Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0863/13
Data do Acordão:11/19/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:OPOSIÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
COIMA
Sumário:I - A oposição à execução fiscal só pode ter por fundamento facto ou factos susceptíveis de serem integrados em alguma das previsões das várias alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
II - Os fundamentos da condenação, transitada, em processo de contra-ordenação fiscal não são sindicáveis em sede de oposição.
Nº Convencional:JSTA000P18233
Nº do Documento:SA2201411190863
Data de Entrada:05/14/2013
Recorrente:A...., LDA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A……….., Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, rejeitou liminarmente a oposição à execução fiscal n.º 35557.2012.01128159 contra si instaurada no Serviço de Finanças de Sintra-3.

1.2. Termina com a formulação das conclusões seguintes:
I. A Meritíssima Juiz a quo proferiu a Douta sentença através da qual rejeitou liminarmente a oposição à execução fiscal, por força do preceituado na alínea b) do n.º 1 do artigo 209.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (adiante apenas designado por CPPT).
II. Tal rejeição está intrinsecamente relacionada com a análise e decisão tomada no âmbito de duas questões, as quais delimitam o presente recurso, a saber:
a) O desconhecimento da dívida exequenda, sem que dela tivesse anteriormente sido notificada, por qualquer via (tomada de conhecimento apenas no momento da citação emitida no âmbito processo de execução fiscal);
b) A ilegitimidade da Executada, decorrente do desconhecimento da dívida, bem como da não notificação da liquidação.
III. Tendo a Mma. Juiz a quo decidido rejeitar liminarmente a oposição à execução fiscal, por força do preceituado na alínea b), do n.º 1, do artigo 209.º, do CPPT.
IV. Ora, considera a Recorrente que a Mma. Juiz a quo,ao decidir como decidiu, violou o artigo 204.º, n.º 1, alíneas b) e i) do CPPT.
DESCONHECIMENTO DA DÍVIDA EXEQUENDA ATÉ AO MOMENTO DA CITAÇÃO. AUSÊNCIA DE ANTERIOR NOTIFICAÇÃO EM SEDE DE LIQUIDAÇÃO.
V. A Recorrente apenas teve conhecimento da existência da dívida exequenda, aquando a recepção da citação, a qual dava conhecimento de que contra si havia sido movida a execução fiscal 3557201201128159, cujos títulos executivos correspondem a duas certidões de dívida, emitidas pela Recorrida.
VI. Tais certidões revelam que a dívida exequenda teve origem em 11J coimas e Encargos de Processos de Contra-Ordenação, os quais, se crê, estarem relacionados com a entrega de IRS decorrente da emissão de duas facturas, por parte do Sr. B…….., NIF ……… .
VII. Tal como se pugnou em sede de oposição à execução fiscal, à aqui Recorrente não assiste qualquer culpa ou responsabilidade, não tendo sequer agido de forma negligente.
VIII. A certidão de dívida 2012/5006687, em princípio dirá respeito às facturas que o Sr. B………, contribuinte fiscal …….., emitiu em nome da Recorrente, as quais têm data de 31 de Dezembro de 2011. Contudo, o emissor de tais facturas, não deu conhecimento desse facto à Recorrente.
IX. Apenas depois de 20 de Janeiro de 2012, é que a Recorrente teve conhecimento das facturas emitidas, por apenas nessa data lhe terem sido entregues pelo seu emissor, ou seja, em data do conhecimento por banda da Recorrente operou em momento posterior à data em que, em situação normal, teria a obrigação de entregar o valor da retenção do IRS ao Estado.
X. A actuação do contribuinte emissor das facturas, condicionou o comportamento da Recorrente, mormente no que ao cumprimento dos prazos legais concerne. De resto, atenta a data aposta nas facturas, resistirão sérias dúvidas de que o emissor das facturas tenha agido no seu próprio interesse contabilístico.
XI. A segunda certidão, com o número 2012/5006688, tem origem, exactamente, no mesmo modus operandi por banda do emissor da factura, a qual foi emitida em Agosto de 2011.
XII. A Recorrente e o emissor da factura têm um histórico comum em sede de conta corrente, sendo que, apenas quando as relações entre ambos sofreram um desaguisado, é que o mesmo começou a pautar o seu comportamento pela omissão de informação quanto a emissão de facturas.
XIII. Apenas em Abril de 2012 é que a Recorrente teve conhecimento da factura emitida em Agosto de 2011, por ter sido nessa data que a mesma foi notificada relativamente à existência de uma divergência quanto aos valores declarados de IRS do Sr. B…….. .
