DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 11917/15.8T8LSB
Tribunal 1ª instância: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LISBOA
Juízo ou Secção: JUIZO LOCAL - JUIZ 18
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES ELETRÓNICAS
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: MEO - SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES E MULTIMÉDIA, SA
Data da Decisão: 01/04/2017
Descritores: ALTERAÇÃO DAS REGRAS DO RISCO
CLÁUSULAS PENAIS DESPROPORCIONADAS
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
CLÁUSULAS EXCLUÍDAS DOS CONTRATOS SINGULARES
IMPOSIÇÃO DE FICÇÕES
Texto das Cláusulas Abusivas: Pelo exposto, declaram-se nulas e absolutamente proibidas as seguintes cláusulas:
I.1) Cláusula 9.8, al.c) [8.8, al. c) no caso do documento n.º 2; 9.8, al.c) no caso dos documentos n.ºs 4 e 5], inserida sob a epígrafe"Garantias e Adiantamentos", constante das "Condições Gerais de Prestação de Serviços de Comunicações Electrónicas", dos documentos n,ºs 2 a 5, dadas por reproduzidas no Facto Provado n.º 11;
I.2) Cláusula 4. do ponto II do Anexo III - Condições de Disponibilização da Factura Electrónica e Extracto on-line (anexo II no caso dos documentos n.ºs 4 e 5], sob a epígrafe"Extracto On-line", constante das "Condições Gerais de Prestação de Serviços de Comunicações Electrónicas", dos documentos n,ºs 3 a 5, dadas por reproduzidas no Facto provado n.º 17, a cláusula 3.3, sob a epígrafe "Códigos de acesso ao serviço", constante das "Condições Específicas do Serviço de Dados - Internet d«no telemóvel, banda larga móvel e acesso á internet wi-fi da MEO" dos documentos n.º 3 a 5, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 18, a cláusula 1.3. do Anexo I - Condições Particulares Aplicáveis ao Serviço prestado sobre IP ("VoIP"), inseridasob a epígrafe "Códigos de acesso ao serviço", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Voz em Rede Fixa da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 19, a cláusula 3.3, sob a epígrafe " Códigos de acesso ao serviço", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de acesso à Internet em banda larga da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 20, a cláusula 4.2, sob a epígrafe "Códigos de acesso ao serviço", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de televisão e multimédia da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 21, a cláusula 14.2, (13.2 no caso do documento n.º 2) sob a epígrafe "Responsabilidade", constante das "Condições Gerais de Prestação do Serviços de Comunicações Electrónicas da MEO" dos documentos n.º 2 a 5, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 22;
I.3) a cláusula 10.5, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de acesso à Internet em banda larga da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 27, a cláusula 12.4, sob a epígrafe " Vigência, Denúncia e Rescisão", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Televisão e Multimédia da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 28, a cláusula 8.4, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Voz Móvel da MEO" dos documentos n.º 3 e 4, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 29, a cláusula 9.4, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas do Serviço de Dados - Internet no Telemóvel, banda larga móvel e acesso à internet wi-fi da MEO" dos documentos n.º 3, 4 e 5, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 30, a cláusula 16., constante das "Condições Particulares de Prestação do Serviço MEO com telemóvel" do documento n.º 3, dada por reproduzida no Facto n.º 31, as cláusulas 10.5, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de acesso à Internet em banda larga da MEO" dos documentos n.º 2 e 3; a cláusula 12.4, sob a epígrafe "Vigência, Denúncia e Rescusão", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Televisão e Multimédia da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, 8.4, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Voz Móvel da MEO" dos documentos n.º 3 e 4; 8.4, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas de Prestação do Serviço de Voz Fixa em Rede Móvel da MEO" dos documentos n.º 3 e 4; 9.4, sob a epígrafe "Vigência", constante das "Condições Específicas do Serviço de Dados - Internet no telemóvel, banda larga móvel e acesso à internet wi-fi da MEO" dos documentos n.º 3, 4 e 5; e 16, constante das "Condições Particulares de Prestação do Serviço MEO com Telemóvel" do documento n.º 3, dadas por reproduzidas no Facto Provado n.º 32; a cláusula 17.1 (18.1 no caso do documento n.º 3), sob a epígrafe "Resolução", constante das "Condições Gerais de Prestação de Serviços de Comunicações Electrónicas da MEO" dos documentos n.º 2 a 5, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 33;
I.4) a cláusula 3., sob a epígrafe "Denúncia", constante do Anexo II - Condições Particulares do Tarifário Free" das " Condições Específicas de Prestação do Serviço de Acesso àInternet em banda Larga" dos documentos n.º 2 e 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 34;

I.5) a cláusula 6., das "Condições Particulares de prestação do Serviço MEO com Telemóvel" do documento n.º 3, dada por reproduzida no Facto Provado n.º 37.

