Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0452/20.2BEALM
Data do Acordão:11/18/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ADRIANO CUNHA
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
ADJUDICAÇÃO
CADUCIDADE
HABILITAÇÃO DO ADJUDICATARIO
SUBCONTRATAÇÃO
Sumário:I – A caducidade de uma adjudicação não opera automaticamente, “ope legis”, tendo de resultar de uma decisão da entidade adjudicante no sentido da imputabilidade das suas causas ao adjudicatário, tomada após prévia audiência deste (art. 86º do CCP).
II – Num procedimento de concurso público, os documentos de habilitação do adjudicatário – ou de subcontratados, de cujas habilitações aquele se pretenda socorrer –, salvo em caso de diferente exigência constante das peças do procedimento ou de solicitação da Entidade Adjudicante, só têm de ser apresentados em momento seguinte à adjudicação, e não no momento da apresentação da proposta; o mesmo ocorrendo com as declarações de compromisso por parte de eventuais subcontratados (arts. 77º nº 2 a) e 81º do CCP e 2º da Portaria nº 372/2017, de 14/12).
Nº Convencional:JSTA00071321
Nº do Documento:SA1202111180452/20
Data de Entrada:10/13/2021
Recorrente:INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, SA E OUTROS
Recorrido 1:ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA A NORMALIZAÇÃO E CERTIFICAÇÃO FERROVIÁRIA
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:CCP ART77 N2 AL.A) ART81 ART86
PORTARIA 372/2017 DE 14/12 ART2
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – RELATÓRIO

1. “Infraestruturas de Portugal, SA”, Ré nos autos, e “A………… - Sociedade Unipessoal, Lda.”, Contrainteressada, interpõem recursos de revista do Acórdão do TCASul, de 7/7/2021, que negou provimento aos recursos por elas interpostos, mantendo as decisões do TAF de Almada.

2. A Autora “APNCF - Associação Portuguesa para a Normalização e Certificação Ferroviária” intentou no TAF de Almada a presente ação relativa a contencioso pré-contratual contra a “lnfraestruturas de Portugal, SA”, sendo Contrainteressada a “A………… - Sociedade Unipessoal Lda.”, pedindo, no âmbito do procedimento concursal para a “Aquisição de Serviços para a verificação CE, por um organismo Notificado, do subsistema ENE (Energia) nos troços Tunes-Lagos e Faro- Vila Real de Santo António, da Linha do Algarve, nas fases de projecto e empreitada”, que a Ré fosse condenada a declarar a caducidade da adjudicação efetuada a favor da Contrainteressada e a proferir novo ato de adjudicação, agora a seu favor, abrindo-se prazo para a correspondente e necessária apresentação dos documentos de habilitação (cfr. p.i., a fls. 1 e sgs. SITAF).

3. A Ré “Infraestruturas de Portugal” e a Contrainteressada/adjudicatária “A…………” apresentaram contestações em que pugnaram pela improcedência da ação; preliminarmente, excecionaram a intempestividade na interposição da ação (cfr. contestações a fls. 187 e segs. e 287 e segs. SITAF, respetivamente), tendo a Autora replicado quanto a esta invocada exceção (cfr. réplica, a fls. 355 e segs. SITAF).

4. Por despacho de 9/10/2020, o TAF de Almada admitiu a ampliação do objeto da ação à impugnação do contrato, requerida pela Autora (cfr. fls. 397 e segs. SITAF).

5. O TAF de Almada proferiu despacho saneador, em 9/10/2020, no qual apreciou a invocada caducidade do direito de ação, exceção que julgou improcedente (cfr. fls. 404 e segs. SITAF).

6. Por sentença de 10/3/2021 (cfr. fls. 562 e segs. SITAF), foi a ação julgada procedente, e a Entidade Demandada condenada a declarar a caducidade do ato de adjudicação, por falta de habilitação da Contrainteressada, com a consequente anulação do contrato de prestação de serviços celebrado entre a Ré e a Contrainteressada, e a adjudicação da proposta da Autora, nos termos do art. 86° n° 4 do CCP.

7. Por sua vez, o TCAS, através do Acórdão recorrido (cfr. fls. 714 e segs. SITAF), apreciando a invocada caducidade da adjudicação, alegadamente operando “ope legis”, concluiu que: “A decisão que julgou a acção tempestiva procedeu a uma correta análise, não tendo violado os arts. 51°, 53°, 59º e 69° do CPTA”. E quanto à alegada violação do art. 2° da Portaria n° 372/2017 e dos arts. 77° e 81°, ambos do CCP, entendeu que tal não se verificava, tendo considerado, nomeadamente, o seguinte: “A habilitação traduz-se, na sua essencialidade, numa atividade certificativa da aptidão profissional e da idoneidade do concorrente adjudicatário. Os requisitos da habilitação têm de existir desde o momento da apresentação da proposta, sendo portanto exigíveis a todos os concorrentes. Não tendo a Contrainteressada os requisitos de habilitação exigidos para a prestação de serviços cuja aquisição constitui o objeto do procedimento e não tendo oportunamente, com a apresentação da proposta, apresentado o compromisso de terceiro a subcontratar, não lhe pode efetivamente, nos termos explicitados na sentença recorrida, ser adjudicado o contrato, impondo-se a caducidade da adjudicação”.

Assim, concluiu que o despacho saneador e a sentença deviam manter-se, negando provimento aos recursos.

8. A Ré/Recorrente (“Infraestruturas de Portugal, SA”) conclui do seguinte modo as alegações do seu recurso de revista (cfr. fls. 840 e segs. SITAF):

