendo como objecto social promover a utilização racional de energia e a diversificação de fontes energéticas através da identificação, estudo, projecto e execução, com recursos próprios ou em associação, de instalações para produção de energia eléctrica e/ou aproveitamento de calor residual e a sua posterior exploração e venda de energia, sob forma de financiamento por terceiros. [cf. documento n.º 5 anexo à P. I.]

B- A estrutura de capital da Requerente foi alterada em meados de 2011, passando a pertencer a 100% ao “Grupo D...”, pois sendo então já detida em 50% pela “C... España, SL”, esta última adquiriu os 50% que pertenciam ao anterior accionista, a “E...”. [cf. PA junto aos autos]

C- A Requerente passou, desde então, a integrar plenamente o universo “C...”, grupo económico líder à escala global no sector da produção de electricidade pela utilização de recursos renováveis. [cf. PA junto aos autos]

D- O que teve um impacto na sua estrutura de financiamento, pois deixou de ser financiada por terceiros e passou a ser financiada por empréstimos intra-grupo, tendo terminado em 2011 o financiamento externo que tinha obtido através de programas de papel comercial. [cf. PA junto aos autos]

E- A Requerente é uma holding intermédia do “Grupo C...” que, além de participações sociais em diversas sociedades do sector da energia, dispõe de recursos e estruturas técnicas e humanas que permitem criar sinergias e potenciar o desenvolvimento da actividade operacional por parte das respectivas subsidiárias.

F- No ano de 2011, a Requerente relacionava-se com as entidades e detinha as participações a seguir identificadas [cf. PA junto aos autos]:

Empresas Participação

2011 2012

Subsidiárias

F... 51,00% 51,00%

G... 95,00% 95,00%

H... 95,00% 95,00%

I... 70,00% 70,00%

J... 60,00% 60,00%

K... 95,00% 95,00%

L... 35,00% 35,00%

M... 95,00% 95,00%

N... 35,00% 35,00%

O... 90,00% 90,00%

P... 80,00% 80,00%

Q... 52,38% 52,38%

R... 100,00% 100,00%

Associadas

S... 10,00% 10,00%

T... 30,00% 30,00%

U... 21,88% 21,88%

V... 50,00% 50,00%

W... 50,00% 50,00%

X... 20,00% 20,00%

A custo

Y... 2,62% 2,62%

B... 17,98% 17,98%

G- A participada B...” consubstancia um consórcio para a construção e exploração de parques eólicos.

H- O desenvolvimento da actividade da Requerente – o qual tanto é realizado directamente, como indirectamente, através das suas subsidiárias/associadas e outras participadas – pressupõe necessariamente a concessão de empréstimos intra-grupo, na medida em que os referidos financiamentos se mostram essenciais à prossecução da actividade desenvolvida pelas suas participadas e, consequentemente, à actividade exercida pela própria Requerente, permitindo que aquelas obtenham lucros que, posteriormente, serão distribuídos à Requerente e que valorizarão as participações sociais da Requerente.

I- Os serviços prestados pela Requerente decompõem-se em [cf. PA junto aos autos]:
(1) Um fee de gestão, na medida em que as sociedades que desenvolvem os projectos energéticos recorrem aos recursos existentes na esfera da Requerente, com vista à exploração dos mesmos, designadamente, nas áreas administrativa, técnica, financeira e comercial.
(2) Um fee de manutenção, uma vez que os ACE’s “S...” e “T...”, no âmbito da sua actividade de produção de energia nas suas centrais de cogeração, recorrem aos recursos disponíveis na esfera da Requerente, tendo em vista a exploração de projectos, nomeadamente, na área da manutenção de equipamento.

J- Relativamente ao ano de 2011, a Requerente declarou os seguintes valores em sede de IRC [cf. PA junto aos autos]:

[segue quadro demonstrativo desses valores]

K- No ano de 2011, a Requerente apresenta os seguintes saldos no que respeita a financiamentos, quer obtidos, quer concedidos [cf. PA junto aos autos]:
- Empréstimos obtidos: € 103.836.584,00;
- Empréstimos concedidos: € 113.852.159,00.

L- No concernente a gastos e rendimentos de financiamentos reconhecidos em 2011, estes cifram-se nos seguintes montantes [cf. PA junto aos autos]:
- Gastos: € 4.781.874,00;
- Rendimentos: € 3.437.136,00;
- Gastos líquidos: € 1.344.738,00.

