Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0664/13
Data do Acordão:05/15/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
RENDIMENTO PADRÃO
Sumário:I - Embora a justificação parcial não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89º-A da LGT, deve ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método.
II - Nesse caso, a matéria tributável é apurada com recurso ao rendimento padrão, calculado apenas sobre a manifestação de fortuna não justificada, e não pela diferença entre o rendimento padrão, calculado sobre a totalidade da fortuna, e a fortuna justificada.
Nº Convencional:JSTA00068258
Nº do Documento:SA2201305150664
Data de Entrada:04/24/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:DIRGER DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REC JURISDICIONAL
Legislação Nacional:LGT98 ART89-A N1 N4 N7
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0734/09 DE 2010/05/19; AC STAPLENO PROC0761/08 DE 2009/01/28; AC STA PROC0358/12 DE 2012/07/05; AC STA PROC0668/12 DE 2012/07/11; AC STA PROC01088/12 DE 2012/11/07
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A……, com os demais sinais dos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou parcialmente procedente o recurso da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto, relativamente aos rendimentos declarados em 2009.
Nas respectivas alegações, conclui o seguinte:
I. Partindo da decisão recorrida aceita-se que o recorrente só logrou justificar parcialmente as fontes de rendimento que lhe permitam constituir os suprimentos aqui em causa.
II. Emergindo a questão de saber se terá tal justificação parcial reflexos na determinação do rendimento tributável por recurso a esta modalidade de avaliação indirecta.
III. A jurisprudência dos tribunais superiores tem vindo a considerar a relevância dessa justificação parcial para efeitos da quantificação do rendimento presumido a tributar.
IV. Foi trazido à colação, a tal propósito, o acórdão do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do recurso nº 734/09, de 19 de Maio de 2010, que implicitamente defende que o rendimento padrão deverá ser subtraído ao rendimento justificado, de forma a determinar o incremento patrimonial não justificado.
V. Fazíamos notar que a dado passo dizia aquele arresto: “(… A quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 20% do valor de aquisição deduzido do montante do empréstimo bancário que demonstrou ter efectuado para a aquisição do imóvel em questão, já que este montante não está nem pode estar sujeito a IRS, não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação”.
VI. Donde, se assim era e atendendo a que, naquele caso, “20% do valor de aquisição” correspondiam exactamente ao rendimento padrão e o “valor do empréstimo” correspondia ao rendimento justificado acolhia hermenêutica (ainda que implicitamente) que advogada que o rendimento tributável por aplicação da avaliação indirecta em que se consubstanciam as manifestações de fortuna resultava da diferença (se positiva) entre rendimento padrão e rendimento justificado.
VII. Nessa conformidade se se deduzisse o rendimento padrão (294.796,12€) ao rendimento justificado (441.796,12), o rendimento a tributar, por aplicação do instituto das manifestações de fortuna, previsto no art. 89º-A da LGT, resultaria em valor zero, nada se mostrando adequado sujeitar a efeito impositivo.
VIII. E atendendo a que, in casu, o valor do rendimento justificado – 441.359,91€ – era claramente superior ao valor do rendimento padrão apurado – 294.796,12€ – (e, ademais, que o rendimento não justificado – 166.677,24€ - era inferior a tal rendimento padrão, ainda que não se entendesse que por esta razão devesse ser afastada a aplicação do regime) e não havendo o aqui recorrente logrado justificar a afectação total dos seus rendimentos à constituição de suprimentos realizados em 2009, considerávamos legitimada a utilização do instituto das manifestações de fortuna por parte da AT, contudo e não obstante por via da quantificação acima operada (que passava por deduzir o rendimento padrão ao rendimento justificado), não haveria acréscimo de rendimento tributável a sujeitar a IRS por aplicação do art. 89º-A da LGT.