XIV. De resto, apenas no início de 2013 é que o Estado criou mecanismos legais, que permitem os contribuintes terem conhecido de quais as facturas que foram emitidas em seu nome.
XV. Até então, o contribuinte estava à mercê da “bondade” do emissor das facturas, esperando que este paute o seu comportamento com base nos mais elementares princípios, como sendo a boa fé, e que comunique atempadamente os documentos que fazem incorrer terceiros em determinados comportamentos, como sendo a entrega dos valores retidos em sede de IRS.
XVI. Atenta a factualidade relatada, bem como a circunstância de apenas com a citação a Recorrente ter tido conhecimento da situação que deu origem ao processo executivo, entende a mesma que a sua oposição deveria ter sido admitida, por se encontrem preenchidos os requisitos da alínea i), do número 1, do artigo 204.º, do CPPT, pelo que não se concorda com os fundamentos de recusa liminar da mesma.
DA ILEGITIMIDADE DA EXECUTADA, DECORRENTE DO DESCONHECIMENTO DA DÍVIDA, BEM COMO DA NÃO NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO. DA REJEIÇÃO LIMINAR DA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO, RELATIVAMENTE AO FUNDAMENTO ILEGITIMIDADE.
XVII. Conforme indicado em 3. supra, a Mma. Juiz a quo rejeitou liminarmente a oposição à execução proposta pela Recorrente, não considerando o argumento invocado – a ilegitimidade da Executada. Também como referido anteriormente, não concorda a Recorrente com tais fundamentos, considerando mesmo que ao decidir como decidiu, a Mmª Juiz violou o disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT, senão vejamos.
XVIII. A Recorrente considera que é parte ilegítima por, embora figurar no título executivo, terem sido preteridos formalismos legais, que teriam conduzido ao conhecimento da existência desta dívida, e a mais adequada reacção, como sendo a impugnação judicial. Se assim tivesse ocorrido, a Recorrente não estaria a braços com uma execução fiscal, nem teria prestado garantia, como o fez.
XIX. Igualmente, considera a Recorrente ser parte ilegítima, por não se considerar responsável pela dívida exequenda, o que de resto resulta da exposição constante dos números 5. a 9., o que aqui que dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
XX. Tendo a emissão das facturas ocorrido totalmente à revelia do conhecimento da Recorrente, não pode a mesma considerar-se responsável pelo pagamento de uma quantia que não resulta, em momento nenhum, de uma actuação dolosa ou sequer negligência, da sua parte.
XXI. A Recorrente está ainda em crer que, a Mma. Juiz a quo, não analisou correctamente os fundamentos contidos na oposição à execução, nomeadamente o seu cabimento em alguma das alíneas do artigo 204.º, do CPPT.
XXII. De acordo com Jorge Lopes de Sousa, no CPPT anotado e comentado, do ano de 2007, no seu ponto 11, o mesmo considera que “o que é relevante para apreciar se o oponente invoca um fundamento de oposição à execução são os factos invocados e não a sua qualificação jurídica, pois o tribunal não está vinculado pelo alegado pelas partes quanto à aplicação do direito (art. 644.º do CPC). Por isso, se os factos invocados se enquadram nalguma das situações previstas no n.º 1 do art.º 204.º deste Código, não se poderá rejeitar a oposição com fundamento na não invocação de um dos fundamentos admissíveis, mesmo que a qualificação que, erradamente, é dada aos factos invocados, não preencha qualquer uma das situações referidas.”
XXIII. Na verdade, não restou outra alternativa à Recorrente senão deduzir a oposição à execução, já que apenas com a citação é que teve conhecimento de que contra si havia sido instaurada uma acção executiva, cuja dívida exequenda tinha origem na não entrega atempada da quantia retida a título de IRS.
XXIV. Ao decidir como se decidiu, foi a Recorrente sujeita a uma tremenda injustiça, desde logo por não ter sido dado cumprimento a procedimentos legais que antecedem o processo executivo, os quais teriam permitido à aqui Recorrente outro direito de acção, sem que tivesse sido penalizada da forma como tem ocorrido.
XXV. Em face do que vem sido dito, e em reposição da justiça, está a Recorrente em crer que as questões alvo do presente recurso só serão sanadas com a revogação da sentença recorrida, ordenando-se a baixa do recurso para a primeira instância de molde a que as questões suscitadas na oposição à execução sejam apreciadas.
Termina pedindo a procedência do recurso e que, em consequência, seja revogada a decisão recorrida e se ordene que os autos baixem à 1.ª instância de molde a que as questões suscitadas em sede de oposição à execução fiscal sejam apreciadas.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«A recorrente acima identificada vem sindicar a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, exarada a fls. 37/39, em 07 de Dezembro de 2012.