«I – Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul de 07/07/2021 que negou provimento ao recurso apresentado pela IP e pela A………… e, por conseguinte, manteve a decisão proferida pelo TAC de Lisboa em 10/03/2021, que condenou a IP a declarar a caducidade do ato de adjudicação da “Aquisição de Serviços para a verificação CE, por um Organismo Notificado, do subsistema ENE (Energia) nos troços Tunes-Lagos e Faro-Vila Real de Santo António da Linha do Algarve, nas fases de projeto e empreitada", por falta de habilitação da adjudicatária A…………, com a consequente anulação do contrato de prestação de serviços celebrado entre a IP e esta última, e a adjudicação da proposta da APNCF – Associação Portuguesa para a Normalização e Certificação Ferroviária (APNCF), ordenada em segundo lugar, nos termos do artigo 86.º, n.º 4 do CCP.
II - Conforme estabelece o n.º 1 do 150.º do CPTA “Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.”
III - Não há dúvidas que ambos os requisitos estão verificados, na presente situação.
IV - A admissão do presente recurso de revista é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
V – Isto porque na presente ação, como em outras prováveis ações que venham a ser interpostas com o mesmo fundamento, está-se perante a questão de saber quais os sentido e alcance, num concurso público, do instituto da habilitação legal previsto pelo artigo 81.º do CCP e pelo disposto no artigo 2.º, n.º 2 da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro.
VI - Cuidando esta norma de regular a fase, pós adjudicatória da habilitação e, não obstante coincidentes temporalmente, ser a habilitação legal, para efeitos de aplicação do CCP, um instituto distinto da confirmação de compromissos prevista nos artigos 77.º, n.º 2, alínea c), 92.º e 93.º, todos do CCP, tem um concorrente (e não adjudicatário), para beneficiar da possibilidade legalmente concedida, de socorrer-se das habilitações de terceiros para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais, que obter junto dessas entidades, e integrar na sua proposta, a declaração de compromisso das mesmas de que vão executar aquela atividade em regime de subcontratação?
VII - Se um concorrente (e não adjudicatário), para beneficiar da possibilidade legal de socorrer-se das habilitações de terceiros para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais, tem de instruir a sua proposta com a declaração de compromisso das mesmas de que vão executar aquela atividade em regime de subcontratação, em que situações é válido o recurso à habilitação legal de um terceiro prevista no sobredito artigo 2.º, n.º 2, onde se estabelece que, para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes, bem como, por conseguinte, à subcontratação?
VIII - Com efeito,
i. As decisões em causa parecem confundir o regime legal da assunção de compromissos por terceiros para cumprimento de atributos ou termos ou condições do caderno de encargos pela proposta adjudicada (cfr. artigos 77.º, n.º 2, alínea c), 92.º e 93.º, todos do CCP), com o regime do recurso à habilitação legal através de terceiros, admitida sem restrições pelo artigo 81.º do CCP e pelo artigo 2.º, n.º 2 da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro. E com base na aparente confusão entre os dois regimes, acabam por violar o regime da habilitação legal, regime este que, com a última definição resultante da sobredita Portaria admite, sem restrições ou distinções, que, num concurso público, (e nada sendo exigido para esse efeito, no Programa de Procedimento), só o adjudicatário tenha que demonstrar, e na fase de habilitação, que a execução da sua proposta cumpre os requisitos legais para as atividades em causa. As decisões desvirtuam, desta forma, todo o papel que a habilitação legal desempenha, por lei, num concurso público, implicando, sem avançar critérios interpretativos para tal, uma restrição dos seus efeitos.
ii. Estas decisões destroem a diferença clara e expressamente estabelecida pelo legislador entre concurso limitado por prévia qualificação e concurso público, afetando grave e seriamente a grande virtude da natureza objetiva, isenta e imparcial do concurso público, ao pressuporem, e fixarem como corolário das posições assumidas, ser exigível que, num concurso público, a proposta apresente já a declaração de um terceiro que ao revelar que visa complementar a habilitação legal do concorrente, faz desviar os olhos do júri da proposta, para as qualidades subjetivas desse concorrente. Na verdade, a falta neste procedimento, de uma norma equivalente ao artigo 168.º, n.º 4, prevista para o concurso limitado por prévia qualificação, é intencional e merece um alcance totalmente oposto ao que a douta sentença e, por adesão, o acórdão em crise, retiraram da mesma.
iii. A posição resultante da sentença e do acórdão interpreta de forma restritiva o artigo 2.º, n.º 2, da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, sem, todavia, avançar qualquer fundamento legal para tal. Ora, é absolutamente necessário para a boa interpretação de uma matéria tão relevante quanto esta, estabelecer/fixar um critério distintivo para a sua aplicação, na medida em que esta norma visará sempre a habilitação legal do adjudicatário, ou seja, a validação dos requisitos legais aplicáveis ao exercício da atividade e da execução contratual a que se vincula. Tal significa que estar-se-á sempre perante atividades reguladas por lei, não fazendo o legislador, pelo menos nas aquisições de serviços e de bens, qualquer distinção entre atividades mais e menos reguladas, cujos requisitos podem ser, ou não, solicitados a terceiros pelo adjudicatário, para efeitos dessa validação;
iv. A posição resultante da sentença e do acórdão esvazia o teor e desvirtua, na íntegra, o alcance visado pelo legislador com o artigo 2.º, n.º 2, da supra mencionada Portaria de promover a concorrência, ao permitir que um concorrente, capaz de elaborar a melhor proposta - pois só o adjudicatário é que fica nesta posição - possa aceder a um contrato, socorrendo-se de outro operador que, por sua vez, e por variadíssimas razões, como por exemplo, de natureza económica ou de capacidade de meios técnicos e humanos próprios de outras especialidades, não possa participar em grandes contratos;
v. A vingar o entendimento do TCA Sul, segundo o qual do Guia Azul 2016 sobre a Aplicação das Regras da UE em matéria de Produtos, “não pode retirar-se qualquer elemento interpretativo no sentido de que, num procedimento no âmbito do qual seja exigido aos concorrentes serem organismos notificados, se apresentem entidades sem tal qualificação e que, após a adjudicação se façam substituir através de subcontratações, por entidades, desta feita devidamente notificadas. Aliás, no seu item 5.2.5. a propósito da subcontratação pelos organismos notificados, é referido que um organismo notificado só pode subcontratar tarefas para as quais ele próprio tenha competência pelo que, um organismo como a Contrainteressada, que não seja “notificado para as Especificações Técnicas de Interoperatividade - Comissão Europeia-NANDO”, por maioria de razão, não poderia também subcontratar. Resultando ainda dessas regras (item 5.2.5. Subcontratação pelos organismos notificados) que o organismo notificado que recorre à subcontratação deve ter competência para rever todos os elementos do trabalho o subcontratado o que a Contrainteressada A…………, não sendo organismo notificado, não pode fazer”, bem como a sua motivação - pois não se pode ignorar o alcance que o acórdão retira para a subcontratação, não obstante expressamente contrariado pelo regime legal nacional posterior e vinculativo para todo o mercado - a posição que resulta do mesmo, altera de forma substancial, e sem fundamento que o torne compreensível, não só o paradigma do instituto da habilitação legal inovado pelo CCP já desde 2008, representando a Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, a sua normal evolução, mas também o instituto da subcontratação previsto nos artigos 317.º e ss., em total disrupção com o regime estabelecido no CCP. Na verdade, o pressuposto jurídico desta posição, num concurso público, terá como corolário lógico a redução do âmbito da subcontratação à mera satisfação de necessidades quantitativas do adjudicatário (instrumento de suprimento de quantidade de meios) e não de qualidade, o que desvirtua todo o instituto da subcontratação previsto no CCP, como instrumento de agilização e criação de diferentes dinâmicas no mercado. Ademais, considerando a prolixidade de muitos dos contratos públicos, reduz a possibilidade de recurso a diferentes especialidades, com particularidades que muitas vezes pela sua complexidade técnica e requisitos legais de exercício e certificação, só um nicho de mercado detém.
vi. Para além de limitar a execução do contrato, a posição resultante da sentença e do acórdão irá certamente conduzir a desvios e manipulações do mercado que em nada contribuirão para a saudável e livre concorrência, primado europeu da contratação pública, uma vez que a entidade (terceira ao concurso público) que é titular da habilitação legal para o exercício da atividade ao comprometer-se, deve fazê-lo com determinado concorrente e não com os demais, sob pena de poderem existir propostas distintas elaboradas com a participação do mesmo terceiro, o que levantaria outros problemas concorrenciais. Ora, podendo em muitas destas situações, e essa é a grande preocupação subjacente à presente revista, estar em causa uma atividade de exercício profissional muito particular e específico, que integra a par com outras mais comuns, o objeto do contrato, o acesso de um concorrente a esse terceiro para viabilização da elaboração e apresentação da sua proposta num concurso público, vai limitar a possibilidade de apresentação de outras propostas de diferentes operadores e potenciais concorrentes, colocando esse terceiro numa posição privilegiada, que pela sua influência determinante, irá distorcer a concorrência.
IX – Tal questão tem relevância social fundamental incontornável, pois a sua apreciação e resolução têm um interesse comunitário significativo, dado que as situações em que se tem verificado o recurso pelo adjudicatário, à habilitação de terceiros, na fase da habilitação, ao abrigo do artigo 2.º, n.º 2, da Portaria n.º 372/2017 (situação distinta da confirmação de compromissos assumidos relativamente a atributos, termos ou condições da proposta, insistimos) tem sido crescentemente recorrente, pois com efeito, esta norma veio conformar legalmente a prática revelada. Os interesses em jogo extravasam assim, em muito, os limites do caso concreto.
X - Além de contender com a segurança e certeza jurídicas, v. g. os regimes jurídicos da assunção de compromissos por terceiros e da habilitação legal, na medida em que as decisões confundem, aparentemente, os pressupostos e âmbito das declarações de compromisso de terceiros para efeitos de cumprimento de atributos ou termos e condições de CE com o regime do recurso à habilitação legal através de terceiros, criando em quem queira concorrer uma dúvida insanável sobre quais as regras que deve respeitar, a questão suscitada tem evidente virtualidade de vir a repetir-se frequentemente nos tribunais administrativos, tantas vezes quanto, no âmbito de um concurso público, o adjudicatário se socorrer das habilitações de terceiros para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais.
XI - A relevância jurídica fundamental da questão, é, porventura, ainda maior, pois tem evidente relevância prática, medida pela sua utilidade face à capacidade de expansão da controvérsia, que poderá alastrar-se à quase totalidade dos concursos públicos lançados em Portugal, tanto é frequente o recurso à habilitação legal de terceiros e à subcontratação.
XII – É, desta forma, inequívoco que a importância e projeção do objeto da presente controvérsia extravasa do âmbito da ação objeto dos presentes autos para se projetar em todos os casos a decidir administrativa e jurisdicionalmente em que esteja envolvida a apreciação do momento em que deve ser apresentada a declaração através da qual os subcontratados se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constante: se logo com a proposta pelos concorrentes (como defende o acórdão recorrido) ou se apenas pelo adjudicatário na fase da habilitação legal (como defende a ora Recorrente e decorre expressamente do artigo 81.º do CCP e da Portaria n.º 372/2017).
XIII - A utilidade da presente decisão extravasa, assim, os limites da situação singular do presente litígio, pois contém uma questão passível de se repetir em (muitos) outros casos.
XIV – A questão é também claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, na medida em que existe grande possibilidade de esta se vir a repetir em casos futuros, estando em causa uma matéria importante e fundamental como a da contratação pública, para a qual importa garantir a uniformização do direito.
XV – O acórdão recorrido incorre ainda em erro judiciário grosseiro, ostensivo e incontroverso, por violação flagrante da lei aplicável, porquanto, a interpretação feita pelo acórdão do regime jurídico da habilitação legal, sem formulação de critérios para a aplicação restritiva do regime em causa (artigo 81.º do CCP e Portaria n.º 372/2017, de 14/12), e até para subcontratação - artigos 317.º e ss do CCP, com as consequências que pode ter na vida prática quer dos operadores económicos, quer das entidades adjudicantes, na medida em que impacta grandemente na forma como o mercado se organiza na preparação para os procedimentos pré-contratuais, viola não só o regime legal da habilitação legal e subcontratação num concurso público, mas também o regime do próprio concurso público, com a consequente alteração de paradigma que o legislador criou relativamente ao regime estabelecido no Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março, nos termos do qual a Entidade Adjudicante escolhe a proposta, sem se distrair com as qualidades dos concorrentes.
XVI – Deve, pois, ser admitido o presente recurso de revista, nos termos do artigo 150.º do CPTA, porquanto está em causa uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental, sendo a admissão do presente recurso claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
XVII – Quanto ao mérito do presente recurso, ao considerar que, num concurso público, e sem que o programa de procedimento exija tal, quando o concorrente se socorre da habilitação de entidades terceiras (subcontratados) para comprovar as habilitações exigidas pelo programa do concurso, a declaração desses subcontratados, através da qual estes se comprometem incondicionalmente a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes, deve ser apresentada com a proposta do concorrente e não na fase de habilitação, o Tribunal a quo fez, salvo o devido respeito, uma incorreta interpretação da lei, errando sobre a natureza dessa declaração e, por conseguinte, sobre o regime legal que lhe é aplicável, verificando-se, desta forma, a violação da lei substantiva, concretamente do regime jurídico da habilitação legal, mas também do regime jurídico do concurso público.
XVIII - O recurso à declaração de compromissos assumidos por terceiros relativos a atributo ou a termo ou condição da proposta adjudicada, não é equivalente, nem se confunde com o recurso aos documentos e declarações de terceiros para efeito de habilitação legal, em qualquer procedimento por maioria de razão num concurso público, como é o caso do presente procedimento, em que a escolha dos adjudicatários é feita apenas com base nas características das propostas, independentemente da apreciação da qualificação das empresas concorrentes, das suas capacidades técnicas e financeiras.