IX. Era exactamente nesta parte que, advogamos, a M. Juiz a quo errava no julgamento que empreendeu.
X. Assim, embora a justificação parcial não afastasse a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89º-A da LGT, não podia deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável a determinar por esse método entendendo-se, como visto, que a quantificação do rendimento tributável do recorrente deveria ser igual ao rendimento padrão deduzido do rendimento justificado e já não, como decidiu a M. Juiz a quo, na proporção do rendimento não justificado.
XI. Isto dito, não podíamos deixar de advogar que a decisão, aqui sindicada, do Director de Finanças de Leiria, de 21 de Setembro de 2012, que procedeu à avaliação indirecta em conformidade com o aludido art. 89º-A da LGT dos rendimentos do aqui recorrente, reportados ao ano de 2009, corrigindo-os em função do rendimento padrão que se cifrou em 294.759,12€, não podia deixar de estar grosseiramente viciada.
XII. Aceite como boa a hermenêutica vinda de explicar, inexiste acrescido rendimento tributável decorrente da aplicação da avaliação indirecta, devendo manter-se o rendimento tributável do recorrente apurado em sede de IRS, reportado ao ano de 2009, o montante de 95.134,94€ e que resultou do cumprimento do acto declarativo respectivo e do seu subsequente tratamento por parte da AT

1.2. A recorrida contra-alegou, nos seguintes termos:

A. Vem o Recorrente apresentar alegações de recurso, tendo por base inferições lógicas sub-reptícias, que entende estarem incisas no Acórdão nº. 734/09, de 19 de Maio de 2010, do STA, perfilhado na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo” respeitante ao recurso parcialmente procedente deduzido nos termos do artigo 89º-A, da LGT;
B. O objecto das alegações de recurso diz respeita ao método de determinação do rendimento tributável, onde é advogado que a quantificação do rendimento tributável do Recorrente deveria ser igual ao rendimento padrão, deduzido do rendimento justificado e não na proporção do rendimento não justificado;
C. É evidente que o Recorrente pretende aqui adoptar um método de apuramento do rendimento tributável que vá de encontro à não tributação dos montantes não declarados ao Estado;
D. Sucede que o rendimento padrão tem como funções essenciais delimitar os pressupostos legais para o recurso a métodos indirectos, assim como, determinar numa fase póstuma, o montante acrescer ao rendimento da categoria G no apuramento do saldo final da justificação;
E. Assim o apuramento do rendimento tributável pela diferença positiva entre o rendimento padrão e o rendimento justificado não tem qualquer correspondência legal e encontra-se, manifestamente fora da voluntas legis e, não tendo, como não tem, «na letra da lei um mínimo de correspondência verbal», não pode tal interpretação gozar de alguma validade jurídica — cf. o n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.;
F. Ademais o método propugnado pelo Recorrente viola o principio da igualdade e da capacidade contributiva, porquanto, não tem em conta os sujeitos passivos que não lograram provar qualquer rendimento e foram tributados segundo o rendimento padrão pela totalidade dos montantes injustificados, bem como, ignora o escalonamento do rendimento padrão e a respectiva progressividade do Imposto sob o Rendimento das Singulares que se encontra reflectida na tabela a que se refere o nº 4 do artigo 89º-A da LGT.
G. Desta forma bem andou o Tribunal " a quo" não podendo ser assacado nenhum vicio à alias, douta sentença recorrida, pois que a mesma fez uma correcta interpretação

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, porque “não é certo que, como alega a recorrente, que o acórdão do Pleno da SCT do STA, que a sentença recorrida, também, convoca para a defesa da sua posição, sustente que, no caso de justificação parcial das manifestações de fortuna, o rendimento padrão deva ser subtraído ao rendimento justificado, de forma a determinar o incremento patrimonial não justificado”.

