DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 11695/15.0T8PRT
Tribunal 1ª instância: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DO PORTO
Juízo ou Secção: JUÍZO LOCAL CÍVEL DO PORTO - JUIZ 2
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: CONTRATO BANCÁRIO DE DEPÓSITO À ORDEM
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: BANCO COMERCIAL PORTUGU~ES
Data da Decisão: 12/23/2016
Descritores: IMPOSIÇÃO DE FICÇÕES
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
EXCLUSÃO OU LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
ALTERAÇÃO DAS REGRAS DO RISCO
REPARTIÇÃO DO ÓNUS DA PROVA
Texto das Cláusulas Abusivas: Pelo exposto, julga-se a acção integralmente procedente e em consequência:
Declaro nulas as seguintes cláusulas do Contrato de "Depósito à Ordem - Pessoas singulares":
a) Cláusula 14ª, n.º 1 (sob a epígrafe "Tratamento das instruções do Cliente", referente ao segmento A - Condições gerais de contas de depósitos à ordem);
"O Cliente reconhece que os serviços e/ou operações disponibilizadas pelo Banco estão sujeitos a interferências, interrupções, desconexões ou outras anomalias, designadamente em consequência de avarias, sobrecargas ou outras eventualidades às quais o Banco é completamente alheio, aceitando expressamente o Cliente que o Banco não será responsável pelos danos ou prejuízos, atuais ou potenciais e incluindo lucros cessantes, que possam resultar, direta ou indiretamente, de tais eventos para os clientes."
b) Cláusula 15ª (sob a epígrafe "Compensação de créditos", referente ao segmento A - Condições gerais de contas de depósitos à ordem);
"Sem prejuízo da faculdade de exercer a compensação de créditos nos termos legalmente previstos, é expressamente reconhecida ao Banco a possibilidade de extinguir, total ou parcialmente, o crédito que detenha sobre o titular da conta ou qualquer um dos contitulares, procedendo ao débito, sem necessidade de aviso prévio, das importâncias que lhe sejam devidas por qualquer um dos referidos titulares da conta ou contitulares, em qualquer conta em que qualquer deles seja titular único ou contitular."
c) Cláusula 4ª, n.º 9 (sob a epígrafe "Tratamento das instruções do Cliente" referente ao segmento D - Condições gerais de utilização dos meios de comunicação à distância);
"Considerando que os serviços ou operações disponibilizados pelo Banco através dos meios de comunicação à distância estão sujeitos a interferências, interrupções, desconexões ou outras anomalias, designadamente em consequência de avarias, sobrecargas, cargas de linha ou outras eventualidades às quais o banco é alheio, o Cliente reconhece expressamente que nenhuma responsabilidade poderá ser imputada ao Banco relativamente a danos, potenciais ou atuais que, direta ou indiretamente, possam resultar para o Cliente por força da acorrência de tais eventos."
d) Cláusula 12ª (sob a epígrafe "Autorização de débito", referente ao segmento E - Condições gerais de crédito).
"O Banco, em ordem à liquidação integral ou parcial dos seus créditos poderá, sem necessidade de aviso prévio, debitar qualquer conta de depósito à ordem de que o titular seja ou venha a ser titular ou contitular solidário, para pagamento de quaisquer dívidas que qualquer um dos contitulares seja responsável perante o Banco."
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO PORTO
Relator: FILIPE CAROÇO
Data do Acórdão: 05/04/2017
Decisão: Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, revogando-se, em parte, a sentença recorrida, declara-se também com base ao abrigo do art. 25º do RJCCG:
A. a nulidade da cláusula 14ª, n.º 1 (sob a epígrafe "Tratamento das instruções do Cliente", referente ao segmento A - Condições gerais de contas de depósitos à ordem) e da cláusula 4ª, n.º 9, (sob a epígrafe "Autorização de débito", referente ao segmento D - Condições gerais de utilização dos meios de comunicação à distância), do contrato de depósito à ordem - Pessoas singulares, identificado no ponto 3 dos factos provados;
B. A nulidade da cláusula 15ª (sob a epígrafe "Compensação de créditos", referente ao segmento A - Condições gerais de contas de depósitos à ordem) e da cláusula 12ª (sob a epígrafe "Autorização de débito", referente ao segmento E - Condições gerais de crédito), do contrato de depósito à ordem - Pessoas singulares, identificado no ponto 3 dos factos provados, com exceção da parte, quanto a estas duas cláusulas, em que autoriza o Banco a extinguir total ou parcialmente, o crédito que detenha sobre o aderente titular da conta, procedendo ao débito, sem necessidade de aviso prévio, das importâncias que, por ele, lhe sejam devidas, em qualquer conta de que seja o único titular.

SUMÁRIO:
1. É matéria de direito a análise interpretativa das cláusulas contratuais gerais, em sede de ação inibitória, efetuada ao abrigo do art. 10º do RJCCG e do art. 236º, n.º 1, do Código Civil.
2. É nula a cláusula contratual geral integrante de contrato de depósito bancário pela qual o Banco afasta toda a sua responsabilidade por avarias e outras eventualidades prejudiciais, designadamente nos meios de comunicação, a que é alheio, por excluir também, sem que o diga expressamente, a responsabilidade pelo risco por facto devido a caso fortuito ou de força maior.
3. Tal cláusula, tal como está redigida, pode levar o declaratário normal a admitir a exclusão da responsabilidade do banco apenas quando o dano resulta de facto imputável a terceiro, quando, na realidade,d e forma ambígua e encoberta, o Banco coloca o cliente a aceitar a sua integral irresponsabilidade sempre que não se verifique a sua culpa.
4. É nula a cláusula contratual geral que, sendo parte integrante de um contrato de depósito bancário, prevê a compensação de crédito do Banco sobre o aderente por débito noutras contas de depósito à ordem em que ele seja contitular, tanto no regime de conta solidária como no regime de conta conjunta.

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Texto Integral: 11695_15_0T8PRT.pdf 11695_15_0T8PRT.pdf