XIX - Conforme decidido por esse Douto Tribunal, no seu acórdão de 30/01/2013, proferido no âmbito do Proc.º 993/12,
“No concurso público, em contraposição com o procedimento de concurso limitado por prévia qualificação (vide art.º 165.º do CCP), não são exigíveis aos concorrentes requisitos mínimos de capacidade técnica. Salvo disposição especial em contrário (vide, por exemplo, o art.º 75.º, n.º 3, do CCP), qualquer operador económico pode ser concorrente (art.º 53.º do CCP), desde que não se encontre em situação de impedimento (art.º 55.º do CCP) e esteja legalmente habilitado a executar o contrato (art.º 81.º do CCP).
Deste regime legal resulta que o concurso público é um procedimento aberto, de acesso livre, em que qualquer operador económico se pode apresentar a concurso e em que as propostas serão analisadas apenas pelos aspetos de natureza objetiva, relativos às propostas em si mesmas e à qualidade dos respetivos atributos, estando vedado à Entidade Adjudicante escolher o cocontratante em razão dos aspetos subjetivos que respeitem à qualificação técnica e/ou económico-financeira dos concorrentes.
E pode inferir-se que a opção por este tipo de procedimento, e não pelo procedimento de concurso limitado por prévia qualificação, tem ínsita a ideia de que a entidade adjudicante pressupõe que para satisfazer o interesse público que determinou a decisão de contratar não são requeridas especiais competências ou experiência por parte do adjudicatário e que qualquer agente que esteja legalmente autorizado a atuar no segmento de mercado relevante, está em condições de executar o contrato a outorgar.
“Sempre que a entidade adjudicante pretenda avaliar a capacidade técnica e/ou financeira dos concorrentes, o procedimento adequado é o concurso limitado por prévia qualificação” (as palavras são de Marco Real Martins e de Miguel Assis Raimundo, in Documentos de habilitação e documentos de qualificação nos procedimentos de formação dos contratos públicos, p. 10) (vide art.º 162.º e segs. do CCP).
Deste modo, o sistema seria incoerente se permitisse que a adjudicante pudesse introduzir no regulamento de um concurso público [que, repete-se, a lei quer aberto e de acesso livre, “desinteressando-se quase totalmente do respetivo proponente” (Olazabal Cabral, “O Concurso Público no Código dos Contratos Públicos”, in Estudos da Contratação Pública, I, p. 185)] requisitos subjetivos de participação e/ou de habilitação, atinentes à capacidade técnica e /ou financeira que limitassem o acesso dos concorrentes ou os afastassem da celebração do contrato, em detrimento do valor objetivo das respetivas propostas”.
XX - São igualmente distintos os regimes jurídicos aplicáveis à declaração de compromissos assumidos por terceiros relativos a atributo ou a termo ou condição da proposta adjudicada e à declaração de terceiros para efeitos de habilitação legal.
XXI - O regime jurídico da declaração de compromissos assumidos por terceiros relativos a atributo ou a termo ou condição da proposta adjudicada, uma vez que que a declaração diz respeito a compromissos assumidos relativamente a atributo ou termo ou condição da proposta adjudicada, obriga a que essa declaração conste da proposta apresentada, sob pena de a mesma ser excluída nos termos dos artigos 70.º, n.º 2, alínea a) e 146.º, n.º 2, alínea o), ambos do CCP.
XXII -Por sua vez, o regime jurídico da declaração de terceiros para efeitos de habilitação legal, sendo, portanto, um documento de habilitação, somente impõe que essa declaração seja entregue na fase da habilitação e não, como defende o acórdão recorrido, com a apresentação da proposta.
XXIII - Como refere PEDRO COSTA GONÇALVES, in Direito dos Contratos Públicos, 2020, 4.ª Edição, Almedina, pág. 1008,
“Próximos dos compromissos de terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta adjudicada, “que têm de ser confirmados após a adjudicação, parecem-nos os documentos de comprovação de habilitações de subcontratados, que o adjudicatário deve apresentar, nos termos dos artigos 2.º, n.º 2, ou 3.º, n.º 2, da Portaria n.º 372/2017: aqui se estabelece que, para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes. A Portaria não alude, neste caso específico, a confirmação de compromissos, porventura porque estará a supor que o agora adjudicatário, enquanto concorrente, não declarou que iria socorrer-se de terceiras entidades para cumprir as exigências relacionadas com a habilitação profissional. Neste sentido, pode dizer-se que se trata da apresentação da declaração de compromisso (e, portanto, de um “documento de habilitação”) e não tanto da confirmação de um compromisso” (negrito nosso).
XXIV - Pelo que, ao considerar que, no âmbito de um concurso público, e sem que o programa do procedimento tenha feito tal previsão (e que, em nosso entendimento, nem devia) a declaração de terceiros para efeitos de habilitação legal, deve integrar os documentos da proposta apresentada, a decisão recorrida viola o regime jurídico da habilitação legal, bem como o regime jurídico do concurso público.
XXV - Com efeito, o regime jurídico da habilitação legal consagrado no artigo 81.º do CCP e na Portaria n.º 372/2017, de 14/12 prevê que o adjudicatário (e apenas esse), deve apresentar (i) os documentos de habilitação exigidos nos termos do disposto no artigo 81.º do CCP, bem como (ii) nos procedimentos de formação de um contrato de aquisição de serviços, quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a prestação dos serviços em causa (cfr. n.º 1, do artigo 2.º da Portaria n.º 372/2017),
XXVI - Especificando o n.º 2, do artigo 2.º da Portaria n.º 372/2017 que, para efeitos de comprovação dessas habilitações, não sendo o adjudicatário titular das habilitações requeridas pelo procedimento pré-contratual, este pode “socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração, através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes”.
XXVII - Regulando esta norma a fase da habilitação, só se pode interpretar o momento em que deve ser feita esta apresentação como a desta fase, e não com a proposta.
XXVIII - In casu, e conforme expressamente previsto na lei (artigo 2.º, n.º 2 da Portaria n.º 372/2017), a A…………, por não possuir a qualidade de Organismo Notificado para as Especificações Técnicas de Interoperabilidade - Comissão Europeia – NANDO, socorreu-se das habilitações das empresas B………… S.A.S e C………… S.L.,
XXIX - Fazendo constar de forma clara e inequívoca essa informação da sua proposta, que não obstante tal informação, foi objeto de adjudicação, não juntando, no entanto, aos documentos integrantes da proposta a declaração das empresas subcontratadas, “através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes”, porquanto a apresentação dessa declaração, visando a habilitação do adjudicatário (ainda que por terceiro), não é exigida na fase de apresentação das propostas, mas tão-somente na fase de habilitação que ocorre, como é sabido, após a decisão de adjudicação da entidade contratante.
XXX - Pois, como referem MARCO REAL MARTINS e MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, in, “Documentos de habilitação e documentos de qualificação nos procedimentos de formação de contratos públicos, in Revista do Ministério Público, n.º 121, Jan-Março 2010, págs. 15-17, “na habilitação, que só tem lugar na parte final do procedimento e apenas é exigível ao adjudicatário, por motivos de desburocratização e de celeridade procedimental, poderemos distinguir duas subfases, sem que entre as mesmas exista qualquer tipo de precedência: i) uma subfase em que se procede a uma comprovação essencialmente negativa relativa ao preenchimento por parte do adjudicatário dos requisitos negativos de falta de idoneidade profissional ou pessoal, bem como uma verificação do cumprimento de requisitos gerais respeitantes ao cumprimento de obrigações fiscais e sociais (…); e ii) uma subfase em que se procede a uma comprovação positiva de que o adjudicatário é detentor das habilitações legais necessárias para o exercício de determinada atividade ou profissão (v. g., certificados de inscrição em listas oficiais de fornecedores, cédulas profissionais, alvarás, etc.) (…).
Em qualquer destas subfases da fase de habilitação, a doutrina tem entendido inexistir qualquer juízo avaliativo por parte do júri. (…)
Quando a entidade adjudicante escolhe o concurso público, procede a um “apelo genérico à concorrência", manifestando ou publicitando apenas "a sua intenção de receber propostas, para escolher a melhor, desinteressando-se quase totalmente do respetivo proponente", devendo, pois, entender-se que se basta com a habilitação do adjudicatário” (negrito nosso).
XXXI - Com efeito, uma vez que a mencionada Portaria n.º 372/2017 define as regras e os termos de apresentação dos documentos de habilitação do adjudicatário no âmbito de procedimentos de formação de contratos públicos, sendo inquestionável que só é adjudicatário quem viu a sua proposta ser adjudicada, o que, obviamente, ainda não aconteceu na fase de apresentação das propostas, a declaração de terceiros para efeitos de habilitação legal deve apenas ser apresentada, pelo adjudicatário, na fase de habilitação!
XXXII - Pois, como esclarece JORGE ANDRADE E SILVA, “Inovador é o regime da habilitação do adjudicatário. No regime anterior a este CCP, todos os concorrentes teriam que se habilitar, isto é, demonstrar que possuíam as qualificações exigidas para que pudessem concorrer e, portanto, para que as suas propostas pudessem ser apreciadas, se não enfermassem de algum dos vícios previstos considerados como determinantes da sua exclusão. Assim, os documentos de habilitação não respeitam às propostas, mas aos próprios concorrentes. […] Este preceito estabelece um regime bem diferente, pois apenas faz incidir esse ónus da habilitação sobre o adjudicatário, relegando, pois, a deliberação sobre essa habilitação para depois da adjudicação e restringindo-a, logicamente, ao adjudicatário […]” (in Código dos Contratos Públicos, Anotado e Comentado, 8.ª edição, p. 292) (sublinhado e sombreado nossos).
XXXIII - Por outras palavras, continua aquele Autor “[…] no regime anterior o ónus de habilitação recaía sobre todos os concorrentes e teria que ser cumprido com a apresentação das respetivas propostas, tendo então que demonstrar, pela forma exigida, que possuíam as qualificações impostas para que pudessem celebrar o contrato a que o procedimento respeitava. […] O CCP veio estabelecer uma clara distinção entre a habilitação (agora do adjudicatário) e a qualificação (agora apenas nos procedimentos que comportam uma fase de qualificação) ” (in Código dos Contratos Públicos p. 304) (sublinhado nosso).
XXXIV - Ademais, também o teor do artigo 2.º, n.º 2, da Portaria 372/2017 é absolutamente claro e inequívoco, na medida em que afirma que é o adjudicatário – e não o concorrente, que, para efeitos de comprovação das habilitações exigidas no programa do concurso “pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração, através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes” (sublinhado nosso).
XXXV - Isto é, o adjudicatário que não é titular das habilitações exigidas no programa do procedimento, apresenta, em sede de habilitação, e somente nesta fase, em vez das suas próprias habilitações, as habilitações dos subcontratados acompanhadas da declaração “através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes”.
XXXVI - Prevendo expressamente a lei que somente o adjudicatário deve apresentar a declaração dos subcontratados para efeitos de comprovação das habilitações exigidas pelo programa do concurso ou o convite, deve o intérprete presumir, que na fixação do sentido e do alcance da lei, o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (cf. artigo 9.º, n.º 3 do CC), razão pela qual, não pode essa declaração ser exigida ao concorrente!
XXXVII - Ademais, tal exigência não tem “na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (cf. artigo 9.º, n.º 2 do CC), pelo que a mesma deve ser afastada, e, por conseguinte, ser a declaração através da qual os subcontratados se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constante apenas exigida ao adjudicatário na fase de habilitação, não existindo no CCP qualquer preceito de onde resulte que, num concurso público, os documentos de habilitação são exigíveis (logo) no momento da apresentação das propostas.
XXXVIII - Entender o contrário seria violar não só o regime legal da habilitação (constante do artigo 81.º do CCP e da Portaria n.º 372/2017), como também o regime do concurso público, pois a vingar o entendimento defendido no acórdão recorrido tal corresponderá, salvo melhor opinião, à violação do paradigma que o legislador criou relativamente ao regime estabelecido no Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março, nos termos do qual a Entidade Adjudicante escolhe a melhor proposta, sem se distrair com as qualidades dos concorrentes.
XXXIX - Sem prescindir e à cautela, sempre se dirá que, entendendo as doutas decisões que se estaria perante uma declaração de confirmação de compromissos para efeitos dos artigos 77.º, n.º 2, alínea c), 92.º e 93, todos do CCP, então a cominação para a sua falta de apresentação com a proposta, terá que ser a exclusão da mesma e não a caducidade da adjudicação, com as respetivas consequências legais e processuais, atento o momento de conhecimento do vício que, nessa perspetiva alegadamente teria inquinado o ato adjudicatório, nos termos do artigo 70.º, n.º 2, alínea a) e 146.º, n.º 2, alínea o), ambos do CCP.
XL - A posição que resulta do acórdão recorrido, altera, também, de forma substancial, e sem fundamento que o torne compreensível, o instituto da subcontratação previsto nos artigos 317.º e ss., em total disrupção com o regime estabelecido no CCP. Na verdade, o pressuposto jurídico desta posição, num concurso público, terá como corolário lógico a redução do âmbito da subcontratação à mera satisfação de necessidades quantitativas do adjudicatário (instrumento de suprimento de quantidade de meios) e não de qualidade.
XLI – Donde, o acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação da lei, verificando-se o vício de violação de lei substantiva, o que suscita, em matéria substantiva, as questões seguintes:
i. A relativa ao regime jurídico da habilitação legal de terceiros, a saber, se este instituto da habilitação legal equivale ou se confunde um instituto distinto da confirmação de compromissos por terceiros;
ii. A relativa à apreciação do momento em que deve ser apresentada a declaração através da qual os subcontratados se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constante: se logo com a proposta pelos concorrentes ou se apenas pelo adjudicatário na fase da habilitação legal;
iii. A de saber se o entendimento vertido no acórdão do TCA Sul, a vingar, se aplica apenas ao caso dos autos, isto é, quando estão em causa organismos notificados ou é mais abrangente e se aplica a todas as situações em que os concorrentes, para efeitos de habilitação, se socorram das habilitações legais de terceiros, ao abrigo do artigo 2.º, n.º 2, da Portaria n.º 372/2017, de 14/12,
XLII - Impondo-se, assim, a intervenção desse Venerando Tribunal para a melhor aplicação do direito e boa administração da justiça.

