Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01772/18.1BEBRG
Data do Acordão:04/07/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:OPOSIÇÃO
TAXA
PORTAGEM
PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
Sumário:I - Constituem créditos tributários, para os efeitos do disposto no artigo 30.º da Lei Geral Tributária, os créditos provenientes de taxas de portagem, respectivos juros de mora e custos administrativos.
II - O plano aprovado no processo especial de revitalização instituído pelos artigos 17.º-A a 17.º-1, aditados ao CIRE pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, não pode obstar à instauração da execução fiscal para cobrança desses créditos, a não ser nos casos e dentro dos pressupostos previstos pela própria lei fiscal;
Nº Convencional:JSTA000P29229
Nº do Documento:SA22022040701772/18
Data de Entrada:11/25/2020
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.........., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou totalmente procedente a oposição à execução fiscal n.º 2330201801026720 e apensos, que no Serviço de Finanças de Valença correm termos contra A…………., S.A., contribuinte fiscal n.º ………., com sede no ……., 4930-… Gandra, em Valença, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de «taxas de portagem e custos administrativos», referentes aos períodos de 2012/07, 2013/11 e todos os meses de 2015, no montante global de € 27.727,77 e acrescidos.

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…)

I. O presente recurso tem por objeto a douta sentença recorrida, proferida no processo supra referenciado, a qual julgou a Oposição totalmente procedente e, em consequência, determinou a extinção do processo de execução fiscal nº 2330201801026720 e apensos, instaurado contra a Recorrida “pelo Serviço de Finanças de Valença para cobrança coerciva da quantia exequenda de € 27.727, proveniente da falta de pagamento de taxas de portagem e custos administrativos às sociedades concessionárias “Ascendi O&M, SA”, “Ascendi Pinhal Interior Estradas do Pinhal Interior, SA” e “ ViaLivre, SA”, dos períodos de 2012/07, 2013/11, e todos os meses dos anos 2015”.

II. A Recorrente não se conforma com a douta sentença em causa, na medida em que entende que a mesma padece de erro de julgamento, em matéria de direito, ao ter concluído, em suma, que os créditos exequendos em causa nos autos, provenientes de taxas de portagem e custos administrativos associados, no montante global de € 27.727,77, não assumem a natureza de créditos tributários e, em consequência, ao entender que não poderia o Serviço de Finanças de Valença ter instaurado os PEF em causa nos presentes autos à luz do disposto no artigo 17º- E, nº 1 do CIRE, aditado pela Lei nº 16/2012, de 20 de abril. Vejamos:

III. Tal como decorre da douta sentença aqui em causa, o M. mo Juiz do Tribunal “a quo” entendeu que os créditos aqui em causa “Sucede que, a posterior decisão de homologação do plano de revitalização tem como consequência a extinção da execução, uma vez que no plano de revitalização não se encontra prevista a continuação do processo executivo e nem se aplicam, in casu, as condições previstas no artigo 180.º do CPPT, uma vez que os créditos em causa não têm natureza de créditos tributários.”

IV. Não obstante o entendimento vertido na douta sentença o certo é que, ao que se nos afigura, a maioria da Jurisprudência e da Doutrina existente sobre esta matéria entende que as taxas de portagem e respetivas custas têm natureza tributária

V. Na verdade, importará ter presente que as taxas de portagem são tributos da espécie taxas, porquanto constituem a contrapartida pela utilização de um bem público, tal como se prevê no artigo 4º, nº 2 da LGT. – (cfr. RIBEIRO, Teixeira – Noção Jurídica de Taxa, RLJ – Ano 117 – p. 290).

VI. No mesmo sentido, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2004.10.14, processo 04B2885, disponível em www.dgsi.pt, cujo sumário reza o seguinte:

“I - Exercendo actividade pública de que a Administração é titular, as empresas privadas concessionárias de bens públicos substituem a Administração nas relações com o público e actuam como se fossem entidades públicas.

II - O pagamento de uma - taxa de portagem "pelos utentes da auto-estrada representa a cobrança de uma receita coactiva, de um financiamento público, e não a satisfação, por parte do utilizador dessa via, de uma obrigação assumida no âmbito de um contrato sinalagmático, cuja contraprestação do Estado, transferida, por concessão, para a Brisa, seria a possibilidade de circulação na via referida, com condições de segurança e níveis de fiscalização mais elevados em comparação com as demais estradas.” .

VII. No mesmo sentido, veja-se ainda o douto acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 640/95, disponível em www.pgdlisboa.pt,.

