Acórdão do Tribunal dos Conflitos | |
| Processo: | 02/12 |
| Data do Acordão: | 09/20/2012 |
| Tribunal: | CONFLITOS |
| Relator: | SANTOS BOTELHO |
| Descritores: | CONFLITO DE JURISDIÇÃO |
| Sumário: | I – A competência em razão da matéria é fixada em função dos termos em que a acção é proposta, concretamente, afere-se em face da relação jurídica controvertida, tal como configurada na petição inicial, relevando, designadamente, a identidade das partes, a pretensão e os seus fundamentos, sendo que em sede da indagação a proceder a este nível irreleva o juízo de prognose que, hipoteticamente, se pretendesse fazer relativamente à viabilidade da acção, por se tratar de questão atinente com o mérito da pretensão. II – Não afasta a competência dos tribunais administrativos e fiscais a eventualidade de o Autor pedir, na acção, a condenação solidária de entidades públicas e de entidades particulares e o facto de para o conhecimento do pedido formulado contra estas últimas ser competente o “tribunal comum”. |
| Nº Convencional: | JSTA000P14571 |
| Nº do Documento: | SAC2012092002 |
| Data de Entrada: | 03/19/2012 |
| Recorrente: | A..., NO CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO ENTRE O 1 JUÍZO DE COMPETÊNCIA CÍVEL DO TRIBUNAL JUDICIAL DE PÓVOA DE VARZIM E OS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS |
| Recorrido 1: | * |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Aditamento: | |
| Texto Integral: | Acordam no Tribunal de Conflitos, I – RELATÓRIO 1. A…… intentou um acção declarativa de condenação, com processo ordinário, no Tribunal Judicial da Póvoa do Varzim, contra B……., C……, D……, E……, Lda, F……, Município da Póvoa do Varzim e Estado Português, pedindo a condenação dos RR a pagarem-lhe, solidariamente, a quantia de Euros 1.352,084,67, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos. Para o efeito, alegou, designadamente, que tinha direito a ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua embarcação, em consequência de um incêndio que ocorreu na sequência do lançamento de fogo de artificio nas Festas da Assunção, organizadas pela G……, da dita Paróquia, sendo que foi o aludido Município da Póvoa do Varzim que deu autorização e colaborou na colocação de barracas e espaços de diversão no local, desrespeitando os termos do licenciamento para o lançamento de foguetes, enquanto o Estado Português é responsável pelos actos imputados a seus agentes, no caso, à PSP, que não cumpriu as tarefas de fiscalização. A dita acção deu entrada em 18-06-07. 2. O RR Município e o Estado Português vieram arguir a excepção de incompetência material do tribunal, pugnando pela competência dos tribunais administrativos, por sua vez, os RR C……, D…… e E…… e os demais RR e habilitados, arguiram, também, a excepção de incompetência material do triunfal, por entenderem que a mesma cabe ao tribunal marítimo. 3. Na fase do saneamento, foi julgada procedente a excepção dilatória da incompetência material invocada pelos RR Município e Estado, absolvendo da instância os ditos RR, prosseguindo, contudo, os autos quanto aos demais RR. 4. Tendo sido interposto recurso pelo A. para o Tribunal da Relação da aludida decisão, foi a mesma confirmada. 5. Recorreu, então, o A. para STJ, que, por Acórdão, de 15-12-11, decidiu não tomar conhecimento do recurso, determinando a remessa dos autos para o Tribunal de Conflitos. II – CUMPRE DECIDIR Na situação em análise, tal como se salienta no mencionado Ac. do STJ, estamos no âmbito da previsão do n° 2, do artigo 107° do CPC, configurando-se o recurso para o Tribunal de Conflitos como um meio de prevenir um conflito futuro, na exacta medida em que não chegou a existir uma pronúncia por parte dos tribunais administrativos e fiscais sobre a sua própria competência. Vejamos, então, qual o Tribunal competente. Ora, como é sabido e constitui jurisprudência constante quer deste