Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:058/19
Data do Acordão:11/03/2020
Tribunal:CONFLITOS
Relator:MARIA BENEDITA URBANO
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL.
DANOS.
INDEMNIZAÇÃO.
Sumário:De harmonia com o disposto na al. f) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF, cabe aos tribunais da jurisdição administrativa a competência para conhecer de litígios relativos à questão da “Responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público, incluindo por danos resultantes do exercício das funções política, legislativa e jurisdicional, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 4 do presente artigo”.
Nº Convencional:JSTA000P26671
Nº do Documento:SAC20201103058
Data de Entrada:11/28/2019
Recorrente:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE O TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LISBOA - JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LISBOA - JUIZ 10 E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA.
AUTOR: CLUBE TAP PORTUGAL
RÉU: METROPOLITANO DE LISBOA, EPE
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Tribunal de Conflitos:

I. Relatório

1. O presente conflito de competências tem na sua origem uma acção declarativa de condenação, com a forma de processo comum, intentada no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Cível de Lisboa - Juiz 10, pelo Clube Tap Portugal, Associação de Utilidade Pública, contra Metropolitano de Lisboa EPE.

De forma sumária, o A. formulou a final um pedido principal de condenação do R. numa quantia total de € 2.315.127,24 “a título de indemnização por responsabilidade civil contratual, emergente do contrato celebrado em Abril de 2008, cujos termos foram reiterados em Janeiro de 2010”.

Subsidiariamente, peticionou a quantia total de € 2.315.127,24 a “título de indemnização por responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito emergente das obras de expansão da rede de metropolitano que afectaram o solo e subsolo das parcelas de que o A. é superficiário e sitas na Avenida de Berlim e Avenida do Porto”.

Na contestação apresentada o R. defendeu-se por excepção e por impugnação, tendo, no que respeita à defesa por excepção, suscitado, antes de mais, a incompetência ratione materiae do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, uma vez que cabe à jurisdição administrativa a competência para conhecer das questões de responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público. Além desta, deduziu ainda a excepção da prescrição do (eventual) direito à indemnização reclamada nos autos

Ouvido o A., o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, por decisão de 07.04.2017 – na qual entendeu que “Atenta a versão da A., o enquadramento jurídico possível é tão só a responsabilidade extracontratual” –, julgou procedente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria. Consequentemente, absolveu o R. da instância. Desta decisão recorreu o A. Clube Tap Portugal para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por acórdão de 31.10.2017, e porque entendeu que não se configura qualquer responsabilidade civil contratual (pois não chegou a ser concluído nenhum acordo indemnizatório entre as partes), julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão recorrida.

Na sequência deste último acórdão, o A. requereu, em 13.11.2017, a remessa dos autos para o TAC de Lisboa.

O TAC de Lisboa, por decisão de 19.10.2018, decidiu, em síntese, o seguinte:

Assim e em relação ao pedido de deduzido a título principal, há que concluir que este Tribunal não dispõe de competência material para do mesmo, sendo competentes para a sua apreciação e decisão os tribunais judiciais”. Em face disso, procedeu “à absolvição da Ré da instância, na parte que se refere ao pedido principal (…)” e, quanto ao pedido subsidiário, decidiu suspender “a instância até que seja conhecido o mérito do pedido principal (…)”.

Uma vez mais inconformado, o A. recorreu para o Tribunal de Conflitos ao abrigo do artigo 109.º e ss. do CPC e dos artigos 59.º e 102.º e ss. do Decreto n.º 19243, de 16.01.1931. Em resposta ao requerimento (e alegações de recurso) do A., o TAC de Lisboa, por despacho de 20.11.2019, remeteu os presentes autos ao Tribunal de Conflitos “para resolução negativa de conflito de jurisdição”.

2. A Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu parecer no sentido de o presente conflito ser resolvido a favor dos tribunais administrativos por, em seu entender, ser aplicável ao caso a al. f) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF.

II. Enquadramento e apreciação do conflito

3. A única questão a decidir no âmbito do presente conflito é a de saber qual a jurisdição materialmente competente para conhecer do pedido indemnizatório formulado pelo A. a título principal. Os factos a considerar são, para o que agora interessa, os mencionados no relatório.

Vejamos.

4. Tudo está em saber se, face ao pedido indemnizatório deduzido a título principal, estamos perante uma situação de responsabilidade civil contratual ou extracontratual. A natureza da responsabilidade vai determinar qual a jurisdição competente: a administrativa, caso se trate de responsabilidade civil extracontratual, ou a judicial, caso se trate de responsabilidade civil contratual.

O A. Clube Tap Portugal, Associação de Utilidade Pública, é titular de um direito real de superfície sobre determinados terrenos camarários e ficou prejudicado no seu gozo por conta das obras realizadas por empreiteiros ao serviço do Metropolitano de Lisboa EPE., nesse sentido se podendo dizer que foi expropriado (lato sensu) ou privado de um valor, o que poderá determinar o pagamento de uma indemnização. Mas, como bem acentuam o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Cível de Lisboa e, ulteriormente, o Tribunal da Relação, não chegou a haver ou a ser celebrado qualquer acordo indemnizatório entre as partes, sendo vários os factos que comprovam que ele não existe. Razão pela qual há que concluir que para o conhecimento da acção declarativa de condenação intentada pelo A. Clube Tap Portugal contra Metropolitano de Lisboa EPE são competentes os tribunais administrativos, dado que nela está envolvida uma questão de responsabilidade civil extracontratual.

5. Termos em que se decide resolver o presente conflito de jurisdição atribuindo a competência para conhecer da acção declarativa de condenação que está na sua origem aos tribunais administrativos.

Sem custas.

Lisboa, 3 de Novembro de 2020.

A presente decisão foi adoptada por unanimidade pelos Senhores Conselheiros Maria Benedita Urbano (relatora), José Manuel Bernardo Domingos, Ana Paula Soares Leite Martins Portela, Ilídio Sacarrão Martins, Maria do Céu Dias Rosa das Neves e Joaquim António Chambel Mourisco, e vai assinada apenas pela Relatora, com o assentimento (voto de conformidade) dos Senhores Conselheiros adjuntos, de harmonia com o disposto no artigo 15-A (Recolha de assinaturas dos juízes participantes em tribunal colectivo) do DL n.º 10-A/2020, de 13.03 – preceito introduzido pelo DL n.º 20/2020, de 01.05.