Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01158/12
Data do Acordão:09/18/2013
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:DULCE NETO
Descritores:DECISÃO ARBITRAL
ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA
RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
ACÓRDÃO FUNDAMENTO
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário:I – O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral, previsto no art. 25º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, a que é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152º do CPTA, depende da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros de natureza substancial.
II – São requisitos formais essenciais: (i) a interposição do recurso no prazo de 30 dias contado da notificação da decisão arbitral; (ii) a invocação e identificação de acórdão proferido pelo TCA ou pelo STA que se encontre em oposição com a decisão arbitral recorrida (acórdão fundamento); o trânsito em julgado de acórdão fundamento.
III – O conceito de trânsito em julgado é o que consta do art. 677º do CPC (art. 628º do novo CPC).
IV – A falta de trânsito em julgado do acórdão fundamento torna inadmissível o recurso.
Nº Convencional:JSTA00068360
Nº do Documento:SAP2013091801158
Data de Entrada:10/31/2012
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:UNIFORM JURISPRUDÊNCIA
Objecto:DECISÃO ARBITRAL PROC39/12 - TCAAD / AC TCA SUL PROC05073/11
Decisão:NÃO ADMITIR RECURSO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - UNIFORM JURISPRUDÊNCIA
Legislação Nacional:RJAT ART25 ART27 ART28
CPTA02 ART152
CPC96 ART276 N1 C ART279 N1 ART763 N2 ART677 ART668 ART669
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


1. A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA dirigiu ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em 30 de Outubro de 2012, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 25º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária), recurso da decisão arbitral proferida no processo nº 39/2012-T CAAD instaurado na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado pela sociedade A………………….., S.A., invocando para o efeito a oposição dessa decisão arbitral de 24 de Setembro de 2012 com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em de 25 de Setembro do mesmo ano, no processo n.º 05073/11, afirmando que este acórdão fundamento transitara já em julgado.

A Recorrente apresentou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo:

A- Vem o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, interposto da decisão arbitral proferida no processo nº 39/2012-T CAAD, que correu termos no Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, na parte que aqui nos interessa, de reconhecimento do carácter de utilidade social, para efeitos do disposto no nº 2 do então artigo 40º do CIRC, dos custos incorridos com o pagamento dos prémios de seguro de doença, de que são beneficiários os familiares dos trabalhadores.

B- Com efeito, a decisão arbitral recorrida colide frontalmente com o Acórdão, já transitado em julgado, do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), de 25/09/2012, no âmbito do processo nº 05073/11 (Acórdão fundamento), encontrando-se irremediavelmente inquinado do ponto de vista jurídico, por errada interpretação do nº 2 do então artigo 40º do CIRC.

C- Na decisão recorrida, o Tribunal Arbitral sufragou a interpretação de que o enquadramento jurídico do nº 2 do art. 40º do CIRC abrange necessariamente, não só os trabalhadores no ativo, como, no que ao caso importa, os seus familiares.

D- Conclui-se na decisão recorrida que podem ser considerados como custos dedutíveis os gastos suportados com o pagamento de prémios de apólice de seguro de doença de que são beneficiários os familiares dos trabalhadores. Assim, tal seguro é enquadrável no conceito de outras realizações de utilidade social e como tal aceite como custo dedutível.

E- Sobre esta questão pronuncia-se o Acórdão fundamento em sentido totalmente oposto, ao concluir, no caso, que não poderão ser considerados custos ou perdas do exercício os encargos suportados por seguros de saúde em benefício dos familiares dos trabalhadores, reformados ou dos seus viúvos, dado que tais gastos não se enquadram na previsão do nº 2 do (então) artigo 38º do CIRC na redação em vigor em 2002 (norma que somente se refere aos trabalhadores da empresa), por remissão do nº 4 do artigo 23º. Pelo que “o legislador, na previsão do art. 38º nº 2 do C.I.R.C., unicamente admitia como custos ou perdas do exercício os prémios dos contratos de seguros de doença e acidentes pessoais que tenham sido constituídos a favor dos trabalhadores. Daí a utilização do advérbio “exclusivamente” na parte final do segmento do mesmo preceito ...”.