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. mui e sempre doutamente suprirão, deve o presente recurso de revista ser admitido e considerado procedente, revogando-se em consequência o Acórdão proferido pelo TCA Sul, fazendo-se, assim, a costumada Justiça».

9. Por sua vez, a também Recorrente, Contrainteressada/adjudicatária (“A………… – Sociedade Unipessoal, Lda.”), concluiu do seguinte modo as suas alegações de recurso de revista (cfr. fls. 797 e segs. SITAF):

«1ª. Quer a Ré, quer a aqui Recorrente alegaram a caducidade do direito de acção, em virtude de ter sido ultrapassado o prazo previsto no artigo 101.º do CPTA, tendo o tribunal de Primeira Instância declarado tal excepção improcedente, o que foi confirmado pelo Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa.
2ª. A Autora alega que a aqui Recorrente não apresentou, em devido prazo, no procedimento concursal, o documento comprovativo da certificação da Comissão Europeia designada por “NANDO”, e por esse motivo a adjudicação à aqui Recorrente teria caducado.
3ª. Ora, com a notificação da adjudicação, em 18 de Novembro de 2019, a Contrainteressada A………… Soc. Unip. Lda. foi notificada para, no prazo de 10 dias, apresentar os documentos de habilitação, que comprovassem ser um “Organismo Notificado para as Especificações Técnicas de Interoperabilidade” – facto considerado provado no ponto K) da douta sentença recorrida.
4ª. De acordo com a Autora, o prazo concedido à Contrainteressada para apresentação desses documentos terminou no dia 02 de Dezembro de 2019, tendo a Contrainteressada apresentado a documentação apenas no dia 05 de Dezembro 2019.
5ª. Assim, a própria Autora confessa que, no seu entendimento, a adjudicação caducou no dia 3 de Dezembro de 2019, pelo que ficou à espera de “ser notificada da caducidade da adjudicação inicial”.
6ª. Sucede que, tal como vem sendo entendimento da jurisprudência, a caducidade da adjudicação é um facto que opera ope legis, ou seja, por força da lei, sem que se afigure necessária a declaração de caducidade por parte da Adjudicante.
7ª. Importa perceber se, verificada a caducidade da adjudicação, a Ré tinha ou não um prazo para declarar essa caducidade – prazo esse a partir do qual iria contar-se o prazo de 1 mês para a Autora intentar a respectiva acção, nos termos do artigo 101.º do CPTA.
8ª. Ora, o Tribunal a quo, no seu despacho saneador considerou (e posteriormente, o Tribunal de Círculo confirmou-o), que a Ré apenas no despacho de 26 de Junho de 2020 é que se pronunciou definitivamente quanto à questão da caducidade da adjudicação (que não reconheceu), pelo que o prazo de caducidade da acção deveria ser contado a partir desta data.
9ª. Todavia, se a adjudicação caducou no dia 3 de Dezembro de 2019 (como defendeu a Autora), o acto seguinte a praticar pela Entidade Adjudicante (Ré) deveria ser a notificação da Adjudicatária (aqui Recorrente), para exercer o seu direito de audiência prévia, nos termos do n.º 3 do artigo 86.º do CCP. Esta notificação, na falta de prazo específico, deveria ser feita no prazo subsidiário de 10 (dez) dias, previsto no n.º 1 do artigo 86.º do CPA.
10ª. Ao não ter realizado aquela notificação obrigatória, no prazo de 10 (dez) dias, a Ré demonstrou, através desta omissão, que não considerou caducada a adjudicação e, portanto, que iria prosseguir com o procedimento, pelo que, nos termos do artigo 101.º do CPTA, a Autora deveria ter exercido o seu direito de acção (para pedir a alegada caducidade da adjudicação), no prazo de um mês, ou seja, até ao dia 14 de Janeiro de 2020, mas só o fez a 27 de Julho de 2020.
11ª. Assim, em 15 de Maio de 2020, a Ré notificou a Contrainteressada para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentar os documentos de habilitação actualizados de acordo com o artigo 20.º do Programa de Procedimento – tal como resulta do ponto P) dos factos provados constantes da douta sentença.
12ª. Em 18 de Maio de 2020, em resposta àquela solicitação, a aqui Recorrente apresentou requerimento de igual teor ao apresentado em 05 de Dezembro de 2019, requerendo autorização para a subcontratação das empresas B………… e C………… – conforme resulta do ponto Q) dos factos provados constantes da douta sentença.
13ª. Em 27 de Maio de 2020, a Ré solicitou à aqui Recorrente mais documentação, a qual foi apresentada. De acordo com a Autora, esta apresentação de documentos em 27 de Maio de 2020 foi realizada fora do prazo fixado pela Ré, motivos pelos quais a adjudicação teria caducado, nos termos do artigo 86.º do CCP.
14ª. Assim, mais uma vez, considerando que a caducidade da adjudicação opera ope legis, a mesma teria ocorrido (dentro da lógica da tese da Autora) no termo do prazo de 5 (cinco) dias fixado pela Ré para junção de documentos, ou seja, no dia 21 de Maio de 2020. Ora, se a adjudicação caducara no dia 21 de Maio de 2020, o acto seguinte a praticar pela Ré deveria ser, mais uma vez, a notificação da Adjudicatária (aqui Recorrente), para exercer o seu direito de audiência prévia, nos termos do n.º 3 do artigo 86.º do CCP, no prazo subsidiário de 10 (dez) dias, nos termos do n.º 1 do artigo 86.º do CPA.
15ª. Porém, a Ré não notificou a aqui Recorrente para exercer o seu direito de audiência prévia relativamente à operada caducidade de adjudicação, mas antes para prestar esclarecimentos e apresentar mais documentos – conforme resulta dos factos provados.
16ª. Com esta nova notificação de 27 de Maio de 2020, a Ré demonstrou de forma inequívoca que não tinha considerado caducada a adjudicação que, de acordo com a tese da Autora, teria operado no dia 21 de Maio de 2020.
17ª. Sucede que, em 8 de Junho de 2020, a Autora apresentou impugnação administrativa, mas, nos termos do disposto no artigo 270.º do CCP, as impugnações administrativas devem ser apresentadas no prazo de 5 (cinco) dias a contar da respectiva notificação.
18ª. A Autora, em 27 de Maio de 2020, teve conhecimento, por acto da Ré, que esta não iria declarar a caducidade de adjudicação, pelo que o prazo máximo para apresentar a impugnação administrativa relativa a esse acto seria o dia 2 de Junho de 2020. Tendo somente sido apresentada em 8 de Junho de 2020, a mesma encontrava-se já fora de prazo, pelo que a impugnação administrativa não pode ter o efeito de suspensão do prazo de caducidade, previsto no n.º 4 do artigo 59.º do CPTA.
19ª Inexistindo suspensão do prazo de caducidade (por força da intempestividade da impugnação administrativa), o acto praticado pela Ré a 27 de Maio de 2020 e notificado à Autora na mesma data, apenas poderia ter sido impugnado até ao dia 27 de Junho de 2020, nos termos do artigo 101.º do CPTA. Não o tendo sido (a acção apenas deu entrada em 27 de Julho de 2020), caducou o direito da Autora de impugnar aquele acto, e bem assim de ver declarada a caducidade da adjudicação, que alegou ter ocorrido no dia 21 de Maio de 2020, devendo o tribunal a quo ter declarado caducado o direito da Autora a intentar acção de contencioso pré-contratual, onde a mesma podia pedir a condenação da Ré na declaração de caducidade da adjudicação.
20ª. Ora, como pode o Tribunal a quo considerar que o direito de acção da Autora ainda não estava caducado, quando a própria Autora confessa, na impugnação administrativa de 8 de Junho de 2020, que, no seu entendimento, a caducidade da adjudicação já ocorrera há mais de 6 meses?!
21ª. Ao não considerar caducado o prazo da Autora para intentar a acção aqui em causa, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 101.º, e n.ºs 3 e 4 do 59.º do CPTA.
22ª. Qualquer interessado pode apresentar a sua candidatura a um concurso público, sendo que, na fase inicial, concretamente na apresentação de proposta, não podem ser exigidos ao concorrente a comprovação das suas habilitações ou as entidades que pretende subcontratar.
23ª. A apresentação dos documentos comprovativos de habilitações, apenas é legalmente exigida após a adjudicação, sob pena de violação do disposto no artigo 81.º do CCP. No artigo 81.º do CCP é expressamente referido que é o adjudicatário quem tem de prover pela apresentação dos documentos de habilitação. Com efeito, é o adjudicatário quem se habilita à celebração do contrato, pelo que só ele terá de comprovar à entidade contratante que cumpre as habilitações estabelecidas para aquele concurso.
24ª. Na apresentação da A……….. ao concurso, esta explica desde logo que “O Grupo D………… detém na sua estrutura internacional diversas qualificações e acreditações, às quais as suas subsidiárias recorrem, sendo que na situação em concreto, o modelo de governance assentará na sub-contratação interna (ao Grupo) das entidades que detêm as qualificações solicitadas no âmbito do presente concurso, nomeadamente E………… S.L Unipessoal (doravante designada como E…………) e B…………, doravante designada por F………….”
25ª. Os serviços foram adjudicados à Contrainteressada, tendo esta sido então notificada, a 18 de Novembro de 2019, para apresentar “documentação referente à notificação da Autoridade Nacional de Segurança ou Estado-membro em que o Concorrente se encontra notificado (atualizado e de acordo com o presente na base de dados da Comissão Europeia - NANDO - http://ec.europa.eu/growth/toolsdatabases/nando/), que comprove a sua habilitação ao desenvolvimento da atividade de Organismo Notificado para as Especificações Técnicas de Interoperabilidade alvo da presente aquisição de serviços.”
26ª. Nessa sequência, a Contrainteressada requereu autorização para subcontratar as empresas B………… S.A.S (B…………) e C………… S.L. (C…………), ambas pertencentes ao Grupo Multinacional D…………, que ela também integra, para a execução do contrato em causa, tendo juntado documentação comprovativa do cumprimento dos requisitos constantes do Caderno de Encargos, designadamente, a “Notificação de um organismo no âmbito de uma diretiva de harmonização técnica, onde consta: 10  Para a empresa B…………, que esta é formalmente acreditada para EN ISO/IEC 17020 – Inspeção, sendo que a acreditação em causa “abrange as categorias de produtos e os procedimentos de avaliação de conformidade abrangidos nesta notificação”, e  Para a empresa C…………, que esta está formalmente acreditada para EN ISO/IEC 17065 – Certificação de Produtos, sendo que, aqui também, a acreditação em causa “abrange as categorias de produtos e os procedimentos de avaliação de conformidade abrangidos nesta notificação”. Mais informou que ambas as entidades cumprem com todos os requisitos exigidos no Convite e no Caderno de Encargos, bem como com todas as disposições previstas na legislação aplicável à actividade por si desenvolvida.
27ª. Toda a documentação solicitada e legalmente exigida pela Ré foi entregue pela Contrainteressada, tendo sido regularmente aceite.
28ª. De acordo com a Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, designadamente o n.º 2 do artigo 2.º, que “Para efeitos de comprovação das habilitações referidas no número anterior, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes.”, pelo que decorre da Lei que a Contrainteressada pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, neste caso concreto, das empresas B………… e C…………, as quais sendo de Estados membros da União Europeia podem livremente laborar em território nacional.
29ª. Não era necessário ao adjudicatário possuir as habilitações necessárias à execução das prestações objeto do contrato, pois o n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro e o próprio Programa do Procedimento, permite que as habilitações de terceiros (subcontratados), mediante apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes, se substituam às habilitações do adjudicatário.
30ª. Há Pareceres nesse sentido, designadamente o Parecer n.º DAJ 23/20, proferido em 5 de Fevereiro de 2020 pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, que chega às mesmas conclusões.
31ª. Logo, é, em nosso entender, atento o acima descrito, errada a conclusão do douto Tribunal a quo de que “Tem, pois, de concluir-se que, não tendo a Contrainteressada habilitação para o desenvolvimento da atividade de organismo notificado para as Especificações Técnicas de Interoperabilidade alvo da aquisição de serviços em questão, não lhe pode ser adjudicado o contrato, por se tratar de entidade não habilitada à prestação dos serviços que integram o objeto principal do concurso, não sendo de admitir o aproveitamento da capacidade de terceiros, por via da subcontratação, por não ter sido apresentado em tempo devido, a imprescindível declaração de compromisso nesse sentido.”
32ª. Conforme decorre da Directiva 2008/57/CE do Parlamento e do Conselho, de 17 de Junho de 2009 relativa à interoperabilidade do sistema rodoviário na Comunidade, pode ler-se no artigo 10.2. “Os Estados-Membros não podem, nos respectivos territórios e com base na presente directiva, proibir, restringir ou prejudicar a colocação no mercado de componentes de interoperabilidade para utilização no sistema ferroviário que cumpram o disposto na presente directiva.”, podendo ainda ler-se no artigo 16.º do diploma que “Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 15º, os Estados-Membros não podem, nos respectivos territórios e por motivos relacionados com a presente directiva, proibir, restringir ou prejudicar a construção, entrada em serviço e exploração de subsistemas de carácter estrutural constitutivos do sistema ferroviário, que satisfaçam os requisitos essenciais. Nomeadamente, não podem exigir verificações que já tenham sido efectuadas: no âmbito do procedimento que deu origem à declaração «CE» de verificação, cujos elementos constam do anexo V,— ou, noutros Estados-Membros…”
33ª. Também no Guia Azul de 2016 sobre a aplicação das regras da União Europeia em matéria de produtos, publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 26 de Julho de 2016, pode ler-se no seu ponto 5.2.2. “Os organismos notificados são livres de oferecer os seus serviços de avaliação da conformidade, no âmbito da respetiva notificação, a qualquer operador económico estabelecido dentro ou fora da União. Podem também exercer estas atividades no território de outros Estados-Membros ou de países terceiros”.

TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER PROCEDENTE, REVOGANDO-SE A DECISÃO A QUO, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE:
a) Declare a caducidade do direito de acção da Autora, com as legais consequências;
Sem prescindir, e caso assim não seja entendido,
b) Julgue a acção totalmente improcedente, por não se verificar qualquer facto gerador de caducidade da adjudicação».

10. Por seu lado, a Recorrida/Autora (“APNCF – Associação Portuguesa para a Normalização e Certificação Ferroviária”) apresentou contra-alegações, onde, sem conclusões, pugnou pela manutenção do Acórdão do TCAS recorrido (cfr. fls. 887 e segs. SITAF).

11. Os presentes recursos de revista foram admitidos pelo Acórdão de 23/9/2021 (cfr. fls. 919 e segs. SITAF) proferido pela formação de apreciação preliminar deste STA, prevista no nº 6 do art. 150º do CPTA, designadamente nos seguintes termos:

«Na presente revista a Recorrente CI pretende discutir duas questões: i) Saber se a caducidade da adjudicação por falta de comprovação de habilitação do concorrente opera “ope legis”, ou se necessita de ser declarada, com efeitos constitutivos, pela entidade adjudicante, ou seja se depende de acto administrativo [sendo que a resposta a esta questão tem implicações na contagem do prazo de caducidade da acção de contencioso pré-contratual, previsto no art. 101° do CPTA]; ii) Saber em que momento deve o adjudicatário apresentar as habilitações de subcontratados, nos termos do art. 2°, n° 2 da Portaria 372/2017, se no momento de apresentação da candidatura, ou se após a adjudicação.
A Recorrente IP pretende igualmente discutir o sentido e alcance, num concurso público, do instituto de habilitação legal previsto pelo art. 81° do CCP e pelo disposto no art. 2°, n° 2 da Portaria n° 327/2017, de 14/12.
(…) O TAF de Almada proferiu despacho saneador, em 09.10.2020 no qual apreciou a invocada caducidade do direito de acção, excepção que foi julgada improcedente.
Por sentença de 10.03.2021 foi a acção julgada procedente, e a entidade demandada condenada a declarar a caducidade do acto de adjudicação, por falta de habilitação da contra-interessada com a consequente anulação do contrato de prestação de serviços celebrado entre a Ré e a Cl, e a adjudicação da proposta da A., nos termos do art. 86°, n°4 do CCP.
Por sua vez o acórdão recorrido apreciando a invocada caducidade da adjudicação por ser facto que opera “ope legis”, concluiu que: “A decisão que julgou a acção tempestiva procedeu a uma correta análise, não tendo violado os art°s 51°, 53°, 590 e 69° do CPTA”.
Quanto à alegada violação do art. 2° da Portaria n° 372/2017 e dos arts. 77° e 81°, ambos do CCP, entendeu que não se verificava tendo considerado, nomeadamente, o seguinte: “A habilitação traduz-se, na sua essencialidade numa atividade certificativa da aptidão profissional e da idoneidade do concorrente adjudicatário.
Os requisitos da habilitação têm de existir desde o momento da apresentação da proposta, sendo portanto exigíveis a todos os concorrentes (…)
Não tendo a Contrainteressada os requisitos de habilitação exigidos para a prestação de serviços cuja aquisição constitui o objeto do procedimento e não tendo oportunamente, com a apresentação da proposta, apresentado o compromisso de terceiro a subcontratar não lhe pode efetivamente, nos termos explicitados na sentença recorrida, ser adjudicado o contrato, impondo-se a caducidade da adjudicação”.
Assim, concluiu que o despacho saneador e a sentença deviam manter-se, negando provimento aos recursos.
Ora, apesar de as instâncias terem decidido de forma consonante, as questões que as Recorrentes pretendem ver tratadas nas revistas justificam a sua admissão por parecer, em juízo sumário, que têm relevância jurídica, principalmente a atinente ao sentido e alcance, num concurso público, do instituto de habilitação legal previsto pelo art. 81° do CCP e pelo disposto no art. 2°, n° 2 da Portaria n° 327/2017, de 14/12, sobre a qual não haverá uma jurisprudência suficientemente consolidada [pese embora este STA já haver apreciado o momento em que é exigível a apresentação de documentos de habilitação — cfr. ac. deste STA de 04.11.2010 Proc. n° 795/10 e de 30.01.2013, Proc. nº 0846/12, indicados nas alegações da CI] (…)».

12. A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste STA, notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º nº 1 do CPTA, emitiu parecer (cfr. fls. 930 e segs. SITAF), no sentido de ser negado provimento aos recursos de revista.

13. Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, mas com prévia divulgação do projeto do acórdão pelos Srs. Juízes Conselheiros Adjuntos, o processo vem submetido à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

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II - DAS QUESTÕES A DECIDIR

14. Constitui objeto do presente recurso de revista saber se o Acórdão do TCAS recorrido, confirmativo da decisão de 1ª instância do TAF/Almada, procedeu a um correto julgamento dos recursos de apelação interpostos pelas também ora Recorrentes (Ré e Contrainteressada), em face dos erros de julgamento que, por estas, lhe são apontados nos presentes recursos de revista. Concretamente, tal como delimitado pelas conclusões das alegações das Recorrente e tal como, aliás, já sintetizado no Acórdão que admitiu as revistas (cfr. ponto 7 supra), cumpre:

a) Saber se a presente ação de contencioso pré-contratual foi interposta tempestivamente (conforme decidiram as instâncias) ou se o foi quando já expirara o respetivo prazo de caducidade, previsto no art. 101º do CPTA (como alega a Recorrente/Contrainteressada) – o que implica ponderar a natureza do instituto de caducidade de uma adjudicação) – questão suscitada no recurso da Contrainteressada; e

b) Saber em que momento deve o adjudicatário apresentar as habilitações de subcontratados, nos termos do art. 2°, n° 2 da Portaria 372/2017: se no momento de apresentação da candidatura - ou, ao menos, um compromisso por parte dos subcontratados (a confirmar posteriormente), como decidiram as instâncias - ou se, apenas, após a adjudicação (como alegam as Recorrentes), implicando apreciar o sentido e alcance, num concurso público, do instituto de habilitação legal previsto nos arts. 81° do CCP e 2°, n°2 da Portaria n° 327/2017, de 14/12 – questão suscitada por ambas as Recorrentes.

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III - FUNDAMENTAÇÃO

III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

15. Dão-se aqui por integralmente reproduzidos os factos – “A” a “GG” - dados como provados nas instâncias (cfr. parte III do Acórdão recorrido) - arts. 663º nº 6 e 679º do CPC, aplicáveis “ex vi” do disposto nos arts. 1º e 140º nº 3 do CPTA.

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III. B – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


a) Quanto à questão da alegada intempestividade na instauração da presente ação (questão suscitada pela Recorrente/Contrainteressada)


16. Partindo do pressuposto de que a caducidade de uma adjudicação opera automaticamente, “ope legis”, alega a Recorrente/Contrainteressada que, no próprio entendimento da Autora, a adjudicação (à Contrainteressada) terá caducado no dia 3/12/2019, pelo que ficou à espera de “ser notificada da caducidade da adjudicação inicial”. Ora, assim sendo, o ato seguinte a praticar pela Entidade Adjudicante (Ré) deveria ter sido a notificação da Adjudicatária (aqui Recorrente), para exercer o seu direito de audiência prévia, nos termos do nº 2 do artigo 86.º do CCP, a qual deveria ter sido efetuada no prazo subsidiário de 10 dias (nº 1 do artigo 86º do CPA). Ao não ter realizado aquela notificação obrigatória, em tal prazo, a Ré demonstrou, através desta omissão, que não considerou caducada a adjudicação, pelo que, nos termos do artigo 101º do CPTA, a Autora deveria ter exercido o seu direito de ação (para pedir a alegada caducidade da adjudicação), no prazo de um mês, ou seja, até ao dia 14/1/2020, só o tendo feito a 27/7/2020.