M- Em virtude de, à data dos factos, deter uma participação social de 17,98% na sua participada “B...”, quer a Requerente, quer o “Grupo C...” em que esta se integra encontravam-se desprovidos da faculdade de impor à “B...” uma taxa de juro nos financiamentos diferente da que foi contratualmente acordada e praticada (no ano de 2011, uma taxa média de 4,448%).

N- Todos os contratos e acordos subjacentes à definição das taxas de juro praticadas foram aprovados por unanimidade pelos membros do consórcio “B...”, não tendo dependido de uma declaração unilateral de vontade da Requerente.

O- A discrepância entre a taxa de juro a que a Requerente obteve financiamento e a taxa de juro por ela praticada nos financiamentos concedidos é explicada pelo facto de os primeiros serem tendencialmente empréstimos de longo prazo, contrariamente ao que sucede com referência a estes últimos. [cf. documentos n.ºs 11 e 12 anexos à P. I.]

P- O objectivo era que a participada “B...” viesse a ser financiada com recurso a project finance, com empréstimos obtidos junto de terceiros, o que apenas não veio a acontecer dada a grave crise financeira instalada desde o ano 2011 [cf. documento n.º 13 anexo à PI]

Q- A coberto da ordem de serviço n.º OI2014..., foi a Requerente sujeita a uma acção inspectiva externa de âmbito geral, incidente nos exercícios fiscais de 2011 e 2012, a qual foi realizada pela Divisão de Inspecção Tributária –... da Direcção de Finanças do Porto, tendo tido início em 08/01/2014 e termo em 05/05/2015. [cf. PA junto aos autos]

R- No âmbito do referido procedimento inspectivo, os Serviços de Inspecção Tributária solicitaram à Requerente que indicasse, relativamente aos exercícios de 2011 e 2012, quais as taxas de juro praticadas nos empréstimos por si obtidos e concedidos. [cf. PA junto aos autos].

S- Na sequência desse pedido, a Requerente prestou o seguinte esclarecimento aos Serviços de Inspecção Tributária [cf. PA junto aos autos]:

Juros empréstimos obtidos (5% + Euribor 6M)

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

T- Através do ofício n.º .../..., datado de 06/05/2015, dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do …, remetido por carta registada, foi a Requerente notificada do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária e para, querendo, exercer o direito de audição, tendo ali sido propostas as seguintes correcções em sede de IRC, relativamente ao exercício de 2011 [cf. documento n.º 6 anexo à P. I. e PA junto aos autos]:
III.5 – Correcções propostas
As correcções propostas, decorrentes da desconsideração da dedutibilidade fiscal de encargos financeiros suportados no interesse de outras empresas suas associadas, são as que resultam dos cálculos traduzidos no mapa seguinte:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

U- Em 02/06/2015, a Requerente exerceu o direito de audição sobre aquele Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, tendo ali preconizado que os financiamentos que concedeu às suas associadas mostram-se justificados e plenamente admissíveis à luz do disposto no art. 23.º, n.º 1, do Código do IRC (aplicável à data dos factos), pelo que a manutenção das correcções propostas se afiguram manifestamente ilegais [cf. documento n.º 7 anexo à P. I. e PA junto aos autos]

V- As correcções ao IRC da Requerente, referente ao exercício de 2011, mencionadas em T), foram integralmente mantidas no Relatório da Inspecção Tributária, tendo o exercício de direito de audição por parte da Requerente sido objecto de apreciação pelos Serviços de Inspecção Tributária, nos termos constantes daquele Relatório e que aqui se dão por reproduzidos. [cf. PA junto aos autos]

W- As aludidas correcções respeitantes à matéria colectável de IRC do exercício de 2011, tiveram subjacente a seguinte fundamentação plasmada no Relatório da Inspecção Tributária [cf. PA junto aos autos]:

[segue-se cópia do relatório]

X- A Requerente foi notificada do Relatório da Inspecção Tributária, através do ofício n.º .../..., datado de 09/06/2015, da Divisão de Inspecção Tributária –...da Direcção de Finanças do …, remetido por carta registada com aviso de recepção. [cf. documento n.º 4 anexo à P. I. e PA junto aos autos]

Y- Em virtude das referenciadas correcções, foram efectuadas a liquidação adicional de IRC n.º 2015..., datada de 24/06/2015, referente ao exercício de 2011, no montante de € 92.997,89, a liquidação de juros compensatórios n.º 2015..., no valor de € 25.348,91, bem como a compensação n.º 2015..., datada de 29/06/2015, e a demonstração de acerto de contas n.º 2015..., na qual foi apurado um valor total a pagar de € 247.761,28, com data limite de pagamento voluntário a 27/08/2015. [cf. documentos n.ºs 1, 2 e 3 anexos à P. I.]

