Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01898/02
Data do Acordão:07/02/2003
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ALMEIDA LOPES
Descritores:RECURSO CONTENCIOSO.
REDUÇÃO DE TAXA DE SISA.
LEGITIMIDADE ACTIVA.
OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA.
TRANSMISSÃO DE BENS.
Sumário:As obrigações tributárias não são susceptíveis de transmissão por contrato de direito privado, salvo se a lei tal autorizasse, pelo que o co-contratante não adquire legitimidade para recorrer contenciosamente contra os actos tributários dirigidos a quem fez a transmissão da dívida fiscal.
Nº Convencional:JSTA00059467
Nº do Documento:SA22003070201898
Data de Entrada:12/02/2002
Recorrente:A...
Recorrido 1:DIRSERV DO IMPOSTO DE SELO E TRANSMISSÃO DO PATRIMÓNIO
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR FISC - SISA.
DIR ADM CONT - ACTO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART9 N4.
LGT98 ART1 N2 ART9 N1 ART18 N4 A ART29 N3.
Aditamento:
Texto Integral: 1º Relatório
Com fundamento na falta da sua notificação do indeferimento do requerimento de redução da taxa de sisa apresentado pela locadora financeira, em vício de violação de lei por erro nos pressupostos e em insuficiência de fundamentação, A..., com sede na Zona Industrial de ..., ..., Vila do Conde, interpôs recurso contencioso contra o despacho do Director dos Serviços dos Imposto de Selo e Transmissão do Património da DGCI de 22 de Maio de 2000, proferido com subdelegação de competências do Ministro das Finanças sobre requerimento apresentado pela B... .
Por sentença de fls. 122 e seguintes, o Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa julgou a recorrente parte ilegítima neste recurso, por entender que ela não tinha um interesse pessoal, directo e legítimo no deferimento do requerimento de redução da taxa de sisa, não sendo parte da relação jurídico-tributária, pois os titulares do direito à redução da sisa são apenas as sociedades de locação financeira e não as locatárias.
Contra essa sentença foi interposto recurso para este STA, tendo a recorrente apresentado as suas alegações de fls. 137 e seguintes, nas quais concluiu que se vinculou por contrato a pagar a sisa cuja redução foi pedida, que de facto pagou essa sisa à locadora, que houve repercussão do pagamento da sisa na sua esfera jurídica, que tem um interesse legalmente protegido (directo, pessoal e legítimo) por ter tido um prejuízo, que o meio processual utilizado é o meio adequado, que se considera prejudicada, pelo que pode vir a juízo. Termina dizendo que tem legitimidade para discutir em juízo a legalidade do acto impugnado.
A autoridade recorrida contra-alegou, sustentando a sentença recorrida.
Corridos os vistos cumpre decidir.
São os seguintes os factos a ter em conta:
- o despacho recorrido é de 22.5.2000, do Director dos Serviços do Imposto de Selo e das Transmissões Patrimoniais;
- tal despacho recaiu sobre o requerimento formulado pela B..., no qual esta pedia a redução da taxa de sisa para 4% em relação à aquisição do prédio urbano situado em ..., ..., Vila do Conde, destinado à utilização da recorrente em cumprimento do contrato de locação financeira com ela celebrado em 28.10.99;
- nos termos desse contrato, a recorrente obrigou-se ao pagamento de todos os encargos (incluindo impostos) por esta suportados com a referida aquisição.
2º Fundamentos
Pelo facto de a recorrente ter pago a sisa à requerente da redução, nos termos de um contrato privado, ficará com legitimidade para impugnar contenciosamente o despacho que indeferiu o requerimento não feito por si, mas pela locadora?
Nos termos do artº 9º, nº 4, do CPPT têm legitimidade no processo judicial tributário os contribuintes, as partes dos contratos fiscais E QUAISQUER OUTRAS PESSOAS QUE PROVEM UM INTERESSE LEGALMENTE PROTEGIDO.
Não basta ter um interesse de facto por se ter pago uma prestação tributária. É preciso que a lei dê protecção a esse interesse, em termos de permitir a sua defesa em juízo. Tem de ser um interesse legítimo.
Ora, um interesse somente é legítimo ou legalmente protegido quando está ancorado na lei e não num contrato de direito privado.
Considera-se relação jurídico-tributária a estabelecida entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares ou colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas (artº 1º, nº 2, da Lei Geral Tributária).
In casu, a recorrente não é titular de qualquer relação jurídico-tributária com a administração tributária, precisamente porque titular dessa relação é somente a locadora que fez o requerimento. Por outro lado, nenhuma lei equipara, para efeitos fiscais, a locatária à locadora. E foi por isso que quem fez o requerimento que foi indeferido foi a locadora e não a locatária.
Nos termos do artº 9º, nº 1, da LGT é garantido o acesso à justiça tributária para a tutela plena e efectiva de todos os direitos ou interesses legalmente protegidos. Significa isto que se um interesse não estiver legalmente protegido não existe o direito de aceso à justiça fiscal. Não se conhece nenhuma lei que conceda protecção aos interesses da recorrente.
Nos termos do artº 18º, nº 4, al. a), da LGT, não é sujeito passivo da relação tributária quem suporte o encargo do imposto por repercussão legal, sem prejuízo do direito de impugnação nos termos das leis tributárias.
Ora, a repercussão a que a recorrente se refere não é a legal, mas a resultante de um contrato de direito privado e que vincula apenas as partes nesse contrato. Por outro lado, nenhuma lei tributária confere à recorrente o direito de impugnar.
De acordo com o artº 29º, nº 3, da LGT, “as obrigações tributárias não são susceptíveis de transmissão inter vivos, salvo nos casos previstos na lei”.
Logo, o contrato de direito privado entre locador e locatário não é susceptível de transmitir para este a obrigação tributária daquele. Não há qualquer lei que permita essa transmissão.
Conforme decidiu este STA no acórdão de 9.5.93, Rec. nº 12 168, sujeito passivo de um imposto é aquele que a lei indica e em relação ao qual se verificou o facto tributário e não aquele que consta de qualquer acordo ou pacto privado.
Deste modo, improcedem todas as conclusões das alegações e a sentença não pode deixar de ser confirmada.
3º Decisão
Nestes termos, acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, com 400 euros de taxa de justiça e metade de procuradoria.
Lisboa, 2 de Julho de 2003
Almeida Lopes – Relator – António Pimpão – Brandão de Pinho (votei a conclusão na base dos artºs 2º da LPTA e 46º nº 1 do RSTA).