A decisão recorrida rejeitou liminarmente a oposição por, alegadamente, não ter sido alegado nenhum dos fundamentos de oposição enunciados no artigo 209.º/1/ b) do CPPT.
A recorrente termina a suas alegações com as conclusões de fls. 57/62, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684.º/3 e 685.º-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
A recorrida não contra-alegou.
A nosso ver o recurso não merece provimento.
Com resulta dos autos a execução fiscal a que a presente oposição se reporta tem, somente, em vista a cobrança coerciva de coimas fiscais e encargos inerentes ao respectivo processo de contra-ordenação.
Sustenta a recorrente que alegou factos susceptíveis de integração no artigo 204.º/l/ b) e i) do CPPT.
A nosso ver tal afirmação não corresponde à realidade.
Na verdade, como deflui do texto da PI da autoria da recorrente, em defesa da sua tese sustenta, em síntese, que não estava ao seu alcance a possibilidade de cumprir com a obrigação legal de entrega de qualquer quantia ao Estado, uma vez que não tinha conhecimento de que sobre si impendia essa obrigação.
Invoca, ainda a recorrente que determinado contribuinte havia emitido as facturas em que a mesma figurava como devedora, não podendo por isso ser responsabilizada.
Mais adianta que, embora figure no título executivo na qualidade de executada, a ausência de conhecimento quanto à existência das facturas exime-a de responsabilidade quanto à obrigação de entrega de IRS, não tendo agido com culpa, ou sequer negligentemente.
Ora, do que vem invocado pela recorrente, a nosso ver, resulta, com clareza, que o que põe em causa é a legalidade concreta da dívida exequenda (coimas fiscais e inerentes encargos), por, alegadamente, não ter tido conhecimento das facturas de que resulta a obrigação legal de fazer a retenção de IRS, sem que tenha agido com culpa, lato sensu.
Trata-se de matéria que contende com a legalidade concreta da dívida exequenda e não com a ilegitimidade da recorrente nos termos do estatuído no artigo 204.º/1/ b) do CPPT nem com quaisquer fundamentos não referidos no citado artigo, a provar apenas por documento, desde que não envolvam a apreciação da legalidade da liquidação (que no caso nem existe no sentido estrito do termo) da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, nos termos da aliena i) do mesmo artigo.
Ora, toda argumentação que a recorrente utiliza em sede da presente oposição judicial, deveria ter sido usada no respectivo processo de contra-ordenação, nomeadamente, recorrendo da decisão de aplicação da coima, nos termos do disposto no artigo 80.º do RGIT.
E manifesto que não existe qualquer possibilidade de convolação dos autos em recurso de decisão de aplicação de coima.
Bem andou, pois, a sentença recorrida ao rejeitar liminarmente a oposição, nos termos do disposto no artigo 209.º/1/b) do CPPT.
Termos em que deve negar-se provimento ao recurso, e manter-se a decisão recorrida na ordem jurídica

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.


FUNDAMENTOS
2.1. A decisão recorrida é do teor seguinte:
«A…….., com os demais sinais nos autos, veio deduzir Oposição à Execução Fiscal n.º 3557.2012.01128159, que corre termos no Serviço de Finanças de Sintra – 3.
O Oponente assenta a sua pretensão na ilegalidade da dívida em cobrança no processo de execução fiscal, invocando, para tanto, que não estava ao alcance da Executada a possibilidade de cumprir com a obrigação legal de entrega de qualquer quantia ao Estado, pois a mesma não tinha conhecimento de que sobre si impendia essa obrigação. Mais afirma que desconhecia que determinado contribuinte havia emitido as facturas em que a mesma figurava como devedora, não podendo por isso ser responsabilizada pela não entrega de IRS dentro do prazo. E que, embora figure no título executivo na qualidade de executada, a ausência de conhecimento quanto à existência das facturas exime-a de responsabilidade quanto à obrigação de entrega de IRS, não tendo agido com culpa, ou sequer negligentemente.
Cumpre apreciar liminarmente.
No artigo 204.º do C.P.P.T. estabelecem-se, taxativamente, os fundamentos de oposição à execução fiscal, como resulta do seu texto em que se refere que «a oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos».
A legalidade da liquidação da dívida exequenda apenas pode ser apreciada em oposição à execução fiscal nas situações enquadráveis nas seguintes disposições:
- na alínea a) do n.º 1 do art. 204.º, se se tratar de uma ilegalidade abstracta, afectando a própria norma em que se baseia a liquidação;
- na alínea g), onde se prevê a duplicação de colecta, que se pode verificar quando estiver pago ao credor tributário o tributo que se pretende cobrar;
- na alínea h), quando se tratar de situação em que a lei não assegure meio de impugnação contenciosa do acto de liquidação.