Tribunal de Conflitos quer do STJ e do STA, a competência em razão da matéria é fixada em função dos termos em que a acção é proposta, concretamente, afere-se em face da relação jurídica controvertida, tal como configurada na petição inicial, relevando, designadamente, a identidade das partes, a pretensão e os seus fundamentos, sendo que em sede da indagação a proceder em termos de se determinar a competência material do tribunal é irrelevante (e descabido) o juízo de prognose que, hipoteticamente, se pretendesse fazer relativamente à viabilidade da acção, por se tratar de questão atinente com o mérito da pretensão, temos, assim, que a competência se afere pelo quid decidendum. Cfr., entre muitos outros, os Acs. do Tribunal de Conflitos, de 31-01-91, AD 361, de 06-07-93 (Conflito n° 253), de , do STJ, de 12-10-82 – BMJ 320, a págs. 389 e sgts., do STA, de 9-03-89 – Rec. 25.084, de 13-05-93 – Rec. 31.478, de 27-01-94 – Rec. 32.278, de 28-05-96 – Rec. 39.911, de 26-09-96 – Rec. 267, de 27-11-96 – Rec. 39.544, de 19-02-97 – Rec. 41.555, de 24-11-98 – Rec. 43.737, de 23-03-99 – Rec. 43.973, de 26-05-99 – Rec. 40.648, de 30-06-99 – Rec. 40.693, de 06-07-00 – Rec. 46.161, de 11-07-00 – Rec. 318, de 26-09-00 – Rec. 46.024 e de 03-10-00 – Rec. 356. Ver, no mesmo sentido, M. Andrade, in “Noções Elementares de Proc. Civil”, a págs. 91. Sucede que, no caso em apreço, olhando aos critérios acabados de enunciar, é patente que a competência para conhecer da acção no referente aos entes públicos demandados incumbe, efectivamente, aos tribunais administrativos, tal como, de resto, se decidiu quer no Tribunal Judicial de P. Varzim quer na Relação do Porto. Na verdade, aos RR Município da Póvoa de Varzim e Estado Português o Autor imputa, na sua petição inicial, a prática de actos que se traduziram, no caso do R. Município, no alegado desrespeito dos termos do licenciamento para o lançamento de foguetes e, no caso do R. Estado Português, no invocado incumprimento, por parte da PSP, das suas tarefas de fiscalização, fazendo o A. radicar em tais actos o seu pedido indemnizatório, no quadro da responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos, o que, claramente, se integra na previsão da alínea g), do n° 1, do artigo 4º do ETAF (aprovado pela Lei nº 13/2002, de 19-02). Ou seja, no concernente aos já aludidos entes públicos, estamos em face de um litígio emergente de uma relação jurídica administrativa (cfr. artigo 1º do ETAF) e, daí, a competência dos tribunais administrativos para conhecer de tal acção no respeitante ao pedido formulado contra os ditos RR Município da Póvoa de Varzim e Estado Português, não sendo tal conclusão infirmada pela alegada circunstância de o Tribunal Judicial da P. Varzim ser o competente para conhecer da acção no referente aos demais RR (vertente decisória contida do despacho saneador, proferido no Tribunal Judicial da P. do Varzim, que o Autor não contesta), acolhendo-se, aqui, a argumentação aduzida quanto a esta questão nos Acs. deste Tribunal de Conflitos de 29-06-04, Proc. N° 01/04 e de 28-11-07 — Proc. N° 06/07, de onde resulta, em síntese, que não afasta a competência dos tribunais administrativos a eventualidade de o Autor pedir a condenação solidária de entidades públicas e de entidades particulares e o facto de para o conhecimento do pedido formulado contra estas últimas ser competente o “tribunal comum”. DECISÃO Nestes termos, acordam em julgar os tribunais administrativos como os competentes, em razão da matéria, para conhecer da acção intentada pelo Autor no concernente aos RR Município da Póvoa do Varzim e Estado Português. Sem custas. Lisboa, 20 de Setembro de 2012. – José Manuel da Silva Santos Botelho (Relator) – João Moreira Camilo – António Políbio Ferreira Henriques – José Adriano Machado Souto de Moura – Fernanda Martins Xavier e Nunes – Raul Eduardo do Vale Raposo Borges. |