Mais alega que, em 15/5/2020, a Ré notificou a Recorrente/Contrainteressada para, no prazo de 5 dias, apresentar os documentos de habilitação atualizados de acordo com o artigo 20º do Programa de Procedimento (ponto P dos factos provados), tendo a Contrainteressada apresentado, em 18/5/2020, em resposta àquela solicitação, requerimento de igual teor ao apresentado em 5/12/2019, requerendo autorização para a subcontratação das empresas “B…………” e “C…………” (ponto Q dos factos provados). E em 27/5/2020, a Ré solicitou à Contrainteressada mais documentação, a qual foi apresentada. De acordo com a Autora, esta apresentação de documentos em 27/5/2020 foi realizada fora do prazo fixado pela Ré, motivos pelos quais a adjudicação teria caducado, nos termos do artigo 86º do CCP. Assim, mais uma vez considerando que a caducidade da adjudicação opera “ope legis”, a mesma teria ocorrido no termo do prazo de 5 dias fixado pela Ré para junção de documentos, ou seja, no dia 21/5/2020. Ora, se a adjudicação caducara no dia 21/5/2020, o ato seguinte a praticar pela Ré deveria ser, mais uma vez, a notificação da Adjudicatária (aqui Recorrente), para exercer o seu direito de audiência prévia, nos termos do nº 2 do artigo 86.º do CCP, no prazo subsidiário de 10 dias.

Não tendo a Ré notificado a aqui Recorrente/Contrainteressada para exercer o seu direito de audiência prévia relativamente à operada caducidade de adjudicação, mas antes para prestar esclarecimentos e apresentar mais documentos – conforme resulta dos factos provados -, com esta nova notificação de 27/5/2020, a Ré demonstrou, de forma inequívoca, que não tinha considerado caducada a adjudicação que, de acordo com a tese da Autora, teria operado no dia 21/5/2020.

Ocorre que, em 8/6/2020, a Autora apresentou impugnação administrativa, mas, nos termos do disposto no artigo 270º do CCP, as impugnações administrativas devem ser apresentadas no prazo de 5 dias a contar da respetiva notificação, pelo que o prazo máximo para apresentar a impugnação administrativa relativa a esse ato seria o dia 2/6/2020. Tendo somente sido apresentada em 8/6/2020, a mesma encontrava-se já fora de prazo, pelo que não pode ter o efeito de suspensão do prazo de caducidade, previsto no n.º 4 do artigo 59.º do CPTA.

E inexistindo suspensão do prazo de caducidade (por força da intempestividade da impugnação administrativa), o ato praticado pela Ré a 27/5/2020 e notificado à Autora na mesma data, apenas poderia ter sido impugnado até ao dia 27/6/2020, nos termos do artigo 101º do CPTA. Não o tendo sido (a ação apenas deu entrada em 27/7/2020), caducou o direito da Autora de impugnar aquele ato, e bem assim de ver declarada a caducidade da adjudicação, que alegou ter ocorrido no dia 21/5/2020, devendo o tribunal “a quo” ter declarado caducado o direito da Autora a intentar a presente ação de contencioso pré-contratual, onde a mesma podia pedir a condenação da Ré na declaração de caducidade da adjudicação.

E remata questionando como pode o tribunal “a quo” considerar que o direito de ação da Autora ainda não estava caducado, quando a própria Autora confessa, na impugnação administrativa de 8/6/2020, que, no seu entendimento, a caducidade da adjudicação já ocorrera há mais de 6 meses? Conclui, pois, que, ao não considerar caducado o prazo da Autora para intentar a presente ação, o tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 101º e nos nºs 3 e 4 do art. 59.º do CPTA.

17. Sucede que toda esta argumentação da Recorrente/Contrainteressada se baseia no pressuposto, de que parte, de que a caducidade de uma adjudicação – no caso, a caducidade, suscitada na presente ação pela Autora, da adjudicação efetuada pela Ré à proposta da Recorrente/Contrainteressada – opera automaticamente, “ope legis”, e não em resultado de um “subprocedimento” para eventual imputação culposa à adjudicatária dos factos pretensamente justificadores da caducidade da adjudicação.

Refere a Recorrente que o Ac.TCAS recorrido julgou mal ao decidir que «(…) a caducidade da adjudicação não ocorre, portanto, automaticamente. É necessário que a Entidade Adjudicante assim o declare, formulando um juízo sobre a imputabilidade, “in casu”, da falta de apresentação dos documentos, ponderadas as razões invocadas pelo adjudicatário que para o efeito, deverá ser previamente ouvido».

A Recorrente defende que, pelo contrário, a caducidade da adjudicação ocorre “ope legis”, afirmando que «tal como vem sendo entendimento da jurisprudência, a caducidade da adjudicação é um facto que opera “ope legis”, ou seja, por força da lei, sem que se afigure necessária a declaração de caducidade por parte da Adjudicante» (cfr. conclusão 6ª das suas alegações).

E, em apoio desta sua tese, de operabilidade automática da caducidade da adjudicação, invoca anterior Acórdão do mesmo TCAS, de 5/11/2009 (proc. 5506/09), em que se decidiu que «(…) a caducidade da adjudicação (…) ocorre “ope legis”, sem que se afigure necessária a notificação do adjudicante nos termos e para os efeitos do disposto no art. 100º e segs. do CPA».

Mas esta tese defendida pela Recorrente não é de sufragar, sendo de concluir que o Acórdão TCAS recorrido julgou bem, nesta parte, como já o tinha feito a sentença de 1ª instância do TAF de Almada.

O invocado Acórdão TCAS, de 5/11/2009, para além do mais, laborou ainda sobre a versão original do art. 86º do CCP (resultante do DL nº 18/2008, de 29/1), sendo que o DL nº 278/2009, de 2/10, aplicável aos procedimentos iniciados após a sua entrada em vigor, veio alterar a redação do seu nº 2 introduzindo-lhe a expressa obrigatoriedade de o adjudicatário ser ouvido previamente a uma declaração de caducidade da adjudicação tomada pela entidade adjudicante.

E ainda que se tenha considerado esta alteração como meramente clarificadora e, portanto, não verdadeiramente inovatória, o certo é que veio reforçar o entendimento, correto, da natureza não automática da caducidade de uma adjudicação por decorrência de um incumprimento supostamente justificador de tal desfecho.

Efetivamente, este STA, logo na sequência desta alteração ao art. 86º do CCP, veio esclarecer que (Acórdão de 7/8/2010, proc. 0275/10):
«(…) Este art. 86º veio a ser alterado pelo já indicado DL 276/09 ficando o referido nº 2 com a seguinte redacção: “2- Sempre que se verifique um facto que determine a caducidade da adjudicação nos termos do n° 1, o órgão competente para a decisão de contratar deve notificar o adjudicatário relativamente ao qual o facto ocorreu, fixando-lhe um prazo, não superior a 5 dias, para que se pronuncie, por escrito, ao abrigo do direito de audiência prévia”.
(…) Algumas das razões apontadas para se ter procedido à revisão da versão inicial do CCP estão enunciadas no preâmbulo do DL 276/09 referindo-se, designadamente, que “(...) O acompanhamento efectuado (de aplicação do CCP) permitiu, sem prejuízo de uma intervenção posterior noutras matérias, identificar os bloqueios cuja superação é tanto mais urgente quanto a própria actividade científica em Portugal atingiu recentemente níveis de desenvolvimento e relevância que justificam tal intervenção. No âmbito da actividade desenvolvida pela Comissão de Acompanhamento do Código dos Contratos Públicos introduzem-se, desde já, outras alterações no Código com vista a clarificar o respectivo conteúdo e a corrigir lapsos entretanto verificados, sem prejuízo das que venham a resultar dos trabalhos daquela Comissão”. Acompanha-se, assim, inteiramente a posição sustentada no acórdão recorrido no sentido de que a alteração de redacção do nº 2 do art. 86º do Código mais não é do que uma clarificação da situação anterior, constituindo um dos lapsos a que o preâmbulo se refere. De resto, no seguimento de toda a jurisprudência deste Tribunal segundo a qual a audiência dos interessados se aplica a todos os procedimentos administrativos, mesmo os especiais, ainda que não expressamente previstos nos diplomas que disciplinam o respectivo procedimento. Por outro lado, o facto de se ter procedido a esta alteração mostra à evidência que inexistiam razões genéticas, naquela fase do procedimento, para se não proceder à audição dos interessados nos termos gerais».

E, como este STA ainda recentemente expendeu, negando o efeito automático, “ope legis”, da caducidade de uma adjudicação (Acórdão de 11/1/2018, proc. 01148/17):
«(…) importa considerar que, como resulta dos arts. 86º nº 1 e 91º nº 1, ambos do CCP, a não apresentação tempestiva dos documentos de habilitação ou a não prestação da caução só constituem causas da caducidade da adjudicação se forem imputáveis ao adjudicatário.
Essa caducidade não opera automaticamente, devendo ser declarada, pela entidade adjudicante, após a audiência do adjudicatário (cf. n.º 2 do citado art.º 86.º e n.º 1 do art.º 121.º do CPA aprovado pelo DL n.º 4/2015, de 7/1).
É à entidade adjudicante que cabe emitir o juízo sobre a imputabilidade ao adjudicatário da não apresentação atempada dos documentos de habilitação ou da não prestação tempestiva da caução, em face das razões por este invocadas para o incumprimento verificado.
Essa imputabilidade, deve averiguar-se em face das circunstâncias do caso concreto e ocorre se o adjudicatário actuou com culpa, ou seja, se não cumpriu os deveres de cuidado, prudência e diligência a que estava adstrito para evitar a caducidade».

No mesmo sentido, veja-se o Ac.STA de 18/4/2018 (proc. 060/18).

Veja-se, também, o artigo de Durval Tiago Ferreira, “A falta de apresentação de documentos da habilitação como causa de caducidade de adjudicação”, in “Revista de Contratos Públicos, nº 25, Janeiro/2021, págs. 73/93:
«(…) a acrescer à necessidade de promover a audiência prévia de interessado, exige-se à Administração que realize um juízo “subjetivo” de imputabilidade sobre o comportamento do adjudicatário. Não estamos perante uma caducidade que opera automaticamente, “ope legis”, uma verificação meramente “objetiva” como sustentam alguns autores e foi entendimento inicial da jurisprudência; é mister que a entidade adjudicante se pronuncie acerca da gravidade dos factos e da sua imputabilidade ao adjudicatário».

No mesmo sentido, Jorge Andrade da Silva, in “CCP Comentado e Anotado”, e Marco Caldeira, in “Sobre a caducidade da adjudicação no CCP” (“Estudos da Contratação Pública, IV”, Coimbra Editora).