F- Demonstrada está uma evidente contradição entra a decisão recorrida e o Acórdão fundamento, quanto a interpretação e aplicação do nº 2 do então artigo 40º do CIRC, isto é, uma manifesta contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e, consequentemente, anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo Acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida (nº 6 do artigo 152º do CPTA).

G- A infração a que se refere o nº 2 do artigo 152º do CPTA, consiste num gritante erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral adotou uma interpretação do nº 2 do artigo 40º do CIRC em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente.

H- Tal interpretação encontra sustentação jurídica, no entender do Sr. Árbitro, no facto de assentar numa consideração de base, segundo a qual o n.º 2 do artigo 40º deve ser dividido em 3 segmentos: 1º “são igualmente considerados custos ou perdas do exercício até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários, respeitantes ao exercício”, 2.º “contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais”, 3º “contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, benefícios de saúde pós-emprego, invalidez ou sobrevivência a favor dos trabalhadores da empresa”.

I- E daqui o Tribunal Arbitral conclui, tal como a Recorrida havia apresentado, que o 1º segmento (estatuição) é aplicável às situações previstas no 2º e 3º segmentos (previsões).

J- Decidindo que os custos com seguros de doença de familiares de trabalhadores se subsumem no nº 2 do artigo 40º do CIRC.

K- Todavia, ficou devidamente demonstrado que a linha de raciocínio adoptada pelo Sr. Árbitro do Tribunal Arbitral, é ilegal por violação expressa do disposto no nº 2 do artigo 40º do CIRC.

L- Com efeito, o seguro de doença contratado pela recorrida em beneficio dos familiares dos trabalhadores no ativo, sai fora do âmbito da referida norma. Tal se constata pela simples leitura do preceito, respeitando as regras básicas da interpretação dos textos legais.

M- Assim sendo, o enquadramento do referido custo no nº 2 do artigo 40º (atual artigo 43º do CIRC), só a erro de julgamento pode ser imputado.

Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.

1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações para sustentar a ausência de verificação dos requisitos de admissibilidade do recurso e, a título subsidiário, a correcção da decisão recorrida, rematando com o seguinte quadro conclusivo:
DA AUSÊNCIA DE VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DESTE RECURSO POR ALEGADA OPOSIÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL COM ACÓRDÃO DO TCAS
A. Em primeiro lugar o acórdão fundamento (do TCAS) ainda não transitou em julgado.

B. Em segundo lugar, aquando da sua notificação (condição de eficácia da mesma) a decisão arbitral recorrida de nenhuma capitis diminutio padecia que se consubstanciasse em constituir oposição a um acórdão de um Tribunal superior, e menos ainda de um acórdão de Tribunal superior transitado em julgado.

C. Não preenchia, pois, por definição, a previsão legal “(...) esteja em oposição com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo” (cfr. artigo 25º do RJAT). A decisão arbitral não estava em oposição com o alegado acórdão fundamento, pela razão simples de que este não existia antes dela.

D. Acresce que, aquando do trânsito em julgado que ocorreria na ausência deste recurso cuja admissibilidade se discute, a decisão arbitral recorrida também de nenhuma capitis diminutio padeceria que se consubstanciasse em constituir oposição a um acórdão de um Tribunal superior transitado em julgado.

E. Pelo que se deve entender não haver oposição com acórdão de Tribunal superior no âmbito daquela que deve ser tida pela janela temporalmente relevante: estado do tratamento da questão (em moldes irreversíveis, i.e., com trânsito em julgado) nos Tribunais superiores, aquando da notificação (por sua vez condição de eficácia) da decisão recorrida ou, no limite, até ao termo do prazo cujo decurso a fará transitar em julgado. A fronteira temporal, que (alguma) sempre terá de existir, não pode, crê-se, ir mais além do que isto.