Facto Provado n.º 11:
Cláusula 9.8, al. c):
"Caso o cliente atinja o seu limite de consumo, a MEO reserva-se o direito de lhe exigir:
c) o pagamento de um determinado volume mensal de comunicações de acordo com o tarifário aplicável ao serviço, em função do valor médio mensal dos consumos efectuados pelo cliente ou, quando não exista, em função do valor previsto de consumo apresentado pelo cliente, acrescido do investimento realizado pela MEO na celebração do contrato com o cliente, designadamente em equipamento(s)"
Facto Provado n.º 17:
Cláusula 4, Anexo III:
"A MEO não será responsável por acesso indevido de terceiros ou eliminação, destruição, danificação, supressão, modificação de dados ou extravio quaisquer perdas ou danos causados por utilizações abusivas do código referido nos números anteriores que lhe não sejam directa ou indirectamente imputáveis a título de dolo ou culpa grave."
Facto Provado n.º 18:
Cláusula 3.3:
"A MEO não será responsável por quaisquer perdas ou danos causados por utilizações abusivas dos códigos referidos nos números anteriores que lhe não sejam directa ou indirectamente imputáveis a título de dolo ou culpa grave."
Facto Provado n.º 19:
Cláusula 1.3, Anexo I:
"A MEO não será responsável por quaisquer perdas ou danos causados por utilizações abusivas dos códigos referidos nos números anteriores que lhe não sejam directa ou indirectamente imputáveis a título de dolo ou culpa grave."
Facto Provado n.º 20:
Cláusula 3.3:
"A MEO não será responsável por quaisquer perdas ou danos causados por utilizações abusivas dos códigos referidos nos números anteriores que lhe não sejam directa ou indirectamente imputáveis a título de dolo ou culpa grave."
Facto Provado n.º 21:
Cláusula 4.2:
"A MEO não será responsável por quaisquer perdas ou danos causados por utilizações abusivas dos códigos referidos nos números anteriores que lhe não sejam directa ou indirectamente imputáveis a título de dolo ou culpa grave, considerando-se realizada pelo cliente a utilização do serviço por terceiros com recurso aos códigos disponibilizados pela MEO, salvo prova em contrário."
Facto Provado n.º 22:
Cláusula 14.2:
"A MEO garante que as redes de comunicações electrónicas utilizadas para a prestação dos serviços cumprem os requsitos necessários e adequados à segurança da prestação dos mesmos e da própria rede, não podendo, no entanto, garantir a sua inviolabilidade por terceiros não autorizados.
Caso a MEO conceba soluções técnicas que se destinem a evitar o risco de inviolabilidade, dará disso conhecimento ao cliente, informando-o igualmente dos custos prováveis das mesmas."
Facto Provado n.º 27:
Cláusula 10.1:
"As presentes Condições Especificas entram em vigor na data de adesão e vigoram pelo período mínimo inicial que, naquela data, estiver definido nas condições de oferta do serviço devidamente publicitadas pela MEO; se nada estiver definido nas condições de oferta do serviço, considera-se que tal período é de 12 (doze) meses."