Ora, a factualidade que o Oponente invoca na p.i. consubstancia matéria que diz respeito à legalidade do acto de liquidação ou do acto que fixou a coima, o que significa que não pode ser apreciada em sede de oposição à execução fiscal, sendo o meio próprio para tal a impugnação judicial do acto de liquidação ou o recurso de aplicação de coima.
Não sendo invocado qualquer vício de norma em que se tenha baseado a liquidação, nem que a lei não assegure a possibilidade de impugnação judicial do acto de liquidação subjacente à presente execução, não é possível, em sede de oposição, apreciar a legalidade do acto de liquidação do tributo em causa.
Ora, atenta a previsão contida na alínea b) do nº1 do artigo 209º do CPPT, forçoso é de concluir pelo indeferimento liminar da Oposição que originou os presentes autos.
Decisão
Termos em que, atento o supra exposto, se rejeita liminarmente a presente oposição à execução fiscal, por força do preceituado na alínea b) do n.º1 do artigo 209º do CPPT

2.2. Atentando na decisão recorrida e no teor das alegações e conclusões do recurso, resulta que a questão a decidir se prende apenas com a de saber se aquela decisão enferma de erro de julgamento por ter indeferido liminarmente a petição inicial da presente oposição.
Vejamos.

3.1. É sabido que a oposição à execução fiscal é permitida com os fundamentos previstos no art. 204.º do CPPT, devendo ser rejeitada liminarmente caso não tendo sido invocado nenhum desses fundamentos (al. b) do n.º 1 do art. 209.º do mesmo código).
No caso, como se viu, a decisão recorrida rejeitou liminarmente a oposição, no entendimento de que os fundamentos invocados pela executada/recorrente ─ (i) que não estava ao seu alcance a possibilidade de cumprir a obrigação legal de entrega de qualquer quantia ao Estado, pois não tinha conhecimento de que sobre si impendia essa obrigação; (ii) que desconhecia que determinado contribuinte havia emitido as facturas em que ela (executada) figurava como devedora, não podendo por isso ser responsabilizada pela não entrega de IRS dentro do prazo; (iii) que, embora figure no título executivo como executada, a ausência de conhecimento quanto à existência das facturas a exime de responsabilidade quanto à obrigação de entrega de IRS, não tendo agido com culpa, ou sequer negligentemente ─ não se inserem em nenhum dos fundamentos de oposição taxativamente previstos no art. 204.º n.º 1 do CPPT, sendo que a factualidade invocada na PI consubstancia matéria que diz respeito à legalidade do acto de liquidação ou do acto que fixou a coima, não podendo ser apreciada em sede de oposição à execução fiscal, pois que o meio próprio para tal é o recurso da decisão de aplicação da coima.
Discordando, a recorrente alega que a decisão enferma de erro de julgamento, já que, de acordo com o alegado na PI, importa analisar duas questões:
a) O desconhecimento da dívida exequenda, sem que dela tivesse anteriormente sido notificada, por qualquer via (tomada de conhecimento apenas no momento da citação emitida no âmbito processo de execução fiscal);
b) A ilegitimidade da Executada, decorrente do desconhecimento da dívida, bem como da não notificação da liquidação.

3.2. Afigura-se-nos, porém, desde logo, que a recorrente interpreta deficientemente a decisão recorrida.
Na verdade, a decisão não analisou - mas também não tinha que o fazer - a agora enunciada questão do «desconhecimento da dívida exequenda, sem que dela tivesse anteriormente sido notificada, por qualquer via (tomada de conhecimento apenas no momento da citação emitida no âmbito processo de execução fiscal)».
É que, como claramente resultada Petição Inicial da oposição, em lado algum a oponente/recorrente suscitou tal questão ou, sequer, a da falta de notificação da decisão de aplicação das coimas ou da notificação para pagamento destas e dos encargos contados no processo de contra-ordenação.
O que se alega na PI é que:
- relativamente à certidão de dívida 2012/5006687, a oponente desconhecia as facturas que o sr. B………. (contribuinte fiscal ………) emitiu em seu nome e, por isso, não questionando que tais facturas deveriam ter sido emitidas por ter havido a prestação de um serviço, não pode, contudo, ser responsabilizada pois que o emitente é que tinha obrigação de lhas entregar nas respectivas datas de emissão, sendo certo que só depois de 20/1/2012 é que as facturas lhe foram entregues. Portanto, a entrega e consequentemente conhecimento da existência de facturas é posterior obrigação legal que resulta da entrega do IRS retido e, por isso, não podia a executada ter cumprido a obrigação legal de entrega de qualquer quantia ao Estado, pois não tinha conhecimento de que sobre si impendia essa obrigação, dado que não sabia que o aquele citado contribuinte havia emitido facturas com data de 31/12/2011.
