DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 884/09.7YXLSB
Tribunal 1ª instância: JUIZOS CÍVEIS DA COMARCA DE LISBOA
Juízo ou Secção: 8º JUÍZO
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: ALUGUER DE AUTOMÓVEL SEM CONDUTOR
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: BANCO SANTANDER CONSUMER PORTUGAL, SA
Data da Decisão: 10/29/2009
Descritores: EXCLUSÃO DA EXCEÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
ALTERAÇÃO DAS REGRAS DO RISCO
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
CLÁUSULAS PENAIS DESPROPORCIONADAS
Texto das Cláusulas Abusivas: Por todo o exposto o Tribunal julga a presente acção parcialmente procedente e em consequência:
a) Declara nula a cláusula 7ª, nº 7, quando consagra que o risco de perda, deterioração, defeito de funcionamento e imobilização correm por conta do locatário,s em prever a culpa da locadora, e a possibilidade de resolução do locatário com base nesse acto culposo ou em situações geradoras de incumprimento ou cumprimento defeituoso;
Cláusula 7ª, nº 7:
"7. Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, os riscos de perda, deterioração, defeito de funcionamento e imobilização correm por conta do locatário, em tais casos este responderá perante a locadora apenas no âmbito e nos limites do valor do seguro previsto, a menos que tenha celebrado tal seguro ou o mesmo não se encontre em vigor, por motivo que lhe seja imputável, caso em que o locatário responderá pela totalidade do valor em causa."
b) Declara nulas as claúsulas 8ª, nº 3 e nº 5, por conterem uma cláusula penal desproporcional, e excessiva, reduzindo o valor na mesma previsto, nos termos do art. 812º CC, para 20% do somatório dos alugueres vincendos e do valor relativo ao preço de compra mencionado no número um do contrato de promessa de compra e venda subjacente ao presente contrato;
Cláusula 8ª, nº 3 e 5:
"3. A resolução por incumprimento não exime o locatário da restituição e do pagamento de quaisquer dívidas vencidas para com a locadora, do pagamento da reparação de danos que o veículo apresente da responsabilidade do locatário e ainda, de uma indemnização por lucros cessantes correspondentes a 25% do somatório dos alugueres vincendos e do valor relativo ao preço de compra mencionado no número um do contrato de promessa de compar e venda subjacente ao presente contrato.
5. À denúncia praticada nos termos do número anterior é aplicável o regime previsto no número três desta cláusula devendo o montante apurado ser liquidado pelo locatário à locadora, no acto de restituição do veículo sob pena de ineficácia da denúncia."
c) Declara nula a cláusula 9ª nº 3 quando elenca condutas que equipara à prática do crime de furto, por violar a lei penal, constitucional e a boa fé;
Cláusula 9ª, nº 3:
"3. Em caso de resolução do presente contrato, e a verificar-se a não restituição do veículo e dos respectivos documentos que o acompanham, o locatário será considerado possuidor de má fé e as penas de furto ser-lhe-ão impostas se alienar, onerar, modificar, destruir ou desencaminhar o referido bem, sem autorização escrita do banco sanatnder consumer Portugal, SA."
d) Declara nula a cláusula 15ª, nº 2, quando consagra o valor de 12,5% sobre o valor em dívida a título de despesas a suportar pelo locatário em caso de incumprimento deste, por falta de causalidade e, consequentemnete, ser uma cláusula penal excessiva e desproporcionada.
Clásula 15ª, nº 2:
"2. Decorrem, igualmente, por conta do locatário e serão por ele pagas quaisquer despesas ou encargos resultantes da execução do presente contrato que o banco santander consumer Portugal SA faça para garantir a cobrança dos seus créditos e restituição do veículo de sua propriedade, incluindo as judiciais, extrajudiciais, honorários de advogado e solicitador, bem como a subcontratação de serviços a terceiras entidades, as quais a título de cláusula penal se fixam desde já em 12,5% (doze e meio por cento)sobre o valor em dívida."
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO LISBOA
Relator: MARIA AMÉLIA RIBEIRO
Data do Acórdão: 06/29/2010
Decisão: Termos em que, de harmonia com as disposições legais citadas, concedendo provimento à apelação, se revoga, na parte recorrida, alterando-se a sentença, e se conclui pela nulidade da cláusula 7.ª, n.º 3, al. c), nº 4 e n.º 5 das Condições Gerais de Aluguer sem Condutor, condenando-se a R. a abster-se de utilizar a referida cláusula e com a extensão indicada nos contratos que actualmente e no futuro venha celebrar com os clientes. Vai ainda a R. condenada a publicitar tal proibição, nos mesmos termos determinados na decisão de 1.ª instância.
Cláusula 7ª, nºs 3, al. c), 4 e 5:
"3. Em caso de sinistro que tenha como consequência a perda total ou parcial do bem locado, o locatário obriga-se a:
c) Em caso de perda parcial, após peritagem e decisão da seguradora, ou em caso de furto ou roubo, o contrato será considerado extinto por caducidade.
4. Verificada a caducidade o locatário pagará ao locador o montante dos alugueres vincendos e do valor de opção de compra, actualizado com a taxa de juro referida na cláusula quinta, adicionado ao montante das rendas vencidas e não pagas.
5. Qualquer atraso, ainda que parcial, no pagamento da indemnização referida no número anterior, acarretará o vencimento dos juros de mora à taxa referida na cláusula décima terceira."