2. A sentença deu como assente a seguinte factualidade:

a) O Recorrente, A……., é sócio da sociedade com a denominação “B……., LDA”.
b) Em cumprimento da ordem de serviço nº 01201201161, de 17 de Maio de 2002, foi dado início a uma acção de inspecção interna, de âmbito parcial, ao Recorrente A……., relativamente ao IRS de 2009.
c) O procedimento de inspecção referido em b), foi motivado pela informação recolhida no âmbito da acção inspectiva à empresa “B……., LDA”, relativa ao exercício de 2009.
d) Por Ofício nº 2680, datado de 22 de Maio de 2012, subordinado ao assunto “Divergência entre Rendimentos Declarados e Empréstimos Efectuados foi o Recorrente notificado para exercer o direito de audição sobre o projecto de decisão de aplicação de métodos indirectos para a determinação do rendimento sujeito a IRS, do qual resulta, designadamente, o seguinte:
“(…) b. No âmbito da acção inspectiva ao exercício de 2009 à empresa B…….. LDA, Contribuinte nº …….., verificou-se que foram registados na conta 2680001, suprimentos do seu sócio A…….., no montante de €589 518,24
De acordo com a tabela prevista no nº do artigo 89.º -A da LGT ao valor dos suprimentos efectuados pelo sócio à sociedade, no ano de 2009, corresponde um rendimento padrão de €294.769,12.
No entanto, A……. declarou em 2009, rendimento líquido de €95.134,94 inferior a 502J do referido rendimento padrão.
c. Pelo que, se encontram reunidas as condições legais para, de acordo com a tabela a que se refere o nº 4 do referido artigo 89.º A, se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de €294.759,12, o qual, de acordo com a alínea d) do nº 1 do artigo 9º do Código do IRS será considerado como rendimento da categoria G
2. Nos termos do nº 3 do artigo 89. º A da LGT, para obstar ao procedimento da fixação, pode o notificado A……. fazer prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, nomeadamente herança ou doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso ao crédito, mediante apresentação, nomeadamente, de cópia dos extractos bancários que evidenciem a origem e a mobilização dos recursos financeiros utilizados para a realização dos suprimentos.” (cfr. doc. 2 junto com a p.i., a fls. 22 dos autos);
e) Em 4 de Junho de 2012, o Recorrente exerceu o direito de audição prévia relativamente ao projecto de decisão referido em d), no qual requer que se tenham por não verificadas as condições legais para a avaliação indirecta da matéria colectável do ano de 2009, mantendo-se como rendimento tributável em sede de IRS de 2009, o declarado no valor de €95.134,94, onde se extrai, designadamente, o seguinte:
“ (…) 4. Com efeito, para a realização dos referidos suprimentos, no montante de €589.518,24, o Contribuinte utilizou o seu próprio capital, constituído por recursos das heranças do seu pai e do seu cônjuge (o Contribuinte é casado sob o regime da comunhão geral) e da doação de meação e de quinhão hereditário outorgada pela sua mãe e, bem assim, por poupanças provenientes de rendimentos tributados ao longo de mais 50 anos, o que globalmente excede o montante dos suprimentos efectuados.
(…)
6. Dos documentos juntos sob o nºs 1 a 4 resulta que o valor global à época dos respectivas transmissões sem consideração dos imóveis da relação de bens referida na alínea b) do nº 5 antecedente e com consideração pelos valores matriciais/patrimoniais dos imóveis das relações de bens referidas nas alíneas a) e c) do nº 5 antecedente e dos imóveis do documento complementar à escritura pública referida na alínea d,) do nº 5 antecedente, ascendia a cerca de 53.000 contos hoje muito mais do que €589.518,24.
(…)
8. Nas alturas devidas, cada uma das referidas heranças, bem como a referida doação, foram devidamente declaradas, tendo sido foi apresentada junto da Administração Fiscal a relação de bens referente a cada uma das heranças e o documento complementar à escritura pública de doação, e as respectivos transmissões foram devidamente tributadas em imposto sobre as sucessões e doações.
