DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 7397/14.3T8LSB
Tribunal 1ª instância: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LISBOA
Juízo ou Secção: JUIZO LOCAL CÍVEL DE LISBOA - JUIZ 19
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: CONTRATO DE DEPÓSITO BANCÁRIO
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: BANCO SANTANDER TOTTA, SA
Data da Decisão: 11/03/2015
Descritores: CLÁUSULAS EXCLUÍDAS DOS CONTRATOS SINGULARES
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
Texto das Cláusulas Abusivas: Pelos fundamentos expostos, a presente acção instaurada pelo Ministério Público contra o Banco Santander Totta, SA, é julgada parcialmente procedente por provada e, em consquência, decide-se:
1) Declarar nulas as cláusulas 10.ª, n.º 1 e n.º 2 das Condições Especiais - Conta ordenado e 7ª, n.º 1 e n.º 2 do Documento Autónomo - Condições Aplicáveis à facilidade de descoberto - Super Conta Ordenado Protocolo, ambas sob a epígrafe "Comissões e Despesas" com a seguinte redacção:
"1. São da responsabilidade do Cliente todos os impostos, incluindo o imposto do selo sobre os juros, que sejam devidos por força da "Conta Ordenado" e de outras operações com contratos que com ela se encontrem em conexão.
2. São da conta do Cliente todas as despesas e encargos a que der lugar o cumprimento das suas ordens de aplicação de capitais, bem como as da utilização do crédito concedido, incluindo as que o Banco venha a realizar para garantia e cobrança dos seus créditos."
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO LISBOA
Relator: -
Data do Acórdão: 12/10/2017
Decisão: Assim e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e consequentemente, mantêm decidido pelo Tribunal a quo.

Recurso SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Data do Acórdão: 03/08/2018
Decisão: Pelo exposto, acorda-se em julgar o recurso parcialmente procedente decidindo-se:
a) Revogar parcialmente o acórdão recorrido, na parte em que declarou a nulidade do n.º 1 e do n.º 2, primeira parte, da Cláusula 10ª do Contrato I, e do n.º 1 e do n.º 2, primeira parte, da Cláusula 7ª do Contrato II, nos quais se estabelece:
"1. São da responsabilidade do Cliente todos os impostos, incluindo o imposto do selo sobre os juros, que sejam devidos por força da "Conta Ordenado" e de outras operações com contratos que com elas se encontrem em conexão.
2. São da conta do Cliente todas as despesas e encargos a que der lugar o cumprimento das suas ordens de aplicações de capitais, bem como as da utilização do crédito concedido"
declarando-as válidas.
b) Manter o acórdão recorrido, na parte em que manteve a declaração de nulidade do n.º 2, segunda parte, da Cláusula 10ª do Contrato, e do n.º 2, segunda parte, da Cláusula 7ª do Contrato II, nos quais se estabelece:
"São da conta do Cliente todas as despesas e encargos (...) incluindo as que o Banco venha a realizar para garantir a cobrança dos seus créditos";

SUMÁRIO:
I - Na orgânica do regime legal das cláusulas contratuais gerais, a protecção dos aderentes alcança-se por meio de duas vias distintas, uma pela Consagração de deveres de comunicação e de informação das cláusulas, cuja violação conduz à respectiva exclusão dos contratos singulares; a outra pela exigência de conformação do conteúdo das cláusulas contratuais gerais com a boa fé, concretizada através dos valores fundamentais do direito (art. 16º da LCCG) ou do confronto com as proibições constantes dos arts. 18º e ss. da LCCG.
II - A acção inibitória destina-se a reconhecer a nulidade de determinadas cláusulas e, consequentemente, a impedir a sua inclusão em contratos singulares a celebrar futuramente. o que não se confunde com a tutela prevista nos arts. 5º a 8º da LCCG, que visa a exclusão de cláusulas inseridas em contratos singulares já celebrados, por violação dos deveres de comunicação ou de informação.