VIII. Por sua vez, o Professor José Casalta Nabais, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, pronunciou-se, igualmente, sobe esta questão em parecer jurídico elaborado em novembro de 2017, a solicitação da Associação Portuguesa das Sociedades Concessionárias de Auto-Estradas ou Pontes com Portagens (“APCAP”), remetido por esta entidade para a Direção dos Serviços de Justiça Tributária, da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a coberto do ofício com a referência nº 2018/APC.010, de 2018.02.20, no qual refere, nomeadamente:

“Em suma, a taxa de portagem continua a consubstanciar-se numa contraprestação à prestação estadual constituída pela utilização privativa do domínio público do Estado, nada se alterando, sob o ponto de vista da substância das coisas, pela circunstância de essa utilização ocorrer no quadro de uma concessão de exploração desse domínio público.”

IX. No mesmo sentido, veja-se ainda “Algumas Considerações sobre o Processo de Cobrança Coerciva da Taxa de Portagem”, Dissertação de Mestrado em Direito Fiscal de Sílvia Rosas Dantas (Orientador: Professor Doutor Rui Duarte Morais), Universidade Católica Portuguesa, outubro de 2015, disponível em https://repositorio.ucp.pt,. na qual se conclui, nomeadamente, a páginas 17, “que apesar da concessionária, ser habitualmente uma sociedade anónima, a lei atribui-lhe, por força do contrato de concessão, prerrogativas e deveres de autoridade típicos ao Estado, o que significa que a atividade que ela explora não perde a sua natureza pública administrativa” e “Deste modo, concluo que o valor da portagem cobrado ao utente pela utilização da infraestrutura autoestrada, objeto de concessão, é uma verdadeira taxa, devendo obedecer aos princípios da proporcionalidade e da equivalência.”

X. Assim, aqui chegados, ao invés do que foi decidido na douta sentença aqui posta em crise, impera concluir, que os créditos exequendos em causa nos autos, provenientes de taxas de portagem e custos administrativos associados, no montante global de € 27.727,77, (cfr. pontos 5 e 6. do probatório) assumem, inequivocamente, a natureza de créditos tributários.

XI. Impondo-se seguidamente averiguar, à luz do entendimento antes referido relativamente à natureza tributária dos créditos exequendos, se poderia ou não o Serviço de Finanças de Valença ter instaurado os PEF em causa nos presentes autos, tendo em vista, nomeadamente, o disposto no artigo 17º- E, nº 1 do CIRE, aditado pela Lei nº 16/2012, de 20 de abril, em confronto, nomeadamente, com o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários plasmado no nº 2 do artigo 30º da LGT, e com disposto no nº 3 do mesmo artigo 30º da LGT, aditado pela Lei nº 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011).

XII. Ora, a nosso ver, a questão antes acabada de enunciar encontra resposta inequívoca no (a nosso ver, paradigmático) acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2015.05.27, proferido no processo nº 0473/15, disponível para consulta em www.dgsi.pt.

XIII. Assim, atendendo à vasta e acertada Jurisprudência e Doutrina invocada no douto acórdão do Supremo Tribunal Administrativo acima reproduzido em parte, e, em especial, atendendo ao princípio da indisponibilidade dos créditos tributários plasmado no nº 2 do artigo 30º da LGT, e atendendo, ainda, ao disposto no nº 3 do artigo 30º da LGT, aditado pela Lei nº 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), afigura-se-nos ser de concluir que a decisão do Serviço de Finanças de Valença de instaurar, contra a Recorrida, o processo de execução fiscal melhor identificado no ponto 6. do probatório, para cobrança de dívidas referentes a taxas de portagem e respetivas custas, não merece, pese embora a existência do PER a que aludem os pontos 1. 2. 3 e 4 do probatório, e pese embora a ocorrência dos factos aí melhor referidos, qualquer censura no plano jurídico.

XIV. Deveria, pois, a nosso ver, a oposição à execução fiscal aqui em crise ter sido julgada totalmente improcedente, por não provada, com todas as legais consequências, impondo-se, em sequência, em sede do presente recurso, determinar-se a revogação da douta sentença ora em crise, substituindo-a por outra que declare a oposição à execução fiscal totalmente improcedente, por não provada, com todas as legais consequências – o que, respeitosamente, se requer a V. Exas.».

Pediu fosse o presente recurso julgado procedente e, em consequência, fosse anulada a douta decisão em apreço, com todas as legais consequências.

Requereu a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

O Recorrido apresentou contra alegações e concluiu nos seguintes termos:

«Ao julgar procedente a oposição extinguindo, na sequência, a execução fiscal nº 2330201801026720 e apensos, a douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo” fez uma certíssima e correta interpretação e aplicação dos factos, da lei e do direito, não merecendo qualquer censura ou reparo.».

O recurso foi admitido com subida imediata nos autos e com efeito devolutivo.

Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

A Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta lavrou douto parecer no sentido da procedência do recurso.

Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir.