9. Face ao exposto, deverá considerar-se provado que o rendimento líquido de €95.134,94, declarado pelo Contribuinte para efeitos de IRS de 2009, corresponde aos rendimentos efectivamente obtidas no referido ano de 2009 e, bem assim, que os recursos utilizados, em 2009, para efectuar suprimentos à sociedade B…….., LDA, provieram do capital do Contribuinte (...) “(cfr. doc. 3 junto com a p.i., a fls. 24 a 26 dos autos);
f) Em 17 de Setembro de 2012, foi proferida Informação pela Inspectora Tributária da Direcção de Finanças de Leiria - Divisão de Inspecção Tributária II, relativamente ao projecto de decisão referido na alínea antecedente, do qual resulta, designadamente o seguinte:
(…)
Os argumentos aduzidos pelo sujeito passivo no direito de audição prévia não comprovam que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna, pelo seguinte:
Tendo por base os mapas de partilha da herança do sogro, a relação de bens da herança do pai, a relação de bens da herança da sogra e a doação e convenção outorgada pela mãe, disponibilizados pelo sujeito passivo, e a portaria nº 772/2009 de 21 de Julho (coeficientes de desvalorização da moeda a aplicar aos bens e direitos alienados durante o ano de 2009), verifica-se que o valor actual dos bens herdados acendia em 2009 a €441.359,93 (...)
A análise dos documentos acima referidos permite verificar que as heranças recebidas pelo sujeito passivo são constituídos maioritariamente por bens imóveis, que não foram objecto de alienação, ou seja, não geraram encaixe financeiro que justifique o valor dos suprimentos. Estes bens geram apenas rendimentos prediais que constam da declaração de IRS do sujeito passivo relativa ao exercício em análise.
As alegadas poupanças não foram efectivamente comprovadas, isto é, o sujeito passivo não as quantificou nem apresentou qualquer documento bancário que permitisse aferir, da sua origem.
É ainda relevante fazer menção aos seguintes factos:
No âmbito da acção de inspecção à empresa B……., Lda, contribuinte nº …….., relativa ao exercício de 2008, verificou-se que o saldo inicial da conta 2680001 apresentava o valor de €4.109.744,65, dos quais €3.100.000,00 foram convertidos em prestações suplementares, sendo aquele montante proveniente do sócio A……...
No âmbito da acção de inspecção à empresa B……., Lda, contribuinte nº ………, relativa ao exercício de 2010, verificou-se que foram registados na conta 2680001, suprimentos do seu sócio A……., contribuinte nº ……., no montante de 290.000,00.
Conclusão.
Face ao exposto, determina o nº do art. 89º A da LGT que “Quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número anterior relativamente às situações previstas no nº 1 deste artigo, considerar-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano em causa (…)
Assim, não acolhendo a justificação apresentada pelo sujeito passivo em sede de direito de audição prévia, considera-se que o sujeito passivo não fez a prova referida no nº 3 do art. 89º-A da LGT, encontrando-se reunidas as condições legais, para, de acordo, com a tabela a que se refere o nº 4 do mesmo normativo, se proceder à fixação do rendimento tributável do exercício de 2009 no montante de €294.759,12 (€589.518,24 X 50%,) o qual, de acordo com a alínea d) do nº 1 do art. 9, º do Código do IRS (IRS), será considerado como rendimento da categoria G
Considerando o exposto, nos termos do nº 6 do art. 89.º da LGT, solicita-se autorização para proceder à avaliação da matéria colectável pelo método indirecto, com os valores e fundamentos aqui invocados.” (cfr. doc. 1 junto com a pi., a fls. 19 a 21 dos autos);

g) Em 21 de Julho de 2012, foi emitido parecer pelo Director de Finanças Adjunto, cujo conteúdo se extrai o seguinte:
PARECER
Atentos os fundamentos de facto e direito expressos, entendo reunidos os pressupostos para aplicação das regras previstas no artigo 89.º A da LGT,
designadamente, o recurso ao método indirecto no ano de 2009.
À consideração do Sr. Dir. Finanças atento o nº 6 do artº 89.ºA da LGT.”