Z- A Requerente não efectuou o pagamento do montante de € 247.761,28, resultante da referida demonstração de acerto de contas n.º 2015... .

AA- Em consequência dessa falta de pagamento, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º ...2015..., no valor de € 248.805,06. [cf. documento n.º 8 anexo à P. I.]

AB- A Requerente, tendo em vista a obtenção da suspensão daquele processo de execução fiscal, prestou uma garantia bancária, emitida pelo Banco Z...e à qual foi atribuído o n.º..., no montante de € 314.628,21. [cf. documento n.º 9 anexo à P. I.]

AC- Em 23 de Novembro de 2015, a Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo. [cf. sistema informático de gestão processual do CAAD]».

2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do RJAT, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida no processo 661/2019-T CAAD, por oposição com a decisão proferida no processo 695/2015-T do mesmo CAAD, no que respeita à questão do enquadramento, ou não, na previsão do art. 23.º, n.º 1, alínea c), do Código do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Colectivas (CIRC), dos encargos financeiros suportados com empréstimos contraídos em favor de empresas associadas ou do mesmo grupo empresarial.
Nos termos do n.º 2 do referido art. 25.º do RJAT, «[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é […] susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»; dispõe o n.º 3 do mesmo artigo que a esse recurso «é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral».
Assim, o regime de interposição do recurso da decisão arbitral para o Supremo Tribunal Administrativo difere do regime do recurso previsto no art. 152.º do CPTA, na medida em que aquele tem de ser apresentado no prazo de 30 dias contado da notificação da decisão arbitral, enquanto neste o prazo se conta do trânsito em julgado do acórdão recorrido, como decorre da alínea a) do n.º 2 do referido art. 152.º ( Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, pág. 230. ).
Já quanto ao acórdão fundamento, o recurso para uniformização de jurisprudência pressupõe o seu trânsito em julgado, como tem vindo a afirmar este Supremo Tribunal Administrativo, condição verificada no caso sub judice.
Assim, e não havendo dúvidas quanto aos demais requisitos formais (legitimidade da Recorrente e tempestividade do recurso), há que passar a averiguar se estão verificados os requisitos substanciais da admissibilidade do recurso.
Só depois, se for caso disso, passaremos a conhecer do mérito do recurso.

*

2.2.2 DOS REQUISITOS SUBSTANCIAIS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

2.2.2.1 Nos termos do referido art. 25.º, n.º 2, do RJAT, que remete, com as devidas adaptações, para o art. 152.º do CPTA, os requisitos de admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral que tenha conhecido do mérito da pretensão deduzida para uniformização de jurisprudência são os seguintes: i) que exista contradição entre essa decisão, por um lado, e, por outro lado, outra decisão arbitral ou um acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo, relativamente à mesma questão fundamental de direito, ii) que a orientação perfilhada pelo decisão impugnada não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) de 1984 e da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:

i. identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões alegadamente em oposição, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica;
iii. que se tenha perfilhado, nas decisões em confronto, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

2.2.2.2 Começaremos por apreciar se estão verificados os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios, já que a sua inexistência obstará, lógica e necessariamente, ao conhecimento do mérito do recurso.
Para tanto, vamos remeter para o texto do recente acórdão do Pleno desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 21 de Abril de 2021 no processo n.º 29/20.2BALSB ( Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/b67330a6117002a2802586c30034c7f3.), onde a situação sub judice era em tudo semelhante à dos presentes autos (() O recurso foi interposto de uma decisão do CAAD em tudo semelhante à ora recorrida – proferida em 4 de Fevereiro de 2020 no processo n.º 212/2019-T – pois a Recorrente é a mesma, a questão colocada ao CAAD é a mesma, se bem que respeitante ao IRC de 2013, e o acórdão fundamento aí invocado é o mesmo que foi invocado como fundamento no presente recurso. ). Permitimo-nos alterar o texto apenas para que as referências aí feitas se ajustem ao caso sub judice, usando para o efeito um tipo de letra diferente. Aí ficou dito:

«Examinemos, pois, o teor dos acórdãos em confronto (as decisões arbitrais, recorrida e fundamento) tendo sempre presente, como pano de fundo, a questão para que foi invocada a contradição de julgados, a qual consiste no enquadramento, ou não, na previsão do art. 23.º, n.º 1, al. c), do C.I.R.C. (na versão em vigor no ano de 2011), dos encargos financeiros suportados com empréstimos (instrumentos de capital alheio para efeitos de regime contabilístico e fiscal) contraídos e não debitados às empresas associadas/do mesmo grupo empresarial a quem viriam a ser concedidos.
Ora, antes de mais, o sujeito passivo do acto tributário objecto da decisão arbitral recorrida é uma sociedade anónima sujeita ao regime geral de apuramento do lucro tributável e cujo objecto social se consubstancia na montagem de materiais refractários, isolante e anticorrosivos e construção e projecto de instalações industriais, sendo que a correcção meramente aritmética que substancia a liquidação, tem por base, além do mais, a constatação de que a actividade em questão (encargos financeiros com a contracção/versus concessão de empréstimos) não integra o objecto social do sujeito passivo de imposto (cfr. alíneas a), b), t, v) e w do probatório supra; arts. 15.º, n.º 1, al. a), 17.º e seg. do C.I.R.C.).
Já o sujeito passivo do acto tributário objecto do aresto arbitral fundamento é uma holding/SGPS (cfr. Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2.ª Edição, Almedina, 2007, pág. 380 e seg.) sujeita ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades/RETGS, mais não tendo a correcção meramente aritmética que substancia a liquidação, como vector fundante, a questão do objecto social do sujeito passivo de imposto (cfr. als. E), F), H), I) e W) da matéria de facto supra; art. 69.º e seg. do C.I.R.C.).
Pelo que, e desde logo, do exame da factualidade provada nos arestos em confronto, não resulta que os sujeitos passivos em causa tenham a mesma natureza societária e que seja idêntica a sua relação com as empresas participadas.
Com objectos sociais e enquadramentos societários nitidamente diversos, fica prejudicado a exigida substancial identidade fáctica.
Por conseguinte e desde logo, não se verifica o segundo requisito de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, acima identificado (que exista contradição entre a decisão arbitral recorrida e fundamento, relativamente à mesma questão fundamental de direito, que tem pressuposta a identidade das respectivas circunstâncias de facto).
Por outras palavras, inexiste a pretendida identidade de situações de facto entre as apontadas decisões, sendo, precisamente, a diversidade dessas situações de facto e os distintos juízos que se formularam sobre a prova produzida nos respectivos autos, a imporem as diferentes soluções jurídicas em cada caso, assim não tendo, os arestos em confronto, consagrado soluções opostas para a mesma questão jurídica fundamental, contrariamente ao defendido pelo apelante.
Concluindo, não se mostram reunidos os requisitos do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art. 25.º, n.º 2, do R.J.A.T., e no art. 152.º, do C.P.T.A., desde logo, porque não pode afirmar-se ter a decisão arbitral recorrida adoptado entendimento oposto ao do acórdão fundamento no quadro de uma situação de facto similar. Não se verificam, portanto, os pressupostos de que depende o conhecimento do salvatério, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão».
Subscrevemos esse entendimento, pelo que não pode afirmar-se que as decisões em confronto tenham decidido a mesma questão fundamental de direito em sentido divergente, divergência essa imprescindível como requisito para o conhecimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência.


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2.2.3 CONCLUSÃO

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, no caso entre as decisões arbitral recorrida e a decisão arbitral invocada como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cfr. o n.º 2 do art. 25.º RJAT) e, inexistindo essa oposição, não deve tomar-se conhecimento do mérito do recurso.


* * *

3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em não tomar conhecimento do mérito do recurso.

Custas pela Recorrente.

Comunique-se ao CAAD.

Dispensamos a junção do acórdão para que remetemos, por indicarmos onde o mesmo pode ser consultado.


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Assinado digitalmente pelo relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros que integram a formação de julgamento.
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Lisboa, 26 de Maio de 2021. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Paulo José Rodrigues Antunes - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Anabela Ferreira Alves e Russo.