◇◇◇

2. Na sentença recorrida foram julgados provados os seguintes factos:

1) No Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo - Valença - Instância Local - Secção de Competência Genérica (2), correu termos o Processo Especial de Revitalização (PER) da Oponente, sob o n.º 311/16.3T8VLN, no âmbito do qual foi proferido, em 06/09/2016, despacho a declarar iniciado o processo especial de revitalização e a nomear administrador judicial provisório – (cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido).

2) Por correio registado datado de 12/09/2016, foi dado conhecimento às sociedades “Ascendi” e “ViaLivre”, da apresentação da Oponente a PER e para, querendo, participarem nas negociações do PER – (cfr. documentos n.º 3, 6 e 7 juntos com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido).

3) No PER mencionado no ponto 1), foram reconhecidos créditos anteriores ao PER, à sociedade “Ascendi O&M, SA”, no montante de € 100.847,95, e à sociedade “ViaLivre, SA”, no montante de € 75.970,77 – (cfr. documento de fls. 371 a 383 do SITAF e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido).

4) Em 02/02/2017 foi proferida sentença de homologação do plano de revitalização da Oponente no processo indicado no ponto 1), transitado em julgado em 11/07/2017, na sequência de Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães – (cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido).

5) Em 5/07/2018, foram emitidas as certidões de dívida n.º 2018/1509836, 2018/7097001, 2018/1509840, 2018/1509841, 2018/1509842, 2018/1509843, 2018/1509844, 2018/1509826, 2018/1509828, 2018/7097000, 2018/1509823, 2018/1509824, 2018/1509812, 2018/7096997, 2018/1509814, 2018/1509815, 2018/1509816, 2018/7096998, 2018/1509817, 2018/1509818, 2018/1509819, 2018/1509820, 2018/7096999, 2018/1509798, 2018/1509799, 2018/1509800, 2018/1509801, 2018/7096994, 2018/1509806, 2018/1509807, 2018/1509808, 2018/1509809, 2018/7096996, 2018/1509802, 2018/1509803, 2018/1509804, 2018/1509805, 2018/7096995, 2018/1509845, 2018/1509846, 2018/1509847, 2018/1509848, 2018/1509849, 2018/1509850, 2018/1509851 e 2018/1509852, em 10/07/2018, as certidões de dívida n.º 2018/1512655 e 2018/9030647, pelas sociedades “Ascendi O&M, SA”, “Ascendi Pinhal Interior Estradas do Pinhal Interior, SA” e “ViaLivre, SA” provenientes do não pagamento de taxas de portagem e de custos administrativos, respeitantes aos períodos de 2012/07, 2013/11, e todos os meses do ano de 2015, no montante exequendo total de € 27.727,77 – (cfr. fls. 60 a 237, 266 a 363 do SITAF e cujo teor aqui se dão por inteiramente reproduzidas).

6) As certidões de dívida referidas no ponto anterior, deram origem, respetivamente, aos processos de execução fiscal n.º 2330201801026720 (eleito o processo principal), n.º 2330201801026780, n.º 2330201801026798, n.º 2330201801026801, n.º 2330201801026810, n.º 2330201801026828, n.º 2330201801026836, n.º 2330201801026844, n.º 2330201801026852, n.º 2330201801026860, n.º 2330201801026879, n.º 2330201801026887, n.º 2330201801026895, n.º 2330201801026909, n.º 2330201801026917, n.º 2330201801026925, n.º 2330201801026933, n.º 2330201801026941, n.º 2330201801026950, n.º 2330201801026968, n.º 2330201801026976, n.º 2330201801026984, n.º 2330201801026992, n.º 2330201801027000, n.º 2330201801027018, n.º 2330201801027026, n.º 2330201801027034, n.º 2330201801027042, n.º 2330201801027050, n.º 2330201801027069, n.º 2330201801027077, n.º 2330201801027085, n.º 2330201801027093, n.º 2330201801027107, n.º 2330201801027115, n.º 2330201801027123, n.º 2330201801027131, n.º 2330201801027140, n.º 2330201801027492, n.º 2330201801027506, n.º 2330201801027514, n.º 2330201801027522, n.º 2330201801027530, n.º 2330201801027549, n.º 2330201801027557, n.º 2330201801027565, n.º 2330201801028405 e n.º 2330201801028413, instaurados pelo Serviço de Finanças de Valença – (cfr. fls. 60 a 237, 266 a 363 do SITAF e cujo teor aqui se dão por inteiramente reproduzidas).


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3. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que, tendo concluído que a decisão de homologação do plano de revitalização obsta à instauração de execuções fiscais por dívidas anteriores, referentes a taxas de portagem, juros e custos administrativos, julgou ilegais as respectivas pretensões executivas por violarem o disposto no artigo 17.º-E, n.º 1, do Código de Insolvência e de Recuperação de Empresas (doravante “CIRE”) e, consequentemente, julgou procedente a oposição.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente, por entender que a douta sentença padece de erro de direito ao ter entendido que os créditos exequendos não têm natureza tributária e, consequentemente, ao ter concluído que a instauração das execuções fiscais viola o referido dispositivo legal.