F. Em terceiro lugar, não há entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, identidade substancial das situações fácticas: na primeira está em causa a dedutibilidade fiscal de encargos suportados pela empresa com seguros de doença na medida em que abrangiam cônjuges e descendentes dos trabalhadores da empresa.

G. Diferentemente, no alegado acórdão fundamento o que está em causa são (exclusivamente) encargos suportados com seguros de doença na medida em que abrangiam ex-trabalhadores (reformados) da empresa.

SEM CONCEDER, POR CAUTELA DE PATROCÍNIO, A TÍTULO SUBSIDIÁRIO: DO BEM FUNDADO DA DECISÃO ARBITRAL RECORRIDA

H. Está em causa uma obrigação legal da empresa, com fonte em uso laboral, de incluir na cobertura dos seguros de saúde dos trabalhadores as respectivas famílias, pelo que a dedutibilidade fiscal desta despesa não tem de passar pelo crivo (mais apertado) do actual artigo 43.° do Código do JRC: nesse sentido, Código do IRC — Anotado, Edição da DGCJ, p 188; e o acórdão do TCA n.° 2899/00, de 31 de Outubro de 2000 (se constituir obrigação legal, será custo fiscal).

I. Ainda que assim não se entenda, a dedutibilidade fiscal deste custo não é afastada pelo nº 2 do artigo 43º (artigo 40º em 2007) do Código do IRC que só restringe a abrangência especificamente aos trabalhadores com respeito às despesas elencadas após o divisor da oração “bem como”.

J. É despropositado dizer-se que o nº 4 do (actual) artigo 43º, ao estabelecer as condições (v.g. de generalidade) com respeito apenas aos trabalhadores, está a excluir as famílias: como é evidente, é por referência aos trabalhadores que as exigências têm de ser feitas (abranger todos os trabalhadores significa, se for esse o caso, abranger também todas as famílias dos trabalhadores, sem exclusão das famílias de alguns trabalhadores, como aliás ocorre com o requisito da generalidade previsto no nº 1 do artigo 43.° e que reconhecidamente por todos abrange também as famílias dos trabalhadores).

K. Improcede também dizer-se que a interpretação preconizada permite incorrer nos custos em causa em benefício de qualquer pessoa: só o permite com respeito a pessoas cuja inclusão no âmbito de cobertura do seguro de doença seja feita por causa do trabalhador, i. e., porque isso interessa ao trabalhador. De outro modo o custo será evidentemente indedutível por ausência da verificação do requisito (de aplicação geral) da indispensabilidade do custo (causação empresarial), previsto no artigo 23º do Código do IRC.

L. Finalmente, como se tentou mostrar, a história do preceito em causa, a que se soma a história e redacção de preceitos que lhe estão intimamente associados (perspectiva sistemática da interpretação), apontam justamente no sentido de que só ao que está na oração para lá do divisor “bem como”, se aplica a restrição de a despesa ser feita exclusivamente a favor do trabalhador (com exclusão, portanto, de outras despesas que, embora feitas no interesse do trabalhador e por causa dele, não preencham este requisito).

M. Às realidades localizadas para cá do divisor (a montante do divisor) não se aplica essa restrição adicional e específica (mas aplica-se na mesma, evidentemente, a condição geral da indispensabilidade do custo, no sentido de custo que tem de ter causação.


1.3. O Excelentíssimo Procurador-Geral-Adjunto junto do STA emitiu douto parecer no sentido de que devia ser concedido provimento ao recurso, revogada a decisão arbitral e substituída por acórdão que decida a questão controvertida com observância da solução adoptada no acórdão do TCAS, por entender que tal solução é a que decorre da melhor interpretação da norma constante do art.38º nº 2 CIRC.

