DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 20054/10.0T2SNT
Tribunal 1ª instância: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LISBOA OESTE
Juízo ou Secção: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE SINTRA - JUIZ 4
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: CONTRATO DE MANUTENÇÃO DE ELEVADORES
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: OTIS - ELEVADORES, L.DA
Data da Decisão: 07/16/2014
Descritores: CLÁUSULAS PENAIS DESPROPORCIONADAS
EXCLUSÃO OU LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
IMPOSIÇÃO DO FORO COMPETENTE
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
Texto das Cláusulas Abusivas: Face ao que precede e com os fundamentos expostos, julgo a presente ação inibitória [...], parcialmente procedente. Em consequência:
a) Condeno a Ré a abster-se de se prevalecer e utilizar as cláusulas contratuais gerais com os números 5.5.2, 5.7.4, 5.6 e 5.9 do contrato Otis Controlo OC, nos contratos que de futuro venha a celebrar com os sesu clientes, absolvendo-a quanto ao demias peticionado.
5.5 Mora e incumprimento imputáveis ao cliente
5.5.2 - Independentemente do direito à indemnização por mora, estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente Contrato por parte do Cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à Otis por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente Contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado.
5.6 Incumprimento Imputável à Otis
Na situação de eventual incumprimento à OTIS, é expressamente aceite que a Otis apenas responderá até à concorrência do valor de 3 meses de faturação Otis do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao Cliente.
5.7 Duração do contrato
5.7.4 - Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da Otis, em caso de denúncia antecipada do presente Contrato pelo Cliente, a Otis terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado.
5.9 Foro Convencional
Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presnete Contrato, serão competentes os foros das Comarcas de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a quaisquer outros.
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO LISBOA
Relator: LUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Data do Acórdão: 09/10/2015
Decisão: Pelo exposto acordamos em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar a decisão recorrida.

Recurso SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA
Relator: FONSECA RAMOS
Data do Acórdão: 12/14/2016
Decisão: Nega-se a revista.

Sumário:
I) As acções inibitórias visam a tutela dos interesses difusos dos consumidores/aderentes, encontram-se genericamente previstas no art. 52º da CRP e, no âmbito do direito do consumo, no art. 10º, nº 1, da Lei de Defesa do Consumidor e no art. 25º do Dec.-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n°220/95, de 31 de Agosto, relativo às cláusulas contratuais gerais (ccg).

II) – O facto de o contraente que propõe contratos cujas cláusulas são predispostas por si, consentir na negociação de algumas, não exclui que se qualifique o contrato como contrato de adesão: o que importa é saber se o aderente pode negociar as que lhe aprouver, pois se, desde logo, a sua margem de negociação está balizada, condicionada, pelo predisponente, existe um quadro impositivo em que as cláusulas de negociação individual só seriam contempladas pela opção do predisponente. Importará considerar, olhando o contrato como um todo, o quadro negocial padronizado, onde certamente existem cláusulas mais importantes e outras não tanto, quais as que consentem negociação individual e que o predisponente aceita modificar.

III) – Constituindo o conteúdo essencial do contrato cláusulas fixas, de formulário, pré-elaboradas pela parte que as predispõe para a negociação por adesão, mesmo que não exista impossibilidade absoluta de modificação, ainda aí se está perante um contrato de adesão que não é descaracterizado pelo quantum que nele possa ingressar para acolher interesses peculiares do contraente.

IV) – Para se qualificar um contrato como de adesão releva, além do mais, que exista “unilateralidade da predisposição” e que, em relação ao conteúdo negocial que contemple genérica e massivamente os interesses económicos do predisponente, o potencial aderente nada possa negociar assistindo-lhe a possibilidade de aceitar ou rejeitar em bloco, ou seja, se a negociação deferida ao aderente não versar sobre cláusulas que constituem o núcleo essencial do conteúdo contratual, não o içando do patamar inferior da sua débil força negocial para o igualar ao predisponente, deve considerar-se que se está perante um contrato de adesão sujeito ao regime jurídico das ccg.

V) – Nas cláusulas 5.5.2 e 5.7.4, atento o critério ressarcitório inserto nas cláusulas penais, equipara-se, objectivamente, o cumprimento pontual à cessação do contrato, seja no caso de mora do aderente, seja no caso de sua denúncia antecipada, não se atendendo à vantagem económica que advém para o predisponente da cessação imediata do contrato, introduzindo na equação económica do negócio uma injustificada acentuação da posição de supremacia do predisponente.

VI) – A cláusula 5.6 é limitativa da responsabilidade contratual, em caso de incumprimento pela AA, que, tendo que indemnizar o aderente, estipulou que o valor da indemnização tem como limite três meses de facturação da AA: sejam quais forem os danos para o aderente, resultantes do incumprimento pela predisponente, a extensão dos danos não terá qualquer influência na indemnização, porquanto o valor não poderá exceder três meses de mensalidades. Viola o art. 18º, c) da lccg por limitar, sem qualquer critério que permita fazer um juízo de justa proporção, entre a sua conduta, em termos de culpa nas modalidades de dolo e culpa grave, por contraponto a culpa leve e levíssima, e os danos resultantes do seu incumprimento para o aderente.

VII) – A Cláusula 5.9 – cláusula de foro – pelo seu conteúdo, constitui cláusula relativamente proibida, face ao disposto no artigo 19.º, alínea g) do Decreto-Lei n.º446/85, de 25 de Outubro, logo nula, porque, impositivamente, estabelece foro competente que pode envolver graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra a predisponente o justifiquem.

VIII) – A temida possível concorrência predatória de outras empresas concorrentes da Recorrente, que fundamenta a sua pretensão de não publicação da decisão, se confirmatória, argumentando que logo se aprestariam, num desleal “porta a porta”, a minar a sua carteira de clientes, não pode entender-se como regra, num mercado em que a concorrência é regulada.

IX) – Subjacentes à acção inibitória estão interesses de ordem pública como, desde logo, resulta da legitimidade activa conferida ao Ministério Público: visando a acção inibitória a apreciação abstracta de cláusulas contratuais gerais elaboradas para utilização futura – art. 25º do DL.446/85 – a publicidade da decisão, podendo ser imposta ou não na decisão judicial, tem um fim imediato que se exprime na proibição de inclusão em contratos futuros, dirigida ao infractor, fim colimado à protecção do consumidor que, pela via da publicação da decisão judicial, fica informado e pode fazer a sua opção de modo a não contratar com quem predispõe cláusulas proibidas, pelo que só razões muito excepcionais, que não se verificam, determinariam que se omitisse a publicidade da decisão.
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Texto Integral: 20054_10_0T2SNT.pdf 20054_10_0T2SNT.pdf