Cláusula 10.5:
"Em caso de rescisão das presnetes Condições Específicas, pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a MEO terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade)."
Facto Provado n.º 28:
Cláusula 12.1:
"As presentes Condições Especificas entram em vigor na data de adesão e vigoram pelo período mínimo inicial de 24 (vinte e quatro) meses, salvo nos casos em que o cliente opte por contratar o serviço pelo período mínimo inicial de 12 (doze) meses, de acordo com o tarifário em cada momento em vigor."
Cláusual 12.4:
"Em caso de rescisão das presnetes Condições Específicas, pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a MEO terá direito a receber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade)."
Facto Provado n.º 29:
Cláusula 8.3:
"A MEO e o cliente poderão acordar na prestação do serviço por um período mínimo de vigência, indicado no Formulário. No termo do período de vigência acordado, as presnetes Condições Específicas renovam-se por períodos sucessívos de 1 (um) mês, salvo denúncia por qualquer das Partes nos termos previstos na Condição 8.1"
Cláusula 8.4:
"Em caso de rescisão das presentes Condições Específicas, pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período de vigência mínimo, inicial ou subsequente, a MEO terá direito a rceber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade)."
Facto Provado n.º 30:
Cláusula 9.3:
"A MEO e o cliente poderão acordar na prestação do serviço por um período mínimo de vigência, indicado no Formulário. No termo do período de vigência acordado, as presnetes Condições Específicas renovam-se por períodos sucessívos de 1 (um) mês, salvo denúncia por qualquer das Partes nos termos previstos na Condição 9.1"
Cláusula 9.4:
"Em caso de rescisão das presentes Condições Específicas, pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período de vigência mínimo, inicial ou subsequente, a MEO terá direito a rceber uma indemnização calculada da seguinte forma: (período mínimo de vigência - n.º de meses em que os serviços estiveram activos) x (valor da mensalidade)."
Facto Provado n.º 31:
Cláusual 13:
"A adesão ao serviço pressupõe a aceitação de um período de vigência inicial de 24 (vinte e quatro) meses"
Cláusula 14.:
"Sem prejuízo do disposto no número anterior, cada cartão de acesso ao serviço de voz móvel contratado está sujeito a um período mínimo de 24 (vinte e quatro) meses na rede móvel da MEO, a contar da data da respectiva activação".
Cláusula 16.:
"A cessação antecipada do presente Contrato, por iniciativa do cliente ou pela MEO por motivo imputável ao cliente, antes de decorrido o período de vigência inicial de 24 (vinte e quatro) meses a contar da data de instalação do Serviço, constitui a MEO no direito de exigir ao cliente o pagamento de uma indemnização no valor correspondente às mensalidades acordadas, multiplicadas pelo número de meses em falta para completar aquele período, acrescido do valor correspondente à totalidade das prestações em falta relativas à aquisição de telemóvel(eis), quando aplicável."
Facto Provado n.º 32:
Cláusulas 10.5, 12.4, 8.4, 9.4, 16:
"Em caso de rescisão contratual pelo cliente ou por motivo ao mesmo imputável, antes de decorrido o período mínimo de vigência, a Ré terá direito a receber uma indemnização correspondente ao número de mensalidades que ainda se encontrem por pagar, resultantes da diferença entre o período mínimo de vigência contratuial e o número de meses em que os serviços estiveream activos."
Facto Provado n.º 33:
Cláusula17.1:
"...em caso de incumprimento definitivo das obrigações contratuais, tal confere a qualquer uma das Partes o direito à resolução do Contrato, após pré-aviso adequado de 8 (oito) dias, sem prejuízo da indemnização a que o referido incumprimento possa dar lugar."
Facto Provado n.º 34:
Cláusula 3.:
" A denúncia do Contrato nos termos da Cláusula 10. das Condições Específicas não implica o direito a qualquer indemnização ou outra compensação a pagar pela MEO e importa a perda de todos os montantes que constem do saldo da Conta de Acesso, na data em que a mesma produza efeitos, nos termos da Cláusula 10.4. das Condições Específicas."