- relativamente à certidão 2012/5006688: trata-se de certidão subjacente à emissão de uma factura (n.º 8) de Agosto de 2011, emitida, igualmente, pelo mencionado contribuinte e em relação à qual ele também nunca diligenciou pela normal entrega. As prestações de serviços entre as partes existiram em menor quantidade do que as facturas ora questionadas e só quando começaram os desentendimentos nos serviços prestados é que estas emissões ocorreram. Sendo que, relativamente a esta factura de Agosto/2011, a executada só dela teve conhecimento em Abril/2012 e só neste mês foi notificada relativamente à existência de uma divergência quanto aos valores declarados de IRS pelo dito contribuinte e os pagos por si.
Ou seja, o que realmente a oponente alegou foi, tão só, que até ter terminado o prazo legal de entrega do IRS retido subjacente às ditas facturas desconhecia que o emitente destas as tivesse emitido, e, por isso, não agiu com dolo ou com sequer com culpa negligente, pois desconhecia, sem obrigação de conhecer, que aquele havia emitido facturas em que ela (oponente) figurava como devedora, não podendo por isso ser responsabilizada pela não entrega do IRS dentro do prazo, devendo, portanto, concluir-se pela sua ilegitimidade visto que embora figure no título como executada a ausência de conhecimento quanto à existência das facturas, exime-a de responsabilidade quanto à obrigação de entrega de IRS (retenção).
E o sentido desta alegação é, aliás, confirmado nas Conclusões V a XVI do recurso.
A recorrente carece, todavia, de razão legal.
É que, uma vez que, como se disse, a presente execução fiscal tem em vista, somente, a cobrança coerciva de dívidas emergentes de coimas fiscais e encargos inerentes ao respectivo processo de contra-ordenação (e não, como parece entender a recorrente, qualquer outra quantia, nomeadamente IRS retido na fonte por reporte às ditas facturas – este terá sido entregue, embora para além do prazo legal, e daí a instauração do processo de contra-ordenação), só pode, portanto, concluir-se que não há na Petição Inicial, qualquer invocação de «desconhecimento da dívida exequenda», ou de «desconhecimento ou não notificação da liquidação» ou de que «apenas com a citação para a execução fiscal a executada tenha tido conhecimento da liquidação».
É certo que a recorrente continua a sustentar que alegou factos (desconhecimento da dívida exequenda até ao momento da citação e ausência de anterior notificação em sede de liquidação) que são subsumíveis aos fundamentos de oposição previstos nas als. b) e i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
Mas, como se disse, estando em execução a dívida emergente de coimas aplicadas no processo de contra-ordenação, bem como dos respectivos encargos, então, por um lado, a dívida exequenda não é assimilável às quantias de imposto (IRS) retidas e entregues para além do prazo legal e, por outro lado, a apreciação da factualidade alegada (não ter a oponente tido conhecimento das facturas de que resultou a obrigação legal de retenção e entrega do IRS, sem que tenha agido com culpa) sempre implicará apreciação da legalidade concreta da dívida exequenda, não se inserindo no âmbito da pretendida invocada ilegitimidade (veja-se que a oponente figura nos títulos executivos e não estamos perante a execução de tributos cuja incidência decorra da posse de quaisquer bens), nem em qualquer fundamento susceptível de ser enquadrado no âmbito da al. i) do mesmo normativo (fundamento não enquadrável nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título).
Como bem salienta o MP, a factualidade e argumentação apresentadas em sede da presente oposição judicial deveriam, oportunamente, ter sido invocadas no respectivo processo de contra-ordenação e, se fosse caso disso, em eventual recurso da decisão de aplicação da coima, nos termos do disposto no art. 80.º do RGIT, sendo que os fundamentos da condenação, transitada, em processo de contra-ordenação fiscal já não são sindicáveis em sede de oposição.
Sendo, também, manifesto que não existe agora qualquer possibilidade de convolação dos autos em recurso de decisão de aplicação de coima.
E assim sendo, há que concluir que, não tendo sido invocado nenhum dos fundamentos de oposição admitidos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, se impunha a rejeição liminar da oposição (al. b) do n.º 1 do art. 209.º do mesmo código), como bem se decidiu no despacho recorrido.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em conferência em, negando provimento ao recurso, confirmar o despacho recorrido.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 19 de Novembro de 2014. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.