(cfr. despacho a fls. 8 do processo administrativo tributário apenso; cfr.doc. 1 junto com a pia fls. 18 verso dos autos);

h) A 21 de Setembro de 2012, foi proferido o seguinte despacho pelo Director de Finanças de Leiria, em regime de substituição:
Concordo com o teor integral da informação e pareceres que sanciono nos termos previstos no art. 89.º A da LGT, decidindo, face ao nº 6 do citado artigo determinar a matéria tributável por avaliação indirecta. Notifique se o SP
(cfr. despacho a fls. 8 do processo administrativo tributário apenso; cfr.doc. 1 junto com a pi. fls. 18 verso dos autos);
i) Por ofício nº4875, da Direcção de Finanças de Leiria – Divisão de Inspecção Tributária II, datado de 24 de Setembro de 2012, expedido por carta registada com aviso de recepção, recebido pelo Recorrente em 25 de Setembro de 2012, foi o mesmo notificado do despacho do Director de Finanças referido em h) e do parecer referido c) e da informação referida em f) – facto confessado no artigo 1º da p.i e cfr. doc. de fls. 21 verso; e cfr. p.a fls. 6 e 7)
j) Em 22 de Setembro de 2004, o Recorrente apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2003, tendo declarado no anexo F, quadro 4, campo 417 o valor total de Rendimentos Prediais de €61.210,49 (cfr. declaração de rendimentos mod. 3 a fls. 116 a 119 dos autos);
k) Em 31 de Julho de 2008, o Recorrente apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2007, tendo declarado no anexo F, quadro 4, o valor total de rendimentos Prediais de €86.452,74 (cfr. declaração de rendimentos mod. 3 a fls. 120 a 124 dos autos);
l) Em 24 de Maio de 2009, o Recorrente apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2008, tendo declarado no anexo E, quadro 4, o valor total de Rendimentos Prediais de €100.810,95 (cfr. declaração de rendimentos mod. 3 a fls. 125 a 128 dos autos);
m) Em 28 de Maio de 2010, o Recorrente apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2009, tendo declarado no anexo F, quadro 4, o valor total de Rendimentos Prediais de €85.611,42 e um rendimento líquido de €95.134,94 (cfr. declaração de rendimentos mod. 3 a fls. 112 a 115 dos autos);
n) Em 12 de Novembro de 2010, foram emitidas pelo Banco Privée Edmond de Rothschild documentos que se intitulam de “Declarações de Regularização Tributária”, referentes ao Recorrente, com o conteúdo constante de fls. 133 a 148 dos autos.
o) O Recorrente e cônjuge são titulares desde 9 de Janeiro de 2001, da conta bancária nº 22080 junto do BANQUE PRIÉE EDMOND DE ROTHSCHILD (cfr. documento a fls.71 do autos);
p) O saldo da conta referida em o), a 31 de Dezembro de 2008. ascendia a €2.298.653,92 (cfr. documento a fls. 71 dos autos);
r) A favor da conta referida em q) do BPI e por débito da conta do Banco Prive Edmond de Rothschil referida em o), foram efectuados as transferências descritas no documento de fls. 71 dos autos.
s) No ano de 2009, o Recorrente transferiu da conta do BPI, referida em q) os valores constantes do documento de fls. 70 dos autos.
t) O Recorrente herdou bens cujo valor total, em 2009, ascendia a €489794,09 (facto confessado no artigo 32. da p.i facto não controvertido; facto que se extrai da documentação junta aos autos a fls. 26 a 68 verso dos autos);
u) Os bens herdados pelo Recorrente são constituídos maioritariamente por bens imóveis (facto confessado no artigo 33.º da p.i.; facto não controvertido; Facto que se extrai da documentação junta aos autos a fls. 26 a 68 verso dos autos);
v) Os bens herdados têm vindo a gerar rendimentos e foram tributados ao longo os anos (facto confessado na p.i; facto não controvertido; facto que se extrai das declarações de rendimentos juntas aos autos a fls. 112 a 127).