Facto Provado n.º 37:
Cláusula 6:
"O cliente declara conhecer os preços aplicáveis ao serviço, constantes do tarifário em vigor, designadamente de instalação, reinstalação, activação, mensalidades e, no caso de clientes empresariais, taxa de downgrade no valor de 200 Euros (à qual acresce IVA) para alteração para pacote com menos serviços, tendo sido facultada, nesta data, ao cliente uma cópia do tarifário em vigor, podendo o mesmo obter informações permanentemente actualizadas sobre os preços aplicáveis em meo.pt."
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO LISBOA
Relator: MANUEL MARQUES
Data do Acórdão: 03/13/2018
Decisão: Pelo acima exposto, decide-se:
Julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se a sentença recorrida na parte em que julgou nula e absolutamente proibida e cláusula 4.2, 2ª parte, sob a epígrafe "Códigos de acesso ao serviço", constante das "Condições Específicas de prestação do Serviço de televisão e multimédia da MEO" dos documentos n.º 2 e 3, confirmando-se no demais a sentença recorrida.

Sumário:
1. O não estabelecimento de limites à cobrança dos montantes investidos pela ré, no caso do cliente atingir os limites de consumo, mantendo intocadas, as cláusulas onde são consagrados, o período mínimo de vigência contratual imposto ao consumidor - os quais visam a recuperação dos custos investidos por si suportados com a instalação e activação do serviço, bem como os despendidos com a angariação e cedência do equipamento necessário à prestação dos serviços a que respeitam - e a sua obrigação de indemnização da Ré, em caso de rescisão antecipada do contrato, é proibida e nula, por atentar contra valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa fé, nos termos do art. 15.º e 16.º, ambos do DL 446/85, de 25/10, uma vez que confere á Ré uma vantagem injustificável que afecta significativamente o equilíbrio contratual, em detrimento do aderente/consumidor.
2. O estabelecimento de uma presunção de que o serviço de televisão foi utilizado pelo aderente, fazendo-se recair sobre este a prova de que a utilização do serviço foi feita por terceiro, sem o seu consentimento, não viola o art. 21º, al. g) do DL 446/85, por não se modificar o critério de repartição do onús da prova, encontrando-se a presunção em consonância com as regras que estabelecem os princípios que norteiam as normas de distribuição do ónus de prova (art. 342º do CC), na medida em que a atribuição dos códigos de acesso é pessoal, cabendo ao seu titular a obrigação de manter secreto os mesmos.
3. A exoneração de responsabilidade da operadora/predisponente por culpa leve nas situações de acesso indevido por parte de terceiros ao serviço de internet no telemóvel, de televisão, de comunicações electrónicas e de voz em rede fixa, deixa o aderente completamente desprotegido, constituindo uma desoneração injustificada, quando é certo que o aderente responde pelos danos causados na situação inversa ( quando age com culpa leve), sendo tais cláusulas contratuais gerais proibidas, nos termos dos arts 15º e 16º, al. a) do RCCG.
4. De igual modo, ao fazer recair por inteiro a responsabilidade no aderente nas situações em que se verifique uma utilização abusiva dos códigos de acesso por parte de terceiros, sem culpa do aderente, nem da predisponente, nomeadamente quando se desconhece como aquele acedeu aos códigos, a composição dos interesses será excessivamente desequilibrada, tanto mais que, em tese, tal também pode ocorrer através da plataforma informática da predisponente, ou seja, quando o controle da situação está sob o domínio desta e não do utilizador.

Recurso SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA
Relator: -
Data do Acórdão: 09/22/2018
Decisão: Por tudo o exposto, acorda-se em não admitir o recurso de revista excepcional.
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Texto Integral: 11917_15_8T8LSB_1.pdf 11917_15_8T8LSB_1.pdf 11917_15_8T8LSB_2.pdf 11917_15_8T8LSB_2.pdf