SUMÁRIO:
Num contrato de ALD, a cláusula que altera o disposto no art.º 1044.º CC, sobre a distribuição do risco no contrato de locação, em desfavor do locatário, viola o disposto no art.º 21.º, f) do DL 446/85, de 25 de Outubro, sendo, pois, absolutamente proibida.

Recurso SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA
Relator: HÉLDER ROQUE
Data do Acórdão: 02/11/2011
Decisão: Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que constituem a 1ª secção cível do Supremo Tribunal de Justiça, em conceder a revista, e, em consequência, revogando o acórdão recorrido, julgam a acção improcedente, por não provada, neste particular, não declarando a nulidade da cláusula sétima, nºs 3, c), 4 e 5, das Condições Gerais do Contrato de Aluguer de Veículo sem Condutor, sob a epígrafe “Responsabilidade, Risco e Seguro”, no mais confirmando o acórdão impugnado.

SUMÁRIO:
I - O denominado contrato de ALD retrata uma pluralidade multilateral de contratos interligados por uma relação de coligação funcional de três tipos contratuais distintos que constituem o seu esqueleto estrutural, ou seja, de um contrato de aluguer de longa duração, de um contrato de compra e venda a prestações e de um contrato-promessa de compra e venda do bem alugado.
II - A aludida coligação funcional do triângulo contratual em que se consubstancia o ALD é subsumível à matriz do contrato de mandato sem representação, cujos elementos em que o seu conteúdo típico se desdobra nele se revêem, igualmente, ou seja, por um lado, a vinculação do mandatário [locador], em nome próprio, mas por conta do mandante [locatário], que se obriga a adquirir o bem, por este, expressamente, escolhido e indicado, a terceiro, transferindo, em seguida, para este os direitos que haja adquirido na execução do mandato, a propriedade do bem adquirido por sua conta, para depois lhe proporcionar o gozo, e, por outro lado, o dever do mandante em reembolsar o mandatário das despesas que este haja efectuado no cumprimento do encargo de que fora incumbido com a aquisição do bem.
III - Deste modo, o ALD seria um contrato de concessão de crédito ao consumo, que opera, não mediante o empréstimo de dinheiro, mas antes através de um instrumento técnico-jurídico capaz de permitir que alguém conceda, temporariamente, a outrem o poder de compra de que este não dispõe, fraccionando e diferindo a execução da obrigação do mandante [o locatário] reembolsar o mandatário [o locador] da despesa efectuada na aquisição do bem objecto do contrato.
IV - A única semelhança que existe entre o contrato de compra e venda a prestações, instrumento pioneiro da concessão de crédito ao consumidor, em que o crédito é concedido pelo próprio vendedor, através do diferimento da exigibilidade da obrigação de pagamento do preço para um momento futuro, posterior ao imediato cumprimento do dever de entrega da coisa, e o ALD, traduz-se em que, em ambos os casos, existe uma obrigação pecuniária de execução fraccionada, no primeiro, de pagamento do preço, e, no segundo, de reembolso dos fundos adiantados pelo locador.
V - Embora no ALD, o efeito da transferência da propriedade só se produza com a celebração, em cumprimento do contrato-promessa que a operação comporta, de um futuro contrato prometido de compra e venda entre o locatário e o terceiro interposto pelo locador, este apenas adquire os bens que lhe são, especificamente, solicitados pelo locatário carecido, ao qual cabe suportar os riscos inerentes à qualidade de proprietário do bem de que usufrui o gozo, porquanto o locador age, por conta e risco do locatário.
VI - O desequilíbrio real de poder negocial entre as partes, que neste tipo de contrato de adesão desfavorece o consumidor, beneficiário de uma particular tutela constitucional que supra a «assimetria informativa» que o penaliza, não é suficiente, na hipótese do presente contrato de ALD, para excluir ou limitar o princípio da liberdade negocial, na vertente que aqui se coloca da liberdade de celebração ou conclusão dos contratos..
f
Texto Integral: 884_09_7YXLSB.pdf 884_09_7YXLSB.pdf