3. O recorrente, utilizando a forma processual urgente prevista no nº 7 do artigo 89º-A da LGT, interpôs recurso da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto, com referência ao ano de 2009, corrigindo-a em €294.759,12.
Fundamentou o recurso impugnatório na existência de erro nos pressupostos de facto que foram considerados na avaliação, uma vez que justificou a totalidade dos suprimentos que fez à sociedade de que é sócio, no valor de €589.518,24, sendo por isso inaplicável o disposto nos nºs 1e 4 do artigo 89º-A da LGT.
A sentença recorrida, considerou que o recorrente apenas provou parte da manifestação de fortuna que evidenciou na celebração do contrato de suprimento, extraindo daí duas conclusões: (i) que foi correcta a avaliação da matéria colectável através do método indirecto, inexistindo violação da regra do nº 1 do artigo 89º- A da LGT; (ii) que o rendimento colectável deve ser apurado tendo em conta a justificação parcial dos suprimentos, pelo que o rendimento padrão previsto no nº 4 do artigo 89º-A deve ser calculado apenas sobre a parte não justificada, pelo que a avaliação impugnada, que assim não considerou, é parcialmente ilegal.
O recorrente aceita a primeira conclusão, mas entende que a sentença padece de error in iudicando, por errada interpretação do nº 4 do artigo 89º-A, uma vez que a fortuna justificada dever ser subtraída ao rendimento padrão e não que este seja calculado sobre o remanescente não justificado.
No seu entender do recorrente, no acórdão do Pleno do STA proferido no recurso nº 734/09, em 19/5/2010, faz-se a distinção entre “rendimento padrão” e “rendimento justificado”, e na hermenêutica nele exposta, chega-se à conclusão, “ainda que implicitamente”, que “o rendimento tributável por aplicação da avaliação indirecta em que se consubstanciam as manifestações de fortuna resulta da diferença (se positiva) entre rendimento padrão e rendimento justificado”. Daí que «se se deduzisse o rendimento padrão (294.796,12€) ao rendimento justificado (441.359,91€), o rendimento a tributar, por aplicação do instituto das manifestações de fortuna, previsto no art. 89º-A da LGT, resultaria em valor zero, nada se mostrando adequado sujeitar a efeito impositivo».
Em nossa opinião, não é aceitável essa concepção.
O nº 4 do artigo 89º-A prescreve que «quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número anterior relativamente às situações previstas no nº 1 deste artigo, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existem indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, o rendimento padrão apurado nos termos da tabela seguinte».
Ora, desta norma e do sentido que a jurisprudência mais recente do STA lhe tem dado não se retira a fórmula de quantificação da matéria colectável que o recorrente pretende aplicar. Na verdade, não é o rendimento justificado que se deve subtrair ao rendimento padrão, mas o rendimento padrão que apenas deve ser calculado sobre o rendimento não justificado.
Em primeiro lugar, a significação das expressões (texto) contidas no referido nº 4 do artigo 89º-A não permite recortar uma norma com o sentido que o recorrente lhe pretende dar. Desde logo, na sua previsão está o facto do sujeito passivo não provar a fonte de manifestação de fortuna evidenciada na aquisição de bens ou nos suprimentos e empréstimos realizados. Ao referir-se, «quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número anterior», só pode estar a reportar-se aos rendimentos não justificados, pois, se há justificação para parte da riqueza evidenciada na aquisição, pelo argumento a contrario, tal parte não cabe no âmbito da previsão. Depois, na estatuição, determina-se que nesse caso o “rendimento tributável” é o rendimento padrão apurado nos termos da tabela, o que exclui a possibilidade de se subtrair a este o rendimento justificado. O imposto incide sobre o “rendimento padrão” e não sobre a diferença entre o rendimento padrão e o rendimento justificado.