1.4. Notificada a Recorrente para apresentar certidão do acórdão do TCAS com nota de trânsito em julgado face à questão suscitada pela Recorrida, veio juntar a certidão que consta de fls. 254 e segs., onde se certifica que esse acórdão não transitou em julgado, tendo sido requerida a sua aclaração (indeferida por acórdão de 9/04/2013) e dele interposto recurso por oposição de acórdãos para o Pleno do STA, admitido por despacho de 10/05/2013.
Defende, todavia, a Recorrente, no requerimento que apresentou em simultâneo com a junção da referida certidão, que esse acórdão do TCAS deve considerar-se transitado em julgado no que respeita à questão em discussão nestes autos, uma vez que o recurso que dele foi interposto para o STA por oposição de acórdãos apenas incidiu sobre a questão das menos-valias registadas com a venda das participações detidas pela sociedade A…………….., e não já sobre a questão que nele foi também decidida e aqui em análise, respeitante a realizações de utilidade social não dedutíveis.

1.5. Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar em conferência no Pleno da Secção.

2. Colocada que foi, pela Recorrida, a questão da falta de verificação dos requisitos de admissibilidade do presente recurso, cumpre conhecer prioritariamente dessa questão.

Como se viu, a Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do Tribunal Arbitral proferido no processo n.º 39/2012-T CAAD (“acórdão recorrido”), por alegada contradição com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido no recurso n.º 05073/11 (“acórdão fundamento”), nos termos e para os efeitos do art. 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do art. 25º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT).

Segundo o disposto nesse art. 25º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (nº 2), sendo aplicável a esse recurso, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152.º do CPTA, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral (nº 3).

O que significa, desde logo, que o recurso perante o STA tem de ser apresentado no prazo de 30 dias contado da notificação da decisão arbitral; e porque essa mesma decisão arbitral pode também ser objecto de impugnação perante o TCA no prazo de 15 dias contados da sua notificação (arts. 27º e 28º do RJAT), torna-se inquestionável que aquele recurso pode ter que ser interposto antes de a decisão arbitral se ter tornado definitiva através da resolução da respectiva impugnação (nesse caso, e tendo em conta que a eventual procedência da impugnação determinará a eliminação da ordem jurídica do objecto do recurso, propendemos a considerar que a interposição dessa impugnação deve determinar, ao abrigo do disposto nos arts. 276º, nº 1, al. c), e 279º, nº 1, do Código de Processo Civil, a suspensão da instância de recurso até ao trânsito em julgado do acórdão a proferir na impugnação).

Tudo isto para dizermos que não constitui pressuposto formal ou requisito de admissibilidade deste recurso o carácter definitivo da decisão recorrida (definitividade a que corresponde, nas decisões judiciais, o trânsito em julgado).

O mesmo não se diga relativamente ao acórdão fundamento.

É que tendo em conta que ao recurso da decisão arbitral se aplica o regime do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art. 152º do CPTA, há que atender à teleologia deste preceito, que inequivocamente aponta para que só se justifique o recurso para uniformização de jurisprudência quando o acórdão cuja oposição é invocada como fundamento do recurso já não seja já susceptível de recurso ordinário - pois só nesse caso estamos perante acórdão que, por ter transitado em julgado, tem eficácia em sentido contrário ao da decisão recorrida, só então podendo considerar-se estabilizada a oposição justificativa do recurso extraordinário que essa disposição prevê.

Este entendimento tem consagração legal no art. 152º do CPTA e no art. 763º, nº 2 do CPC, para os recursos para uniformização de jurisprudência, e foi já acolhido no acórdão do Pleno desta Secção de 3/07/2013, no recurso nº 01136/12, também interposto ao abrigo do art. 25º do RJAT, onde se deixou dito que «Manifesto é, porém, que o recurso - este ou qualquer outro destinado a prevenir ou solucionar conflitos de jurisprudência – não pode ser admitido (ou, tendo-o sido indevidamente, deve ser julgado findo) se o acórdão invocado como fundamento não transitou, também ele, em julgado, pois que tal seria contrário à razão de ser de tais recursos. É que não pode pretender-se uniformizar jurisprudência tendo como parâmetro uma decisão ainda não definitiva e que pode nunca vir a sê-lo.».

