DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 1401/09.4YXLSB
Tribunal 1ª instância: JUÍZOS CÍVEIS DE LISBOA
Juízo ou Secção: 3º JUÍZO
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: CONTRATO DE SEGURO DE VIDA
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: VICTORIA - SEGUROS DE VIDA, SA
Data da Decisão: 02/07/2011
Descritores: PRINCÍPIO DA BOA FÉ
IMPOSIÇÃO DO FORO COMPETENTE
Texto das Cláusulas Abusivas: A acção foi julgada improcedente e consequentemente absolveu a Ré dos pedidos.
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO LISBOA
Relator: JORGE MANUEL LEITÃO LEAL
Data do Acórdão: 11/30/2011
Decisão: Julga-se a apelação procedente e consequentemente revoga-se a sentença recorrida e em sua substituição julga-se a acção procedente e consequentemente:
a) Declara-se a nulidade da cláusula 18ª do Contrato de Seguro de Vida Grupo -m Victória Vida Seguro, comercializado pela R., que tem a seguinte redacção: "O Tomador de Seguro e as Pessoas Seguras, nos termos em que as suas bases e o respectivo tratamento sejam conformes com a legislação aplicáveis e com as autorizações decorrentes da lei ou de decisão da Autoridade competente e com as declarações firmadas por aqueles na proposta de seguro, autorizam expressamente a VICTÓRIA a recolher, a tratar e a partilhar informações e registos informáticos que possam ser tidos como dados pessoais ou mesmo dados pessoais sensíveis, sobre si e sobre todos os movimentos relativos a este contrato";
b) Declara-se a nulidade do n.º 4 da cláusula 19ª, do Contrato de Seguro de Vida Grupo - Victória Vida Segura, comercializado pela R., que tem a seguinte redacção: "Se nada de diferente se convencionar nas Condições Particulares, qualquer litígio emergente do presente contrato será submetido aos tribunais portugueses, considerando-se competente o foro da emissão da Apólice ou o do domicilio em Portugal do Tomador do Seguro, à opção da parte que for autor."
SUMÁRIO:
I - É abusiva, contrária à boa fé, e por conseguinte proibida, nos termos do art. 15º da LCCG, uma cláusula geral que, em contravenção aos artigos 26º e 35º da CRP e à lei de Protecção dos Dados Pessoais imputa ao tomador do seguro e às pessoas seguras, uma autorização expressa para a Ré seguradora recolher e tratarinformações e registos informáticos contendo dados pessoais, incluindo dados pessoais sensíveis, sobre si (o tomador de seguro e as pessoas seguras) e sobre todos os movimentos relativos ao contrato, informações e registos esses que a Ré poderá inclusive partilahr com outrem, sem especificar o tipo de dados a que se reporta, o concreto tratamento tido em vista e a sua finalidade, sem escalrecer acerca da possibilidade de recusa do consentimento nem as consequências dessa recusa e sem que a declaração de consentimento esteja destacada do resto do contrato.
II - O facto de na aludida cláusula se associar o consentimento aos "termos em que as suas bases e o respectivo tratamento sejam conformes com a legislação aplicáveis e com as autorizações da lei ou de decisão da Autoridade competente e com as decalarções firmadas por aqueles na proposta de seguro" é irrelevante, dado o carácter genérico dessa referência, inclusive no que concerne às mencionadas "declarações firmadas por aqueles", cujo conteúdo, finalidade e condições em que serão proferidas não é explicitado.
III - Diga-se, aliás, que a "declaração relativa a dados pessoais", indicada na alínea c) dos factos provados e documentada a fls 66 dos autos, enferma dos alegados vícios no que concerne a rarefacção de informação e especificidade: contém autorização de tratamento de dados concedida não só à R. como às "outras sociedades do Grupo Ergo em Portugal" (quem são?), "bem como os prestadores previstos e indicados nas Condições Gerais ou Particulares do seguro" (quem são?); não indica quais os dados pessoais que serão objecto de tratamento; autoriza a comunicação "quer a instituições de crédito quer a outras sociedades que, sob contrato, efectuem prestações acessórias ou complementares da gestão do contrato" (quem são?), "quer ainda a outras sociedades do Grupo Ergo em Portugal" (quem são?); não indica em concreto o tratamento de dados tido em vista; não indica o concreto objectivo desse tratamento, mencionando genericamente "fins informativos, de acção comercial, ou para efeitos de análise de risco ou para tudo quanto respeite à gestão dos contratos ou dos sinistros".
IV - É nula, na parte em que contraria o disposto no art. 74º, nº 1 do CPC e proibida nos termos dos artigos 15º e 19º alínea g) da LCCG, a cláusula contratual geral com a seguinte redacção: "Se nada de diferente se convencionar nas Condições Particulares, qualquer litígio emergente do presente contrato será submetido aos tribunais portugueses, considerando-se competente o foro da emissão da Apólice ou o do domicilio em Portugal do Tomador do Seguro, à opção da parte que for autor".
V - Mesmo que se provasse que a R. deixara de utilizar a cláusula referida em IV, tal não acarreteria a inutilidade superveniente da lide nessa parte, pois nada pode garantir que a R. não voltará a utilizar a aludida cláusula, sendo certo que só uma decisão judicial inibitória terá o efeito previsto no nº 1 do art. 32º da LCCG, sustentará a compulsão da sanção pecuniária prevista no art. 33º da LCCG e conferirá aos contraentes subscritores de cláusulas idênticas a faculdade de invocarem perante a R., em seu benefício, a declaração de nulidade contida na decisão inibitória.
VI - Nada obstará a que na acção inibitória se declare que determinadas cláusulas contratuais gerais são nulas, sendoc erto que não se trata de declarar a nulidade de cláusulas efectivamente celebradas e vigentes, mas de exercer um controlo preventivo e abstracto de cláusulas potencialmente exaráveis em contratos futuros, condenando-se o predisponente numa prestação de facto negativa, que é a não utilização in concreto dessas cláusulas, precisamente por se entender que as mesmas contrariam a lei e por isso são nulas, nos termos da LCCG.

Recurso SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA
Relator: -
Data do Acórdão: 04/19/2012
Decisão: Julga o recurso improcedente, confirma o acórdão e nega-se, em consequência, a revista.
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Texto Integral: 1401_09_4YXLSB.pdf