III - Em termos gerais, a indeterminabilidade das obrigações negociais gera nulidade (art. 280º, nº 1, do CC). Quanto à simples indeterminação, não estando excluída pelo regime do CC (cfr. art. 400º), poderá contudo, no domínio mais exigente do regime das cláusulas contratuais gerais, configurar violação da boa fé, na medida em que afecte de forma desproporcionada, a previsibilidade das obrigações assumidas por parte dos futuros aderentes.
IV - O contrato de abertura de conta corresponde a um contrato socialmente tipificado - reconhecido pelo Aviso do BP nº 11/2005, de 21-07, entretanto substituído pelo Aviso nº 5/2013, de 11-12 -, inserindo-se no vasto âmbito dos contratos de prestação de serviços, devendo o seu regime ser colmatado com recurso ao regime do mandato nos termos do art. 1156º do CC.
V - Sendo o contrato de abertura de conta caracterizado como um "contrato normativo, uma vez que regula toda uma actividade jurídica ulterior, ainda que facultativa", compreende-se que o conteúdo das suas cláusulas se revista de um certo grau de indeterminação, sem que se possa considerar que tal constitua, por si só, um desrespeito dos parâmetros da boa fé.
VI - Constando das cláusulas contratuais gerais dos contratos de abertura de conta que o Banco apresenta aos seus Clientes, no que respeita à responsabilidade pelo pagamento dos impostos, que "São da responsabilidade do Cliente todos os impostos, incluindo o imposto do selo sobre os juros, que sejam devidos por força da [nome da conta]e de outras operações com contratos que com ela se encontrem em conexão", na impossibilidade de enunciar os concretos impostos a que os clientes, no futuro, se encontrem sujeitos por força desse contrato, devem, tais cláusulas ser consideradas válidas à luz da LCCG.
VII - Da mesma forma, são igualmente válidas as cláusulas contratuais gerais que, a respeito do pagamento de despesas e encargos inerentes a operações bancárias, dispõem que "São da conta do Cliente todas as despesas e encargos a que der lugar o cumprimento das suas ordens de aplicação de capitais, bem como as da utilização do crédito concedido" uma vez que, considerando a natureza do contrato de abertura de conta referida em V, configura-se como aceitável que o conteúdo das respectivas cláusulas se revista de um certo grau de generalidade, sem que se possa considerar que tais cláusulas impõem "ficções de recepção, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos para tal insuficientes" (art. 19º, al. d), da LCCG) ou desrespeitam valores fundamentais do direito, tutelados genericamente pela exigência de conformidade com a boa fé.
VIII - Relevante para este efeito será que, tanto no momento da celebração de cada contrato singular de abertura de conta, como ao longo da execução do mesmo, sejam cumpridos os deveres de comunicação e de informação em relação a cada cliente quanto ao preçário das operações bancárias em vigor, não ocorrendo a invalidade das cláusulas impugnadas referidas em VII uma vez que estas devem ser conjugadas com as Condições Gerais do contrato das quais consta a previsão de um Preçário com “as taxas de juros em vigor, indexantes, comissões e preços cobrados pelo Banco em contrapartida dos serviços por si efectuados, ou o modo de os determinar”.
IX - Já as cláusulas contratuais gerais que, a respeito do pagamento de despesas e encargos que o Banco venha a suportar, dispõem que “São da conta do Cliente todas as despesas e encargos (…) incluindo as que o Banco venha a realizar para garantia e cobrança dos seus créditos.”, afectam o necessário equilíbrio entre as partes ao impor aos aderentes encargos indetermináveis e eventualmente desproporcionados, estando, por isso, feridas de nulidade por desconformidade com as exigências da boa fé (art. 15º da LCCG).
X - Tal nulidade emerge de tais cláusulas: (i) não preverem a exigência de relação causal entre o incumprimento contratual e as despesas e encargos a suportar pelo cliente; (ii) não esclarecerem se o pagamento “se efectiva pela via do reembolso das custas de parte ou directamente perante o Banco, com o consequente risco, neste caso, de duplicação de pagamento”, ainda que o valor das despesas judiciais esteja, em cada momento, fixado por lei e, (iii) quanto às despesas extrajudiciais (honorários de advogados ou outras), verifica-se a “ausência de um critério definidor quer do respectivo âmbito, quer do respectivo montante”, assim como da “sua necessidade e justificação”.
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