É, pois, pressuposto formal essencial do recurso previsto no art. 25º do RJAT, tal como acontece com o recurso para fixação de jurisprudência, o trânsito em julgado do acórdão fundamento.

E, quanto a este conceito de trânsito em julgado, há que ir buscá-lo ao art. 677º do Código de Processo Civil (a que corresponde o análogo art. 628º do novo CPC), de acordo com o qual se considera transitada em julgado a decisão logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação nos termos dos artigos 668º e 669º.

No caso vertente, a Recorrente não juntou, aquando da interposição deste recurso, em 30/10/2012, prova do trânsito em julgado do acórdão fundamento, e, notificado para o fazer, juntou certidão, emitida pelo TCAS em Julho de 2013, onde se certifica que o acórdão ainda não transitou em julgado, por ter sido requerida a sua aclaração e posteriormente interposto recurso por oposição de acórdãos para o Pleno do STA.

Na verdade, perante os elementos documentais que integram essa certidão e demais elementos processuais que resultam dos presentes autos, verifica-se que a decisão arbitral recorrida foi proferida em 24 de Setembro de 2012, altura em que ainda não fora proferido o acórdão fundamento do TCAS, já que este só foi proferido no dia seguinte, 25 de Setembro. Por outro lado, quando o presente recurso da decisão arbitral foi interposto neste STA, em 30 de Outubro de 2012, ainda se encontrava pendente, relativamente ao acórdão fundamento do TCAS, o incidente de aclaração desse acórdão, o qual só veio a ser decidido em 9 de Abril de 2013, a que se seguiu a interposição de recurso por oposição de acórdãos para o Pleno do STA, admitido por despacho de 10 de Maio de 2013, o qual, como se sabe, constitui um recurso ordinário.

O que significa que o acórdão fundamento ainda não transitou em julgado.

E não assiste razão à Recorrida quando advoga que ele se deve considerar transitado em julgado no que toca à questão em discussão nestes autos por virtude de o recurso que dele foi interposto por oposição de acórdãos para o STA ter incidido sobre a questão das menos-valias registadas com a venda das participações detidas pela A…………….., e não sobre a questão que nele foi também decidida e aqui em análise, respeitante a realizações de utilidade social não dedutíveis. Isto porque, como acima se referiu, o que importa é o conceito de trânsito em julgado acolhido pelo Código de Processo Civil, de acordo com o qual se considera transitada em julgado a decisão logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação nos termos dos artigos 668º e 669º. Ora, não só o incidente de aclaração (que integra a figura da reclamação prevista no art. 669º), como a interposição de recurso ordinário por oposição de acórdãos, ainda pendente, impediram o seu trânsito em julgado, como convém lembrar que da decisão que vier a ser proferida nesse recurso ainda poderá, porventura, ser interposto recurso para o Tribunal Constitucional que abranja a questão respeitante às realizações de utilidade social não dedutíveis ( O recurso para o Tribunal Constitucional é igualmente um recurso ordinário, porque deve ser interposto antes do trânsito em julgado da decisão (arts. 70º/2, 75º/1 LTC).).

Não tendo transitado em julgado o acórdão fundamento, falece um dos pressupostos formais essenciais do presente recurso, o que o torna inadmissível e nos exime de verificar se os pressupostos substanciais se encontram ou não preenchidos.

3. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não admitir o presente recurso.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 18 de Setembro de 2013. – Dulce Manuel da Conceição Neto (relatora) – João António Valente Torrão – Joaquim Casimiro Gonçalves – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Pedro Manuel Dias Delgado.