18. Assim sendo, afastada a tese da Recorrente/Contrainteressada quanto ao suposto efeito automático, “ope legis”, da caducidade da adjudicação, cai pela base a alegada intempestividade na interposição da presente ação pela Autora, pois que, conforme o Acórdão recorrido bem ponderou (na sequência do já decidido em 1ª instância), apenas em 26/6/2020 – data da notificação à Autora da recusa em declarar a caducidade da adjudicação à Contrainteressada e proceder, nos termos do nº 4 do art. 86º do CCP, à adjudicação da proposta apresentada pela Autora -, é que a Ré (Entidade adjudicante) manifestou considerar que, efetivamente, a Contrainteressada/adjudicatária estava habilitada para prosseguir os termos do procedimento.

Assim sendo, e como bem decidido, a presente ação foi, nos termos do art. 101º do CPTA, tempestivamente proposta em 27/7/2020.


b) Quanto à questão do momento em que deve o adjudicatário apresentar as habilitações de subcontratado, nos termos do art. 2°, n° 2 da Portaria 372/2017: se no momento de apresentação da candidatura - ou, ao menos, um compromisso por parte do subcontratado (a confirmar posteriormente), como decidiram as instâncias - ou se, apenas, após a adjudicação (como alegam as Recorrentes), implicando apreciar o sentido e alcance, num concurso público, do instituto de habilitação legal previsto nos arts. 81° do CCP e 2°, n° 2 da Portaria n° 327/2017, de 14/12 – questão suscitada por ambas as Recorrentes.

19. A questão, nas circunstâncias concretas dos presentes autos, é simples de colocar.

Está em causa um procedimento pré-contratual, de concurso público, para a “Aquisição de Serviços para a verificação CE, por um Organismo Notificado, do subsistema ENE (Energia) nos troços Tunes-Lagos e Faro- Vila Real de Santo António da Linha do Algarve, nas fases de projeto e empreitada”, sendo o critério de adjudicação o do melhor preço – cfr. ponto O da matéria de facto dada como provada.

Do Programa do Concurso – art. 20º nº 1 g) - consta que, no prazo de 10 dias após a notificação da adjudicação, o adjudicatário deve apresentar a documentação referente à notificação da Autoridade Nacional de Segurança, ou Estado-Membro em que o Concorrente se encontre notificado (atualizado e de acordo com o presente na base de dados da Comissão Europeia NANDO), que comprove a sua habilitação ao desenvolvimento da atividade de Organismo Notificado para as especificações técnicas de interoperabilidade alvo da presente aquisição de serviços – cfr. ponto P da matéria de facto dada como provada.

Na proposta que apresentou, a Contrainteressada/adjudicatária mencionava que para executar o contrato (em caso de adjudicação) iria recorrer a subcontratação interna ao grupo “D…………” a que pertence, a duas entidades detentoras das qualificações solicitadas (nomeadamente, a “E…………, SL” – posteriormente denominada “C…………, SL” - e “F…………, SAS”) – cfr. ponto S da matéria de facto dada como provada.

A aqui Autora, na sequência do Relatório preliminar do Júri, já se havia pronunciado contra a admissão da proposta da Contrainteressada, alegando que esta não era “organismo notificado”, nos termos exigidos no concurso. Em sede de Relatório final, o Júri esclareceu, porém, a tal propósito, que, em conformidade com o disposto no CCP, na fase de apresentação de propostas não foram solicitados quaisquer documentos relacionados com certificações ou habilitações, não se verificando qualquer motivo de exclusão na fase de análise de propostas. Mais referiu que: «Terá futuramente o concorrente sob o qual recair a adjudicação de, na fase subsequente do procedimento, fazer prova das habilitações necessárias e obrigatórias à prestação de serviços objeto do presente concurso» cfr. pontos U e V da matéria dada como provada.

A proposta da Recorrente/Contrainteressada “A…………” foi ordenada em 1ª lugar, e a da Autora ”APNCF” em 2º lugar, pelo que a adjudicação foi deferida àquela – cfr. pontos T e W da matéria de facto dada como provada.

Os concorrentes foram notificados do ato de adjudicação e a Contrainteressada/adjudicatária para, no prazo de 10 dias úteis, como previsto no programa do concurso, apresentar os documentos de habilitação, designadamente a referida documentação referente à notificação da Autoridade Nacional de Segurança ou Estado-Membro em que o concorrente se encontra notificado, de acordo com o constante, atualizadamente, na base de dados NANDO – cfr. ponto W da matéria de facto dada como provada.

A Contrainteressada/adjudicatária satisfez o solicitado através da apresentação dos documentos de habilitação das duas empresas do seu grupo que já tinha referenciado, na sua proposta, como subcontratadas para o caso de vir a ser adjudicatária, como veio a ser – cfr. pontos Y e Z da matéria de facto dada como provada.

Posteriormente, a Contrainteressada/adjudicatária satisfez ainda solicitações complementares de documentação por parte da Ré/Entidade adjudicante, nomeadamente declarações de compromisso das entidades subcontratadas – cfr. pontos AA, BB, CC e DD da matéria de facto dada como provada.

Ora, perante estes factos, a questão que se coloca é a de saber se as instâncias decidiram bem, ao concluírem, nos termos peticionados pela Autora, pela caducidade da adjudicação à aqui Contrainteressada, e a consequente anulação do contrato de prestação de serviços celebrado, com fundamento na falta de detenção, pela adjudicatária, dos requisitos de habilitação exigidos, e não tendo, por outro lado, apresentado, com a sua proposta, compromisso(s) do terceiro ou dos terceiros a subcontratar.

20. O Acórdão TCAS recorrido, sufragando a sentença do TAF/Almada, julgou que, não tendo a Contrainteressada/adjudicatária habilitação para a prestação de serviços que integram o objeto do concurso, não era legalmente admissível o aproveitamento da capacidade de terceiros, uma vez que não foi oportunamente apresentada, com a proposta, declarações de compromisso destes.

E o TAF/Almada alicerçou esta conclusão expressamente no disposto no nº 2 do art. 81º do CCP e no art. 2º da Portaria nº 372/2017, de 14/12, referindo, designadamente: «Ora, não sendo titular das habilitações necessárias à execução do contrato, e pretendendo prevalecer-se das habilitações de entidades terceiras, teria a Contrainteressada de levar ao procedimento, com a apresentação da sua proposta, as declarações de compromisso dos terceiros subcontratados e habilitados para esse efeito, conforme resulta legalmente previsto no art. 2º nº 2 da Portaria nº 372/2017, onde se refere que “para efeitos de comprovação das habilitações (…) o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações profissionais de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual este se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes”, o que não fez».

21. Mas esta fundamentação, expressada pelo TAF/Almada e acompanhada pelo Ac.TCAS recorrido, não é convincente nem de sufragar.

É que, desde logo, esta fundamentação refere-se como expressamente apoiada, como dissemos, no nº 2 do art. 81º do CCP no art. 2º da Portaria nº 372/2017, quando nenhuma destas normas impõe – contrariamente ao concluído pelas instâncias – a conclusão de que as declarações de compromisso de terceiros (de cujas habilitações o adjudicatário se pretenda prevalecer) tenham de ser apresentadas com a sua proposta inicial. Em vão se buscará em que norma de todo o art. 81º do CCP ou de todo o art. 2º da Portaria nº 372/2017 um tal dever se encontra aí imposto.

Tal não resultando da letra de tais normas, a conclusão das instâncias só pode ter sido alcançada por via do suposto espírito do legislador ínsito em tais normas.

Porém, o que de tais normas se retira é, precisamente, o contrário.

Desde logo, quer o art. 81º do CCP quer o art. 2º da Portaria nº 372/2017 estipulam exclusivamente sobre a apresentação de documentos de habilitação, e a alínea a) do nº 2 do art. 77º do CCP determina qual o momento em que devem ser apresentados, pelo adjudicatário, os documentos de habilitação, exigidos no art. 81º do mesmo CCP (e na Portaria nº 372/2017): após a decisão de adjudicação e com a notificação desta.

E o nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, prevendo expressamente a possibilidade de o adjudicatário poder socorrer-se das habilitações de subcontratados – que é o que ocorre “in casu” – através de “declarações de compromisso” (não de “confirmações”, note-se), não impõe, contrariamente ao que resulta do entendimento das instâncias, que estas declarações tenham que ser previamente apresentadas com a proposta. Nem faria qualquer sentido que, se assim fosse pretendido, tal exigência declarativa se inserisse numa Portaria reguladora da apresentação dos documentos de habilitação. Aliás, o referido nº 2 fala, apropriadamente, em “adjudicatário” [«para efeitos de comprovação das habilitações (…) o adjudicatário pode socorrer-se (…)»], em consonância com o novo paradigma do regime do CCP, desde 2008, de apresentação dos documentos de habilitação em momento posterior ao da adjudicação. Ora, o “adjudicatário” só o é após a decisão de adjudicação, e não, como é óbvio, em antecedente momento de apresentação da sua proposta.

Donde, parece insofismável, face ao disposto neste nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, que para “socorrer-se de habilitações de terceiros”, o concorrente, apenas quando já “adjudicatário” (e se acaso o vier a ser), terá de apresentar declarações de compromisso de tais terceiros, bem como os necessários documentos de habilitação.

Note-se, a propósito do referido novo paradigma do regime do atual CCP, que, estando aqui em causa um procedimento de “concurso público”, inexiste uma fase prévia de “qualificação” de concorrentes, sendo que, como explicitam Diogo Duarte Campos e Carla Machado in “A qualificação dos candidatos” (“Comentários ao CCP”, I Vol., AAFDL, 4ª edição, Agosto/2021, pág. 779): «A escolha de um procedimento com prévia qualificação antolha-se a única que permite ter em consideração não só a proposta em si mesma, mas também a aptidão do candidato (e posterior concorrente), para efetivamente executar a proposta que apresenta».

22. Dado o exposto, parece-nos ter razão a Recorrente/Ré quando alega que as decisões das instâncias laboram em confusão entre “documentos de habilitação” de terceiros, de que o adjudicatário se pode socorrer apresentando declarações de compromisso, nos termos do nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, e “confirmações” de “compromissos assumidos por terceiras entidades relativas a atributos ou a termos ou condições da proposta adjudicada”.

E, na verdade, tratando-se de “compromissos assumidos por terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta adjudicada”, há que confirmar tais compromissos, como dispõe o nº 2 c) do art. 77º (e os arts. 92º e 93º) do CCP, o que pressupõe, naturalmente, a apresentação antecedente de tais compromissos.

Mas esta exigência (de apresentação com a proposta e confirmação após a adjudicação) compreende-se quanto a estes “compromissos” que têm que ver com atributos, termos e condições das propostas e que, portanto, logicamente, têm que ser analisados e, eventualmente, valorados, com as próprias propostas (isto é, em momento necessariamente antecedente à decisão de adjudicação). Mas tal não se aplica – sob pena de subverter-se o referido paradigma do atual CCP - aos documentos de habilitação, sejam estes referentes a habilitação do adjudicatário, sejam referentes a habilitação de subcontratados de que o adjudicatário queira socorrer-se, como lhe possibilita o nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017.