Em segundo lugar, não é correcto extrair-se da fundamentação do acórdão do Pleno do STA, de 19/5/2010, proferido no recurso nº 734/09, a norma segundo a qual a quantificação da matéria tributável apura-se pela diferença entre o rendimento padrão e o rendimento justificado.
A controvérsia que o acórdão pretendeu resolver consistiu em saber se na determinação da matéria colectável, ao abrigo do disposto no artigo 89º-A da LGT, se deve considerar o rendimento padrão decorrente da tabela anexa ao nº 4 do mesmo preceito legal, ou se o mesmo deverá ser calculado apenas sobre o montante que o contribuinte não logrou justificar. Apesar da posição inicial da jurisprudência ter sido no primeiro sentido (cfr. do Pleno do STA, de 28/1/2009, rec. nº 761/08), aquele acórdão entendeu que “a justificação parcial, embora não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89º-A da LGT, não pode deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método, entendendo-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 20% do valor de aquisição deduzido do montante do empréstimo bancário que demonstrou ter efectuado com a aquisição do imóvel em questão, já que esse montante não está, nem pode estar sujeito, a IRS, não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação”.
Ora, a interpretação do nº 4 do artigo 89º-A no sentido dado por esta jurisprudência, que se transformou maioritária pelo acórdão do Pleno do STA, de 5/7/2012, proferido no recurso nº 0358/12, não permite concluir, ainda que implicitamente, que o apuramento da matéria colectável se faz pela diferença entre o rendimento padrão e o rendimento justificado. Nesses casos e em todos aqueles que têm vindo a aplicar o mesmo critério jurídico (cfr. acs. de 11/7/2012 e 7/11/2012, recs. nº 0668/12 e nº 01088/12), a matéria tributável é calculada sobre o rendimento não justificado. Ao valor da aquisição (ou dos suprimentos e empréstimos que evidenciam manifestação de fortuna) deduz-se o montante justificado, calculando-se o rendimento padrão sobre o remanescente.
E é esse o método que está em conformidade com a argumentação invocada para se excluir o rendimento justificado do âmbito da norma do nº 4 do artigo 89º-A da LGT. Qualificando-se esta norma como uma norma de “incidência objectiva”, é-lhe aplicável a proibição de presunções legais absolutas de rendimentos derivada do princípio da capacidade contributiva, pelo que, como se refere no referido acórdão “não pode deixar de ser reconhecido ao contribuinte o direito de provar o manifesto excesso dessa quantificação, pela demonstração de que o seu rendimento tributável não pode ser igual ao rendimento padrão que a lei fixa ou presume, na medida em que logrou demonstrar a proveniência de parte do montante que permitiu a manifestação de fortuna e esse montante não está sujeito a declaração e tributação como rendimento para efeitos de IRS”.
Em terceiro lugar, a fórmula de cálculo da matéria colectável proposta pelo recorrente não tem justificação no motivo-fim que determinou a norma do nº 4 artigo 89º-A da LGT. Se o rendimento justificado fosse subtraído ao rendimento padrão, calculado este sobre a totalidade dos valores afectos à aquisição dos bens ou de suprimentos e empréstimos, o rendimento não justificado não seria tributado sempre que o justificado ultrapassasse o valor do rendimento padrão. Uma curiosa fórmula de cálculo da matéria tributável, em que o rendimento justificado intervêm num primeiro momento para cálculo do rendimento padrão, para logo de seguida lhe ser subtraído, afastando a matéria colectável do rendimento padrão. Deste modo, frustrar-se-ia a pretensão legislativa de tributar manifestações de fortuna de fonte desconhecida, como instrumento jurídico de luta contra a fraude e evasão fiscais.
Em suma: em caso de justificação parcial da manifestação de fortuna evidenciada na aquisição de um bem ou na concessão de suprimentos e empréstimos, a matéria tributável é apurada com recurso ao rendimento padrão calculado sobre a parte não justificada.

4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente.
Lisboa, 15 de Maio de 2013. – Lino Ribeiro (relator) – Dulce Neto – Isabel Marques da Silva.