No entendimento da Recorrente, as taxas de portagens e as respectivas custas são verdadeiros tributos e assumem, por isso, a natureza de créditos tributários. E o disposto no artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE não obsta à instauração de execuções fiscais para cobrança coerciva destes créditos, atento o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, consagrado no artigo 30.º da Lei Geral Tributária.

A questão fundamental a decidir é, por isso a de saber se o tribunal de primeira instância incorreu em erro na qualificação daquelas dívidas como dívidas sem natureza tributária.

Ora o Supremo Tribunal Administrativo já teve oportunidade de se pronunciar quanto à questão de saber se as taxas de portagem são tributos (ver os acórdãos de 30 de abril de 2019, de 30 de junho de 2020 e de 14 de outubro de 2020, tirados nos processos 01021/12.6BEAVR, 01092/19.4BEPNF e 0412/20.3BEPNF, respetivamente).

Todos estes acórdãos se pronunciaram no sentido de que as taxas de portagem têm natureza tributária, remetendo para a jurisprudência firmada no Acórdão do Tribunal Constitucional de 15 de novembro de 1995 (tirado em Plenário no processo n.º 286/94 – acórdão n.º 640/95).

Quanto aos juros de mora, devidos pelo atraso no seu pagamento, o terceiro acórdão citado convocou o entendimento firmado no acórdão do Pleno do mesmo Tribunal, de 13 de abril de 2011, tirado no processo n.º 0361/10, e segundo o qual integram a dívida do tributo correspondente (e, por conseguinte, partilham a sua natureza).

E quanto aos custos administrativos (que são fixados por portaria do membro do Governo responsável pelo sector das infraestruturas rodoviárias – artigo 5.º, n.º 4, da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho), também foi entendido que integram ainda o conceito de taxa, por constituírem a contrapartida do serviço público correspondente, fixada autoritariamente pelo Estado.

Sendo esta uma jurisprudência uniforme e reiterada deste Tribunal, não se justifica revisitar o tema, até porque a jurisprudência da outra jurisdição em que o Mm.º Juiz a quo se apoia é mais antiga e foi tomada em consideração na análise efetuada nos arestos supra citados.

Sempre se dirá que a jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal Justiça, ponderando expressamente o entendimento firmado nessa jurisprudência, concluiu também no sentido de que se devem considerar abrangidos pelo princípio da indisponibilidade tributária as taxas de portagem, respectivos juros e custos administrativos (acórdão de 10 de maio de 2021, Processo n.º 243/20.0T8FND.C1.S1).

E daqui decorre, desde já, que a douta sentença recorrida não pode ser confirmada.

Porque que, apesar de o artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE nada prever a este propósito, a homologação do plano de revitalização não obsta à instauração de execuções fiscais para cobrança de dívidas anteriores, quando os créditos exequendos tenham natureza tributária.

Porque já existe uma disposição tributária que prevê que os créditos tributários são indisponíveis – artigo 30.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária – e uma das consequências da sua indisponibilidade é a irrelevância da vontade dos credores para obstar à sua cobrança.

E porque o comando legal contido nesta disposição prevalece sobre o de qualquer outra disposição especial – n.º 3 do referido artigo 30.º.

Não podendo, por isso, o processo especial de revitalização instituído pelos artigos 17.º-A a 17.º-1, aditados ao CIRE pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, obstar ao prosseguimento da execução fiscal para cobrança desses créditos, a não ser nos casos e dentro dos pressupostos previstos pela própria lei fiscal.

O que – acrescentemos agora – também tem sido decidido reiteradamente Supremo Tribunal Administrativo (ver, por todos, o acórdão de 25 de março de 2015, no processo n.º 0278/15).

Em sentido convergente se decidiu também no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Setembro de 2020, em processo que correu termos entre as mesmas partes (Processo n.º 02060/17.6BEBRG).

Pelo que o recurso merece provimento.


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4. Conclusões

I. Constituem créditos tributários, para os efeitos do disposto no artigo 30.º da Lei Geral Tributária, os créditos provenientes de taxas de portagem, respectivos juros de mora e custos administrativos.

II. O plano aprovado no processo especial de revitalização instituído pelos artigos 17.º-A a 17.º-1, aditados ao CIRE pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, não pode obstar à instauração da execução fiscal para cobrança desses créditos, a não ser nos casos e dentro dos pressupostos previstos pela própria lei fiscal;


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5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para conhecimento das demais questões suscitadas e se nada mais a tal obstar.

Custas pela Recorrida

Lisboa, 7 de abril de 2022. - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.