Ora, no caso, está em discussão a apresentação, nos termos do nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, de documentos de habilitação de duas subcontratadas, os quais se reportam a uma sua exigida certificação de segurança europeia, “NANDO”, constante de uma base da Comissão Europeia – certificação atribuída, no caso de Portugal, pela “Autoridade Nacional de Segurança” – e que nada tem a ver com as propostas em si, designadamente com atributos, termos ou condições das próprias propostas e que, por isso, tenha que ser necessariamente analisado ou valorado na fase de análise e avaliação das propostas, sob pena, repete-se, de se subverter o atual paradigma legal de separação da fase de análise e avaliação das propostas relativamente à fase, posterior, de verificação de habilitações (do adjudicatário ou de subcontratados).

23. Sobre os “compromissos de terceiras entidades” – a serem “confirmados” – a que se referem os arts. 77º nº 2 c) (e 92º e 93º) do CCP, relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta, e que, por isso, têm que ser ponderados na análise e avaliação destas, explana Pedro Costa Gonçalves, in “Direito dos Contratos Públicos, Vol. I”, 3ª edição, Novembro/2018, págs. 970/971:
«Na fase da pós-adjudicação, supõe-se que o “compromisso” foi, inicialmente, assumido entre uma terceira entidade e o concorrente (v.g., terceira entidade que se comprometeu a fornecer ao adjudicatário os bens ou partes dos bens que este assumiu a obrigação de fornecer à entidade adjudicante; terceira entidade que se compromete com o concorrente a efetuar o transporte de resíduos) e que o concorrente declarou expressamente a existência do referido compromisso como forma de credibilizar a sua proposta, por exemplo, para garantir uma avaliação no fator da organização, qualificações e experiência do pessoal [artigo 75º nº 2, alínea b)] ou no fator da entrega do produto numa certa data [artigo 75º nº 2, alínea c)]. A apresentação de declarações de compromisso de terceiras entidades também pode ser exigida no programa do concurso, nos termos do artigo 132º nº 4 (…)».

E este autor apresenta como exemplo, de exigência nas próprias peças do procedimento, o caso tratado no Acórdão deste STA de 21/5/2015 (proc. 0236/15), em que, precisamente, a Entidade Adjudicante exigia, no Programa do Concurso, a apresentação, com as propostas, de declarações de compromisso de eventuais subcontratados, as quais corresponderão, então, a documentos exigidos nos termos do art. 57º nº 1 c) do CCP, com o propósito de que tais eventuais subcontratados se comprometessem, desde logo (isto é, desde a apresentação das propostas), perante a Entidade Adjudicante, e não meramente perante a eventual adjudicatária.

Já sobre as declarações de compromisso de subcontratados, a que se refere o nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, discorre o mesmo autor (ibidem, edição de Julho/2021, págs. 733 e segs.):
«(…) 107.1 – Aproveitamento de habilitações de terceiros
Se não dispuser ele próprio da habilitação necessária, o candidato ou concorrente pode recorrer a terceiros titulares da necessária habilitação (v.g., subcontratados), desde que sejam estes terceiros a assegurar a execução do contrato, pelo menos na parte em que este exige a titularidade de habilitação. É precisamente isto o que preveem os arts. 2º nº 2 (aquisição de serviços e de bens), e 3º nº 2 (concessões e empreitadas de obras públicas), da Portaria nº 372/2017 (...). Esta faculdade de o adjudicatário se socorrer das habilitações de subcontratados corresponde a um caso de recurso às capacidades de outras entidades, que opera aqui no campo da habilitação (profissional) para o exercício da atividade contratada».

Ora, fazendo a distinção daqueles “compromissos” (sujeitos a confirmações), destas declarações de compromisso a que se refere o nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, aqui em causa, continua o aludido autor Pedro Costa Gonçalves (em passagem, aliás, citada nas alegações da Ré/Recorrente):
«Próximos dos compromissos de terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta adjudicada, “que têm de ser confirmados após a adjudicação”, parecem-nos os documentos de comprovação de habilitações de subcontratados, que o adjudicatário deve apresentar, nos termos dos artigos 2.º, n.º 2, ou 3.º, n.º 2, da Portaria n.º 372/2017: aqui se estabelece que, para efeitos de comprovação das habilitações legalmente exigidas para a execução das prestações contratuais, o adjudicatário pode socorrer-se das habilitações de subcontratados, mediante a apresentação de declaração através da qual estes se comprometam, incondicionalmente, a executar os trabalhos correspondentes às habilitações deles constantes. A Portaria não alude, neste caso específico, a confirmação de compromissos, porventura porque estará a supor que o agora adjudicatário, enquanto concorrente, não declarou que iria socorrer-se de terceiras entidades para cumprir as exigências relacionadas com a habilitação profissional. Neste sentido, pode dizer-se que se trata da apresentação da declaração de compromisso (e, portanto, de um “documento de habilitação”) e não tanto da confirmação de um compromisso».

Assim, ainda que qualificados como “próximos” (e até por isso) dos “compromissos de terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta”, as “declarações de compromisso de subcontratados”, de cujas habilitações o adjudicatário se pretenda socorrer, referidas no nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017, são realidades distintas, concernentes à habilitação ou certificação/credenciação para o exercício de determinadas profissões ou atividades.

E é o que sucede “in casu”, em que é exigida ao adjudicatário – podendo este legalmente socorrer-se de habilitações de subcontratados - uma habilitação/certificação europeia NANDO (no caso de Portugal, atribuída pela “Autoridade Nacional de Segurança”), de “Organismo Notificado” para o exigido, no Concurso, “desenvolvimento da atividade de Organismo Notificado para as Especificações Técnicas de Interoperabilidade alvo da presente aquisição de serviços”.

Assim, nestes casos (previstos no nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017), trata-se, como explicita Pedro Costa Gonçalves, da apresentação de uma declaração de compromisso e não da confirmação de um compromisso.

24. Aliás, este STA já teve oportunidade de clarificar que, tratando-se de apresentação de documentos de habilitação, designadamente de credenciação pela “Autoridade Nacional de Segurança” – cfr. Acórdão de 23/10/2014, proc. 019/14, assim sumariado:

«I - A credenciação, pela Autoridade Nacional de Segurança, a atestar a aptidão do concorrente para o exercício da actividade que é objecto do contrato, corresponde a um documento de habilitação que confirma o preenchimento de um requisito de acesso ao concurso público exigido pelo respectivo programa ao abrigo do nº. 6 do artº. 81º. do CCP.
II - Não sendo, assim, um documento que contenha os atributos da proposta ou os termos ou condições relativos a aspectos de execução do contrato, a irregularidade de que ele padeça não pode fundamentar a exclusão da proposta nos termos dos arts. 146º, nº. 2, al. d) e 57º, nº. 1, al. c), ambos do CCP.
III - Essa exclusão também não se poderá verificar ao abrigo do artº. 70º, nº. 2, al. f), do CCP, se está provado que, à data da apresentação das propostas, o concorrente possuía a certificação exigida pelo programa do concurso.
IV - Assim, e não estando previsto no programa do concurso que a falta do aludido documento é motivo de exclusão da proposta, terá de se concluir pela ilegalidade do acto que excluiu a proposta do recorrente com o fundamento que tal documento não obedecia integralmente ao que era exigido» (sublinhados nossos).

25. As Recorrentes aludem, ainda, a um comentário do citado Autor Pedro Costa Gonçalves, em que este refere que «apesar da abertura genérica da Portaria, há casos em que se não deve aceitar o aproveitamento da capacidade de terceiros para o suprimento das habilitações do concorrente; salvo previsão legal noutro sentido, assim nos parece dever ser nos contratos que têm como objeto prestações que têm que ser asseguradas por titulares de “profissões ou atividades profissionais regulamentadas” (…)».

Não é, contudo, este o caso, pois que apenas aqui está em causa, no objeto do contrato, o desenvolvimento de uma atividade condicionada ou regulamentada, mas não o exercício de uma atividade “profissional” regulamentada (como, por exemplo, de advogado, médico, engenheiro, etc.).

E, se assim fosse, o problema não se resumiria, então, como defendem as Recorrentes, a uma mera falta de apresentação de compromissos das subcontratadas com a proposta da concorrente/adjudicatária, pois que nem seria, nesse caso, possível a assunção válida desses compromissos, reservada que estaria a execução do contrato a titulares da profissão regulamentada em questão.

26. Note-se, ainda, que a questão aqui em discussão – relativa ao momento da apresentação de “documentos de habilitação” – própria ou de subcontratados de cujas habilitações o adjudicatário se pretenda socorrer -, é totalmente distinta da questão, também aflorada nas alegações das Recorrentes, da alegada necessidade de que os requisitos de habilitação se verifiquem no momento da apresentação, e não apenas no momento, pós-adjudicação, de apresentação dos documentos comprovativos.

Porém, ainda que os requisitos tenham que estar presentes anteriormente, tal não pode levar a exigir-se aquilo que a lei não exige, designadamente, o nº 2 do art. 2º da Portaria nº 372/2017 (a comprovação dos requisitos de habilitação no momento da apresentação da proposta), pelo menos sem que tal seja exigido no Programa do Concurso – o que, manifestamente, não é aqui o caso, pois o Programa, como já vimos, limitava-se a exigir, no seu art. 20º nº 1, a apresentação dos documentos de habilitação no prazo de 10 dias após a notificação da adjudicação.

Por outro lado, a aqui Contrainteressada, já anunciava, na sua própria proposta, que iria socorrer-se das habilitações de duas subcontratadas; e não é minimamente posto em causa, nos autos, que estas duas subcontratadas já detivessem, ao tempo da apresentação da proposta, os requisitos de habilitação de que a adjudicatária se veio a socorrer.

Deste modo, tal como também se concluiu no citado Acórdão deste STA de 23/10/2014, a proposta «também não poderia ser excluída nos termos do artº. 70, nº. 2, al. f), com o fundamento “que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis”».

27. Diga-se, por último, que, ainda que estivessem em causa – que não estão – compromissos assumidos anteriormente por terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou condições da proposta, necessitados de confirmação após a adjudicação, a que se referem os arts. 77º nº 2 c) e 92º e 93º do CCP, no entendimento de Pedro Costa Gonçalves (como vimos acima, ponto 19), esses compromissos teriam apenas que ter sido assumidos perante o concorrente, e por este declarados na proposta, salvo em caso de exigência, constante das peças do procedimento, de assunção pública perante a Entidade Adjudicante (como sucedia no caso do acima citado Acórdão deste STA de 21/5/2015).

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IV - DECISÃO

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202º da Constituição da República Portuguesa, em:

Conceder provimento aos presentes recursos de revista interpostos pela Recorrente/Ré “Infraestruturas de Portugal, SA” e pela Recorrente/Contrainteressada “A…………, Sociedade Unipessoal, Lda.”, revogando-se o Acórdão do TCAS recorrido e julgando-se a presente ação, intentada pela “APNCE – Associação Portuguesa para a Normalização e Certificação Ferroviária”, aqui Recorrida, totalmente improcedente.

Custas a cargo da Autora/Recorrida.

D.N.

Lisboa, 18 de novembro de 2021 – Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha (relator) – José Augusto Araújo Veloso – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.